Os fantasmas da Teologia da Libertação ainda assombram Campinas; mas os verdadeiros católicos estão atentos e agem rapidamente

Neste sentido, amados Irmãos, vale a pena lembrar que em agosto passado, completou 25 anos a Instrução Libertatis nuntius da Congregação da Doutrina da Fé, sobre alguns aspectos da teologia da libertação, nela sublinhando o perigo que comportava a assunção acrítica, feita por alguns teólogos[,] de teses e metodologias provenientes do marxismo. As suas seqüelas mais ou menos visíveis feitas de rebelião, divisão, dissenso, ofensa, anarquia fazem-se sentir ainda, criando nas vossas comunidades diocesanas grande sofrimento e grave perda de forças vivas. Suplico a quantos de algum modo se sentiram atraídos, envolvidos e atingidos no seu íntimo por certos princípios enganadores da teologia da libertação, que se confrontem novamente com a referida Instrução, acolhendo a luz benigna que a mesma oferece de mão estendida; a todos recordo que «a regra suprema da fé [da Igreja] provém efetivamente da unidade que o Espírito estabeleceu entre a Sagrada Tradição, a Sagrada Escritura e o Magistério da Igreja, numa reciprocidade tal que os três não podem subsistir de maneira independente» (João Paulo II, Enc. Fides et ratio, 55). Que, no âmbito dos entes e comunidades eclesiais, o perdão oferecido e acolhido em nome e por amor da Santíssima Trindade, que adoramos em nossos corações, ponha fim à tribulação da querida Igreja que peregrina nas Terras de Santa Cruz.

Bento XVI,
Ad Limina dos bispos das regionais Sul-3 e Sul-4 da CNBB
5 de dezembro de 2009

Eu já ouvi a história de mais de uma fonte; conto-a de um modo imperfeito, provavelmente confundindo alguns detalhes, mas a reproduzo íntegra em suas linhas gerais. Certa feita, nos idos do Brasil da década de 70 ou 80, um líder de alguma “comunidade oprimida” (índios, ou imigrantes, não lembro bem) foi se reportar a um certo bispo da Teologia da Libertação para informar-lhe de que a sua comunidade estava abandonando a Igreja Católica (que tivera presença atuante por meio das CEBs na tal comunidade) para abraçar alguma seita pentecostal. E justificou: “Excelência, nós agradecemos pela defesa dos nossos direitos, pela consciência política, pelas lutas por condições mais dignas, por tudo isso; mas estamos indo embora porque precisamos de Deus, e aqui não O encontramos”…

Ora, mas acontece que a finalidade da Igreja é a salvação das almas uma a uma, e não outra (como disse o Papa Bento XVI aqui, na Catedral de São Paulo). Uma religião sem Deus não se pode pretender verdadeira religião, uma práxis que não tenha por objetivo principal a salvação das almas e a glória de Deus não se pode pretender católica, uma teologia que promove uma visão de mundo apenas horizontal e natural não se pode pretender legítima teologia da Igreja. Tudo isto me parece bastante evidente.

Eu lembrei da história (e das recentes palavras do Santo Padre que vão em epígrafe) quando li um artigo recentemente publicado no site da Arquidiocese de Campinas sobre a Teologia da Libertação. Em particular, logo ao ler a primeira frase do artigo: “Quando pároco na paróquia São Judas Tadeu, na Vila Lemos, tive a grata satisfação de ter um contato com as comunidades daquela paróquia, muito marcadas pela presença querida das CEBs, que beberam da Teologia da Libertação e deram seus frutos, como disse o evangelho do domingo passado… «Um deu cem, outro 60 e outro 30…»”. E eu sinceramente não consigo entender como é possível, em pleno século XXI, haver quem ainda defenda os frutos podres da malfadada Teologia da Libertação.

Trata-se provavelmente da teologia mais reiteradas vezes condenada pela Igreja nas últimas décadas! Da Libertatis Nuntius ao discurso do Papa acima citado, de Leonardo Boff a Jon Sobrino, estamos falando de uma posição constante da Igreja – frontalmente contrária à Teologia da Libertação – repetida de modo claríssimo por anos e anos a fio e, infelizmente, ainda encontrando no Brasil os ouvidos surdos de fiéis (ou, muito pior ainda, de pastores) que preferem seguir as próprias fábulas à doutrina segura enunciada pelo Vigário de Cristo.

