Eu naturalmente não acompanhei os debates – em meados do século passado – travados nesta Terra de Santa Cruz e que culminaram com a recepção do divórcio no ordenamento jurídico brasileiro. Li, a posteriori, um excelente livro do Gustavo Corção chamado “Claro Escuro”, que era uma coletânea de artigos de jornais publicados ao longo dos meses nos quais aconteceram os tais debates. E, dentre as crônicas saídas da pena do ilustre escritor católico, uma delas se referia de modo mais claro ao título do livro.
Argumentava o Corção que havia sem dúvidas alguns casais que tinham de tudo para dar certo, como também havia alguns outros casais que visivelmente não poderiam dar certo de jeito nenhum. Mas também havia – a esmagadora maioria – uma multidão enorme de casais que poderiam tanto dar certo como falhar miseravelmente na grande aventura de formação de uma família. E era exatamente com esta multidão, vivendo neste claro-escuro, que a legislação positiva deveria se preocupar – no caso, não oferecendo a “via fácil” da dissolução do vínculo conjugal, a qual poderia fazer com que alguns casais (que dariam certo se tentassem mais um pouco) fossem induzidos a desistir diante das primeiras adversidades.
Porque a entidade familiar tem uma grande importância social e, como disse alguém recentemente (acho que o Ramalhete), se na alegria é fácil aos cônjuges ficarem juntos as coisas não são tão simples assim na tristeza – e, aqui, um pouco de senso de responsabilidade favorecido pela legislação positiva é muito bem vindo. Não me recordo se o Corção falava isto no “Claro Escuro”, mas falo eu: a aprovação do divórcio provocou, talvez acima de tudo, o enorme mal de criar uma cultura de que “se-não-der-certo-separa”, com uma conseqüente desvalorização da Família nos moldes em que ela sempre foi entendida (e como a Igreja sempre a defendeu). A partir desta mentalidade, os bravos e corajosos desbravadores de um mundo novo que se aventuravam para além das fronteiras da casa materna com a missão bem determinada de criar raízes sólidas e edificar na História uma árvore frondosa que pudesse contribuir com rebentos saudáveis para a sociedade e para a Igreja transformam-se agora em jovens irresponsáveis (independente da quantidade de anos que porventura carreguem nas costas) preocupados apenas em “sentirem-se bem” e em gozarem uma “felicidade” confundida com prazer momentâneo.
A imagem é forte, mas não vejo como ela possa ser menos verdadeira. Afinal de contas, quando se fala em “célula-mater da sociedade”, quantas são as pessoas que identificam isto com uma família – e, com isso, estamos falando de um homem e uma mulher unidos em ordem à geração e educação dos filhos e integralmente voltados um para o outro até que a morte os separe? Quantas são as pessoas que entendem as graves responsabilidades que disto decorrem?
A lei do divórcio criou uma cultura de pusilânimes. E talvez um dos mais eloqüentes exemplos disto que eu vi nos últimos tempos tenha sido este texto da sra. Regina Navarro, onde ela faz uma apologia da infidelidade conjugal e defende que “a monogamia não funciona muito bem para os ocidentais”. Que é na verdade uma reescrita daquela “A Maçã” de Raul Seixas, sendo – tanto uma quanto a outra – uma utopia sem sentido de que é possível “amar” sem que o amor seja uma doação íntegra da totalidade do ser, ou de que é possível separar “amor” de “fidelidade”, ou de que o amor não ande sempre e necessariamente de braços dados com a responsabilidade.
A cultura pró-divórcio pavimentou a estrada para que barbaridades como esta ganhassem livre trânsito. Contra os devaneios de articulistas e artistas de rock, contudo, permanecem incólumes os exemplos da história, o testemunho da reta razão humana e aquelas palavras das Escrituras Sagradas conforme a qual o homem e a mulher “serão uma só carne”. E, contra esta verdade insofismável, passarão músicas e artigos; os vinis estarão pendurados em decorações de festas estilo “anos setenta” e os jornais estarão embrulhando o peixe do fim da feira, mas haverá ainda aqueles que defendam a capital importância da Família monogâmica e indissolúvel. Porque certas convicções são inegociáveis. Certas palavras não passarão.
Belíssimo artigo!
A Paz!
[Acerca do casamento e das relações entre os dois sexos]
excerto
Fora da escuridão da minha vida, tão frustrada, eu ponho diante de ti a única grande coisa a amar na face da Terra: O Santíssimo Sacramento. … Lá tu vais encontrar romance, glória, honra, fidelidade, e o verdadeiro caminho de todos os teus amores na terra, e mais do que isso: Morte: pelo divino paradoxo, que termina a vida, e exige a rendição de todos, e no entanto, pelo sabor que por si só pode fazer com que aquilo que procuras nas tuas relações terrenas (amor, fidelidade, felicidade) se mantenha, ou tirar a compleição da realidade, da permanência eterna, que todos os corações dos homens desejam.
J.R.R.Tolkien
O que dizer, Jorge ?
Brilhante! Meus parabéns !
Muito bom o texto. Esses dias eu vi uma frase no facebook que dizia que esse desejo de se ter um alguém para conviver durante todo o curso é pura hipocrisia. Seu texto mostra de fato o porquê de ideias assim estarem tão enraizadas na mentalidade atual, inclusive de pessoas da minha faixa etária (18 anos para cima). Costumo pensar que o entendimento da realidade sacramental do matrimônio, precedido por um reto namoro, já é algo esquecido ou até rejeitado nos tempos em que vivemos.
Abraços.
Belíssimo artigo Jorge. Meus parabéns, não podia ser melhor.
Nossa!! Nota 1000!
É isso aí!!
Exatamente, a funesta consequencia da “pusilanimidade” (escrevi certo?) – nada de correr atrás, nada de querer melhorar. Não está ótimo? Joga fora! descartável assim… Sem pensar que de fato a esmagadora maioria tem problemas que poderiam ser resolvidos com um pouquinho de fé – do tamanho de um grão de mostarda.
Pra fazer pensar!!
E aplicar em outras diversas áreas da nossa vida…
Sim, quantas vezes já ouvi: ah, casei, vamos ver até quando vamos conseguir ficar juntos.
Tão triste.
E esse pensamento utilitarista está se “multiplicando”, uma vez que, se nem a família é eterna, o que mais há de ser???
Só para ter ideia, aqui onde trabalho, do concurso que ingressei há 5 anos, há pessoas que entraram comigo e já estão no QUARTO emprego. Não criam raízes, não valorizam nada, buscam apenas o $$$$. Não é por insatisfação, é por buscar mesmo só o salário.
Claro que não se compara ao Sacramento do Matrimônio, mas é apenas um reflexo do que acontece quando invertemos valores.