O reverendíssimo Dr. Pe. João Carlos Almeida, scj, em seu blog, tem-se esforçado por tentar provar a sua tese sobre a “constituição eucarística da Igreja e de cada batizado”, utilizando-se para isso de documentos da Santa Igreja Católica. Julga o reverendo sacerdote ter encerrado a polêmica ao citar a Sacramentum Caritatis, de SS Bento XVI, onde é dito: “Assim, «tornamo-nos não apenas cristãos, mas o próprio Cristo»” (Sacramentum Caritatis, 36).
Não tenho certeza de que o pe. João Carlos compreenda realmente o que está falando. Em um post do seu blog no qual ele pergunta se [s]erá heresia afirmar que a constituição da Igreja é essencialmente Eucarística, ele afirma corretamente: “a antiguidade cristã designava com as mesmas palavras — corpus Christi — o corpo nascido da Virgem Maria, o corpo eucarístico e o corpo eclesial de Cristo”. Perfeitamente; no entanto, dizer somente isso é amputar a Doutrina Católica e propiciar o surgimento de erros crassos na compreensão do dogma.
É impressionante: parecem aquelas piadas de “lógica” que circulam pela internet. “Eu não sou ninguém, ninguém é perfeito, logo eu sou perfeito. Mas só Deus é perfeito, logo eu sou Deus. Deus é amor, o amor é cego, logo Deus é cego. Mas eu sou Deus… meu Deus, eu sou cego!”. A argumentação do reverendíssimo pe. João Carlos, data maxima venia, urge dizer, é estritamente análoga: “a Eucaristia é o Corpo de Cristo, a Igreja é o Corpo de Cristo, logo a Igreja é a Eucaristia. Eu sou a Igreja, a Igreja é a Eucaristia, logo eu sou eucarístico”. As conclusões repugnam o bom senso tanto quanto aquelas às quais chegou o sujeito da piada que se descobriu cego por meio do exercício especulativo. São absurdas e é muitíssimo fácil demonstrar: se eu sou a Eucaristia e a Eucaristia é digna de adoração, logo eu sou digno de adoração. A menos que eu seja Deus – e não me consta que eu seja -, isso é idolatria. Logo, por reductio ad absurdum, resta claríssimo, sem a menor sombra de dúvidas, que nem a Igreja é – e nem muito menos eu sou – a mesma coisa que a Eucaristia.
O problema aqui é terminológico, e é o mesmíssimo da aplicação indiscriminada da palavra “presença”, confundindo a presença eucarística com a presença nos cristãos reunidos ou nas Escrituras Sagradas. As palavras não têm um único sentido. A aplicação indiscriminada de palavras que significam coisas distintas em contextos distintos, sem que isso seja deixado claro, confunde os fiéis. E, na minha opinião, todo problema de terminologia é sintoma de um problema cognitivo: o sujeito que não consegue explicar algo direito, é porque provavelmente não o compreende direito. Por isso que eu disse acima não ter certeza de que o reverendíssimo pe. João Carlos compreenda o seu discurso.
A Igreja é sem dúvidas o Corpo de Cristo, mas é o Corpo Místico de Cristo. E Santo Tomás de Aquino ensina que se chama a Igreja inteira Corpo Místico por analogia com o corpo natural do homem (Summa, IIIa, q.8, a.1, responsio). A Eucaristia, por sua vez, é real e substancialmente o Corpo de Cristo, sem o ser – como a Igreja – de maneira análoga. E isso faz toda a diferença.
Santo Tomás faz tanta questão de não confundir as duas realidades que, falando sobre a Eucaristia, distingue n’Ela uma coisa, “significada e contida no Sacramento, que é o mesmo Cristo, e outra, significada e não contida, que é o corpo místico de Cristo”, a sociedade dos santos (Summa, IIIa, q.80, a4, responsio). A primeira é res et sacramentum e, a outra, res tantum: não dá para confundir as realidades como se fossem uma só e a mesma realidade (cf. também Summa, IIIa, q.73; em especial a.6, responsio). Receber o Corpo de Cristo é, sim, unir-se (mais) ao Corpo [Místico] de Cristo, mas as palavras significam coisas distintas: a primeira é o Sacramento em si e, a segunda, o efeito do Sacramento. “Tornar-se o próprio Cristo” [i.e., ser parte constituinte do Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja] não tem nada a ver com “tornar-se a Eucaristia”. Os sentidos são múltiplos, e é importante não confundi-los.
Toda esta confusão poderia ser evitada se os ministros do Deus Altíssimo tivessem um maior cuidado com os seus discursos, preocupando-se mais em transmitir a Doutrina Católica do que em fazer rebusques de retórica que, dependendo do público ouvinte [ou leitor], podem provocar muito mais mal do que bem. Causa finita, sim, mas somente quando se compreende exatamente o quê Roma locuta. O exercício do munus docendi não é simplesmente citar trechos pinçados de documentos pontifícios sem os explicar. Pra fazer isso, aliás, ninguém precisa de doutorado em Roma.
Eita Jorge… Não deu nem tempo de respirar, risos.
Meus parabéns irmão!
Você disse neste “post” – com formidável clareza, e ótimas referências – tudo o que eu tento (e lá se vão três dias!!!) dizer no blog do padre… Resta agora ao reverendo sacerdote responder, finalmente, em que sentido ele empregou a tal “citação” (coisa que também por três dias consecutivos eu pergunto… sem obter resposta!).
Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo no Santíssimo Sacramento do Altar!
Bruno
Perfeito, Jorge Ferraz!
E enquanto isso Pe Joãozinho faz malabarismos para parecer que meus comentários vão contra o ensino do Papa Bento XVI. Incrível! E enquanto isso não sabemos se Pe Joãozinho é panteísta, gnóstico ou católico…
Att!
Salve Jorge! :P
Salve Jorge! [2] =D
Há algum tempo comecei a ter medo daquilo que alguns padres escrevem.
Luiz Fernando,
Engraçado. Lá no blog do Padre Joãozinho vc teceu um comentário todo humilde se autodenominando “chato”, mas aqui detona o padre…
Cuidado! Devemos todo respeito aos sacerdotes…
https://www.deuslovult.org//2008/11/21/respeito-devido-aos-sacerdotes-sta-catarina-de-sena/
Um abraço
Ao que tudo indica a polêmica continua e o Pe. Joãozinho no desespero já começa até a chamar o pessoa da Montfort de marxistas e ateus práticos.
Tudo isso porque o padre se expressou muito mal, mas como ele não quer dar o braço a torcer, ele continua fazendo confusão e só Deus sabe se ele é gnóstico, panteísta ou católico, como bem disse o Luis Fernando e olha que já se passou alguns dias.
Para piorar essa salada, o Pe. Joãozinho tem uma certa admiração pela Teologia da Libertação. É o cúmulo!