João Paulo II já disse em 1982 que a heresia se espalhou abundantemente dentro da Igreja.
[Dom Fellay, in Fratres in Unum]
Este texto, da mais recente entrevista do superior geral da FSSPX, aponta uma dolorosa ferida dos nossos tempos modernos: a heresia abundantemente espalhada dentro da Igreja! Não sei – é uma pena! – qual é o pronunciamento original do Papa João Paulo II sobre o assunto; mas sei que é na Ecclesia in Europa que ele fala sobre “apostasia silenciosa” (n. 9). A idéia de fundo é a mesma: refere-se à crise do mundo moderno, à crise do homem, à crise da Igreja.
Falar em “crise da Igreja” exige um grande esforço de precisão de termos. A rigor, a Igreja, o Corpo Místico de Cristo, é Santa e Santificante, indefectível e, por conseguinte, não é passível de “crises”. Ao se falar em “crise da Igreja”, está-se falando não de um (aliás impossível) defeito da Esposa sem ruga e sem mancha de Nosso Senhor, e sim da, digamos, discrepância entre o que ensina a Igreja e o que crêem (ou fazem) os católicos. A Igreja segue resplandecente a despeito dos pecados dos Seus filhos; no entanto, quando os católicos não agem como deveriam, tudo vai mal, porque os seus pecados acabam por, num certo sentido, impedir que a Igreja seja encontrada tal como Ela é. Os maus católicos não “mancham” a Igreja, mas de certo modo “escondem” a Igreja por debaixo de suas falhas.
O assunto é particularmente grave quando se fala em heresia, porque nós sabemos que ela destrói a Fé e, sem Fé, é impossível agradar a Deus. No estado de heresia generalizada no qual nos encontramos nos nossos dias, é importante (1) entendermos o que isso significa, (2) quais as conseqüências disso e (3) o que pode ser feito para vencer a crise.
À luz do que foi dito acima sobre a Igreja Indefectivelmente Santa e os pecados dos membros da Igreja, a única maneira na qual julgo possível entender a heresia abundamentemente espalhada dentro da Igreja é, primeiro, por meio de uma metonímia, verdadeira sem dúvidas, mas que é uma figura de linguagem e não uma sentença escolástica, onde a Igreja é tomada pelos Seus membros (não é possível haver heresia na Igreja, propriamente, e sim nos membros da Igreja) e, segundo, considerando heresia material e não formal. É possível – e, aliás, é a minha opinião sobre a situação atual – que uma grande parte dos católicos esteja em heresia material, graças à confusão doutrinária reinante nos nossos dias.
“Matéria” e “Forma” são conceitos da filosofia escolástica relativamente simples, mas que são muito confundidos hoje em dia porque o sentido corrente destes termos é o inverso daquele que o Aquinate estabeleceu. “Forma” não é o formato, não é o exterior, e sim – ao contrário – o “interior”, aquilo que faz uma coisa ser o que ele é e não outra coisa diferente; por exemplo, ser formalmente católico é ser verdadeira e propriamente católico, enquanto que o ser materialmente é só – digamos – “aparentar” sê-lo. Hoje em dia, para a maior parte das pessoas, um “católico formal” seria justamente alguém que é católico só exteriormente…
Um herege material católico que profere uma heresia material [p.s.: favor ler estes textos trazidos pelo Felipe Coelho nos comentários, para melhor compreender a questão] seria, portanto, um católico que professasse algum absurdo herético – por exemplo, que todas as religiões têm igual valor salvífico – sem que, contudo, tivesse a pertinácia na negação do dogma que é exigida para que se configure verdadeiramente uma heresia (ou seja, sem aquilo que é necessário para que ele seja propriamente um herege, um herege formal). E é exatamente esta, a meu ver, a situação de muitos católicos hoje em dia, que não são catequizados como convém. Um católico que passou a vida inteira em uma paróquia modernista ou da Teologia da Libertação, e que está sinceramente convencido de que (p. ex.) Nosso Senhor é uma espécie de prelúdio de Che Guevera e o comunismo foi pela primeira vez ensinado na Galiléia há 2.000 anos, sem dúvidas é um herege material profere uma heresia material; mas, muito provavelmente, falta-lhe a pertinácia no erro para que ele seja formalmente herege. Muito provavelmente ele quer ser bom católico; como, no entanto, teve péssimos pastores, ele assimila aquilo que lhe ensinaram e, portanto, não lhe pode ser imputado o delito de negar o ensino da Igreja, exatamente porque o “ensino da Igreja” que lhe foi passado é falsificado e ele provavelmente não o sabe. Em uma palavra, este católico não está excomungado por causa disso.