E isto ainda hoje, a despeito de todos os tristes frutos que esta visão marxista do Cristianismo já entregou à sociedade e à Igreja. A TL não dá incentivos à caridade (aliás, ela nem sabe o que é isso), e sim (quando muito!) à filantropia barata. Não forma líderes cristãos preparados para espalhar sobre a terra “o doce odor de Cristo”, e sim sindicalistas. Não salva o homem do pecado, e sim do seu “patrão” (ou – para ser ainda mais impessoal e anti-natural –  “das elites”, ou “do capitalismo”, ou “do neo-liberalismo”, ou de qualquer besteira parecida da qual se queira lançar mão). Não inflama a esperança dos homens acenando-lhes com a promessa do Céu, e sim com a de uma utopia materialista de uma sociedade justa, igualitária… e impossível. Destrói as vocações, em tudo discorda da Doutrina da Igreja, promove a desobediência, as rebeliões e as divisões, propaga uma visão paupérrima de Cristo e da Igreja, solapa a religião em suas bases, aprisiona os homens no mais estéril materialismo… Em suma, de todos os frutos da Teologia da Libertação que se podem dizer verdadeiramente frutos dela (i.e., que sem ela não seriam obtidos), não há um único que se salve. Com a condenação explícita da Igreja e com o triste testemunho factual de seus abundantes frutos podres… qual a razão da insistência nesta teologia inquestionavelmente fracassada?

Voltemos ao artigo publicado no site da Arquidiocese de Campinas. Logo em seguida a ele, está publicada uma (justíssima!) nota da Assessoria de Comunicação Social da Arquidiocese censurando o texto. Nela, se pode ler: “Faz-se mister recordar que os canais editoriais oferecidos (jornais, sites e rádios) expressam o pensamento da Arquidiocese de Campinas, que os selam. (…) Por isso, advertimos a veiculação do referido artigo que em canais da Arquidiocese faz apologia da Teologia da Libertação, condenada pelo Magistério da Igreja em diversos documentos”.

E, para além de quaisquer querelas sobre “liberdade de expressão” ou respeito às opiniões de terceiros, é exatamente isto o que interessa: na Diocese, o Bispo é sentinela responsável por velar pela integridade da Fé. Os canais oficiais disponibilizados pela Arquidiocese devem, forçosamente, fazer eco ao pensamento da Arquidiocese – que deve ser o pensamento da Igreja, em particular do Santo Padre, hoje Bento XVI. Estando para além de qualquer dúvida razoável a inequívoca condenação de Roma – por diversas vezes, repitamos – à Teologia da Libertação, por qual motivo uma sua apologia deveria ser permitida nos meios de comunicação católicos?

A Igreja existe para salvar as almas: recordemos as palavras do Vigário de Cristo. E, para a salvação das almas, é mister o emprego dos meios necessários: em particular, é importante não permitir que uma teologia daninha, estéril e incontáveis vezes condenada pela Igreja tenha livre veiculação pelos meios de comunicação oficiais da Igreja. Outra, aliás, não é a disposição do Direito Canônico: após dizer que os pastores da Igreja devem procurar usar os meios de comunicação social (CIC 822, §1), fala logo em seguida sobre a importância de velar para que, nestes, seja transmitida a doutrina íntegra: “para preservar a integridade das verdades de fé e dos costumes, os pastores da Igreja têm o dever e o direito de velar para que nem os escritos nem a utilização dos meios de comunicação social provoquem dano à fé ou aos costumes dos fiéis cristãos; (…) e também de reprovar os escritos nocivos à retidão da Fé ou aos bons costumes” (CIC 823 §1).

Diante de todo o exposto, resta parabenizar a Assessoria de Comunicação da Arquidiocese de Campinas pelo pronto cumprimento do seu dever, ao reprovar um artigo daninho à Fé Católica – uma vez que este fazia apologia de uma teologia herética e já por diversas  vezes condenada. Que os outros pastores possam seguir-lhe o exemplo! E, no mais, rezemos para que as palavras do Bispo de Roma possam receber melhor acolhida por aqui, nesta Terra de Santa Cruz; que ela possa, liberta das raízes envenenadas da Teologia da Libertação, fazer jus ao próprio nome e oferecer o quanto antes a Deus e à Santa Igreja os frutos – verdadeiros! – de santidade que, pela intercessão da Virgem de Aparecida, o Altíssimo espera receber de nós.

