«Se não acreditamos em Thor, por que crer no Deus cristão?»

“Se não acreditamos em Thor, por que crer no Deus cristão?”, questiona-se (incrivelmente, a sério) o Richard Dawkins. A estapafúrdia pergunta, feita por uma pessoa que vergonhosamente lidera uma recente lista “com os maiores intelectuais do mundo” (sic!), causa-nos perplexidade e angústia. Como ele pode ser tão burro?

Os ateístas fanáticos (dos quais o Dawkins é um excelente exemplar) padecem de uma grave deficiência intelectual que, aparentemente, lhes veta à razão o mais rudimentar raciocínio abstrato. Qualquer crente do mundo sabe responder a esta pergunta simplória e sem sentido. É embaraçosamente evidente: nós acreditamos em Deus e não em Thor porque Deus existe, e Thor não. Como é possível que uma pessoa supostamente estudada não consiga entender isso?

Se fosse possível escolher um sentimento para descrever o que estas patacoadas do Dawkins provocam, tal seria “vergonha alheia”. Ser ignorante não é vergonha; ser ignorante e julgar-se inteligente, contudo, é degradante. Mas nem o Dawkins nem os seus asseclas percebem o patético espetáculo que desempenham em público: cega-lhes a bazófia que não conseguem conter. Pensam que seus dogmas obtusos são verdades apodícticas. São manifestamente incapazes de pensar fora da minúscula caixinha que lhes estreita o horizonte intelectual. É verdadeiramente espantoso.

A pergunta relevante não é e nem pode ser por que acreditar em Deus e não em Thor. A pergunta relevante, como o percebe qualquer pessoa sã, é como saber que Deus existe mas Thor não; ou, dito de outra maneira, como saber qual é o Deus verdadeiro. A isto responde a Igreja com o que tradicionalmente se chama de praeambula fidei, os “preâmbulos da Fé”, ou seja, verdades alcançáveis à luz da razão natural que preparam e apontam para a verdade do Cristianismo. Tais são, por exemplo, o conhecimento natural a respeito da existência de Deus e a verdade histórica do Cristianismo, coisas que qualquer pessoa honesta é capaz de alcançar. O grande problema é que os fanáticos ateístas desprezam a Filosofia e a História e, depois, vêm reclamar “provas”. Comportam-se mais ou menos como aquele sujeito do qual falava Chesterton (inglês como Dawkins, mas mais inteligente do que este), que pede testemunhos da existência do sobrenatural e, quando apresentado a um sem-número de vozes unânimes de todos os tempos e culturas que o atestam, simplesmente responde que não servem porque se tratam de “pessoas supersticiosas que acreditavam em qualquer coisa”. Ora, para respondermos às gabarolices do Dawkins, poderíamos dizer simplesmente isso e mais nada: se não acreditamos em Chesterton, por que crer no biólogo inglês? E já estaria bem respondido.

A grande verdade é que não existe nenhuma razão plausível para que devamos dar mais crédito às sandices de Dawkins et caterva do que à voz dos sábios de todos os tempos. O fato daqueles não entenderem Filosofia não anula o acerto das conclusões metafísicas mais do que a ignorância de um aluno desleixado a respeito da Física Moderna compromete a Teoria da Relatividade. As alegações de explicações mirabolantes para fenômenos históricos incontestes não se assemelham em nada a “desmenti-los” ou “refutar-lhes” o significado que sempre se lhes atribuiu. A crendice pueril que eles têm numa “Ciência” etérea e endeusada [v.g. «[e]u não sei ainda, mas estou trabalhando para saber» – Dawkins, C.R., op. cit.] não tem o condão de tornar falso todo o conhecimento religioso humano acumulado ao longo dos séculos. O que lhes sobra?

Sobram os espantalhos sem sentido, todos eles versões mais ou menos sofisticadas do Bule Voador de Russell. Mas isso já cansou de ser respondido e, aliás, é muito fácil responder. Não há nada de novo sob o sol (o negrito é meu):

O “Bule Voador” realmente existe!

Ele foi crido por índios americanos que deram a ele nomes e varias personalidades, dedicaram cultos e acreditaram nele. […]

Os pagãos abundaram em “Bules Voadores”, e de muitas formas o cultuaram, seus ritos muitas vezes incompreensíveis aos não iniciados, carregavam definições milenares de contatos com estes “Bules Voadores”, que tanta influência em suas vidas exercia.

[…]

E os Judeus? Sempre acreditaram que seu “Bule Voador”, voava por eles e assim viveram e vivem a milhares de anos, pode ser que todo o contato que diziam ter com seu “Bule Voador” fosse ilusão, desespero e desejo, mas este “Bule Voador” que jamais viram foi sempre sem dúvida determinante na história deste povo e não foi preciso descobrir quem colocou o “Bule Voador” a voar.

Eu jamais pedira que Russel provasse sua história do “Bule Voador”, se sua existência fosse a única explicação plausível, do porquê tantos povos distantes no tempo e no espaço, desejassem chá de um mesmo bule.

Se o fanatismo ateísta permite aos que dele padecem entender ou não isto, é um outro problema. Mas o fato que salta aos olhos a quem analisa o fenômeno religioso é que Thor mais evidencia a existência de Deus do que a nega! Muito ao contrário de constituírem um empecilho à Fé, os inumeráveis panteões pagãos que juncaram a história da humanidade dão eloqüente testemunho em favor da existência de um Deus. Chesterton, de novo ele, diria com seu tradicional bom humor que os falsos deuses não lançam dúvidas sobre a Religião Verdadeira mais do que as notas falsas de vinte libras implicam na inexistência do Banco da Inglaterra. Que os ingleses de hoje tenham mais dificuldade para entender isto do que os de outrora apenas nos revela o quanto fomos capazes de regredir em cem anos.

Publicado por

Jorge Ferraz (admin)

Católico Apostólico Romano, por graça de Deus e clemência da Virgem Santíssima; pecador miserável, a despeito dos muitos favores recebidos do Alto; filho de Deus e da Santa Madre Igreja, com desejo sincero de consumir a vida para a maior glória de Deus.

239 comentários em “«Se não acreditamos em Thor, por que crer no Deus cristão?»”

  1. Carissimo Rafael

    Eu li diversas coisas nos seus comentários que considerei desagradáveis. Coisas como eu lhe dizer “olha esta frase deste cara que eu admiro, ela é brilhante!” e você me responder com “que frase imbecil” e “a que ponto de estupidez chega um homem inteligente”. Precisa? Não. Você insinuou que eu seria analfabeto funcional e literalmente disse “quer que eu desenhe?” Eu fiz questão de evitar me expressar assim durante toda a conversa.

    Não é porque você acha brilhante uma coisa que eu tenho obrigação de gostar dela. Além disso, apesar de eu ser um “mente-fechada”, não tenho esse habito de me desagradar quando as pessoas discordam de mim. Quanto à questão do “quer que eu desenhe?” voltarei a ela mais abaixo.

    Mas então, logo depois que eu lhe expliquei o que poderia ser considerado “moral” de um ponto de vista ateu, você me mandou isto:
    “E a coisa mais ridicula no mundo é ateu moralista.”

    Eu não tenho culpa de que seja ridiculo um ateu moralista. É ridiculo mesmo, o que é que vou fazer?

    Não reclame se o meu texto lhe pareceu desagradável.

    Não, o texto não me pareceu desagradavel. Apenas malcriado. Em certas partes, longe de desagradavel, era involuntariamente humoristico, apesar da evidente irritação de quem o redigiu.

    Uma boa conversa tem que fluir no sentido de um ponto comum, não ficar aumentando em pontos de discordância. Conheço muitos cristãos e aprendi com eles que a fé mais cega que abre os olhos. Não vou iniciar uma longa discussão sobre o por quê.

    Você não acha esse julgamento um tanto preconceituoso? Você apela para a sua experiencia pessoal, mas ao mesmo tempo não pode ou não quer encontrar ou ar as suas razões… Esse argumento, em relação ao racismo, já foi ironizado por Michael Moore nos EUA:
    Every person who has ever harmed me in my lifetime has been a white person! Coincidence? I think not! (Stupid White Man, p. 56)

    Quando foi a última vez que esses temas foram discutidos? A igreja está acompanhando a sociedade? Acho que não.

    Sr. Rafael-vai-com-as-outras, por que a Igreja deveria acompanhar a sociedade? Se a sociedade está indo para o abismo, a Igreja, eu e você somos obrigados a ir juntos? É sinal de abertura de mente simplesmente incorporar-se à manada dos hamsters do nosso tempo?

    No fundo o seu ateismo parece apenas mascarar o seu “desagrado” com quem diverge das suas opiniões e o mais servil confomismo com as tendencias da epoca.

    Sua asserção foi estúpida e agora se torna também ofensiva. Idiota é um indivíduo que acredita que moral é uma propriedade religiosa. Que um ateu não pode definir, recomendar, defender e promover preceitos morais.

    Preceitos morais não fazem o menor sentido dentro de uma cosmovisão materialista. Querer defender isso é acrescentar mais uma contradição em termos às muitas que você já expeliu.

    Ou que um ateu está forçado a compactuar de um relativismo imbecil no qual todo posicionamente moral é igualmente válido e não pode ser contrariado.

    Sim, se não existem realidades espirituais, se só existe materia e energia, a unica moralidade que sobre ao ateista é um relativismo imbecil. Não está contente? Azar o seu! Não dá pra ter tudo na vida. Sinceramente, consigo olhar com mais respeito ateus como Marx ou Nietzsche que levam seu ateismo às ultimas consequencias, por mais repugnantes que sejam, do que ateuzinhos temerosos que, depois de haver rejeitado Deus, ainda buscam a benção e a aprovação moral dos cristãos.

    Ademais, se eu tenho a mente fechada, você é um incompetente, porque com tanta conversa jogada fora não foi capaz de abri-la.

    Algumas mensagens atrás você escreveu algo mais ou menos nesta linha: “não me culpe pela sua falta de capacidade de se expressar”. Espero que você já saiba onde eu quero chegar com isso.

    E se a sua intenção não era abri-la, desculpe-me, mas a sua atitude é idiota, porque só um idiota discute com uma pessoa de mente fechada.

    Então o seu ponto de vista é que somos dois idiotas?

    Depois, quando eu faço insinuações sobre sua capacidade de ler um texto, você reclama. Não chamei ninguém de idiota. Apenas argumentei, uma vez que você me toma (ou me tomava, sei lá) por uma pessoa de “mente fechada”, o seguinte: (1) ou você entabulou discussão com a pretensão de abrir minha mente, e nesse caso você seria um incompetente, visto que, por sua propria avaliação, não conseguiu sucesso algum; (2) ou você não tinha essa pretensão e, nesse caso, debater com uma pessoa de mente fechada é coisa de idiota.

    Observe que a conclusão disjuntiva (incompetente ou idiota) está na rigorosa dependencia do julgamento que você fez sobre minha pessoa (supostamente, mente fechada), julgamento que eu mesmo nunca admiti. Portanto, se você se ofendeu com o argumento, não tem ninguém mais a culpar senão a si proprio.

    E eu não “virei” ateu. Eu nasci ateu, assim como você e todos os demais que aqui escrevem e leem.

    Ai, ai. Mais um chavão do “evangelismo” ateista. Se assim é, os cães, as vacas, os porcos, as feras da mata e os vermes da terra são também ateus. E você quer se igualar a eles?

    Aliás, ser ateu não tem “graça” nenhuma. É simplesmente um posicionamento de honestidade intelectual o reconhecimento de que não há motivos para acreditar em nenhum deus em particular e que nós não temos explicação para a nossa presença aqui. Ou para o que será o nosso futuro.

    Não vejo honestidade intelectual nenhuma nisso. Apenas obstinação e ignorancia voluntaria.

    Você está usando o dicionário errado:
    http://www.merriam-webster.com/dictionary/absurd
    Mesmo assim, a acepção 1 do seu dicionário casa muito bem com o que Feynman quis dizer. Sim, a quântica e a relatividade fogem ao bom senso. Sim, elas são contrárias ao nosso modelo baseado nas nossas experiências diárias desse macrouniverso bem comportado.

    Você ainda não me explicou por que raios eu tenho de aceitar a sua interpretação pessoal da frase do Feynman. E mesmo assim, isso é inutil: tomada no sentido proprio das palavras, a frase é imbecil; conforme a “interpretação” que você fez dela, a frase é irrelevante para o que estamos discutindo.

    Com toda a sua argumentação sobre inteligência e sobre os princípios das demonstrações a única coisa que você conseguiu me convencer foi que nós não necessariamente temos a capacidade de apreender a natureza. O que não chega, sinceramente, a ser nenhum espanto.

    Rafael, você também é o rei do argumento suicida. Como é que você sabe que “a matematica é uma linguagem que descreve a natureza”, se “não temos a capacidade de apreender a natureza”?

    Por acaso só porque uma linguagem descreve algo, ela precisa ser capaz de descrevê-la precisa e corretamente? Não pode ser uma tentativa de descrever algo?

    Como é que você vai descrever algo que não consegue apreender? Aliás, como é que você vai saber que está descrevendo algo, nessas circunstancias?

    Você me vê apressadamente escrever comentários em blog sobre um assunto que foge ao meu domínio…

    Por isso mesmo a sua atitude deveria ser outra, e não sair dizendo por aí que tem a mente fechada quem não concorda com Vossa Senhoria.

    Com base nisso, a segunda coisa que eu vou inferir de você é que você é um chato.

    É bom que não rola. Sou chato como o universo descrito por Krauss.

    Sua correção foi aceita. Mas ela não desqualifica o meu argumento.

    Mas a intenção não era desqualificar. Era tornar o argumento melhorzinho. Santo Tomás costumava fazer isso com seus adversarios, quando via que podia formular a objeção melhor que eles mesmos. Às vezes a gente tem de passar um pouquinho a bola pro time adversario, do contrario não tem jogo…

    A asneira que você escreveu aí já foi refutada por Edmund Husserl, nos prolegomenos de suas Investigações Logicas. Um livro que você deveria ler. Abre a mente.

    Aposto que, se fosse uma asneira, não teria sido objeto de estudo de alguém que você considera importante.

    Repetir um erro já completamente refutado há mais de um seculo é asneira. E você não considera importante Edmund Husserl? Faça uma busca no google…

    Adoraria ver como Husserl prova a causalidade, em vez de assumi-la. Ou como ele utiliza um modelo para provar que o modelo é uma representação fiel da realidade.

    Não é bem isso que Husserl prova. O que ele prova é que os objetos logicos não podem ser reduzidos a expressões de uma atividade psiquica ou mesmo cerebral, como você pretendia.

    Quanto à causalidade, ela é uma determinação do principio de razão suficiente que, por sua vez, decorre do principio de não-contradição. Se dois juizos contraditorios não podem ser simultaneamente verdadeiros, para que um deles seja verdadeiro, este deve possuir uma razão suficiente para ser tomado como verdadeiro que não está presente no outro juizo contraditorio. De outro ponto de vista, o ser não pode vir do não-ser: se algo não era e passou a ser, tem uma causa que lhe pré-existe.

    Isso não é nenhum modelo. Antes, a construção de qualquer modelo pressupõe esses principios que, por essa mesma razão, são anteriores e independentes de qualquer modelo. Esses principios decorrem da apreensão mesma do que seja a realidade ou a existencia – em outras palavras, são a condição de possibilidade de tudo o que existe ou pode existir.

    Suas definições não estão erradas. São um modelo consistente.

    É o melhor que minha mente fechada pode fazer.

    Você parte do princípio que a inteligência age sobre si.

    Pelo menos é minha experiencia pessoal. Quando entendo uma coisa, também entendo que a entendi. O ato intelectivo não é apenas consciente, mas autoconsciente. Aliás, essa não é só minha experiencia intelectual pessoal, tem uma sequencia mais que bimilenar de autores que descrevem essas coisas.

    Eu proponho o princípio de que a inteligência não age sobre nada, ela é uma propriedade que reconhecemos na consciência em exercício.

    E exercer, não é agir? Agir não é colocar uma propriedade em exercicio? Compreende que seu argumento, além de confuso (mal expresso), é contraditorio?

    Por exemplo, a capacidade de rir também é uma propriedade. Mas quando em determinado momento eu rio, estou colocando essa propriedade em exercicio, estou agindo. Da fato de a inteligencia ser uma propriedade, não se segue que ela não possa também ser um ato, ou se expressar por um ato.