[Faço um adendo: a heresia pode estar – e, na minha opinião, está de fato – abundantemente disseminada na Igreja neste sentido: membros da Igreja, heresia material. Mas isso não conta para o Papa; não me parece razoável postular que o Papa possa ser herege material e não formal proferir uma heresia material inadvertidamente, salvo algum caso absurdo de perda da razão ou de eleição ao Trono de Pedro de um católico qualquer que já era materialmente herege professava heresias materiais desde sempre. Não sei se uma “Ignorância Doutrinária Invencível” para o Sumo Pontífice é uma impossibilidade teológica, mas é sem sombra de dúvidas uma enorme inverossimilhança; afinal, parece-me lógico que um Magistério [Invencivelmente] Ignorante não poderia produzir senão ignorantes, como um professor que não saiba física não poderia jamais produzir um Stephen Hawking. E uma Igreja Docente que ignorasse a Fé Católica soa-me profundamente absurdo, e implicaria obviamente na perda da Fé Católica no mundo – salvo um caso particularíssimo em que a Fé Católica se encontrasse em algum outro lugar que não na Igreja Docente, o que também considero, se não errôneo, ao menos ofensivo aos ouvidos pios.]
Pois bem, dada esta situação calamitosa, quais são as conseqüências disso? A primeira e mais assustadora, é que as almas vão para o Inferno. “Ah – pode-me dizer alguém -, mas as pessoas não têm culpa de desconhecerem a Doutrina da Igreja”, e com isso pode-se facilmente concordar. Mas as pessoas têm outras culpas e, se não conhecem a Igreja, se não conhecem o Evangelho, se não sabem as coisas que precisam fazer para se salvar, terão muito maior dificuldade em endireitarem as suas veredas. Ao contrário do que parece ser senso comum, parece-me uma evidência gritantemente evidente que não pode, de nenhuma maneira, ser mais fácil salvar-se na Ignorância do que no conhecimento do Deus Verdadeiro. E, se as pessoas não têm conhecimento do Deus Verdadeiro, ainda que não tenham culpa disso, têm menos acesso aos meios ordinários que Deus dispôs para a sua salvação e, por conseguinte, têm maior dificuldade para se salvar.
Além disso, o mundo fica (ao menos parcialmente) privado dos influxos benéficos da Igreja, posto que Ela é sempre, necessariamente, apresentada à humanidade mediante os homens que d’Ela fazem parte. Não Se torna estéril a Esposa de Cristo, mas os frutos que Ela poderia dar simplesmente não vêm aos homens porque os homens não vão até Ela. “Tempo houve” – escreveu Leão XIII – “em que a Filosofia do Evangelho governava os Estados” (Immortale Dei, 28); privando-se as sociedades da Doutrina Cristã, o mundo degenera em barbárie, e então temos a degradação moral da sociedade que hoje contemplamos atônitos.
E, por fim, o que pode ser feito? Em primeiro lugar, rezar, e rezar muito, e fazer penitência pelos nossos pecados, para que o Altíssimo Se compadeça de nós. Sofrer, em segundo lugar, com resignação as adversidades, oferecendo as nossas lágrimas ao Deus Altíssimo em união aos sofrimentos de Nosso Senhor Jesus Cristo na Cruz do Calvário. Combater, em terceiro lugar, mas combater os inimigos verdadeiros, nas posições que a Divina Providência assinalou para nós no grande campo de batalha da História, e não em outras; combater o que precisa ser combatido. Só assim a heresia poderá ser extirpada, a Igreja poderá ser conhecida, e o mundo poderá – como disse Nossa Senhora em Fátima – ter um pouco de paz. Só assim as almas poderão ser salvas, e Deus poderá ser glorificado. Que São Miguel Arcanjo nos proteja sempre no combate.