O ditador e a perspectiva da morte

Alguém dizia recentemente que não existem ateus em aviões atravessando uma turbulência. Eu até concedo que, talvez, haja algum ateu fanático particularmente fundamentalista a ponto de sufocar a voz da própria consciência até mesmo em situações extremas como diante da morte; mas aposto que a maior parte dos ateus renegaria rapidamente a sua fé quando se visse na iminência de deixar o único mundo que ele se permite acreditar.

Porque a morte é um mistério que sempre provocou – e sempre há de provocar – espanto nos seres humanos. A possibilidade de deixar de existir repugna à inteligência humana. Pelo fato de ser racional, o homem sabe que é superior à matéria, mesmo à orgânica, uma vez que inteligência não escorre de pedras nem se sintetiza em laboratório. O homem almeja continuar existindo, ainda que insista em dizer a si próprio que isto são fábulas de gente ignorante. Na iminência da morte, penso que o desejo natural há de falar mais alto (pelo menos na maioria das vezes) do que a mentira artificial auto-contada nos momentos de prazer – quando o futuro (aparentemente) longínquo é fácil de ser ignorado.

Pensava nisso quando via o Chávez recebendo a Extrema-Unção. O ditador comunista perseguidor da Igreja descobre não apenas que não é imortal (isto, afinal de contas, é fácil), mas que pode morrer em muito breve. Esta característica profundamente cristã da brevidade da vida, onde não somos capazes de adicionar um côvado sequer aos nossos dias sobre a terra, é um poderoso fator de aperfeiçoamento próprio. Quem toma consciência de que pode morrer hoje mesmo vai procurar ser hoje mesmo alguém melhor. Ao contrário, quem não pensa nunca na morte e passa a vida empregando esforços para se convencer de que o poeta mentiu ao dizer que a mágoa acompanha o homem ainda “quando esse homem se transforma em verme”… tem muito mais facilidade em deixar “para depois”. A propósito, os que entendem inglês não deixem de ler isto.

Claro, é perfeitamente possível que o Chávez esteja somente fazendo uma jogada de marketing hipócrita. Isto, aliás, é até bastante provável. Mas eu gosto de pensar que ele – que enfrentou recentemente um câncer, segundo a notícia – tenha talvez se dado conta de que é tempo (ou já passou há muito do tempo) de fazer conta. Porque, diante da perspectiva da morte, todas as vaidades da vida perdem o sentido; e, se não provocaram a conversão, talvez tenham provocado ao menos a tomada de consciência da necessidade da conversão. Diante da morte, talvez Chávez tenha tremido e temido. Talvez este Sacramento lhe possa fornecer as graças necessárias à redenção.

“Comecei a achar o ateísmo aborrecido”

Várias pessoas já leram (e escreveram sobre) a interessantíssima entrevista que o Pondé concedeu recentemente à VEJA. Eu também quero dar os meus dois tostões sobre o assunto. Desnecessário dizer que vale a leitura na íntegra.

É bem verdade que – como disse o frei Rojão – “[u]m filósofo que conclui a existência de Deus é realmente um filósofo, não estes garotinhos mimados de classe média que leram Dawkins, que nem é cientista, nem filósofo”; e, nos tempos de indigência intelectual nos quais vivemos, isto é digno de ser mencionado e celebrado. Ainda mais quando o filósofo em questão – o Luiz Felipe Pondé – não é um cardeal católico, nem um piedoso padre católico, nem um renomado teólogo católico. Não é nem sequer um católico. Que, aliás – para horror dos livres-pensadores modernos -, foi ateu por muito tempo, até começar “a achar o ateísmo aborrecido”.

“Aborrecido”! É talvez dos mais elegantes adjetivos que eu vi serem usados recentemente para se referir – com propriedade – ao ateísmo. A miséria intelectual auto-elevada – ridicularmente – ao patamar de única posição socialmente aceitável, provocando os maçantes jantares aos quais o Pondé se refere com tanto bom humor. Como se fossem uma decrépita cerimônia ritual onde os velhos fiéis de uma religião sem fé bajulam-se mutuamente, em um mecanismo de auto-afirmação que é a antítese perfeita dos cultos religiosos onde os fiéis confortam-se uns aos outros. Nem mesmo nisso eles são originais. O diabo só faz mesmo tocar cover das canções do Céu.