    A consciência é um fenômeno emergente do funcionamento do organismo, particularmente o cérebro.

    Isso é uma petição de principio. Aliás desmentida porque a consciencia (pelo menos na minha experiencia de mente fechadinha) implica em coisas que são irredutiveis a “assunções basicas da fisica”.

    Vamos dizer que é o cérebro quem age, que é ele quem exerce e modifica a consciência.

    Não discordo que o cerebro aja, só entendo que não se devem confundir as ações do cerebro com as da inteligencia. A cachorra da minha vizinha tem cerebro, nem por isso ela é capaz de autoconsciencia.

    De novo: não estou tentando provar esse ponto de vista. Na minha concepção, isso seria absurdo. O que eu estou defendendo é que existem pontos de vista plausíveis bem distintos do ponto cristão e que não há provas do ponto cristão.

    Nem eu estou expondo o “ponto cristão”. Estou expondo conceitos e conclusões da filosofia perene ou classica, aquela que se desenvolve numa sequencia ininterrupta desde os primeiros filosofos gregos, passando por Socrates, Platão, Aristoteles, Santo Agostinho, Santo Tomás de Aquino, com representantes até os dias de hoje, não necessariamente cristãos. O “ponto cristão” não é essa filosofia, o “ponto cristão” é a revelação divina (que você a priori excluiu desse debate).

    E eu não estou me fazendo de retardado. Não lhe perguntei absolutamente nada sobre a revelação cristã.

    Perguntou sim. Aqui:

    https://www.deuslovult.org//2013/05/16/se-nao-acreditamos-em-thor-por-que-crer-no-deus-cristao/comment-page-2/#comment-44837
    Só quero saber quais são os preceitos filosóficos, científicos ou da categoria que você achar mais conveniente que devem ser aplicados para se chegar à conclusão de que
    (…)
    5) que essa entidade é o deus cristão.

    O Deus cristão é o Deus da revelação. Não dá pra falar d’Ele sem referencia à revelação, ainda que por mera comparação aos dados da filosofia.

    E aqui:

    https://www.deuslovult.org//2013/05/16/se-nao-acreditamos-em-thor-por-que-crer-no-deus-cristao/comment-page-2/#comment-44855
    Como eu deveria ler as passagens a seguir?
    1) II Reis 2:23-24
    2) Deut. 22:13-30
    Entre outras.

    Eu perguntei como você poderia demonstrar racional e logicamente que deus necessariamente existe e que esse deus é o deus cristão.

    Como eu já disse, o Deus cristão é o Deus da revelação. O cristianismo é, só e por inteiro, revelação. Como é que você quer que eu estabeleça a identidade do Deus dos filosofos e dos sabios com o Deus de Abraão, Isaac e Jacó, se eu não posso invocar a revelação para fazer a comparação?

    Porque, afinal, é disso o que se trata o post: que qualquer mente racional aberta poderia enxergar a obviedade do deus cristão.

    Não acho que seja isso o que o Jorge quis dizer em sua postagem e, portanto, acho que você se equivocou ao interpretar o texto dele. Mas acho também que o Jorge é a pessoa mais autorizada para corrigir eventuais más interpretações do texto dele e não vou entrar nesse merito.

    Ainda que você tivesse me convencido de tudo o que você disse sobre inteligência e causa primária, ficam os saltos de fé ao dizer que essa causa primária se importa com entidades que compartilham (ainda que em um nível muito limitado, como você disse) dessa inteligência e que essa causa primária é o deus cristão.

    É isso mesmo. Podemos descobrir com certeza, sem os auxilios da fé e da revelação, que existe um Ser inteligente e imaterial que é a causa primeira de todas as coisas, que sustenta todas as coisas no ser e sabe que existem as coisas de que ela é causa. Porém, que esta Causa Primeira nos ame com um pai ama seus filhos e nos quer fazer participantes de sua propria vida divina, é algo que aceitamos apenas pela revelação. A aceitação dessa revelação depende, essencialmente, de um ato de entrega pessoal à palavra e ao poder de Jesus Cristo.

    Se você admite que é impossível provar isso tudo sem recorrer a argumentos de fé, então por que sequer iniciou a discussão?

    Primeiro, para mostrar o que a razão pode conseguir sozinha nesse campo. Segundo, para mostrar para o que é imprescindivel a fé.

    Além disso, do fato de não se poderem provar os misterios da fé não se segue que não se possa demonstrar a coerencia entre o Deus da filosofia e o Deus da revelação. O que é impossivel é fazer isso sem invocar a revelação ao menos como padrão de comparação com a filosofia.

  2. Rodrigo,

    Eu quero adiantar que, daqui pra frente, eu vou ignorar absolutamente qualquer coisa que você escreva que fuja ao tópico e se possa ser interpretado levemente como pessoal.

    Não é porque você acha brilhante uma coisa que eu tenho obrigação de gostar dela. Além disso, apesar de eu ser um “mente-fechada”, não tenho esse habito de me desagradar quando as pessoas discordam de mim.

    Não falei nada sobre discordância ou gosto. Falei sobre contundência e sobre como você escolhe se expressar diante de alguém que se põe a conversar amistosamente com você, ainda que por trás de uma tela de computador.

    Você não acha esse julgamento um tanto preconceituoso? Você apela para a sua experiencia pessoal, mas ao mesmo tempo não pode ou não quer encontrar ou ar as suas razões…

    Talvez. Você teria um argumento para defender o que você disse, que esses cristãos que demonstram ter sido cegos pela fé, na verdade não estão cegos pela fé, mas por outros motivos?

    Sr. Rafael-vai-com-as-outras, por que a Igreja deveria acompanhar a sociedade? Se a sociedade está indo para o abismo, a Igreja, eu e você somos obrigados a ir juntos? É sinal de abertura de mente simplesmente incorporar-se à manada dos hamsters do nosso tempo?

    Eu nem mesmo disse acompanhar no sentido de aceitar. Eu disse acompanhar no sentido de se por a discutir sobre os assuntos.

    Preceitos morais não fazem o menor sentido dentro de uma cosmovisão materialista. Querer defender isso é acrescentar mais uma contradição em termos às muitas que você já expeliu.

    Seu posicionamento é lamentavelmente preconceituoso.

    Sim, se não existem realidades espirituais, se só existe materia e energia, a unica moralidade que sobre ao ateista é um relativismo imbecil.

    Sam Harris defende a existência de uma moral absoluta na ausência de deus.

    Mas eu digo que isso não importa. Mesmo em uma situação de total relativismo, existem preceitos morais que podem ser defendidos, pensados e empregados. Imbecilidade é defender que o preceito moral alheio precisa ser aceito.

    É por conta de visões como essa que eu defendo que a fé cega. Você é tão convicto que a moral provem de deus que não aceita a possibilidade de existir uma moral integralmente racional e humana.

    Depois, quando eu faço insinuações sobre sua capacidade de ler um texto, você reclama. Não chamei ninguém de idiota.

    Você insinuou diversas vezes que eu teria a mente tão ou mais fechada do que eu acusei você ou o autor do texto de ter. Eu disse (e não vou voltar a dizer) que você teria a mente fechada. A consequência óbvia disso e do que você falou na última resposta é que seríamos dois idiotas, cada um conversando com alguém de mente fecahda.

    Aliás, quando eu dise que você teria “mente fechada”, fiz uma generalização muito grande. Não tenho a pretensão de tentar conhecer você por uma conversa tão limitada. Apenas acho que, neste tópico, você está impermeável a argumentos.

    Ai, ai. Mais um chavão do “evangelismo” ateista. Se assim é, os cães, as vacas, os porcos, as feras da mata e os vermes da terra são também ateus. E você quer se igualar a eles?

    Eu nem vou me dar ao trabalho de procurar o nome dessa falácia, mas isso foi patético. Por que você não escolhe outro atributo que eu reconheço que compartilho com esses animais e diz que estou querendo me igualar a eles? Você também poderá reconhecer em você diversos atributos em comum a eles.

    Não vejo honestidade intelectual nenhuma nisso. Apenas obstinação e ignorancia voluntaria.

    Não sou culpado pela forma como você superestima seu intelecto.

    Você ainda não me explicou por que raios eu tenho de aceitar a sua interpretação pessoal da frase do Feynman. E mesmo assim, isso é inutil: tomada no sentido proprio das palavras, a frase é imbecil; conforme a “interpretação” que você fez dela, a frase é irrelevante para o que estamos discutindo.

    Eu não tenho que explicar por que você tem que aceitar a minha interpretação. Eu lhe ofereci a minha interpretação. Você concorda ou discorda. Ponto. Vai de você e da sua honestidade intelectual achar que conhece Feynman o suficiente para dizer se a sua interpretação de que a frase é imbecil é melhor ou pior que a minha.

    E a frase não é irrelevante. Você já perdeu o contexto no qual eu a empreguei.

    Como é que você vai descrever algo que não consegue apreender? Aliás, como é que você vai saber que está descrevendo algo, nessas circunstancias?

    Qual é o problema em não se saber? Como você prova que consegue apreender algo na sua totalidade?

    Por isso mesmo a sua atitude deveria ser outra, e não sair dizendo por aí que tem a mente fechada quem não concorda com Vossa Senhoria.

    Não houve uma única vez na conversa inteira que você disse “olha, Rafael, não é que isso que você falou é interessante?” Até mesmo apelando para o ridículo e o absurdo você fez questão de afastar meus argumentos. Isso pra mim é sintoma de uma mente fechada, ao menos no escopo do assunto que nos colocamos a conversar.

    Mas a intenção não era desqualificar. Era tornar o argumento melhorzinho. Santo Tomás costumava fazer isso com seus adversarios, quando via que podia formular a objeção melhor que eles mesmos. Às vezes a gente tem de passar um pouquinho a bola pro time adversario, do contrario não tem jogo…

    Tente fazer isso sem ridicularizar o adversário, da próxima vez.

    Repetir um erro já completamente refutado há mais de um seculo é asneira. E você não considera importante Edmund Husserl? Faça uma busca no google…

    Asneira é assumir que um indivíduo seja obrigado a conhecer aquilo que você conhece. Tenho certeza que, assim como você conhece coisas que eu não conheço, também poderia apontar erros seus em temas específicos que já foram refutados há mais de um século.

    E pra quem criticou tanto a minha capacidade de interpretação, você subentender que eu não considero Husserl importante é um deslize bem feio.

    Quanto à causalidade, ela é uma determinação do principio de razão suficiente que, por sua vez, decorre do principio de não-contradição. […] Isso não é nenhum modelo.

    Mas isso é um modelo. É um modelo resultante de um pensamento lógico-dedutivo que por sua vez depende de um conceito de computabilidade. Tudo o que nós afirmamos sobre a realidade é parte de um modelo.

    Aliás, eu não vou correr atrás disso agora, mas acredito que existem diversos fenômenos na quântica nos quais se observa dois juízos contraditórios que são simultaneamente verdadeiros. Não é absurdo? É o que Feynman dizia. É óbvio que isso não se observa no nosso macrouniverso bem comportadinho, mas a natureza não se resume ao nosso macrouniverso bem comportadinho.

    E exercer, não é agir? Agir não é colocar uma propriedade em exercicio? Compreende que seu argumento, além de confuso (mal expresso), é contraditorio?

    Não há contradição. Eu disse que a consciência exerce. A inteligência é uma propriedade da consciência.

    Da fato de a inteligencia ser uma propriedade, não se segue que ela não possa também ser um ato, ou se expressar por um ato.

    Você está apenas brincando com palavras. Ou a inteligência é uma entidade por si, capaz de agir sobre si, ou ela é uma propriedade que depende de uma consciência, que por sua vez depende do cérebro. Não estou defendendo nehnum dos lados desse “ou”, apenas dizendo que eles se contradizem.

    A cachorra da minha vizinha tem cerebro, nem por isso ela é capaz de autoconsciencia.

    Golfinhos e chimpanzés também são autoconscientes.

    Nem eu estou expondo o “ponto cristão”.

    Correção aceita.

    Como eu deveria ler as passagens a seguir?
    1) II Reis 2:23-24
    2) Deut. 22:13-30

    Você já se esqueceu por que eu perguntei isso?

    “Só quero saber quais são os preceitos filosóficos, científicos ou da categoria que você achar mais conveniente que devem ser aplicados para se chegar à conclusão de que
    (…)
    5) que essa entidade é o deus cristão.”

    Eu perguntei isso a Rui com o objetivo de mostrar a ele que ele não conseguiria provar nada sem recorrer à fé. Você sentou na janelinha e agora está querendo me criticar por não aceitar argumentos baseados na revelação?

    Primeiro, para mostrar o que a razão pode conseguir sozinha nesse campo. Segundo, para mostrar para o que é imprescindivel a fé.

    Não alcançou o primeiro objetivo. Apenas me mostrou o quanto a superestima da capacidade lógico-dedutiva pode levar alguém a aceitar sem provas um posicionamento acerca da observação e do entendimento da natureza.

    O segundo você alcançou. Demonstrou com clareza que a fé é imprescindível para se aceitar a existência de deus.

    Além disso, do fato de não se poderem provar os misterios da fé não se segue que não se possa demonstrar a coerencia entre o Deus da filosofia e o Deus da revelação.

    Eu discordo. Acho que existe uma enorme incoerência entre esse deus filosófico e o deus ignorante e mesquinho apresentado no antigo testamento.

    Mas isso é irrelevante. Mesmo que isso fosse verdadeiro, você não provou que o deus filosófico existe.

    Aliás, será que não lhe passa pela cabeça que, se você tivesse nas mãos uma prova da existência do deus filosófico, o assunto não seria motivo de tanto debate e discordância? Como você mesmo disse, desconhecer um argumento refutado há mais de um século é asneira. Será que todos, exceto os cristãos, que não apenas aceitam o deus filosófico, mas também fazem o link entre esse deus e o deus da revelação, somos asnos?

  3. Porque, afinal, é disso o que se trata o post: que qualquer mente racional aberta poderia enxergar a obviedade do deus cristão.

    Não acho que seja isso o que o Jorge quis dizer em sua postagem e, portanto, acho que você se equivocou ao interpretar o texto dele. Mas acho também que o Jorge é a pessoa mais autorizada para corrigir eventuais más interpretações do texto dele e não vou entrar nesse merito.

    Bom, eu jamais resumiria o meu texto dessa maneira. Se fosse para pegar um trecho que sintetizasse o post, seria este aqui: «o fato que salta aos olhos a quem analisa o fenômeno religioso é que Thor mais evidencia a existência de Deus do que a nega».

    Abraços,
    Jorge

  4. Gostaria de pedir licença aos senhores para interromper brevemente a discussão para um esclarecimento que pode ser relevante, ou não.

    Estava revisando a longa lista de comentários que este assunto gerou, até que me deparei com esta afirmação:

    “A quântica sugere que todo o espaço ‘vazio’ está na verdade permeado de partículas que espontaneamente surgem e desaparecem. E isso ocorre sem qualquer causa material.”

    Tudo bem que eu precisaria rever tudo o que já estudei até agora sobre Física Quântica e Teorias de Campos para dar uma resposta mais contundente, mas, pelo pouco que me recordo no momento, o fenômeno da produção e aniquilação de pares partícula/antipartícula (supondo que seja isto a que a citação acima se refira) não é algo tão “arbitrário” como se possa pensar.

    A criação de pares não se dá de qualquer maneira: há leis de conservação de energia, momento linear, momento angular, etc., que devem ser respeitadas nestes fenômenos. Por isso não se observa uma produção de pares “do vácuo” (embora haja algumas teorias alternativas que permitam esta possibilidade), mas sim como frutos da interação da radiação com a matéria, da colisão entre duas partículas de alta energia, do decaimento radioativo de uma partícula instável, etc.

  5. Existe uma corrente de pensadores/metafísicos que começam a relacionar a física/mecânica quântica com a idéia de Deus… tentam assim tentar explicar cientificamente Deus através da mecânica quântica… assisti há muito tempo um documentário chamado (traduzido) “Quem somos nós”:
    http://pt.wikipedia.org/wiki/What_the_Bleep_Do_We_Know!%3F
    Achei muito viajante… talvez o Jorge (e colegas) conheçam/tenham ouvido falar…

  6. ” Mesmo em uma situação de total relativismo, existem preceitos morais que podem ser defendidos, pensados e empregados. Imbecilidade é defender que o preceito moral alheio precisa ser aceito.”

