A temperança e a situação de pecado

Durante o almoço natalino em família, após estarmos satisfeitos, sentamo-nos para descansar. Alguém ligou a televisão. Estava passando uma cena de uma novela da Globo – “Alma Gêmea”. Não sei o nome dos atores ou dos personagens, nem o contexto. Mas a cena era a seguinte:

Um casal recém-casado discutia. O marido dizia à mulher que ela o tinha enganado e que, por isso, ela não esperasse dele um bom marido. Lançando ao rosto da esposa as mentiras que ela havia contado para que conseguisse se casar com ele, o esposo dizia que não iria nem mesmo tocá-la, jamais, e se retirou para um quarto à parte, deixando-a sozinha.

A mulher não se conforma. Diz para si mesma que é linda, e que vai conseguir ter para si o homem amado. Sobe ao quarto do esposo, deixa cair o vestido, e pergunta ao marido se ele não é homem. Um instante terrível de hesitação. E então o marido, diante do corpo nu dela, afirma que é homem, sim, e que tem vontade de lançá-la à cama, mas que consegue se controlar. Passa por ela, impassível, entrega-lhe o vestido, diz para que se vista, e que saia.

Meu lado Poliana rejubila-se. Em uma novela da Globo, a força de vontade vence a tentação carnal. A temperança vence a luxúria. Um “não” resoluto e irrevogável vence o pecado. É possível resistir, é possível ter princípios mais nobres do que os impulsos sexuais: há uma alternativa ao comportamento meramente instintivo. Há humanidade.

Mas meu lado “não-Poliana” não fica satisfeito. Lembro-me de uma coisa que já li em algum lugar, sobre os cátaros: lembro-me que os líderes da seita, por serem “superiores”, vangloriavam-se de serem capazes de resistir às tentações e, para prová-lo, dormiam com belas moças sem as tocarem. O resultado era que outros cátaros, tentando imitar os seus líderes, faziam a mesma experiência e cediam à tentação durante a noite. Não eram “superiores” e o descobriam da pior maneira possível.

A castidade é virtude que se guarda protegendo-a, e não a pondo à prova. As situações de pecado, como sempre ensinou a Igreja, são para serem evitadas, e não enfrentadas. É admirável, sem dúvidas, o heroísmo dos que conseguem se manter impassíveis diante de uma tentação avassaladora. Mas este heroísmo é uma exceção, e não a regra. Que ninguém o pretenda possuir! Para que não aconteça de só descobrir que não consegue após não conseguir…

Publicado por

Jorge Ferraz (admin)

Católico Apostólico Romano, por graça de Deus e clemência da Virgem Santíssima; pecador miserável, a despeito dos muitos favores recebidos do Alto; filho de Deus e da Santa Madre Igreja, com desejo sincero de consumir a vida para a maior glória de Deus.

3 comentários em “A temperança e a situação de pecado”

  1. Deixa eu ver se entendi…

    Um marido não pode fazer sexo com a mulher na única situação em que a ICAR o permite… sendo marido dela?

    A “horrível luxúria” é pior que um casamento já consumado e desfeito por arrogância?

    Ai, Jorge… Pára.

  2. Mallmal,

    O foco do post é a capacidade de se resistir aos impulsos sexuais, e não a situação canônica de personagens fictícios.

    Mas, já que você falou, pelo que entendi dos cinco minutos que assisti, o sujeito foi enganado pela mulher, de modo que o seu Matrimônio foi, muito provavelmente, inválido.

    Abraços,
    Jorge

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