Caro amigo:
«Temos que admitir realisticamente e com sentimentos de intensa dor que hoje os Cristãos, na sua grande parte, sentem-se perdidos, confusos, perplexos e mesmo desapontados; abundantemente se espalham ideias contrárias à verdade que foi revelada e que sempre foi ensinada; heresias, no sentido lato e próprio da palavra, propagaram-se na área do dogma e da moral, criando dúvidas, confusões e rebelião; a liturgia foi adulterada. Imersos num relativismo intelectual e moral e, portanto, no permissivismo, os Cristãos são tentados pelo ateísmo, pelo agnosticismo, por um iluminismo vagamente moral e por um Cristianismo sociológico desprovido de dogmas definidos ou de uma moralidade objectiva».
João Paulo II, L’Osservatore Romano, 7 de Fevereiro de 1981
Nossa, achei este texto tão forte. Concordo plenamente com o que foi dito. Além de ser uma exortação apostólica, é um texto muito informativo. Expõe com eficácia muitos pormenores que passam por diversas vezes despercebidos.
Parabéns por postar coisas tão edificantes no blog.
Ferretti,
Muito obrigado!
Abraços, em XC,
Jorge Ferraz
Muito prezado Jorge, Ave Maria Puríssima!
Tantas discussões interessantes aqui em seu blog, tantos erros disseminados, certamente de boa fé, por pessoas das mais variadas posições, e tão pouco tempo para participar… Paciência!
Limito-me a observar o seguinte (pois basta-me aqui copiar e colar de dois artigos que traduzi há algumas semanas): a rigor, nunca é correto chamar um Católico de herege material.
Eis por quê:
[COMEÇO DA CIT.]
Corretamente, o elemento material envolvido em ser um herege é o dissentimento consciente da regra Católica da Fé, ao passo que o elemento formal é o estado perverso da vontade implicado nesse dissentimento. Feita assim a distinção, um Católico que inculpavelmente proponha uma proposição herética por inadvertência pode talvez dizer-se que apresentou uma heresia material; mas ele não pode ser chamado de *herege material*. Ele não é um herege em nenhum sentido. Um herege é alguém que dissente totalmente da regra católica da fé, e ele será chamado de herege material se ele for invencivelmente ignorante da autoridade da Igreja que ele rejeita, e de herege formal se a autoridade da Igreja tiver sido proposta suficientemente a ele, de modo que o seu dissentimento dela seja culpável. (Isso é explicado com clareza pelo Cardeal Billot: *De Ecclesia Christi*, ed. 4, pp. 289-290).
Então, de acordo com o uso correto do termo, conforme delineado acima, um católico nunca pode se tornar um herege material. Ele não é invencivelmente ignorante da autoridade da Igreja, e qualquer dissentimento consciente dos ensinamentos dela torná-lo-á, portanto, um herege formal. Hereges materiais são exclusivamente aqueles batizados *não-*católicos que errem de boa fé. É por isso que o Dr. Ludwig Ott observa que “hereges públicos, mesmo aqueles que erram de boa fé (hereges materiais), não pertencem ao corpo da Igreja, ou seja à comunidade jurídica da Igreja” (*Fundamentals of Catholic Dogma*, p. 311).
E, aliás, a expressão escolhida pelo Dr. Ott – “hereges que erram de boa fé” – é aquela usada no Código de Direito Canônico (Cânon 731), que evita completamente o termo potencialmente enganador “hereges materiais”.
[FIM DA CIT.]
(J.S. DALY, Pertinácia: Heresia Material e Formal, trad. br. por F. Coelho, em jan. 2009, de: Pertinacity: Material and Formal Heresy, Le Bouchillou à Servanches, 1999, sedevacantist.net/pertinacity.html)
Eis o trecho esclarecedor do Cardeal Billot, referido no trecho acima, e transcrito como Apêndice a um outro artigo do mesmo autor, que também traduzi mês passado e que colo aqui:
[COMEÇO DA CIT.]