    O arcabouço moral propugnado pelo cristianismo é a identificação do ‘bem’ com a ‘razão’, isto é, o bem é racional e o racional é um bem. E , por isso, ele é exigível a todos os homens e não somente aos cristãos.

    E se é imbecilidade defender que o preceito moral alheio precise ser aceito imagino que ninguém poderia condenar o holocausto ou as culturas que assassinam gays pelo simples fato de serem gays.

    “E eu não “virei” ateu. Eu nasci ateu, assim como você e todos os demais que aqui escrevem e leem.”

    Tanto a sentença “Deus existe” como a “Deus não existe” implica em uma afirmação consciente. Ninguém ao nascer pode fazê-las. Como a afirmação “Deus não existe” não pode ser comprovada racionalmente ela implica num ato de fé de quem a faz.

    “Mas isso é um modelo. É um modelo resultante de um pensamento lógico-dedutivo que por sua vez depende de um conceito de computabilidade. Tudo o que nós afirmamos sobre a realidade é parte de um modelo.”

    Não se trata de modelo. Isso é um constructo a posteriori. Antes disso, a atitude fundamental é a postura diante da realidade. A filosofia clássica parte da “admiratio” do homem diante da realidade e admite a sua capacidade de apreendê-la (não em sua totalidade). É o realismo clássico. A sua contraposição é a postura idealista que não admite a capacidade do homem apreender a realidade, ao menos fazendo essa percepção depender de elementos subjetivos. Ambas posturas não podem ser “comprovadas” . Mas a postura idealista, ainda que racional, fere a razão vital.

  7. Allien,

    Esse filme, se não me engano, é uma mistificação barata e nonsense da física quântica na linha “new age”. Se for o mesmo que assisti é péssimo e superficial.

  8. Laércio,

    A criação de pares não se dá de qualquer maneira: há leis de conservação de energia, momento linear, momento angular, etc., que devem ser respeitadas nestes fenômenos. Por isso não se observa uma produção de pares “do vácuo” (embora haja algumas teorias alternativas que permitam esta possibilidade), mas sim como frutos da interação da radiação com a matéria, da colisão entre duas partículas de alta energia, do decaimento radioativo de uma partícula instável, etc.

    Reconheço a possibilidade de ter me enganado, mas acredito que não. O fenômeno a que eu me referia nesse caso é uma consequência do princípio de incerteza. A suposição de que existiria uma região no qual há vazio absoluto (tanto de matéria quanto campos) leva à conclusão de um estado de total ausência de campo, o que é inaceitavelmente impreciso. Disto supõe-se o surgimento de pares de partículas. Dentro do meu entendimento, isso independe, até por princípio (assumimos vácuo absoluto), de campos e de matéria.

  9. Lampedusa,

    E se é imbecilidade defender que o preceito moral alheio precise ser aceito imagino que ninguém poderia condenar o holocausto ou as culturas que assassinam gays pelo simples fato de serem gays.

    Eu disse que é imbecilidade afirmar que eu sou obrigado a respeitar todo e qualquer posicionamento moral alheio apenas porque a minha descrença em deus me forçaria a esse tipo de relativismo. É justamente porque eu não sou obrigado a isso que eu posso condenar o holocausto e culturas homofóbicas ou machistas.

    Tanto a sentença “Deus existe” como a “Deus não existe” implica em uma afirmação consciente. Ninguém ao nascer pode fazê-las. Como a afirmação “Deus não existe” não pode ser comprovada racionalmente ela implica num ato de fé de quem a faz.

    A definição do que é ateísmo é objeto de disputa. A minha concepção é a de que ateísmo é a simples asuência da crença em deus, não necessariamente o posicionamento de se afirmar a inexistência de deus. Se para você isso é agnosticismo, então você pode me chamar de agnóstico e trocar a minha frase por “todo mundo nase agnóstico”. Eu não me incomodo. “Ateu” ou “agnóstico” é só um rótulo de poder descritivo muito fraco.

    Não se trata de modelo. Isso é um constructo a posteriori. Antes disso, a atitude fundamental é a postura diante da realidade. A filosofia clássica parte da “admiratio” do homem diante da realidade e admite a sua capacidade de apreendê-la (não em sua totalidade). É o realismo clássico. A sua contraposição é a postura idealista que não admite a capacidade do homem apreender a realidade, ao menos fazendo essa percepção depender de elementos subjetivos. Ambas posturas não podem ser “comprovadas” . Mas a postura idealista, ainda que racional, fere a razão vital.

    A sua própria explicação me soa como a descrição de um modelo. Especialmente compatível com o conceito de um modelo é o reconhecimento de que o homem não tem a capacidade de apreender a realidade em sua totalidade.

    E eu não consigo ver problema, partindo de uma postura idealista, em se ferir a razão vital. Se o homem não é capaz de apreender a realidade, então qual é o problema em sua capacidade de analisar criticamente sua realidade ser ferida?

  10. Carissimo Rafael

    Não falei nada sobre discordância ou gosto.

    Falou sim:

    https://www.deuslovult.org//2013/05/16/se-nao-acreditamos-em-thor-por-que-crer-no-deus-cristao/comment-page-5/#comment-45021

    Eu li diversas coisas nos seus comentários que considerei desagradáveis. Coisas como eu lhe dizer “olha esta frase deste cara que eu admiro, ela é brilhante!” e você me responder com “que frase imbecil” e “a que ponto de estupidez chega um homem inteligente”.

    Agradar ou desagradar é questão de gosto. Gostamos das coisas que nos agradam, o que contraria os nossos gostos nos desagrada. No caso, o que desagradou você? Foi o fato de eu haver julgado imbecil uma frase que você considerava brilhante. Ora bolas, só por que você gostou da frase eu sou obrigado a concordar com você? Eu deveria ter evitado expor minha discordancia, chamando de “brilhante” uma frase imbecil, só para não desagradar você?

    Falei sobre contundência e sobre como você escolhe se expressar diante de alguém que se põe a conversar amistosamente com você, ainda que por trás de uma tela de computador.

    Você usou o adverbio “amistosamente”. Eu pergunto: se não pudermos ser francos com os amigos, sê-lo-emos com quem? Com os inimigos?

    Cito Aristoteles: Amicus Plato, amicus Socrates; sed magis amica veritas. Ou em bom português: Sou amigo de meu compadre, porém muito mais da verdade.

    Talvez. Você teria um argumento para defender o que você disse, que esses cristãos que demonstram ter sido cegos pela fé, na verdade não estão cegos pela fé, mas por outros motivos?

    Eu não sei quem são esses cristãos a que você se refere, não sei nem se são catolicos. Como posso opinar a respeito?

    Eu nem mesmo disse acompanhar no sentido de aceitar. Eu disse acompanhar no sentido de se por a discutir sobre os assuntos.

    Mas a Igreja discute todos esses assuntos. Uma das coisas que mais me impressiona na Igreja é que ela tem resposta pra tudo. Você pode não gostar da resposta, pode ignorá-la por não haver tido o cuidado de pesquisar, mas não pode falar que ela não tem resposta.

    Seu posicionamento é lamentavelmente preconceituoso.

    Você ficou irritado porque eu peguei você no pulo do preconceito contra os cristãos e agora está seco para me devolver o predicado. Mas acalme-se. Meu posicionamento não é preconceituoso, não. Preconceito é uma opinião, em geral negativa, formada sem fundamento ou reflexão previa. Achar que a fé catolica fecha a mente, só porque você conviveu com alguns cristãos (que possivelmente nem catolicos eram) que tinham a mente fechada, é preconceito. Mas dizer que preceitos morais não fazem o menor sentido numa cosmovisão materialista não é preconceito, é conceito mesmo, porque uma coisa decorre da outra e vou explicar por quê.

    Preceitos morais ou juizos de valor não são realidades materiais. Assim como Deus e a alma humana, não podem ser justificados ou observados por criterios puramente experimentais, não podem ser examinados com um microscopio, identificados em laboratorio nem tocados com um bisturi. Você pode observar o cumprimento ou a violação de um preceito moral, mas jamais a razão de sua obrigatoriedade. Se só existe materia, os preceitos morais, necessariamente, devem ser relegados ao mesmo status a que os ateus relegam a alma e o proprio Deus: à classe das quimeras, das ilusões da mente humana.

    Sam Harris defende a existência de uma moral absoluta na ausência de deus.

    E que argumento de autoridade é esse? Eu tenho de aceitar só porque esse idiota falou? Sam Harris agora é infalivel?

    Mas eu digo que isso não importa. Mesmo em uma situação de total relativismo, existem preceitos morais que podem ser defendidos, pensados e empregados.

    Você faz mais uma vez jus à alcunha de “rei do argumento suicida”. Se a situação de relativismo é total, como podem existir preceitos morais que podem ser defendidos? E se existem preceitos morais que podem ser defendidos, como posso dizer que é uma situação de relativismo total? Ô mania de se desmentir a si mesmo!

    É por conta de visões como essa que eu defendo que a fé cega.

    Você não consegue desenvolver um argumento sem cair em contradição consigo mesmo e vem dizer que a fé cega? A fé não cega, meu amigo. A fé autentica, virtude teologal, leva a nossa razão a enxergar mais longe. Mas se você se fecha na ignorancia voluntaria, já não vai conseguir enxergar nem mesmo o que poderia só com a razão. Como alguém já disse, o pior cego é o que não quer ver.

    Você é tão convicto que a moral provem de deus que não aceita a possibilidade de existir uma moral integralmente racional e humana.

    O problema é que você não tem sequer uma unica razão para dizer que minha convicção está errada.

    Apenas acho que, neste tópico, você está impermeável a argumentos.

    Não, eu não sou impermeavel a argumentos. Eu até sou muito facil de convencer – quando há argumentos. Impermeavel a argumentos é alguém, por exemplo, a quem a gente demonstra tintim por tintim a existencia de Deus, o fulano até elogia a consistencia da demonstração, mas se limita a dizer que não a aceita, sem apresentar qualquer razão disso ou, quando muito, apresentando argumentos autocontraditorios.

    Eu nem vou me dar ao trabalho de procurar o nome dessa falácia, mas isso foi patético. Por que você não escolhe outro atributo que eu reconheço que compartilho com esses animais e diz que estou querendo me igualar a eles? Você também poderá reconhecer em você diversos atributos em comum a eles.

    O nome dessa figura de linguagem é ironia. Eu quis ironizar a sua defesa do suposto ateismo dos recém-nascidos. A ironia deve ter calado fundo em você, pelo grau de irritação que ela lhe provocou. Quanto ao mais, eu tenho diversos atributos em comum com esses animais (aliás, o homem é um microcosmo, que recapitula em si toda a natureza), mas felizmente não pretendo me igualar com eles no que toca à religião. Porém, se você prefere, posso dizer que os ateus pretendem se igualar aos golfinhos e chimpanzés no que toca às opiniões sobre religião e ao conhecimento de Deus. Melhorou?

    Não sou culpado pela forma como você superestima seu intelecto.

    É, tem gente que prefere subestimar a propria inteligencia. É o que se chama “ignorancia voluntaria”.

    Eu não tenho que explicar por que você tem que aceitar a minha interpretação. Eu lhe ofereci a minha interpretação. Você concorda ou discorda.

    Eu não tenho elementos nem para concordar nem para discordar.

    Qual é o problema em não se saber? Como você prova que consegue apreender algo na sua totalidade?

    E para apreender algo é preciso apreendê-lo na sua totalidade? O que estou dizendo é que não dá pra descrever algo que você não apreende.

    Não houve uma única vez na conversa inteira que você disse “olha, Rafael, não é que isso que você falou é interessante?”

    Não sabia que você precisava tanto da minha aprovação. Eu, pelo menos, não preciso em nada da sua. Você pode me chamar de mente-fechada, de chato, disso e daquilo, que vou achar até graça. Olha, Rafael, vou te dizer uma coisa, como amigo: a unica opinião sobre a gente que realmente importa é a de Deus, os julgamentos dos homens não interessam. Você não tem ideia da libertação e da abertura de mente que essa consciencia dá.

    E pra quem criticou tanto a minha capacidade de interpretação, você subentender que eu não considero Husserl importante é um deslize bem feio.

    Eu não subentendi nada, apenas fiz uma pergunta. Afinal, você disse aqui:

    Aposto que, se fosse uma asneira, não teria sido objeto de estudo de alguém que você considera importante.

    Ora, por que Husserl seria apenas “alguém que eu considero importante” e não alguém importante simpliciter? Como eu estranhei a sua afirmação, perguntei: você também não o considera importante? Espero ter ficado claro.

    Mas isso é um modelo. É um modelo resultante de um pensamento lógico-dedutivo que por sua vez depende de um conceito de computabilidade.

    Pelo jeito, você não consegue perceber a diferença entre um modelo e os pressupostos que tornam possivel a construção de um modelo.

    Aliás, eu não vou correr atrás disso agora, mas acredito que existem diversos fenômenos na quântica nos quais se observa dois juízos contraditórios que são simultaneamente verdadeiros.

    Deixe de sensacionalismo barato. A unica coisa que se constatou até hoje é que supostamente um mesmo fenomeno quando se observa de uma forma se apresenta de um jeito e quando se observa de outra forma se apresenta de outro jeito. Por isso, não dá, por exemplo, para se determinar ao mesmo tempo a posição e o momento da quantidade de movimento de um corpusculo infra-atomico num dado instante. Isso porque a propria medição altera o experimento, como se mostra nessa brilhante aula de um professor de fisica da UFF:
    http://www.youtube.com/watch?v=OLc_v5-sQeM

    O curioso é que a suposta desconfirmação do principio de não-contradição pela fisica quantica que você invoca para justificar o ateismo, é invocada por certos malucos para promover o misticismo gnostico… Vai entender o ser humano!

    Não há contradição. Eu disse que a consciência exerce. A inteligência é uma propriedade da consciência.

    Se não houve contradição, você expressou mal seu argumento, porque disse isso aqui:

    Eu proponho o princípio de que a inteligência não age sobre nada,

    Continuando…

    Você está apenas brincando com palavras. Ou a inteligência é uma entidade por si, capaz de agir sobre si, ou ela é uma propriedade que depende de uma consciência, que por sua vez depende do cérebro.

    Por que a distinção entre inteligencia e consciencia? Já ouviu falar da navalha de Occam? — as entidades não devem ser multiplicadas desnecessariamente.
    Quanto à consciencia (ou inteligencia) depender do cerebro, se se trata de uma dependencia a titulo de conditio sine qua non, na medida em que o cerebro fornece os materiais sobre que a inteligencia trabalha, concedo. Porém, se a dependencia é a titulo de conditio per quam, nego, porque você está fazendo uso de uma petição de principio: dando por já demonstrado aquilo mesmo que deveria demonstrar.

    Ou a inteligência é uma entidade por si, capaz de agir sobre si, ou ela é uma propriedade que depende de uma consciência, que por sua vez depende do cérebro. Não estou defendendo nehnum dos lados desse “ou”, apenas dizendo que eles se contradizem.

    Que são dois enunciados contraditorios, sem duvida. Ocorre que um deles, o da imaterialidade da inteligencia, possui razões que o demonstram. Para o enunciado oposto você não conseguiu achar outra defesa senão uma petição de principio.

    Golfinhos e chimpanzés também são autoconscientes.

    Falaram isso pra você e você acreditou? Eu só vou acreditar no dia em que os proprios golfinhos e chimpanzés falarem, sem intermediarios…

    Como eu deveria ler as passagens a seguir?
    1) II Reis 2:23-24
    2) Deut. 22:13-30
    Você já se esqueceu por que eu perguntei isso?

    Independentemente dos motivos por que você me perguntou, é evidente que se trata de uma pergunta sobre a Revelação cristã.

    Eu perguntei isso a Rui com o objetivo de mostrar a ele que ele não conseguiria provar nada sem recorrer à fé.

    Explique-me então como é possivel comparar uma coisa com outra sem se referir a um dos termos da comparação.

    Não alcançou o primeiro objetivo. Apenas me mostrou o quanto a superestima da capacidade lógico-dedutiva pode levar alguém a aceitar sem provas um posicionamento acerca da observação e do entendimento da natureza.

    O unico que aceita posicionamento sem provas aqui é você. A sua afirmação é puramente gratuita e simplesmente fundada num ato de vontade. Você não aceita a demonstração da existencia de Deus não porque você tenha razões melhores para desconfirmá-la ou demonstrar sua inconsistencia, mas simplesmente porque você não quer.