E o ateísmo é aborrecido, porque auto-limitado. Porque pobre, raso, estéril. Incapaz de satisfazer aos anseios humanos mais profundos – insistindo em ficar às margens e negar a existência do oceano que se descortina diante dele. Um bufão que se julga rei, emitindo ordens disparatadas em sua estultície e rasgando as vestes, espantado, ao perceber serem bem poucos os que o levam minimamente a sério para além das mesas dos “jantares inteligentes”.

“Lei da Marta x Lei de Deus”

[Divulgando iniciativa do IPCO (não deixem de verificar o link), conforme recebi por email. O assunto – como todos sabem – é sério, sendo provavelmente a maior ameaça que paira atualmente sobre esta Terra de Santa Cruz. Que jamais desistamos de combater o bom combate – e que São Miguel Arcanjo nele nos defenda sempre.]

Orígenes, a reencarnação e a Igreja Primitiva

Foi recentemente comentada aqui no Deus lo Vult! uma suposta aprovação do Cristianismo nascente à falsa teoria da Reencarnação nos moldes em que é apregoada pelo espiritismo dos nossos dias. Como já tive a oportunidade de me deparar anteriormente com a afirmação descabida, gostaria de esclarecer quanto segue:

1. O Concílio ao qual se deseja fazer referência é o Segundo Concílio de Constantinopla, ocorrido em 553.

2. Mais especificamente, o cânon sobre o qual se está falando é o 11, que diz [apud “Documentos dos primeiros oito concílios ecumênicos – Tradução de Mons. Otto Skrzypczak”, p. 78; EDIPUCRS, Porto Alegre, 2000] o seguinte:

Cân. 11: Se alguém não declarar anátema a Ário, Eunômio, Macedônio, Apolinário, Nestório, Êutiques e Orígenes com seus ímpios escritos, bem como os demais hereges, que foram condenados e declarados anátemas pela Santa Igreja Católica e Apostólica e pelos quatro sagrados concílios citados anteriormente e outrossim os que professaram ou professam opiniões semelhantes às dos mencionados hereges e persistiram em sua impiedade até o fim, – um tal seja anátema.

3. O texto de Orígenes ao qual os espíritas gostam de fazer referência é o De Principiis [mais especificamente, o livro III, Cap. III, 5], que traduzo:

Em todo caso, aqueles que sustentam que tudo no mundo está sob a administração da Divina Providência (como também nós acreditamos) não pode, ao que me parece, dar nenhuma outra resposta que não esta: não há sombra de injustiça no governo divino, e isto porque há certas causas que provêm de [uma] existência prévia [da alma], em conseqüência das quais as almas, antes de nascerem nos corpos, contraem uma certa quantidade de culpa em sua natureza sensitiva, ou em seus movimentos, em razão das quais são julgadas merecedoras, pela Divina Providência, de serem colocadas em tais condições.

4. Convém notar que Orígenes não defende a “reencarnação”, e sim a pré-existência da alma (que são duas coisas distintas – ambas erradas, mas distintas). Sobre isto vale a pena ler este texto ou este outro (que traz inclusive algumas interessantes citações patrísticas contra a falsa doutrina da reencarnação).

5. Orígenes, ao contrário, negou peremptoriamente a espúria doutrina reencarnacionista. Isto está fora de qualquer discussão, uma vez que há um capítulo do seu “Comentários sobre Mateus” [Livro XIII, cap. 1] no qual ele analisa a doutrina da “transmigração” [a reencarnação espírita] aplicada ao caso de São João Batista e Elias [clássico “exemplo” de reencarnação que os espíritas gostam de inventar nos Evangelhos] e a rechaça absolutamente. Traduzo um trecho do comecinho:

Mas agora, de acordo com as nossas habilidades, vamos investigar também as coisas que estão contidas aqui [na passagem onde Nosso Senhor fala que São João Batista é o Elias que há de vir – Mt 17,10]. Aqui não me parece que, por “Elias”, se esteja falando da alma dele, uma vez que isto seria cair no dogma da transmigração, que é estranho à Igreja de Deus, jamais ensinado pelos Apóstolos e nunca encontrado em lugar nenhum das Escrituras.

6. De toda a patrística, a passagem do De Principiis de Orígenes é a única que se pode dizer possuir remotamente algum resquício de similaridade com a falsa teoria espírita da reencarnação. Isto, ao contrário do que pretendem os espíritas modernos, significa exatamente que tal doutrina era completamente estranha aos primeiros cristãos – tanto que eles nunca falam dela.