Apêndice 2
Billot sobre a Natureza da Heresia
“Os hereges dividem-se entre formais e materiais. Os hereges formais são aqueles para os quais a autoridade da Igreja é suficientemente conhecida; ao passo que os hereges materiais são aqueles que, estando em ignorância invencível da própria Igreja, de boa fé escolhem alguma outra regra diretriz. Então a heresia de hereges materiais não é imputável como pecado e, de fato, ela não é *necessariamente* incompatível com aquela fé sobrenatural que é o início e a raiz de toda justificação. Pois eles podem crer explicitamente nos artigos principais, e crer nos outros, embora não explicitamente, porém implicitamente, através de sua disposição de inteligência e boa vontade de aderir ao que quer que lhes seja proposto suficientemente como tendo sido revelado por Deus. De fato, eles podem ainda pertencer ao corpo da Igreja por desejo e cumprir as outras condições necessárias para a salvação. Não obstante, quanto à incorporação *atual* deles na visível Igreja de Cristo, que é o tema que agora nos ocupa, nossa tese não faz distinção entre hereges formais e materiais, entendendo tudo de acordo com a noção de heresia material que acaba de ser dada, que de fato é a única verdadeira e genuína.(20) Pois, se for entendido pela expressão *herege material* alguém que, ao mesmo tempo que professando sujeição ao Magistério da Igreja em questões de fé, não obstante isso, ainda nega algo definido pela Igreja por não saber que isso foi definido, ou, no mesmo diapasão, defende uma opinião oposta à doutrina Católica por crer equivocadamente que a Igreja a ensina, seria bastante absurdo colocar os hereges materiais fora do corpo da verdadeira Igreja; mas nesse entendimento o uso legítimo da expressão seria totalmente pervertido. Pois um pecado material é dito que existe somente quando aquilo que pertence à natureza do pecado acontece materialmente, mas sem advertência ou vontade deliberada. Mas a natureza da heresia consiste em subtrair-se à regra do Magistério eclesiástico e isso não acontece no caso mencionado [de alguém que está determinado a crer em tudo o que a Igreja ensina mas comete um erro quanto a qual seja o ensinamento dela], já que isso é um simples erro de fato concernente ao que é que a regra/norma dita. E, portanto, não há lugar para heresia, nem sequer materialmente.” (Cardeal Louis Billot S.J., amplamente considerado o principal teólogo tomista dos séculos recentes, em seu De Ecclesia Christi, 4.ª edição, pp. 289-290).
Resulta claro deste texto que um mero erro de fato quanto ao que a Igreja ensina ou acerca de quem é o papa dela não constitui nem mesmo heresia ou cisma materiais. Herege não é quem comete um erro quanto ao que a Igreja ensina, mas quem nem sequer respeita o princípio de submissão ao Magistério. Similarmente, cismático não é quem erra ao julgar se um determinado indivíduo ocupa a Santa Sé, mas quem recusa submissão à Santa Sé. Assim, quando o Cânon 731§2 proíbe que os sacramentos sejam dados a hereges e cismáticos que erram de boa fé, refere-se àqueles que estão em ignorância invencível do dever de pertencer à Igreja, não àqueles que erram inadvertidamente num ponto de doutrina ou na avaliação da pretensão de um dado indivíduo ao papado. Os sacerdotes não podem ministrar os sacramentos a cismáticos nem mesmo se estes foram criados no cisma e não são culpáveis. Mas seria um mal-entendido completo equacionar tais pessoas com os Católicos que estão confusos quanto à avaliação do presente status de João Paulo II.>>
[FIM DA CIT.]
(John S. DALY, Teremos Entendido Corretamente o Cisma?, trad. br. por F. Coelho, em jan. 2009, de: Have We Correctly Understood Schism?, Le Bouchillou à Servanches, 29 set. 1999, http://sedevacantist.com/npis.html )
Isso ajuda a entender melhor a questão?
Um abraço amigo,
Em JMJ,
Felipe Coelho
PS: As citações não apareceram no post anterior, em razão de uma tentativa frustrada minha de simular aspas francesas. Seria possível apagá-lo? Grato, AMDGVM, FC
Prezado Felipe Coelho, Salve Maria!
Agradeço imensamente pelos dois textos trazidos; de fato, reconheço haver uma imprecisão terminológica no meu post porque heresia é definida como negação pertinaz…
Não havendo, portanto, num católico que profere inadvertidamente uma proposição herética, a deliberação em negar o ensino da Igreja, a rigor, o termo “herege material” não se lhe deve ser aplicado. Obrigado, mais uma vez; enriquece muitíssimo a questão.