    O segundo você alcançou. Demonstrou com clareza que a fé é imprescindível para se aceitar a existência de deus.

    Eu poderia mais uma vez fazer referencia à sua dificuldade em interpretar um texto. Porém, aqui as circunstancias indicam que é caso de má-fé mesmo.

    Eu discordo. Acho que existe uma enorme incoerência entre esse deus filosófico e o deus ignorante e mesquinho apresentado no antigo testamento.

    O tom irritado da sua manifestação indica que o seu problema com o Antigo Testamento não é só intelectual, mas tem fatores emocionais envolvidos. Denota ressentimento e implicancia. Será que você nunca parou pra pensar se ignorante e mesquinha não era a sua leitura?

    Além disso, por que você não escreve Deus com inicial maiuscula como todo o mundo faz e a ortografia da lingua portuguesa manda fazer com os nomes proprios? Quer o quê, mostrar para o mundo que você não acredita n’Ele? Que coisa ridicula! Deixe de neurose, cara! Fique tranquilo, eu também escrevo Thor, Saturno e Batman com inicial maiuscula e nunca me incomodei com isso. Trata-se apenas de uma convenção ortografica.

    Mas isso é irrelevante. Mesmo que isso fosse verdadeiro, você não provou que o deus filosófico existe.

    Provar, eu provei. Se você não quer aceitar a prova, é outro problema. À sua inteligencia eu ainda posso falar com palavras. O livre-arbitrio de sua vontade é seu, de mais ninguém.

    Aliás, será que não lhe passa pela cabeça que, se você tivesse nas mãos uma prova da existência do deus filosófico, o assunto não seria motivo de tanto debate e discordância?

    A sua impressão é equivocada, por duas razões. A esmagadora maioria da humanidade admite a existencia de Deus, ateus e agnosticos são apenas uma minoria barulhenta. Além disso, quantos entre os que debatem a existencia de Deus conhecem bem a filosofia de Aristoteles e Santo Tomás de Aquino?

    Como você mesmo disse, desconhecer um argumento refutado há mais de um século é asneira. Será que todos, exceto os cristãos, que não apenas aceitam o deus filosófico, mas também fazem o link entre esse deus e o deus da revelação, somos asnos?

    Eu não excetuaria apenas os cristãos, mas também todos os seguidores das religiões monoteistas, mesmo sem filiação confessional.

  11. Prezado Laercio

    Muitissimo obrigado pelo precioso esclarecimento!

  12. Prezado Lampedusa

    Não se trata de modelo. Isso é um constructo a posteriori. Antes disso, a atitude fundamental é a postura diante da realidade. A filosofia clássica parte da “admiratio” do homem diante da realidade e admite a sua capacidade de apreendê-la (não em sua totalidade). É o realismo clássico. A sua contraposição é a postura idealista que não admite a capacidade do homem apreender a realidade, ao menos fazendo essa percepção depender de elementos subjetivos. Ambas posturas não podem ser “comprovadas” . Mas a postura idealista, ainda que racional, fere a razão vital.

    Dizer que ambas as “posturas” não podem ser comprovadas não seria já idealismo (ou seja, a adoção de uma dessas posturas)? E apelar para a “razão vital” para optar por uma delas não seria mero pragmatismo?

  13. Rodrigo,

    Carissimo Rafael

    Não falei nada sobre discordância ou gosto.

    Falou sim:

    Eu tamém falei sobre religião, mas nunca me posicionei religiosamente. Da mesma forma, eu falei em concordância ou gosto, mas nunca falei que você estava obrigado a concordar ou gostar do que eu estava dizendo.

    Agradar ou desagradar é questão de gosto. Gostamos das coisas que nos agradam, o que contraria os nossos gostos nos desagrada.

    Não exijo que você se sinta agradado pelos meus comentários, mas me reservo o direito de abrir mão de uma conversa se ela ficar desagradável.

    Você usou o adverbio “amistosamente”. Eu pergunto: se não pudermos ser francos com os amigos, sê-lo-emos com quem? Com os inimigos?

    Não é necessário ser desagradável para ser franco. Mas tudo bem, ideias não merecem respeito, pessoas merecem respeito. Então vamos seguir assim. Você pode dizer que minhas ideias são imbecis e eu posso dizer que as suas são preconceituosas, nos momentos oportunos.

    Eu não sei quem são esses cristãos a que você se refere, não sei nem se são catolicos. Como posso opinar a respeito?

    Excelente. Então não vamos discutir o assunto. Não quero provar pra você que a fé cega. Eu apenas compartilhei minha opinião sobre isso num momento que pareceu oportuno. Não me parece mais oportuno discutir se isso é verdade ou não.

    Mas a Igreja discute todos esses assuntos. Uma das coisas que mais me impressiona na Igreja é que ela tem resposta pra tudo. Você pode não gostar da resposta, pode ignorá-la por não haver tido o cuidado de pesquisar, mas não pode falar que ela não tem resposta.

    Abrir-se à discussão não é ter resposta para tudo!!! É exatamente o contrário disso.

    Você ficou irritado porque eu peguei você no pulo do preconceito contra os cristãos e agora está seco para me devolver o predicado. Mas acalme-se. Meu posicionamento não é preconceituoso, não. Preconceito é uma opinião, em geral negativa, formada sem fundamento ou reflexão previa.

    Uma vez que você não sabe como eu cheguei à minha conclusão, você não pode dizer que ela é preconceituosa. É claro que ela é uma generalização. Mas eu tenho o devido cuidado de não aplicar essa minha visão a todo e qualquer caso. Enxergo como uma tendência, não como uma regra.

    Ainda assim, eu vou acabar falando um pouco disso lá pra frente.

    Achar que a fé catolica fecha a mente, só porque você conviveu com alguns cristãos (que possivelmente nem catolicos eram) que tinham a mente fechada, é preconceito.

    Eu não disse que a fé católica fecha a mente. Eu disse que a fé fecha a mente. E devo lembrá-lo que, quando eu falo em “fechar a mente”, eu não me refiro a todo e qualquer assunto.

    Eu estou tentando parar de usar a expressão “mente fechada” nesta conversa porque é uma generalização muito maior do que eu vinha pensando enquanto conversávamos.

    Preceitos morais ou juizos de valor não são realidades materiais.

    Discordo…

    Assim como Deus e a alma humana, não podem ser justificados ou observados por criterios puramente experimentais, não podem ser examinados com um microscopio, identificados em laboratorio nem tocados com um bisturi.

    …justamente porque podem ser justificados e observados por critérios experimentais. O fato de você não poder examinar como se fosse uma célula não significa aboslutamente nada. A experiência em questão aqui é a experiência humana. O simples critério de reduzir e não causar sofrimento é mais que suficiente para pautar a moral. “Não faça ao outro o que você não quer que lhe façam”. A minha moral se desenvolveu de acordo com a minha experiência humana. Meu sofrimento, o sofrimento que eu causei aos meus próximos, meus erros e acertos, meus diálogos… foram essas as experiências que moldaram e vem moldando os meus preceitos morais.

    Você pode observar o cumprimento ou a violação de um preceito moral, mas jamais a razão de sua obrigatoriedade.

    O conceito de “razão” é fútil. Qual a razão do homem? Qual a razão de uma árvore? De uma montanha? Você não encontrará essas respostas na natureza. As respostas dessas perguntas são baseadas na experiência humana. Idem para a moral.

    Se só existe materia, os preceitos morais, necessariamente, devem ser relegados ao mesmo status a que os ateus relegam a alma e o proprio Deus: à classe das quimeras, das ilusões da mente humana.

    Mas quimera, deus e alma são entidades. Elas existem ou não existem no mundo real. Moral é apenas um conceito. Um conceito não pode ser uma ilusão.

    E que argumento de autoridade é esse? Eu tenho de aceitar só porque esse idiota falou? Sam Harris agora é infalivel?

    Meu colega, por favor. Menos. Muito menos. Que isso, cara… Eu estou lhe indicando uma pessoa que dispende tempo em algo que contraria a sua filosofia. Estou apenas dizendo que existem muitas ideias a respeito de como uma moral absoluta pode existir mesmo na ausência de deus. Se você tiver interesse, vá atrás. Não estou dizendo “Sam Harris” disse isso com o objetivo de convencê-lo com base em um argumento de autoridade. Estou apenas apontando algo que talvez seja do seu interesse.

    Francamente… você chama as pessoas de idiotas e suas ideias de imbecis muito rápido. Você ainda nem viu o que o cara tem a dizer e já concluiu que a ideia dele é imbecil? Não é um posicionamento inteligente.

    Você faz mais uma vez jus à alcunha de “rei do argumento suicida”. Se a situação de relativismo é total, como podem existir preceitos morais que podem ser defendidos? E se existem preceitos morais que podem ser defendidos, como posso dizer que é uma situação de relativismo total? Ô mania de se desmentir a si mesmo!

    A impressão que passa é que você está tão treinado a procurar contradições lógicas (ou está sem vontade de conversar, apenas discutir) que já nem para pra pensar no que eu estou escrevendo.

    O que é relativismo moral? Segundo a Wikipédia, “relativismo Moral é uma posição metaética que o julgamento moral ou de valores variam de acordo com as entidades diferentes como indivíduos, culturas e classes sociais que as propõem.”

    Não sei se as palavras estão exatas. Provavelmente não. Mas essa definição bate com o conceito que eu sempre tive acesso.

    Se o julgamento moral ou de valores variam de acordo com as entidades, então eu sou absolutamente livre para incluir no meu julgamento moral a condenação dos seus valores morais.

    Se eu sou livre para julgar que a circunsição feminina é uma violação à liberdade feminina, pelos motivos que eu achar melhores, então eu também posso julgar que sou livre para viajar até a África e condenar o líder religioso que promove essa prática. Da mesma forma que esse líder religioso é livre para vir até aqui e me matar por eu estar dizendo que ele não tem o direito de cortar o clitóris de menininhas.

    É óbvio que não existe uma moral absoluta que diz “não matarás”. Mas isso não é problema porque a nossa sociedade não vive uma moral absoluta. Em várias circunstâncias, é permitido matar.

    Aliás, até mesmo dentro do sistema filosófico católico, não existe moral absoluta. O mandamento é “não matarás”, mas a própria Bíblia está repleta de instruções para matar outras pessoas.

    Você não consegue desenvolver um argumento sem cair em contradição consigo mesmo e vem dizer que a fé cega? A fé não cega, meu amigo. A fé autentica, virtude teologal, leva a nossa razão a enxergar mais longe. Mas se você se fecha na ignorancia voluntaria, já não vai conseguir enxergar nem mesmo o que poderia só com a razão. Como alguém já disse, o pior cego é o que não quer ver.

    Alguém que continua tratando homossexuais como “pecadores”, no meu ver, está cego pela fé.

    A história da ciência também está repleta de cientistas que estagnaram suas pesquisas por conta de fé. Newton se recusou a encarar o problema da estabilidade do sistema solar e invocou deus para explicar como as órbitas se mantinham estáveis ao longo dos séculos. Coube a Laplace, quase meio século depois, deixar deus de fora da jogada e resolver o problema que Newton não quis encarar. Einstein também, por sua fé em um universo estático e perfeito, deixou de enxergar a obviedade do que Hubble estava vendo: que o universo está em expansão.

    Isso para não citar todos os filósofos gregos que concluíram, dentre outras coisas, que todos os corpos caem ao solo à mesma velocidade, que a Terra é o centro do universo e que os planetas orbitam a Terra em órbitas perfeitamente circulares, as “leis” do movimento de Aristóteles, o sistema solar de Ptolomeu… todos baseados na fé de que a natureza coloca o homem (filho de deus) no centro do universo e segue regras perfeitas e harmoniosas.

    Você é tão convicto que a moral provem de deus que não aceita a possibilidade de existir uma moral integralmente racional e humana.

    O problema é que você não tem sequer uma unica razão para dizer que minha convicção está errada.

    Releia essas duas frases e me diga com quem está o ônus da prova.

    Não, eu não sou impermeavel a argumentos. Eu até sou muito facil de convencer – quando há argumentos. Impermeavel a argumentos é alguém, por exemplo, a quem a gente demonstra tintim por tintim a existencia de Deus, o fulano até elogia a consistencia da demonstração, mas se limita a dizer que não a aceita, sem apresentar qualquer razão disso ou, quando muito, apresentando argumentos autocontraditorios.

    Sua demonstração foi realmente muito boa. Eu sinceramente lhe agradeço o tempo que você dispendeu em explicar. E tenho hoje uma visão bem mais respeitosa da filosofia do que eu tinha alguns dias atrás, quando comeceçamos a nossa conversa. Sério.

    Ocorre que eu aprendi que ter uma explicação consistente não basta para que você seja capaz de afirmar que conseguiu entender como algo funciona. Veja Ptolomeu. O modelo do sistema solar dele era muito consistente e elegante. E até batia com as observação, em algum grau de precisão. Mas estava errado. Newton também apresentou um modelo muito bom do sistema solar. Que funciona com uma precisão fantástica. Mas está errado. O modelo considerado correto hoje é o modelo relativista. Funciona com uma precisão muito maior. E pode ser que também esteja errado.

    Da mesma forma, tudo o que você falou para mim sobre inteligência, apesar de ter me soado como uma forma fantástica de se observar a entidade humana, não me convence na medida que é estendido para explicar todo o universo. A afirmação de que a inteligência age como si, como uma entidade, me parece funcionar muito bem como modelo, mas não para afirmar que a criação do universo exige um ato de inteligência.

    Na minha concepção (e eu sinceramente, baseado nas minhas leituras, acredito que essa seja a concepção moderna), a inteligência é uma propriedade. Faz toda a diferença do mundo. Ela só existe na presença de algo mais. Isso leva a uma conclusão bem diferente do seu argumento. Como eu posso aceitar sua prova de deus se eu tenho em mãos dois pontos de vista contraditórios e não posso provar que nenhum dos dois é a explicação correta?

    O nome dessa figura de linguagem é ironia. Eu quis ironizar a sua defesa do suposto ateismo dos recém-nascidos. A ironia deve ter calado fundo em você, pelo grau de irritação que ela lhe provocou. Quanto ao mais, eu tenho diversos atributos em comum com esses animais (aliás, o homem é um microcosmo, que recapitula em si toda a natureza), mas felizmente não pretendo me igualar com eles no que toca à religião. Porém, se você prefere, posso dizer que os ateus pretendem se igualar aos golfinhos e chimpanzés no que toca às opiniões sobre religião e ao conhecimento de Deus. Melhorou?

    Eu não estava irritado. E, em minha defesa, recorro à lei de Poe para explicar por que não reconheci ironia na sua fala.

    Não sou culpado pela forma como você superestima seu intelecto.

    É, tem gente que prefere subestimar a propria inteligencia. É o que se chama “ignorancia voluntaria”.

    Não acho que reconhecer que meu intelecto e meu conhecimento são frágeis demais para explicar a criação do universo seja subestimar minha inteligência. Vocês fazem a mesma coisa com deus. Quantas vezes não fiz questionamentos religiosos e recebi como resposta “não podemos entender essa complexidade de deus”?

    O que estou dizendo é que não dá pra descrever algo que você não apreende.

    Ok, acho que preciso que você explique para mim o que você quer dizer com apreender. Talvez eu não tenha entendido o conceito.

    Não sabia que você precisava tanto da minha aprovação. Eu, pelo menos, não preciso em nada da sua. Você pode me chamar de mente-fechada, de chato, disso e daquilo, que vou achar até graça.

    Não é um pedido de aprovação. Em uma conversa pela internet, visto que não estamos vendo a reação um do outro conforme os argumentos são apresentados, considero uma boa prática você dizer se o interlocutor apresentou algo com o qual você concorda. Do contrário, a impressão que fica é a de que você não está ouvindo, que tudo o que o outro fala você discorda e a única coisa que lhe importa é responder aquilo que você tem capacidade de refutar.

    Deixe de sensacionalismo barato. A unica coisa que se constatou até hoje é que supostamente um mesmo fenomeno quando se observa de uma forma se apresenta de um jeito e quando se observa de outra forma se apresenta de outro jeito.

    Vou suspender minha argumentação com base em quântica até verificar se minha interpretação está correta ou não.

    Por que a distinção entre inteligencia e consciencia? Já ouviu falar da navalha de Occam? — as entidades não devem ser multiplicadas desnecessariamente.