No entanto, não estou certo de que a analogia com relação ao cisma seja exata, afinal, para cisma, fala-se em “recusa à sujeição ao Romano Pontífice” (e não em “recusa ao princípio de que existe uma autoridade”); todo “cisma puro” precisa ser “de fato”, porque negar o princípio de que há uma autoridade única na Igreja configuraria também heresia e, se fosse assim, a tipificação de “cisma” como delito canônico seria redundante (bastaria, afinal, manter as punições para heresia). Até porque, um “erro de fato” desculpável quanto à pessoa que ocupa o Trono de Pedro é possível em certos períodos históricos conturbados quando há Anti-Papas disputando o Sumo Pontificado; quando toda a Igreja reconhece um Papa como legítimo, a coisa muda de figura…
Abraços, em Cristo,
Jorge Ferraz
Sr. Felipe Coelho
Estou estranhando os seus textos
Abandonaste o Sedevacantismo definitivamente ?
Como ficariam as acusações de Rodrigo Antonio Maria
aos Papas pós Concílio Vaticano II, à luz deste texto que o
Sr. Traduziu ?
Poderiamos julgá-los como hereges ou não ?
Acho que este texto nos salvaria destas acusações absurdas que uns católicos julgam outros católicos como heréges sem um julgamento justo pelo Magistério.
Jesus te ama.
UIrmão, faça posts menores!
Mesmoqm não seja tão profundo, sendo mais curto mais gente vai ler!
Muito prezado Jorge, Ave Maria Puríssima!
Fico bem contente de ter podido ajudar.
Vejo que você permanece em dúvida, porém, quanto à questão do cisma e penso que também aqui, talvez, o que segue possa ser esclarecedor.
Antes de mais nada, noto que em nenhum lugar dos dois textos que citei se encontra essa definição falsa de cisma, que você tem razão de repudiar, mas que você põe entre aspas: “recusa ao princípio de que existe uma autoridade”.
Recorto, a seguir, da citação acima, somente o que o autor fala sobre o cisma:
“Resulta claro deste texto [do Cardeal BILLOT, cit. supra] que um mero erro de fato […] acerca de quem é o papa dela [=da Igreja] não constitui nem mesmo heresia ou cisma materiais. […] cismático não é quem erra ao julgar se um determinado indivíduo ocupa a Santa Sé, mas quem recusa submissão à Santa Sé. Assim, quando o Cânon 731§2 proíbe que os sacramentos sejam dados a […] cismáticos que erram de boa fé, refere-se àqueles que estão em ignorância invencível do dever de pertencer à Igreja, não àqueles que erram inadvertidamente […] na avaliação da pretensão de um dado indivíduo ao papado. Os sacerdotes não podem ministrar os sacramentos a cismáticos nem mesmo se estes foram criados no cisma e não são culpáveis. Mas seria um mal-entendido completo equacionar tais pessoas com os Católicos que estão confusos quanto à avaliação do presente status de João Paulo II [ou de Bento XVI (N.doT.).”
Como vê, não há nem sombra aí da falsa definição de cisma que você põe entre aspas, caro Jorge: “recusa ao princípio de que existe uma autoridade”.
De onde você tirou essa idéia?
Em todo caso, já que a dúvida parece pairar sobre a razão pela qual, digamos assim mais diretamente, alguém como eu não é cismático nem mesmo na hipótese (eu quase diria: per absurdum…) de Bento XVI ser verdadeiro Papa, reproduzo abaixo a tradução de um artiguete de fórum (ainda o mesmo autor e o mesmo tradutor apressado…) que, a meu ver, expõe bem essa questão, tradução esta que eu já tinha bem adiantada e que sua resposta me motivou a terminar.
Divido-a em introdução e dois tópicos, por sua vez subdivididos em breves subtópicos, para facilitar a leitura e para ninguém reclamar da extensão.
E fico agüardando seus sempre ponderados comentários, claro!
Um abraço,
Em JMJ,
Felipe Coelho
* * *
[I – OCASIÃO DO ARTIGO]
« Alguns novatos do Fórum [www.leforumcatholique.org (N.doT.)] relançaram, recentemente, a acusação de cisma contra (a) quem adere à FSSPX, ou (b) as pessoas que crêem ilegítimos os pontificados recentes (conhecidas como sedevacantistas).
Notamos imediatamente que aqueles para quem esse julgamento é evidente tendem a ser jovens fogosos cujas intervenções não dão testemunho de um conhecimento muito profundo do direito canônico ou da teologia.
[I.2 – OBJETO DO ARTIGO]
Eu gostaria, por meio deste post, de precisar algumas razões pelas quais certos canonistas e teólogos mais sérios, ainda que submissos ao regime do Vaticano II, hesitariam porém longamente antes de dar seu aval a essa condenação.
[II – SEM PERTINÁCIA NÃO HÁ CISMA]
É verdade que o cânon 1325 do Código de 1917, reconhecido pelos que recusam a Igreja Conciliar, define um cismático como sendo aquele que “recusa submissão ao Romano Pontífice e comunhão com os membros da Igreja a ele sujeitos”. É verdade que é impossível de afirmar que a FSSPX é realmente submissa a Bento XVI, a quem eles não obedecem em absolutamente nada. E menos ainda os sedevacantistas, que não dão a ele nem mesmo reconhecimento nominal. Mas basta consultar os autores aprovados para constatar que a recusa em questão [i.e. a recusa de submissão ao Papa que constitui cisma (N.doT.)] implica não somente o ato material mas também um elemento essencial de conhecimento e de vontade. É o que resta a ser provado mesmo por quem não enxerga nenhuma razão justa para não ser submisso aos chefes do regime conciliar.
Santo Tomás, primeiro que todos, sublinha que “os cismáticos, falando propriamente, são aqueles que se separam voluntariamente e intencionalmente da unidade da Igreja…” (Summa Theologiae II-II, 39, 1). E a célebre Bulla Coenae declara excomungados “os cismáticos e todos aqueles que se retiram com pertinácia da obediência ao Romano Pontífice.”
[II.2 – CONFUSÃO ATUAL QUASE IMPOSSIBILITA A PERTINÁCIA]
Ora, uma circunstância excepcional, tal como uma crise ou uma reviravolta na Igreja, cria facilmente uma situação em que a recusa parcial ou total de submissão ao eleito do conclave, ou mesmo a recusa de o reconhecer em absoluto, pode não ser o fruto dessa pertinácia, dessa “intenção de se separar da unidade que é o efeito da caridade” (Sto. Tomás, loc. cit.). É por isso que os autores especializados concordam em fazer exceções:
1. “Não podem, afinal, ser contados entre os cismáticos aqueles que recusam obedecer ao Romano Pontífice por considerarem a pessoa dele digna de suspeita ou duvidosamente eleita…” (Wernz-Vidal, Ius Canonicum, vol. vii, n. 398).
2. “Não há cisma se … se recusa a obediência na medida em que … se suspeita da pessoa do papa ou da validade de sua eleição…” (Pe. Ignatius Szal, Communication of Catholics with Schismatics, Catholic University of America, 1948, p. 2).
“…não é cismático quem recusa submissão ao pontífice por ter dúvidas prováveis concernentes à legitimidade da eleição dele ou do poder dele…” (De Lugo, Disp., De Virt. Fid. Div., disp xxv, sect iii, nn. 35-8).
Vê-se que os “ultras” caem perfeitamente nessa categoria excepcional naquilo que se refere à atitude deles para com os pontificados conciliares.
[II.3 – PARALELOS HISTÓRICOS O CONFIRMAM]
A história sagrada vem em apoio dessa conclusão. Durante o “cisma” de Anacleto II e novamente durante o Grande Cisma do Ocidente, vemos a unidade da Igreja fraturada em seus acidentes sem ser destruída em sua substância pelas discordâncias concernentes à identidade do verdadeiro Papa.
[II.4 – PERTINÁCIA EXIGE AINDA CONHECIMENTO BEM EXPLÍCITO DO MAL QUE SE FAZ]
Os canonistas irão ainda mais longe, sublinhando que a contumácia necessária para incorrer na excomunhão que atinge ipso facto o cismático e o herege exige um conhecimento particularmente explícito do mal que se faz.
Assim escreve Naz:
“As palavras ‘apóstata’, ‘herege’, ‘cismático’ devem ser tomadas no sentido em que são definidas no cânon 1325§2. Recordemo-lo brevemente e para não termos mais que voltar a isto: a pena não atinge senão os delitos, portanto os atos exteriores e gravemente culpáveis. Ademais, a palavra ‘pertinaciter’ do cânon 1325§2 exime da pena aquele cujo ato herético apresenta qualquer diminuição de imputabilidade (cânon 2229§2). » (Traité de Droit Canonique, tomo IV, n. 1139)
E Vermeersch afirma:
“Se alguém comete esses pecados [apostasia, heresia, cisma] em decorrência de ignorância mesmo gravemente culpável … esse alguém está imune do delito, o qual exige a pertinácia.” (Epitome Iuris Canonici Cum Commentariis (Mechlin), ed. 5, iii, 311).