    Porque eu estou pensando em inteligência como apenas uma das muitas propriedades da consciência. Se você fala em “inteligência” pensando em tudo aquilo que diferencia um ser humano de animais, criatividade, capacidade de observação, de senso crítico, de abstração etc, então estamos falando sobre coisas diferentes e tudo o que eu disse antes precisa ser reescrito.

    Quanto à consciencia (ou inteligencia) depender do cerebro, se se trata de uma dependencia a titulo de conditio sine qua non, na medida em que o cerebro fornece os materiais sobre que a inteligencia trabalha, concedo. Porém, se a dependencia é a titulo de conditio per quam, nego, porque você está fazendo uso de uma petição de principio: dando por já demonstrado aquilo mesmo que deveria demonstrar.

    A única coisa que eu estou tentando demonstrar é que existe uma visão alternativa à que você apresentou que é conflitante e plausível, dadas as assunções necessárias.

    Que são dois enunciados contraditorios, sem duvida. Ocorre que um deles, o da imaterialidade da inteligencia, possui razões que o demonstram. Para o enunciado oposto você não conseguiu achar outra defesa senão uma petição de principio.

    O argumento da imaterialidade da inteligência é cíclico. Você supõe que o começo do universo foi tal que pode ser explicado pela razão e apresentou argumentos que, se não forem respeitados, criam contradições com os princípios da razão.

    Eu queria muito entender como você enxerga causalidade em um cenário no qual não existem os conceitos de tempo e de espaço, justamente o cenário atualmente aceito como aquele que antecedeu o big bang.

    Como eu deveria ler as passagens a seguir?
    1) II Reis 2:23-24
    2) Deut. 22:13-30
    Você já se esqueceu por que eu perguntei isso?

    Independentemente dos motivos por que você me perguntou, é evidente que se trata de uma pergunta sobre a Revelação cristã.

    É evidente que se trata daquilo que sua religião enxerga como a Revelação Cristã. Do meu ponto de vista, trata-se de explicar a coerência de uma religião que afirma ter um deus com atributos magníficos, mas age com mesquinhez e crueldade. Você tem alguma explicação racional para isso?

    Eu perguntei isso a Rui com o objetivo de mostrar a ele que ele não conseguiria provar nada sem recorrer à fé.

    Explique-me então como é possivel comparar uma coisa com outra sem se referir a um dos termos da comparação.

    Então simplesmente reconheça que sua crença no deus cristão não é racional, é baseada em fé.

    O unico que aceita posicionamento sem provas aqui é você. A sua afirmação é puramente gratuita e simplesmente fundada num ato de vontade. Você não aceita a demonstração da existencia de Deus não porque você tenha razões melhores para desconfirmá-la ou demonstrar sua inconsistencia, mas simplesmente porque você não quer.

    Eu não aceito a sua demonstração da existência de deus porque eu não tenho nenhuma razão para acreditar que o pensamento lógico-dedutivo seja capaz de estabelecer critérios para um cenário que está além da minha capacidade de concepção.

    É uma posição cética perfeitamente plausível. Como dizia Carl Sagan, “extraordinary claims require extraordinary evidence“. Na ausência de qualquer evidência, eu suspendo o juízo e aceito a minha incapacidade de apresentar uma resposta. (o que as pessoas corriqueiramente chamam de “agnosticismo”)

    Além disso, por que você não escreve Deus com inicial maiuscula como todo o mundo faz e a ortografia da lingua portuguesa manda fazer com os nomes proprios? Quer o quê, mostrar para o mundo que você não acredita n’Ele? Que coisa ridicula! Deixe de neurose, cara! Fique tranquilo, eu também escrevo Thor, Saturno e Batman com inicial maiuscula e nunca me incomodei com isso. Trata-se apenas de uma convenção ortografica.

    Eu nunca escrevi “Ele” ou “n’Ele”. E jamais vou escrever. “Deus” não é um nome próprio. Para que seja um nome próprio, eu tenho que defini-lo como uma entidade. Claro que eu poderia escrever DDeus para me referir ao deus cristão, pois aí ele está definido como uma entidade que tem um nome, mas eu prefiro escrever Javé ou Jesus, pois claras diferenças podem ser observadas do deus do Antigo Testamento para o deus do Novo Testamento. Eu também escrevo Igreja, quando me refiro à igreja católica em vez de qualquer instituição religiosa igualmente, Bíblia quando me refiro à coletânea de livros e Revelação quando me refiro ao seu conceito de que os ensinamentos divinos foram entregues por deus (seja lá qual for).

    Aliás, será que não lhe passa pela cabeça que, se você tivesse nas mãos uma prova da existência do deus filosófico, o assunto não seria motivo de tanto debate e discordância?

    A sua impressão é equivocada, por duas razões. A esmagadora maioria da humanidade admite a existencia de Deus, ateus e agnosticos são apenas uma minoria barulhenta. Além disso, quantos entre os que debatem a existencia de Deus conhecem bem a filosofia de Aristoteles e Santo Tomás de Aquino?

    O problema é que o assunto é motivo de debate e discordância mesmo entre estudiosos. Chomsky, por exemplo, é ateu. E eu tenho certeza que ele conhece os dois.

    Já que você pegou no pé porque eu escrevo deus, por que diabos você escreve “Santo Tomás” em vez de “São Tomás”, como manda a norma portuguesa?

    A esmagadora maioria da humanidade admite a existência de deus, não de Deus. Menos de um terço da humanidade admite a existência do deus cristão. E os diferentes deuses nos quais a humanidade acredita são contraditórios em muitos pontos.

    Como você mesmo disse, desconhecer um argumento refutado há mais de um século é asneira. Será que todos, exceto os cristãos, que não apenas aceitam o deus filosófico, mas também fazem o link entre esse deus e o deus da revelação, somos asnos?

    Eu não excetuaria apenas os cristãos, mas também todos os seguidores das religiões monoteistas, mesmo sem filiação confessional.

    Obrigado por me colocar no patamar de asneira de Carl Sagan, Stephen Hawking, Neil deGrasse Tyson, Richard Dawkins, Bill Nye, Lawrence Krauss, Charles Darwin, Marie Curie, Ann Druyan, Jodie Foster, Lady Ada Lovelace e grande parte dos amigos e professores cuja capacidade analítica, crítica, de abstração ou moral eu admiro.

    Obrigado também pela distinção intelectual que você faz entre mim e todos aqueles que acreditam na existência de um ser transcendental, onisciente e onipotente, capaz de criar absolutamente qualquer coisa e de saber todas as consequências de todos os atos feitos por ele ou por sua criação, para então escolher criar o inferno, sabendo exatamente quem passará o resto da eternidade lá antes mesmo de criá-los, além de decidir me perdoar por um pecado que eu nunca cometi nascendo no útero de uma virgem e sendo torturado até à morte.

  14. Só um detalhe:

    “Já que você pegou no pé porque eu escrevo deus, por que diabos você escreve ‘Santo Tomás’ em vez de “São Tomás”, como manda a norma portuguesa?”

    “Santo Tomás” é uma eminente exceção à regra. Dada a excepcional importância de Tomás de Aquino para a Igreja Católica, ele é o único santo posterior a Jesus Cristo a ser designado como “Santo Tomás”, e não “São Tomás”, como esperado. Alguém poderia explicar isto melhor?

    Da mesma forma, todos os santos do Antigo Testamento também são designados assim. Por exemplo: “Santo Moisés”, “Santo Davi”, etc. Não é uma prática muito comum designar as principais figuras do Antigo Testamento com o título de “Santo”, mas há uma notável exceção: Santo Elias.

  15. Rafael

    “Eu disse que é imbecilidade afirmar que eu sou obrigado a respeitar todo e qualquer posicionamento moral alheio apenas porque a minha descrença em deus me forçaria a esse tipo de relativismo. É justamente porque eu não sou obrigado a isso que eu posso condenar o holocausto e culturas homofóbicas ou machistas.”

    Imagino que se você pode não respeitar a ‘moral alheia’ simplesmente “PORQUE SIM” ou porque sua experiência pessoal diz o contrário, você julga igualmente correto que a “sua moral” seja desrespeitada por quem pensa diferente, novamente, simplesmente “PORQUE SIM”. E, nesse sentido, você cai naquele absurdo ilustrado por seu exemplo na resposta que você deu ao Rodrigo sobre a circuncisão feminina.

    A convivência social ou a “família humana” se torna impossível sem um fator transcendente ao indivíduo na definição do que é moral ou não.

    “Se para você isso é agnosticismo, então você pode me chamar de agnóstico e trocar a minha frase por “todo mundo nase agnóstico”.”

    Não, Rafael. O agnosticismo também supõe um ato consciente. Após o nascimento (bom, aparentemente, antes disso, já no útero materno) o ser humano começa a apreender a realidade através de seus sentidos e, em determinado estágio, começa a se questionar a origem do real. Só nesse momento, alguém passa a ter fé em Deus, ou fé na inexistência de Deus ou AINDA não ter resposta.

    “A sua própria explicação me soa como a descrição de um modelo. Especialmente compatível com o conceito de um modelo é o reconhecimento de que o homem não tem a capacidade de apreender a realidade em sua totalidade.”

    Reitero aqui a crítica que o Rodrigo lhe faz por não distinguir os pressupostos de um modelo e o modelo em si.

  16. Rodrigo,

    “Dizer que ambas as “posturas” não podem ser comprovadas não seria já idealismo (ou seja, a adoção de uma dessas posturas)?”

    Sinceramente desconheço qualquer comprovação se o homem pode ou não aceder ao “noumenon”. [Nunca entendi porque não pode ser aplicado ao idealismo a ‘navalha de Occam :) ]

    “E apelar para a “razão vital” para optar por uma delas não seria mero pragmatismo?”

    Sim, acho que você tem razão. Mas, penso eu, que a ‘razão vital’ nos induz a enxergar a dissonância de se viver como se ‘realistas fôssemos’ e pensar como ‘idealistas’. Acho que é Chesterton que aponta essa contradição aos ‘idealistas’ quando sentam-se à mesa do café da manhã, não é?

  17. Lampedusa,

    Imagino que se você pode não respeitar a ‘moral alheia’ simplesmente “PORQUE SIM” ou porque sua experiência pessoal diz o contrário, você julga igualmente correto que a “sua moral” seja desrespeitada por quem pensa diferente, novamente, simplesmente “PORQUE SIM”.

    Eu reconheço o direito que você tem de não aceitar os meus valores morais, seja lá os motivos que você tem. Por exemplo, você pode considerar que sexo fora do casamento seja imoral. Eu não. E daí?

    E, nesse sentido, você cai naquele absurdo ilustrado por seu exemplo na resposta que você deu ao Rodrigo sobre a circuncisão feminina.

    Se você não me disse por que acha a resposta um absurdo, eu não tenho como responder nada.

    A convivência social ou a “família humana” se torna impossível sem um fator transcendente ao indivíduo na definição do que é moral ou não.

    Existe um fator transcendente ao indivíduo, que é a noção cultural de moral, mutante, evolutiva. O nome disso, se não me engano, é Zeitgeist.

    E, além desses conceitos morais, alguns deles muito subjetivos e transmitidos de indivíduo para indivíduo na educação familiar e na convivência social, existem leis federais, estaduais, municipais, bem como os princípios humanos estabelecidos em conjunto por diversas nações. Tudo isso junto estabelece as normas da nossa convivência social e familiar.

    Não, Rafael. O agnosticismo também supõe um ato consciente. Após o nascimento (bom, aparentemente, antes disso, já no útero materno) o ser humano começa a apreender a realidade através de seus sentidos e, em determinado estágio, começa a se questionar a origem do real. Só nesse momento, alguém passa a ter fé em Deus, ou fé na inexistência de Deus ou AINDA não ter resposta.

    Não tenho palavras.

    Eu não disse que nasci agnóstico. Sua interpretação de texto está fraca.

    Eu disse que nasci sem crença em deus, assim como vocês. E chamei isso de ateísmo.

  18. Rodrigo,

    Desculpe-me, mas onde se lê: “Sinceramente desconheço qualquer comprovação se o homem pode ou não aceder ao “noumenon”.”

    Leia-se: “Sinceramente desconheço qualquer comprovação se o homem pode ou não conhecer o “noumenon”.”

  19. Rafael,

    “Não tenho palavras.

    Eu não disse que nasci agnóstico. Sua interpretação de texto está fraca

    Eu disse que nasci sem crença em deus, assim como vocês. E chamei isso de ateísmo..”

    Você disse primeiro:

    “E eu não “virei” ateu. Eu nasci ateu, assim como você e todos os demais que aqui escrevem e leem.”

    E quando questionado respondeu:

    “então você pode me chamar de agnóstico e trocar a minha frase por “todo mundo nase [sic] agnóstico”.

    Acho que sobraram palavras suas reiterando a interpretação que eu dei. Se você “reinventa” o conceito de termos tradicionais é outro problema. Atribuir ‘ateísmo’ (e, principalmente, agnosticismo) a um recém-nascido é realmente espantoso.

    ” Por exemplo, você pode considerar que sexo fora do casamento seja imoral. Eu não. E daí?” (…) “Se você não me disse por que acha a resposta um absurdo, eu não tenho como responder nada.”

    Você não percebe as consequências dessa frase. Tente refazê-la com estes termos: ‘ eu sou contra dar porrada em gay, mas o skinhead vizinho meu não. E daí?” Ou se quiser: “eu sou contra o infanticídio de gêmeos, mas o ianomani que apareceu na TV é a favor. E daí?”

  20. Lampedusa,

    “Não tenho palavras.

    Eu não disse que nasci agnóstico. Sua interpretação de texto está fraca

    Eu disse que nasci sem crença em deus, assim como vocês. E chamei isso de ateísmo..”

    Você disse primeiro:

    “E eu não “virei” ateu. Eu nasci ateu, assim como você e todos os demais que aqui escrevem e leem.”

    E quando questionado respondeu:

    “então você pode me chamar de agnóstico e trocar a minha frase por “todo mundo nase [sic] agnóstico”.

    Acho que sobraram palavras suas reiterando a interpretação que eu dei. Se você “reinventa” o conceito de termos tradicionais é outro problema.

    Vamos reconstruir o diálogo, invertendo a ordem dos parágrafos, mas sem alterar uma só palavra?

    “A definição do que é ateísmo é objeto de disputa. A minha concepção é a de que ateísmo é a simples asuência da crença em deus, não necessariamente o posicionamento de se afirmar a inexistência de deus.

    [..] Eu [disse que] nasci sem crença em deus, assim como vocês. Eu nasci ateu, assim como você e todos os demais que aqui escrevem e leem.”

    O que eu disse sobre agnosticismo era na susposição de que você talvez considerasse que “simples ausência de crença em deus” não é ateísmo, é agnosticismo. Mas já vi que não é o caso. Então concluo aqui.

    ” Por exemplo, você pode considerar que sexo fora do casamento seja imoral. Eu não. E daí?” (…) “Se você não me disse por que acha a resposta um absurdo, eu não tenho como responder nada.”

    Você não percebe as consequências dessa frase. Tente refazê-la com estes termos: ‘ eu sou contra dar porrada em gay, mas o skinhead vizinho meu não. E daí?” Ou se quiser: “eu sou contra o infanticídio de gêmeos, mas o ianomani [sic] que apareceu na TV é a favor. E daí?”

    Claro que eu percebo. Eu já pensei muito nesse tema.

    E foi por isso que eu disse:

    “Idiota é um indivíduo que acredita que […] um ateu está forçado a compactuar de um relativismo imbecil no qual todo posicionamente moral é igualmente válido e não pode ser contrariado.”

    E também:

    Existe um fator transcendente ao indivíduo, que é a noção cultural de moral, mutante, evolutiva. O nome disso, se não me engano, é Zeitgeist.

    E, além desses conceitos morais, alguns deles muito subjetivos e transmitidos de indivíduo para indivíduo na educação familiar e na convivência social, existem leis federais, estaduais, municipais, bem como os princípios humanos estabelecidos em conjunto por diversas nações. Tudo isso junto estabelece as normas da nossa convivência social e familiar.

    Portanto, o skinhead tem todo o direito do mundo de achar que pode agredir homossexuais, mas a sociedade tem o direito de prender esse indivíduo e julgá-lo como criminoso e marginal. É assim que funciona uma moral relativa. Não é “ah, puxa, o cara tem essa moral assim, vamos respeitá-la e deixá-lo fazer o que quizer”.

    Idem para os ianomâmis. Eles organizaram uma sociedade na qual é moral o infanticídio de gêmeos. Isso está certo? Do nosso ponto de vista e da nossa instrução, não. “Ah, mas é a cultura deles”. Não importa. Nós temos todo o direito do mundo de intervir. Cabe apenas decidir como podemos intervir e se as consequências dessa intervenção serão positivas ou negativas dentro do nosso arcabouço moral.

    A única coisa absoluta em todas essas situações é o sofrimento humano. Não importa o que o skinhead ou o ianomâmi pense, o sofrimento alheio é causado. Mas é impossível eliminar completamente o sofrimento e promover uma situação de felicidade total. A moral de um indivíduo ou de uma sociedade está relacionada como o que essa sociedade considera sofrimento inevitável e com a intensidade do esforço que ela está disposta a colocar na promoção da felicidade dos seus indivíduos.

  21. Outra coisa, nenhum de vocês falou nada sobre isso:

    É óbvio que não existe uma moral absoluta que diz “não matarás”. Mas isso não é problema porque a nossa sociedade não vive uma moral absoluta. Em várias circunstâncias, é permitido matar.

    Aliás, até mesmo dentro do sistema filosófico católico, não existe moral absoluta. O mandamento é “não matarás”, mas a própria Bíblia está repleta de instruções para matar outras pessoas.

    Eu estou ansioso por uma resposta a isso.

  22. Rafael,

    “O que eu disse sobre agnosticismo era na susposição de que você talvez considerasse que “simples ausência de crença em deus” não é ateísmo, é agnosticismo. Mas já vi que não é o caso. Então concluo aqui.”

    É importante perceber que o ateísmo, o teísmo e o agnosticismo são JUÍZOS da mente humana e, portanto, ninguém nasce com tais juízos inatos. Considerar ateísmo ou agnosticismo como “ausência da crença em Deus” implica em dizer que uma pedra é atéia. Não tem sentido.

    “Portanto, o skinhead tem todo o direito do mundo de achar que pode agredir homossexuais, mas a sociedade tem o direito de prender esse indivíduo e julgá-lo como criminoso e marginal.

    E se amanhã a maioria da sociedade pensar desse modo (já que é mutante e evolutiva)? Passa a ser moral espancar gays?

    ” Idem para os ianomanis.Eles organizaram uma sociedade na qual é moral o infanticídio de gêmeos. Isso está certo? Do nosso ponto de vista e da nossa instrução, não. “Ah, mas é a cultura deles”. Não importa. Nós temos todo o direito do mundo de intervir”

    Por que temos o direito de intervir? Não é a experiência pessoal e cultural deles? Por que sua moral é superior à deles? Por que eles não podem intervir na nossa?

  23. “Outra coisa, nenhum de vocês falou nada sobre isso:

    É óbvio que não existe uma moral absoluta que diz “não matarás”. Mas isso não é problema porque a nossa sociedade não vive uma moral absoluta. Em várias circunstâncias, é permitido matar.

    Aliás, até mesmo dentro do sistema filosófico católico, não existe moral absoluta. O mandamento é “não matarás”, mas a própria Bíblia está repleta de instruções para matar outras pessoas.”

    Eu estou ansioso por uma resposta a isso.”

    O que você considera moral absoluta?

    Sim, o direito à vida não é absoluto. É lícito matar o injusto agressor, por exemplo. Não entendi a sua dúvida.

  24. É importante perceber que o ateísmo, o teísmo e o agnosticismo são JUÍZOS da mente humana e, portanto, ninguém nasce com tais juízos inatos. Considerar ateísmo ou agnosticismo como “ausência da crença em Deus” implica em dizer que uma pedra é atéia. Não tem sentido.

    Ahn… não. Só no seu dicionário. No meu e no do resto do mundo, ateísmo é “ausência de crença em deus”.

    Também faz tanto sentido você se perguntar qual é o propósito de uma pedra quanto de um ser humano, mas vocês se perguntam qual é o propósito do indivíduo mesmo assim.

    E se amanhã a maioria da sociedade pensar desse modo (já que é mutante e evolutiva)? Passa a ser moral espancar gays?

    Do ponto de vista de quem?

    Se você está pensando em uma situação de relativismo, você sempre tem que ter uma referência.

    Por que temos o direito de intervir?

    Defina direito. Tenho certeza que você tem em mente um conceito que vai entrar em conflito com o que eu estou prestes a dizer.

    Não é a experiência pessoal e cultural deles? Por que sua moral é superior à deles?

    Onde eu disse que a nossa moral é superior à deles?

    Por que eles não podem intervir na nossa?

    Eles podem.

    O que você considera moral absoluta?

    Sim, o direito à vida não é absoluto. É lícito matar o injusto agressor, por exemplo. Não entendi a sua dúvida.

    Onde está o absolutismo de que a vida é sagrada e que um humano não pode julgar outro, que o julgamento pertence apenas a Deus, se você diz

    “Não matarás… exceto se o indivíduo coletar madeira em um sábado, se sua esposa não for virgem, se o casal for adúltero, se for por intervenção divina contra um grupo de crianças que chamou você de careca etc”.

    ?

  25. Carissimo Rafael

    Da mesma forma, eu falei em concordância ou gosto, mas nunca falei que você estava obrigado a concordar ou gostar do que eu estava dizendo.

    Se assim é, por que reclamou e disse ter sido desagradavel o fato de eu não ter gostado e emitido opinião negativa sobre a frase que você achou brilhante?

    Não exijo que você se sinta agradado pelos meus comentários, mas me reservo o direito de abrir mão de uma conversa se ela ficar desagradável.

    A Constituição Federal garante a você o direito de interromper a conversa a qualquer momento.

    Não é necessário ser desagradável para ser franco.

    Não é necessario ser desagradavel para ser franco. Mas, em certas circunstancias, não é possivel ser franco sem ser desagradavel.

    Mas tudo bem, ideias não merecem respeito, pessoas merecem respeito.

    Falou muito bem. Se a frase do Feynman era imbecil, esta sua agora é realmente muito inteligente.

    Então vamos seguir assim. Você pode dizer que minhas ideias são imbecis e eu posso dizer que as suas são preconceituosas, nos momentos oportunos.

    Com certeza.

    Excelente. Então não vamos discutir o assunto. Não quero provar pra você que a fé cega. Eu apenas compartilhei minha opinião sobre isso num momento que pareceu oportuno. Não me parece mais oportuno discutir se isso é verdade ou não.

    Tudo bem.

    Abrir-se à discussão não é ter resposta para tudo!!! É exatamente o contrário disso.

    Você está equivocado. Só se fecha à discussão quem não tem respostas. Eu, por exemplo, se não tivesse respostas aos seus questionamentos, ficaria quietinho no meu canto. Além disso, para haver uma resposta que realmente responda, quando a questão é de fato importante, é preciso meditar, refletir, discutir consigo mesmo durante muito tempo. Por exemplo, as respostas que eu dei a você aqui nessa pequena discussão não foram elaboradas de um momento para outro, mas foram objeto da minha reflexão e das minhas indagações pessoais por longos anos, num trabalho metodico, sistematico. Ninguém se habilita a discutir seriamente com ninguém se antes não discutiu prolongadamente consigo mesmo.

    Uma vez que você não sabe como eu cheguei à minha conclusão, você não pode dizer que ela é preconceituosa.

    Cheguei a essa conclusão com fundamento nos motivos que você proprio expôs.

    É claro que ela é uma generalização. Mas eu tenho o devido cuidado de não aplicar essa minha visão a todo e qualquer caso.

    Não teve esse cuidado aqui, anteriormente.

    …justamente porque podem ser justificados e observados por critérios experimentais. O fato de você não poder examinar como se fosse uma célula não significa aboslutamente nada. A experiência em questão aqui é a experiência humana.

    O problema é que você (ou o materialismo) não admite uma ordem de conhecimento superior à do conhecimento sensivel. Assim, a totalidade da experiencia humana será somente experiencia sensivel, seja a dos cinco sentidos de nosso corpo, seja da aparelhagem cientifica que permite ampliar enormemente o alcance desses sentidos, mas sempre permanecendo no nivel do sensivel, no nivel do material. Por definição, os sentidos e os instrumentos materiais não podem captar senão o que é material. Ora, se a totalidade da experiencia humana se reduz à experiencia sensivel, ela jamais poderá captar noções que não sensoriais, como a do bem ou mal moral, do certo ou do errado.

    O simples critério de reduzir e não causar sofrimento é mais que suficiente para pautar a moral.

    Não é, não. Mas pelo menos numa coisa você acertou: se reduzimos a totalidade da experiencia humana à experiencia sensivel, se não temos outro conhecimento senão o sensorial, a unica coisa que resta é a distinção entre prazer e dor. Prazer e dor, com efeito, são sensações. Entretanto, essa distinção não é suficiente para estabelecer uma moral.

    “Não faça ao outro o que você não quer que lhe façam”.

    Este principio é a regra de ouro de Confucio, a que Nosso Senhor Jesus Cristo deu forma positiva: “Faça ao outro o que você quer que lhe façam”. Porém, é possivel deduzir esse principio pura e simplesmente do prazer e da dor, ou mesmo do conhecimento sensivel em geral? E se o que me dá prazer for infligir dor ao outro? Por que deveria me abster disso, segundo uma “etica” sensualista e materialista?

    Mas quimera, deus e alma são entidades. Elas existem ou não existem no mundo real. Moral é apenas um conceito. Um conceito não pode ser uma ilusão.

    Como você pretende distinguir conceitos de entidades? Não é verdade que qualquer entidade não pode ser pensada senão na medida em que tenho um conceito dela? E, mais, como um conceito não pode ser uma ilusão se ele não existe no mundo real? E mais, se a moral é um conceito, quer dizer que ela não existe no mundo real? (aí você me dá razão). Será que essa sua distinção entre conceito e entidade faz mesmo algum sentido?

    Meu colega, por favor. Menos. Muito menos. Que isso, cara… Eu estou lhe indicando uma pessoa que dispende tempo em algo que contraria a sua filosofia. Estou apenas dizendo que existem muitas ideias a respeito de como uma moral absoluta pode existir mesmo na ausência de deus. Se você tiver interesse, vá atrás. Não estou dizendo “Sam Harris” disse isso com o objetivo de convencê-lo com base em um argumento de autoridade. Estou apenas apontando algo que talvez seja do seu interesse.
    Francamente… você chama as pessoas de idiotas e suas ideias de imbecis muito rápido. Você ainda nem viu o que o cara tem a dizer e já concluiu que a ideia dele é imbecil? Não é um posicionamento inteligente.

    Eu sei quem é Sam Harris e por isso o chamei de idiota. Tem muito apelo midiatico, mas não é levado a serio na comunidade academica de filosofia. Está para a filosofia como Bruna Surfistinha está para a literatura e o Luan Santana para a musica. Não é um genuino filosofo, mas apenas um produto da industria cultural.

    A impressão que passa é que você está tão treinado a procurar contradições lógicas (ou está sem vontade de conversar, apenas discutir) que já nem para pra pensar no que eu estou escrevendo.

    Por mais treinado que eu esteja, não teria sucesso se as contradições não estivessem presentes aí. Um conselho: treine-se você também na capacidade de encontrar contradições, é um excelente modo de educar o proprio intelecto.

    O que é relativismo moral? Segundo a Wikipédia, “relativismo Moral é uma posição metaética que o julgamento moral ou de valores variam de acordo com as entidades diferentes como indivíduos, culturas e classes sociais que as propõem.”
    Não sei se as palavras estão exatas. Provavelmente não. Mas essa definição bate com o conceito que eu sempre tive acesso.
    Se o julgamento moral ou de valores variam de acordo com as entidades, então eu sou absolutamente livre para incluir no meu julgamento moral a condenação dos seus valores morais.
    Se eu sou livre para julgar que a circunsição feminina é uma violação à liberdade feminina, pelos motivos que eu achar melhores, então eu também posso julgar que sou livre para viajar até a África e condenar o líder religioso que promove essa prática. Da mesma forma que esse líder religioso é livre para vir até aqui e me matar por eu estar dizendo que ele não tem o direito de cortar o clitóris de menininhas.

    Ou seja, na pratica não existe moral nenhuma. Porque toda e qualquer ação ou omissão pode ser aprovada ou desaprovada dependendo do ponto de vista. Se isso é o melhor que o ateismo pode produzir em materia de moral…

    É óbvio que não existe uma moral absoluta que diz “não matarás”. Mas isso não é problema porque a nossa sociedade não vive uma moral absoluta. Em várias circunstâncias, é permitido matar.

    Falacia de acidente. Você confunde a extensão do preceito de não matar para negar a existencia de uma moralidade objetiva. Vejamos outra ação, amputar um membro, por exemplo. É moralmente licito, pode ser até um dever em determinadas circunstancias (se o fulano é medico e o caso é urgente, por exemplo), amputar um membro gangrenado de uma pessoa. Porém, se o membro é sadio, a amputação, mesmo que parta de um medico, é moralmente reprovavel e se chama “lesão corporal”.

    Aliás, até mesmo dentro do sistema filosófico católico, não existe moral absoluta. O mandamento é “não matarás”, mas a própria Bíblia está repleta de instruções para matar outras pessoas.

    Bom, pra começo de conversa, o catolicismo, como venho repetindo, não é um sistema filosofico, é uma religião revelada. Mas existe um sistema filosofico que a Igreja adotou, porque reflete a verdade das coisas, sistema esse que foi iniciado por não-catolicos e sempre contou com representantes não-catolicos.
    E o mandamento não é exatamente “não matarás” – essa é a versão abreviada do mandamento. O mandamento todo, por extenso, é «jamais matarás o inocente». Porque esse mandamento não exclui a licitude moral da legitima defesa, da pena de morte e da guerra justa. Em todos essas casos, trata-se de matar um injusto agressor e o injusto agressor, por definição, não é um inocente.

    Aplicando. Eu não posso matar o Rafael. Ele não é um injusto agressor. Porém, no caso de ser agredido, eu tenho o direito de defender minha propria vida, ainda que isso custe a vida do agressor. Em outro exemplo, se alguém estiver pronto para matar uma criança, ou um cadeirante, ou qualquer outra pessoa que não esteja em condições de defender-se a si mesma, se eu estou em condições de defendê-la e o unico jeito de evitar o assassinato do inocente seria matando o injusto agressor, eu teria até mesmo o dever de matá-lo, de modo que eu pecaria se não o fizesse. É manifesto que ninguém gostaria de encontrar-se nessas circunstancias, mas é a conduta correta para o caso.

    Observe que a licitude da legitima defesa, ainda que pareça uma exceção ao preceito de não matar, é moralmente absoluta: vale independentemente de tempo ou de lugar. Do mesmo modo, a norma de não se matar o inocente é moralmente absoluta: não posso matar nenhum ser humano inocente, independentemente de ser este uma criança em gestação, um jovem no vigor de sua vida, um doente terminal, negro ou branco, rico ou pobre, homem ou mulher. Além disso, é bom observar que, nos casos da pena de morte, da legitima defesa e da guerra justa, é o injusto agressor que provocou sua propria morte. Assim, o culpado pela execução capital de um criminoso é ele proprio, e não o carrasco ou o juiz que ditou a sentença.

    A história da ciência também está repleta de cientistas que estagnaram suas pesquisas por conta de fé. Newton se recusou a encarar o problema da estabilidade do sistema solar e invocou deus para explicar como as órbitas se mantinham estáveis ao longo dos séculos. Coube a Laplace, quase meio século depois, deixar deus de fora da jogada e resolver o problema que Newton não quis encarar. Einstein também, por sua fé em um universo estático e perfeito, deixou de enxergar a obviedade do que Hubble estava vendo: que o universo está em expansão.

    E o que tem isso a ver com a fé catolica? E será que a fé no ateismo também não cega um Dawkins, por exemplo?

    Isso para não citar todos os filósofos gregos que concluíram, dentre outras coisas, que todos os corpos caem ao solo à mesma velocidade, que a Terra é o centro do universo e que os planetas orbitam a Terra em órbitas perfeitamente circulares, as “leis” do movimento de Aristóteles, o sistema solar de Ptolomeu… todos baseados na fé de que a natureza coloca o homem (filho de deus) no centro do universo e segue regras perfeitas e harmoniosas.

    Aplicar o conceito de fé religiosa aos filosofos gregos que viveram antes de Cristo é forçação de barra e nenhum deles acreditava que o homem é filho de Deus. Essa noção é propria da Revelação cristã. Para os maometanos, por exemplo, embora monoteistas, alguém se dizer filho de Deus é blasfemia.