O Pe. Cance resume sua doutrina em termos similares:
“Na medida em que uma lei contém as expressões seguintes: (se alguém) presume, ousa, conscientemente, deliberadamente, temerariamente, expressa ou outras semelhantes (por exemplo pertinaciter…) toda diminuição de responsabilidade da parte da inteligência ou da vontade exime das penas latae sententiae (c. 2229§2) seja qual for a causa dessa diminuição: ignorância (grave ou leve), intoxicação, falta de diligência necessária, fraqueza de espírito…” (n. 225)
“Conforme o c. 1325§2 devemos considerar…como cismático quem recusa submeter-se ao Papa…; mas o delito…de cisma não pode atingir senão atos exteriores (públicos ou ocultos); gravemente culpáveis (portanto também interiores) e, se se trata de heresia (ou mesmo de cisma), acompanhados de obstinação… Admite-se comumente que a ignorância supina e crassa impede o delito de heresia, e parece se pode dizer o mesmo em se tratando da ignorância afetada.”
(Le Code de Droit Canonique – Commentaire, Tom. III, ed. 8, 1952, n. 273)
Numerosos outros canonistas aderem a essa doutrina, como Chelodi: Jus Poenale, p.30, n.1, M. a Coronata: Institutiones IV, p.120, n.4, Beste: Introductio in Codicem ad can. 2229§2.
[III – CONCLUSÃO, RESPALDADA AINDA PELO SILÊNCIO DA HIERARQUIA CONCILIAR]
Penso que se compreenderá facilmente por que me parece injustificado, face a estas citações, para os “conservadores” tratar de ofício como cismáticos os tradicionalistas radicais [les tradis purs et durs (N.doT.)], os “ultras”, ainda mais enquanto nenhuma sentença de excomunhão foi proferida por quem quer que seja contra um Católico FSSPX ou sedevacantista se não for em razão de ter pessoalmente dado ou recebido a sagração episcopal sem mandato pontifical.
[III.2 – 1.ª RAZÃO DESSA HESITAÇÃO: PLAUSIBILIDADE DA RETORQUIO]
Uma razão dessa reticência talvez seja o receio de que se não lhes reenvie a acusação, e não sem uma aparência de justiça.
O teólogo jesuíta Suarez (1548-1617), tão altamente louvado pelos Papas, e que deveu seu gênio a um milagre da Santíssima Virgem, não hesita em dizer que até mesmo um Papa pode tornar-se cismático, por exemplo ao abolir todas as cerimônias eclesiásticas fundadas na tradição apostólica.
“Et hoc secundo modo posset Papa esse schismaticus, si nollet tenere cum toto Ecclesiae corpore unionem et coniunctionem quam debet, ut si tentat et totem Ecclesiam excommunicare, aut si vellet omnes ecclesiasticas caeremonias apostolica traditione firmatas evertere.” (De Charitate, Disputatio XII de Schismate, sectio 1)
Não faço aqui o processo da revolução do Vaticano II. Observo apenas que mesmo protestantes e ateus compartilharam do julgamento de Mons. Lefebvre de que se tratou da “destruição da Igreja a mais profunda e mais ampla de sua história no espaço de tão pouco tempo, o que nenhum heresiarca jamais conseguiu fazer” (Le Figaro, 4 de agosto de 1976).
O poder do Papa estando limitado pelo que é das tradições divinas e apostólicas e por toda a ordem doutrinal, e não existindo senão para construir [a Igreja], não para [a] destruir, o autor daquilo que ele mesmo chamou de uma “destruição” da Igreja, na ordem litúrgica, disciplinar e ao menos aparentemente doutrinal (Paulo VI) não poderia se espantar de ter provocado a reação “tradicionalista” até às suas manifestações FSSPX ou sedevacantistas. Quem torna a obediência repugnante não será obedecido. Quem põe atos que parecem aqueles que implicam na perda ipso facto de seu ofício diminui seu estatuto e lança uma sombra sobre sua pessoa mesmo se de fato essa aparência for enganosa.