    Você é tão convicto que a moral provem de deus que não aceita a possibilidade de existir uma moral integralmente racional e humana.
    O problema é que você não tem sequer uma unica razão para dizer que minha convicção está errada.
    Releia essas duas frases e me diga com quem está o ônus da prova.

    Independentemente de com quem esteja o onus da prova, eu já fiz o favor de demonstrar as razões de minha convicção em repetidas respostas, inclusive nesta (ver acima). Portanto, se essas razões não o contentam, o onus é seu.

    Sua demonstração foi realmente muito boa. Eu sinceramente lhe agradeço o tempo que você dispendeu em explicar. E tenho hoje uma visão bem mais respeitosa da filosofia do que eu tinha alguns dias atrás, quando comeceçamos a nossa conversa. Sério.

    E eu acredito que seja serio. Apesar de contradições lá e aqui, e da repetição de tiques e chavões ateistas, você é um rapaz inteligente e se esforça por ser intelectualmente honesto. Não perderia tempo em discutir com você se não achasse que a conversa poderia ser proveitosa.

    Ocorre que eu aprendi que ter uma explicação consistente não basta para que você seja capaz de afirmar que conseguiu entender como algo funciona. Veja Ptolomeu. O modelo do sistema solar dele era muito consistente e elegante. E até batia com as observação, em algum grau de precisão. Mas estava errado. Newton também apresentou um modelo muito bom do sistema solar. Que funciona com uma precisão fantástica. Mas está errado. O modelo considerado correto hoje é o modelo relativista. Funciona com uma precisão muito maior. E pode ser que também esteja errado.

    A demonstração não apenas é consistente, como está baseada em premissas irrefutaveis: fatos indiscutiveis da experiencia compreendidos à luz dos primeiros principios do ser. Não é apenas um modelo. Um modelo não só se baseia nos primeiros principios das demonstrações, que são evidentes por si mesmos e permitem a construção de um modelo consistente (os axiomas), como também em hipoteses de impossivel demonstração (como os postulados da geometria). Ou seja, você pode trocar de modelo trocando os postulados e propor modelos alternativos usando outros postulados, quem vai decidir é a progressiva experimentação. Aqui não é o caso. Não há experiencia nem troca de postulado que possa alterar as conclusões.

    Na minha concepção (e eu sinceramente, baseado nas minhas leituras, acredito que essa seja a concepção moderna), a inteligência é uma propriedade. Faz toda a diferença do mundo. Ela só existe na presença de algo mais. Isso leva a uma conclusão bem diferente do seu argumento. Como eu posso aceitar sua prova de deus se eu tenho em mãos dois pontos de vista contraditórios e não posso provar que nenhum dos dois é a explicação correta?

    Como você disse, estamos diante de dois juizos contraditorios. Ambos não podem ser verdadeiros (principio de não-contradição). Porém, um deles é sustentado por razões que o outro não possui (principio da razão suficiente).

    Além disso, a inteligencia seria propriedade do quê? Se for simplesmente do homem, concedo. De fato, é o homem que intelige, decide etc., que exerce os atos da inteligencia e da vontade. Porém, não posso atribuir essa propriedade a um orgão material, porque o ato pelo qual ela se manifesta é imaterial.

    Não acho que reconhecer que meu intelecto e meu conhecimento são frágeis demais para explicar a criação do universo seja subestimar minha inteligência. Vocês fazem a mesma coisa com deus. Quantas vezes não fiz questionamentos religiosos e recebi como resposta “não podemos entender essa complexidade de deus”?

    De fato, nunca poderemos esgotar toda a complexidade de Deus, mas isso não impede que nos exercitemos um pouquinho. Aristoteles, no ultimo livro de sua Etica Nicomaqueia, diz que a vida filosofica é mais divina que humana, mas que não devemos dar ouvidos àqueles que nos dizem que devemos tratar somente das coisas humanas, e que, pelo contrario, devemos nos esforçar por viver de acordo com o que de melhor e mais divino existe em nós. E Socrates igualmente disse que a vida sem meditação investigativa é indigna de um homem.

    Ok, acho que preciso que você explique para mim o que você quer dizer com apreender. Talvez eu não tenha entendido o conceito.

    Descrever é codificar determinada apreensão em signos. Apreender é ver a coisa, a ser ou não descrita. Ver o Corcovado, ou ver o Rio de lá, é uma apreensão. Uma descrição é contar como ele é. Se você nem sabe se apreendeu uma coisa, como é que sabe que a está descrevendo?

    A única coisa que eu estou tentando demonstrar é que existe uma visão alternativa à que você apresentou que é conflitante e plausível, dadas as assunções necessárias.

    Não nego que haja um juizo oposto possivel. O que digo é que essa alternativa possivel não é sequer provavel, tendo em vista as razões que sustentam a sua contraditoria.

    O argumento da imaterialidade da inteligência é cíclico. Você supõe que o começo do universo foi tal que pode ser explicado pela razão e apresentou argumentos que, se não forem respeitados, criam contradições com os princípios da razão.

    Não é, não. Parto do fato de que o universo se comporta inteligentemente, sem ter ele proprio inteligencia.

    Eu queria muito entender como você enxerga causalidade em um cenário no qual não existem os conceitos de tempo e de espaço, justamente o cenário atualmente aceito como aquele que antecedeu o big bang.

    Deus também está fora do tempo e do espaço, sabia? Os primeiros principios do ser não dependem do espaço e do tempo; pelo contrario, estes é que dependem dos primeiros principios.

    É evidente que se trata daquilo que sua religião enxerga como a Revelação Cristã. Do meu ponto de vista, trata-se de explicar a coerência de uma religião que afirma ter um deus com atributos magníficos, mas age com mesquinhez e crueldade. Você tem alguma explicação racional para isso?

    Primeiro eu precisaria saber o que você está chamando de mesquinhez e crueldade.

    Então simplesmente reconheça que sua crença no deus cristão não é racional, é baseada em fé.

    A existencia de Deus não é um misterio de fé (como o são a Santissima Trindade, a Encarnação do Verbo, a Eucaristia etc.). Eu sei que Deus existe, mas a fé traz ao meu conhecimento mais coisas a respeito d’Ele que a minha inteligencia sozinha poderia alcançar. O conhecimento dessas coisas é baseado na fé, mas o da propria existencia de Deus é racional. Aliás, uma das provas da razoabilidade da fé é que você pode conhecer a existencia de Deus por outras vias que não a fé. A fé é a adesão do homem a Deus que se revela; pressupõe que, antes da fé, você já poderia saber que existe um Deus que possa revelar-se.

    Eu não aceito a sua demonstração da existência de deus porque eu não tenho nenhuma razão para acreditar que o pensamento lógico-dedutivo seja capaz de estabelecer critérios para um cenário que está além da minha capacidade de concepção.

    E de onde você tirou que essas coisas estão acima de sua capacidade de concepção? Misericordia, agora vou ter de defender a razão contra os racionalistas…

    É uma posição cética perfeitamente plausível. Como dizia Carl Sagan, “extraordinary claims require extraordinary evidence“. Na ausência de qualquer evidência, eu suspendo o juízo e aceito a minha incapacidade de apresentar uma resposta. (o que as pessoas corriqueiramente chamam de “agnosticismo”)

    Hehe, o agnosticismo é a imagem do fideismo protestante refletida num espelho…

    “Deus” não é um nome próprio.

    Quem disse? Pelo menos é nome proprio o Deus do monoteismo. Napoleão Mendes de ALMEIDA define substantivo proprio como o que expressa, em determinadas classes, um unico ser dessa especie (Gramatica Metodica da Lingua Portuguesa, 166). Ora, para o monoteismo, Deus é o unico ser dessa especie; logo… Não estamos aqui discutindo se existem deuses, mas o Deus unico do monoteismo. Com maiuscula.

    E Deus também é nome proprio segundo o Formulario Ortografico da Academia Brasileira de Letras:

    XVI
    EMPREGO DAS INICIAIS MAIÚSCULAS

    49. Emprega-se letra inicial maiúscula:
    (…)
    2.º – Nos substantivos próprios de qualquer espécie – antropônimos, topônimos, patronímicos, cognomes, alcunhas, tribos e castas, designações de comunidades religiosas e políticas, nomes sagrados e relativos a religiões, entidades mitológicas e astronômicas, etc.: José, Maria, Macedo, Freitas, Brasil, América, Guanabara, Tietê, Atlântico, Antoninos, Afrosinhos, Conquistador, Magnânimo, Coração de Leão, Sem Pavor, Deus, Jeová, Alá, Assunção, Ressurreição, Júpiter, Baco, Cérbero, Via-Láctea, Canopo, Vênus, etc.

    http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=20

    Ateismo agora é desculpa pra escrever português errado?

    O problema é que o assunto é motivo de debate e discordância mesmo entre estudiosos. Chomsky, por exemplo, é ateu. E eu tenho certeza que ele conhece os dois.

    Tem certeza? Com base em quê? Gente mais inteligente e mais importante na historia da filosofia do que Chomsky, como Descartes e Kant só conheciam a filosofia aristotelico-tomista muito superficialmente (pra ter uma ideia, o que Kant conhecia de Santo Tomás é o que ele tinha lido no manual do Wolff, bem ruinzinho por sinal). Pelo menos Chomsky, ao contrario de Sam Harris, faz parte do mainstream da academia. Mas o que ele entende mesmo é de filosofia da linguagem, quando sai disso só fala besteira. O proprio Dawkins criticou Santo Tomás manifestamente sem tê-lo estudado.

    Já que você pegou no pé porque eu escrevo deus, por que diabos você escreve “Santo Tomás” em vez de “São Tomás”, como manda a norma portuguesa?

    Escrevo assim porque é a norma culta da lingua portuguesa. Cito mais uma vez Napoleão Mendes de ALMEIDA:

    «A forma apocopada “são” emprega-se antes de nomes começados por consoante: São Francisco, São José.
    “Santo” precede nome começado por vogal ou por h: Santo Antonio, Santo Henrique.
    São exceções, talvez por influencia do espanhol, Santo Tomás, Santo Tirso, Santo Cristo. Santo é ainda a forma que se usa quando antes de outro titulo (Santo Frei Gil) ou referente a patriarcas do Velho Testamento: Santo Jeremias, Santo Jó.
    Com os nomes proprios femininos usa-se somente a forma santa: Santa Cecilia, Santa Inês». (Gramatica Metodica da Lingua Portuguesa, 44ª ed., São Paulo, 1999, n. 113).

    A esmagadora maioria da humanidade admite a existência de deus, não de Deus. Menos de um terço da humanidade admite a existência do deus cristão. E os diferentes deuses nos quais a humanidade acredita são contraditórios em muitos pontos.

    Ai, ai. De volta aos chavões ateistas! Meu caro, a esmagadora maioria da humanidade reconhece a existencia do Deus unico do monoteismo. O Deus cristão (ou melhor, o Deus dos cristãos), o Deus dos judeus, o Deus dos maometanos, o Deus dos espiritas é o Deus do monoteismo, o mesmo Deus dos filosofos e dos sabios. Até porque é o unico que existe. Os proprios ateus não tem uma argumentação diferente para impugnar o Deus de cada religião monoteista, contestam-no em bloco, como se fosse o mesmo. Você pode dizer que as diversas religiões são contraditorias e dizem coisas diferentes sobre o mesmo Deus, mas dizer que “os deuses são contraditorios” é asneira. É a mesma coisa que eu disser que há outro Rafael porque alguém se enganou e disse que você mexia com musica, e não com computação. Cito o Credo do Povo de Deus, Solene Profissão de Fé do papa Paulo VI:

    «Entretanto, rendemos graças à Bondade divina pelo fato de poderem numerosíssimos crentes dar testemunho conosco, diante dos homens, sobre a unidade de Deus, embora não conheçam o mistério da Santíssima Trindade.»
    http://www.vatican.va/holy_father/paul_vi/motu_proprio/documents/hf_p-vi_motu-proprio_19680630_credo_po.html

    Obrigado por me colocar no patamar de asneira de Carl Sagan, Stephen Hawking, Neil deGrasse Tyson, Richard Dawkins, Bill Nye, Lawrence Krauss, Charles Darwin, Marie Curie, Ann Druyan, Jodie Foster, Lady Ada Lovelace e grande parte dos amigos e professores cuja capacidade analítica, crítica, de abstração ou moral eu admiro.

    Um homem pode ser extremamente capaz em sua especialidade e um asno quando se põe a falar fora dela. Isso só mostra a decadencia da cultura geral em nossa civilização, mais nada. Uma citação do filosofo espanhol Ortega y Gasset:

    «El especialista [científico, técnico, político, etc.] nos sirve para concretar enérgicamente la especie [de hombre-masa] y hacernos ver todo el radicalismo de su novedad. Porque antes los hombres podían dividirse, sencillamente, en sabios e ignorantes. Pero el especialista no puede ser subsumido bajo ninguna de esas dos categorías. No es sabio porque ignora formalmente cuanto no entra en su especialidad; pero tampoco es un ignorante, porque es ‘un hombre de ciencia’ y conoce muy bien su porciúncula de universo. Habremos de decir que es un sabio-ignorante, cosa sobremanera grave, pues significa que es un señor el cual se comportará en todas las cuestiones que ignora no como un ignorante, sino con toda la petulancia de quien en su cuestión especial es un sabio

    O especialista serve-nos como um contundente exemplo dessa nova espécie, expondo com clareza todo o radicalismo de sua novidade. Porque outrora os homens podiam dividir-se, simplesmente, em sábios e ignorantes, em mais ou menos sábios e mais ou menos ignorantes. Mas o especialista não pode ser enquadrado em nenhuma dessas duas categorias. Não é um sábio, porque ignora formalmente o que não entra na sua especialidade; mas tampouco é um ignorante, porque é “um homem de ciência” e “conhece” muito bem sua porciúncula de universo. Devemos dizer que é um sábio-ignorante, coisa sobremodo grave, pois significa que é alguém que se comportará em todas as questões que ignora, não como um ignorante, mas com toda a petulância de quem na sua área de atuação é um sábio.

  26. Prezado Lampedusa

    Sinceramente desconheço qualquer comprovação se o homem pode ou não conhecer o “noumenon”.

    Em primeiro lugar, o idealismo é autocontraditorio. Na primeira definição que você trouxe, idealismo era a postura que não admite a capacidade do homem apreender a realidade. Aqui temos outra: a postura que não admite que o homem possa conhecer o nóumenon, a coisa em si. Ora, se o homem não tem capacidade de apreender a realidade, como poderá ter a capacidade de apreender a realidade do conhecimento? Se o homem não pode conhecer a coisa em si, como pode conhecer em si a natureza de seu proprio conhecimento? Ou seja, o idealismo, pelo menos nessas definições que apresentamos, nega o que simultaneamente pressupõe. Ora, se o idealismo é autocontraditorio, o realismo filosofico é uma verdade evidente por si mesma – efetivamente, uma verdade evidente de per si não pode ser negada sem se cair numa contradição em termos. Isso porque um enunciado autocontraditorio simplesmente não tem sentido e se destrói a si mesmo. Aliás, em certo sentido, a propria formulação do idealismo epistemologico é uma prova do realismo: o homem não poderia formular a negação do conhecimento das coisas em si se não conhecesse as coisas em si.

    Na verdade, o idealismo epistemologico parte de um equivoco fundamental sobre a natureza do conhecimento. Ele entende que o homem não pode conhecer as coisas em si, mas apenas as suas ideias sobre as coisas; por mais que tentemos sair para as coisas mesmas, sempre estaremos presos em nossas proprias sensações e conceitos. O equivoco fundamental, como mostra João de Santo Tomás (Cursus philosophicus Thomisticus, Logica, 2ª p., q. 22, a. 1 e 2), é que o conceito não é um sinal instrumental (como a fumaça é sinal de fogo e a palavra sinal da ideia), mas um sinal formal, isto é, um sinal que traz em si mesmo a forma inteligivel da coisa significada, a propria forma da coisa abstraída da materia. Conhecer é apreender uma forma separada de sua materia. O conhecimento sensorial é a apreensão da forma visivel da coisa, sem a coisa – quando vejo um quadro, apreendo sua forma visivel, sem que o quadro precise entrar no meu olho. Por sua vez, o conhecimento intelectual é a apreensão da forma inteligivel sem a materia, separada pela ação do intelecto agente.