[III.3 – 2.ª RAZÃO: NOVA ECLESIOLOGIA CONCILIAR]
Uma outra razão pela qual as autoridades conciliares (obrigado ao Cardeal Benelli pela palavra) não pronunciam tão facilmente as palavras cismático ou excomunhão com relação aos “ultras” da tradição pode ser por elas já terem emasculado essas concepções a ponto de não lhes deixarem senão uma força ínfima.
Pois a nova concepção eclesiástica do Vaticano II não faz da comunhão eclesiástica um absoluto. Há, para os fiéis do Vaticano II, graus de comunhão e de catolicidade. Um cismático não está mais, segundo essa concepção, simplesmente fora da Igreja, lá onde não há salvação. Ele está numa comunhão menos plena, mas capaz de ser de uma igreja apostólica da qual o Espírito Santo se serve como meio de salvação. Como querer apavorar os “ultras” brandindo um gládio voluntariamente tornado cego?
[III.4 – NEM MESMO O NOVO CÓDIGO DIFERE DO EXPOSTO]
Antes de concluir este pequeno estudo, recordo que me sirvo do Código de 1917, o único em vigor durante o concílio Vaticano II e para todos os conclaves conciliares exceto o último, e o único reconhecido pelos “ultras”. Sem embargo, não creio que o Código de 1983 diga algo diferente acerca dessas questões. »
(John DALY, Cacemos os cismáticos! , Forum Catholique, 9 de setembro de 2007, trad. br. por F. Coelho, em fev. 2009, de: Chassons les schismatiques !, http://www.leforumcatholique.org/message.php?num=263358 ).
Tudo se deve a um unico ponto: Ninguem gosta de ler. Muito menos a palavra de Deus. E não só em um unico ponto, mas no contexto todo. Jesus já disse: ” conhecereis a verdade, e a verdade vos libertara…”
Vivemos em um mundo mal. Governado por aquele, que segundo Jesus só veio para roubar, matar e destruir e também afirmado pelo proprio Cristo, nosso inimigo, o principe deste mundo. Mas os seus dias já estão contados, e todos quantos não aceitarem Jesus como o unico e suficiente salvador, o uncio caminho que nos leva ao Pai, infelizmente deverão perecer da mesma sorte. Salmo 119: Lampadas para os meus pés é a tua palavra, e luz para o meu caminho. Até a palavra de Deus, foi usada por homens maus, para manipularem os outros, para roubarem e para matarem. Que deverão tais pessoas receberem de Deus? O perdão? Se o arrependimento verdadeiro, aceito por Deus, não é aquele que pensamos que enganamos a Deus, quando o unico enganado somos nos mesmos. Devemos dar frutos do arrependimento, pois no reino dos céus, não entrara nada que seja contaminado ou impuro. Devemos buscar a verdadeira transformação, o nosso nascer de novo, do sangue e do espirito. O que para nos é impossivel, mas para Deus não. E Ele esta disposto a nos ajudar a qualquer momento. Portanto, aproveitemos enquanto há tempo. Pois Jesus já esta as portas. A unica coisa confiavél? A palavra de Deus…
Cuidado com as heresias propagadas pela seita pseudo-católica conhecida como FSSPX! Os lefebvristas são perigosíssimos pois estão fantasiados de católicos, mas em verdade não o são. Não respeitam nem se submetem ao Papa, negam a autoridade do magistério papal, não obedecem, criticam o Papa, etc. Se acha a Ifgreja Remanescente e são totalmente contraditórios. Seus Bispos e padres não possuem qualquer jurisdição e o ministpério deles é completamente inválido. Suas missas são ilícitas, suas ordenações são ilícitas, suas confirmações são nulas assim como seus casamentos e confissões ! Cuidado não seja enganado pelos hereges fanáticos da FSSPX. Parecem católicos, mas não são ! A FSSPX é uma seita herética pseudo-católica.
Para mim o lamentável é existirem católicos que são mais papistas do que o Papa, ou seja, criticam o Papa, não aceitam os concílios da Igreja, são insensíveis ao sofrimento dos mais pobres, e rejeitam a democracia, pois só a aceitam quando os partidos de direita ganham. É lamentável, mas sempre existiram farisaístas na Igreja, mas Cristo deu a Pedro as chaves da Igreja, e não aos pseudo católicos que aqui suspiram pela ditadura militar e por uma Igreja arcaica.