    O idealismo epistemologico teria algum sentido se reduzissemos todo o conhecimento humano ao conhecimento sensorial. É evidente que o conhecimento sensivel é unilateral (não podemos, ao mesmo tempo, ver a parte da frente e parte dos fundos de uma catedral) e só alcança os acidentes da coisa, mas não sua essencia, sua substancia (a frase do Pequeno Principe, “o essencial é invisivel aos olhos”, é rigorosamente tomista, é por isso que não vemos o Cristo na Eucaristia, pois mesmo após a transubstanciação permanecem os acidentes do pão e do vinho). É a inteligencia que, a partir dos acidentes capatados pelos sentidos, chega à essencia da coisa, num raciocinio a posteriori muito semelhante ao das cinco vias que demonstram a existencia de Deus. É pela inteligencia, não pelos sentidos, que conhecemos as coisas como são em si mesmas. Aliás, as proprias noções de existencia e realidade não são sensiveis enquanto tais, mas abstraídas dos dados sensiveis pela ação da inteligencia. É só para o intelecto que o dado sensivel é expressão de algo que é. Como ensinou o incomparavel Aristoteles, «nada existe na inteligencia que não venha por meio dos sentidos»: o ser e as demais formas inteligiveis estão em potencia nos dados sensiveis e passam ao ato pela ação do intelecto agente.

  27. Rodrigo,

    Ora, se a totalidade da experiencia humana se reduz à experiencia sensivel, ela jamais poderá captar noções que não sensoriais, como a do bem ou mal moral, do certo ou do errado.

    Por quê? O que impede conceitos de bem e mal serem associados à experiência sensível e aprendidos através dos sentidos?

    Não é, não. Mas pelo menos numa coisa você acertou: se reduzimos a totalidade da experiencia humana à experiencia sensivel, se não temos outro conhecimento senão o sensorial, a unica coisa que resta é a distinção entre prazer e dor. Prazer e dor, com efeito, são sensações. Entretanto, essa distinção não é suficiente para estabelecer uma moral.

    Você pode me dar uns poucos exemplos de conceitos morais que não podem ser baseados nessa distinção? Faça isso e eu lhe mostrarei que, no fundo, é exatamente essa a distinção que está em prática.

    Este principio é a regra de ouro de Confucio, a que Nosso Senhor Jesus Cristo deu forma positiva: “Faça ao outro o que você quer que lhe façam”. Porém, é possivel deduzir esse principio pura e simplesmente do prazer e da dor, ou mesmo do conhecimento sensivel em geral? E se o que me dá prazer for infligir dor ao outro? Por que deveria me abster disso, segundo uma “etica” sensualista e materialista?

    Se você compartilha do princípio que moral é aquilo que minimiza o sofrimento e maximiza a satisfação, então torna-se óbvia a imoralidade do seu fetiche.

    Se você não compartilha desse princípio, então sua prática pode ser considerada imoral por aqueles que compartilham.

    Onde isso funcionaria, então, como um argumento de que a moral não é relativa?

    Se só existe materia, os preceitos morais, necessariamente, devem ser relegados ao mesmo status a que os ateus relegam a alma e o proprio Deus: à classe das quimeras, das ilusões da mente humana.

    Como você pretende distinguir conceitos de entidades? Não é verdade que qualquer entidade não pode ser pensada senão na medida em que tenho um conceito dela? E, mais, como um conceito não pode ser uma ilusão se ele não existe no mundo real? E mais, se a moral é um conceito, quer dizer que ela não existe no mundo real? (aí você me dá razão). Será que essa sua distinção entre conceito e entidade faz mesmo algum sentido?

    A minha intenção ao fazer essa distinção era a mesma que existe entre “cor” e “ojbeto”. Você pode conceber um objeto impossível de existir no mundo real e atribuí-lo uma cor. Mas você não pode conceber uma cor impossível.

    De forma semelhante, você pode imaginar uma quimera azul diante de você, mas não pode imaginar um “azul”.

    Essa era a minha intenção. Se as palavras foram mal escolhidas dentro do que você estudou e eu não, imagino que haja palavras mais adequadas que dizem o mesmo.

    Dito isto, não tem nenhum problema que os conceitos morais existam apenas dentro das nossas cabeças.

    Ou seja, na pratica não existe moral nenhuma. Porque toda e qualquer ação ou omissão pode ser aprovada ou desaprovada dependendo do ponto de vista. Se isso é o melhor que o ateismo pode produzir em materia de moral…

    Na prática não existe moral absoluta nenhuma. O que não é nenhuma surpresa. É a definição.

    Do mesmo modo, a norma de não se matar o inocente é moralmente absoluta: não posso matar nenhum ser humano inocente, independentemente de ser este uma criança em gestação, um jovem no vigor de sua vida, um doente terminal, negro ou branco, rico ou pobre, homem ou mulher.

    Existem dois problemas com isso.

    O primeiro é que, se existe uma moral absoluta que provém de deus, você deve julgar se aquele conceito moral que lhe está sendo transmitido é realmente a moral absoluta que provém de deus ou um engodo. E você só pode fazer esse julgamento com base no seu conhecimento e na sua moral pessoal. É a sua moral, não a moral de outra pessoa ou de deus, que leva você a concluir se é correto apedrejar uma pessoa que cometeu adultério. Se você não emprega sua própria moral nesse julgamento, então você não é um ser moral nem imoral, você é um ser amoral.

    O segundo é que esse absolutsmo leva a situações como esta…

    http://www.nytimes.com/2013/04/20/world/europe/jury-cites-poor-medical-care-in-death-of-indian-woman-in-ireland.html?_r=0

    …torna situações como esta muito mais difíceis do que deveriam ser:

    http://www.dailymail.co.uk/news/article-98338/Parents-sacrifice-Siamese-twin.html

    …e, especialmente quando associado à fé de que a vida humana seria sagrada desde a concepção, dificulta pesquisas com células embrionárias e torna imoral a prática da fertilização in-vitro.

    A história da ciência também está repleta de cientistas que estagnaram suas pesquisas por conta de fé. Newton se recusou a encarar o problema da estabilidade do sistema solar e invocou deus para explicar como as órbitas se mantinham estáveis ao longo dos séculos. Coube a Laplace, quase meio século depois, deixar deus de fora da jogada e resolver o problema que Newton não quis encarar. Einstein também, por sua fé em um universo estático e perfeito, deixou de enxergar a obviedade do que Hubble estava vendo: que o universo está em expansão. ,

    E o que tem isso a ver com a fé catolica? E será que a fé no ateismo também não cega um Dawkins, por exemplo?

    Novamente, eu disse que considero a um vício, não que considero a fé católica um vício. A mesma resposta é válida para seus questionamentos posteriores.

    E, usando palavras semelhantes às suas, considero que “fé no ateísmo” é um oxímoro dos mais imbecis.

    Independentemente de com quem esteja o onus da prova, eu já fiz o favor de demonstrar as razões de minha convicção em repetidas respostas, inclusive nesta (ver acima). Portanto, se essas razões não o contentam, o onus é seu.

    Você argumentou que deus existe (e não convenceu). Não que ele nos proveu com uma moral absoluta.

    A demonstração não apenas é consistente, como está baseada em premissas irrefutaveis: fatos indiscutiveis da experiencia compreendidos à luz dos primeiros principios do ser.

    […]

    Descrever é codificar determinada apreensão em signos. Apreender é ver a coisa, a ser ou não descrita. Ver o Corcovado, ou ver o Rio de lá, é uma apreensão. Uma descrição é contar como ele é. Se você nem sabe se apreendeu uma coisa, como é que sabe que a está descrevendo?

    Então, meu caro Rodrigo! Essa é a questão. Como você sabe se o que você apreendeu é realmente o ser, se a sua apreensão depende dos seus sentidos materiais?

    Mesmo quando você não precisa ver, ouvir ou de alguma forma sentir algo para apreender, a sua apreensão depende que esse ser seja expresso em termos sensoriais. Para você me explicar o que é apreensão, você faz analogias à visão. Para que você ensine ao seu filho o conceito de “compartilhar”, você tem que mostrar para ele o que acontece quando você compartilha e quando você não compartilha alguma coisa. Para que compreendamos o senso de justiça, temos que pensar na experiência humana e no sentido da dor. E por aí vai.

    Sendo que a nossa apreensão das coisas dependem dos nosso sentidos materiais, como você pode saber que apreendeu algo que realmente é?

    Além disso, anteriormente você disse:

    Para que uma coisa seja concebida pelo pensamento, basta que ela seja. Basta que ela seja ao menos possível, isto é, não envolva uma contradição em termos. O ato de ser é a existencia (a simples possibilidade, ou seja, a ausencia de autocontradição, é potencia de ser). […]

    Você pode conceber um tesserato? Você pode apreender um tesserato se você não é capaz de concecê-lo?

    De fato, nunca poderemos esgotar toda a complexidade de Deus, mas isso não impede que nos exercitemos um pouquinho. Aristoteles, no ultimo livro de sua Etica Nicomaqueia, diz que a vida filosofica é mais divina que humana, mas que não devemos dar ouvidos àqueles que nos dizem que devemos tratar somente das coisas humanas, e que, pelo contrario, devemos nos esforçar por viver de acordo com o que de melhor e mais divino existe em nós. E Socrates igualmente disse que a vida sem meditação investigativa é indigna de um homem.

    Mas eu não vejo nada de errado nisso, dependendo, é claro, de como você interpreta “o que é mais divino”. O problema não é viver de acordo com o que de melhor existe em nós, mas assumir que a nossa percepção é suficiente para apreender aquilo que a natureza realmente é, como eu acabo de argumentar ali em cima.

    Não é, não. Parto do fato de que o universo se comporta inteligentemente, sem ter ele proprio inteligencia.

    Você disse:

    Dizer que o universo obedece a leis é o mesmo que dizer que ele se comporta de maneira inteligente sem ter inteligencia.

    O problema é que para dizer que algo se comporta de maneira inteligente, você precisa reconhecer inteligência nesse comportamento. E isso é mais uma vez consequência de se empregar a experiência humana e querer que a natureza se dobre a ela. Reconhecer um comportamento inteligente evidencia que haja uma inteligência por trás desse comportamento.

    Agora, se você me mostrasse que o universo está apreendendo alguma coisa externa a ele e apreendendo a si mesmo, aí iniciaríamos uma conversa bem diferente.

    Eu queria muito entender como você enxerga causalidade em um cenário no qual não existem os conceitos de tempo e de espaço, justamente o cenário atualmente aceito como aquele que antecedeu o big bang.

    Deus também está fora do tempo e do espaço, sabia? Os primeiros principios do ser não dependem do espaço e do tempo; pelo contrario, estes é que dependem dos primeiros principios.

    Sim, eu sabia. E acho muito conveniente como você não exige causalidade para Deus, mas exige para o universo em seu princípio.

    Primeiro eu precisaria saber o que você está chamando de mesquinhez e crueldade.

    Coisas como a preocupação de Javé com a genitália humana, por exemplo. O apedrejamento de adúlteros. Argumentar que uma mulher está “impura” em seu período fértil. Preocupar-se se a mulher se casou virgem ou não. Forçar uma mulher até então virgem a casar-se com seu estuprador. Transformar em sal uma mulher porque ela foi curiosa o bastante para prestar atenção à destruição de sua casa. Criar homem e mulher completamente inocentes, sem noção de certo ou errado, e puni-los por desobediência. Assassinar brutalmente 42 crianças porque chamaram uma pessoa de “careca”. Colocar uma criança em um altar e ameaçá-la de ser morta por seu próprio pai. Dentre outros.

    E de onde você tirou que essas coisas estão acima de sua capacidade de concepção? Misericordia, agora vou ter de defender a razão contra os racionalistas…

    Você pode conceber uma realidade na qual tempo e espaço não existem? Na qual a natureza não é regida por quatro forças fundamentais (gravidade, eletromagnetismo e forças nucleares forte e fraca), mas por uma única superforça que engloba as quatro? São coisas que a matemática nos sugere que aconteceu antes e durante o big bang.

    Quem disse? Pelo menos é nome proprio o Deus do monoteismo.

    Bingo. Eu não sou monoteísta. Não tem por que eu reconhecer esse deus. ;)

    Além disso, existem outros deuses monoteístas: Javé, Jesus (na Trindade), Alá, Jeová, o Deus do espiritismo, Jesus segundo os Mórmons etc. Todos eles têm atributos muito distintos e não podem existir simultaneamente. Não considero correto usar a palavra Deus, como nome próprio, para resumir todos eles. E não compartilho da sua fé para dizer que todos eles, exceto o deus cristão, são imaginários.

    Ateismo agora é desculpa pra escrever português errado?

    Eu não posso deixar de esborçar um sorriso. :)

    Ocorre que, além de adepto do ateísmo e do relativismo moral, eu também sou adepto da linguística descritiva, na qual se afirma que a língua não se define, apenas se estuda. Sendo assim, não existe português certo ou errado. Existe português formal e informal. E por mais que eu goste de aprender a norma formal, eu não me restrinjo a ela. Não é porque a norma diz que “Deus” deve ser escrito com D maiúscula que eu não vou escrevê-lo com minúscula de acordo com a minha interpretação da situação. Assim como eu não emprego mesóclises e não me sinto mal por dizer “você viu ele?” em vez de “você o viu?”.

    Escrevo assim porque é a norma culta da lingua portuguesa. Cito mais uma vez Napoleão Mendes de ALMEIDA

    D’accord.

    Ai, ai. De volta aos chavões ateistas! Meu caro, a esmagadora maioria da humanidade reconhece a existencia do Deus unico do monoteismo. O Deus cristão (ou melhor, o Deus dos cristãos), o Deus dos judeus, o Deus dos maometanos, o Deus dos espiritas é o Deus do monoteismo, o mesmo Deus dos filosofos e dos sabios. Até porque é o unico que existe.

    Lamento que você enxergue como chavão algo que me exigiu muito raciocínio para concluir. Mas esse sincretismo é falso. O deus que determina o apedrejamento de adúlteros não é o mesmo deus que diz “atire a primeira pedra quem nunca houver pecado”, nem é o mesmo deus que não nasceu de uma virgem e possuía sete irmãos e falava com os mortos.

    Os proprios ateus não tem uma argumentação diferente para impugnar o Deus de cada religião monoteista, contestam-no em bloco, como se fosse o mesmo.

    Eu não. Você quer conversar sobre algum deus em particular?

    É a mesma coisa que eu disser que há outro Rafael porque alguém se enganou e disse que você mexia com musica, e não com computação.

    Se você falar para um amigo meu que você andou conversando com o “Rafael, aquele cara da música que defende a existência do deus cristão”, ele certamente vai pensar que você está falando de outra pessoa, não de mim. E, sem evidências adicionais, podem muito bem ser duas pessoas diferentes.

    É exatamente a mesma situação que acontece quando cada religião apresenta uma descrição diferente do criador do universo. Para você alegar que estão todos falando de um mesmo deus, “o Deus”, você tem que assumir que todos, exceto um, estão errados. Ou então que todos estão errados e esse deus na verdade não corresponde a nenhum deles. Eu discordo dos dois.

    Um homem pode ser extremamente capaz em sua especialidade e um asno quando se põe a falar fora dela.

    Tudo bem. Se você acha que eu sou um asno no que diz respeito à questão religiosa, assim como todas essas pessoas, então interpreto isso como um elogio.

  28. Corrigindo:

    O problema é que para dizer que algo se comporta de maneira inteligente, você precisa reconhecer inteligência nesse comportamento. E isso é mais uma vez consequência de se empregar a experiência humana e querer que a natureza se dobre a ela. Reconhecer um comportamento inteligente evidencia que haja uma inteligência por trás desse comportamento.

    deveria ser

    O problema é que para dizer que algo se comporta de maneira inteligente, você precisa reconhecer inteligência nesse comportamento. E isso é mais uma vez consequência de se empregar a experiência humana e querer que a natureza se dobre a ela. Reconhecer um comportamento inteligente não evidencia que haja uma inteligência por trás desse comportamento.

    E também:

    Ocorre que, além de adepto do ateísmo e do relativismo moral, eu também sou adepto da linguística descritiva, na qual se afirma que a língua não se define, apenas se estuda.

    deveria ser:

    Ocorre que, além de adepto do ateísmo e do relativismo moral, eu também sou adepto da linguística descritiva, na qual se afirma que a língua não se regulamenta, apenas se descreve.

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