7. Ainda que Orígenes tivesse defendido a falsa doutrina da reencarnação, isto não significaria nada: seria apenas uma voz isolada defendendo uma doutrina espúria que, posteriormente, seria condenada pela Igreja (como já aconteceu incontáveis vezes). No entanto, nem isso os espíritas têm, uma vez que o próprio Orígenes rejeita taxativamente, em outro de seus escritos, a doutrina da transmigração das almas.

8. Desmascarada esta falsificação histórica, resplandece com clareza – uma vez mais – o fato de que as teses reencarnacionistas do espiritismo são estranhas à Doutrina Católica ensinada por Nosso Senhor – e que, portanto, há total incompatibilidade entre a Fé Cristã e as fábulas espíritas, como aliás a Igreja sempre afirmou.

Curtas

– O Carlos Ramalhete estreou ontem uma coluna semanal (que será publicada toda quinta-feira) na Gazeta do Povo. A primeira leva por título “Brasil de Verdade” e, como sempre, vale a leitura.

Aliás, há mais vídeos do professor Carlos disponíveis no seu canal do gloria.tv. Assistam lá!

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– Eu não tenho tempo (nem capacidade) para traduzir na íntegra este texto do Chesterton, como sempre genial [p.s.: ele já está traduzido aqui]. Fala sobre mulheres no trabalho e nos lares, sob o ponto de vista da divisão do trabalho. Traduzo apenas o finalzinho: “O lugar onde as crianças nascem, onde os homens morrem, onde o drama da vida real se desenrola, não é em um escritório ou em um shopping ou detrás de uma mesa. É um lugar muito menor em tamanho, mais de alcance muito mais abrangente. E embora ninguém seja tão tolo a ponto de defender que este seja o único lugar onde as pessoas devam trabalhar (ou mesmo o único lugar onde as mulheres devam trabalhar), ele possui uma característica de unidade e de universalidade que não se encontra em nenhuma das experiências fragmentárias de divisão do trabalho”.

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– O procurador-geral da República quer a condenação de 36 envolvidos no escândalo do Mensalão. Embora já faça anos, a expectativa – segundo a reportagem citada – é que o STF julgue o caso somente no ano que vem.

Eu ouvia a Lucia Hippolito na CBN hoje pela manhã sobre o mesmo assunto. Ela falava que havia uma possibilidade de que, com a renúncia dos réus, o processo voltasse para as primeiras instâncias dos tribunais – o que, na prática, significaria provavelmente que ninguém nunca seria punido. Em se tratando do Brasil, eu não duvido de nada.

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Jovens ficam feridos em corrida de touros do festival de São Firmino. Não é a primeira vez que uma reportagem dessas é publicada (aliás, publicam-se coisas assim todo santo ano desde que eu me entendo por gente); o objetivo (às vezes expresso, às vezes velado) é provocar ojeriza a este tipo de divertimento bárbaro e perigoso.

Mas faço questão de destacar: são oito pessoas feridas (mais quatro ferimentos leves do dia anterior), sendo grave apenas um dos casos. Quantas pessoas são feridas ou morrem, p.ex., no nosso Carnaval? A desproporção é gritante (e ainda mais gritante se levarmos em consideração que, na Espanha, temos animais selvagens e violentos “à solta”) – e, no entanto,  “[d]esde 1911, esse evento [os festivais de San Firmino] causou 15 mortos”.

Ou seja: perigoso não é correr com touros. Perigosas são as festas brasileiras. Corridas com touros, já! Afinal, estes animais são evidentemente muito mais inofensivos do que outros que as nossas políticas públicas gostam de criar e proteger.

Os resquícios da civilização

Diz-se que o homem é criado à imagem e semelhança de Deus porque é “capaz de conhecer e de amar a Deus, e de gozá-Lo eternamente”; assim nos ensina o Catecismo Maior de São Pio X (Parte I, q. 55). É este – e não outro – o fundamento da dignidade humana, aquilo que faz com que o homem seja detentor de direitos objetivos e lhe salvaguarda das arbitrariedades que alguns indivíduos ou grupos, detentores de força ou de poder, porventura queiram lhe infligir.

Houve um tempo – como nos ensina o Sumo Pontífice Leão XIII – em que a Filosofia do Evangelho governava as nações. E por mais que alguns anti-clericais modernos tenham alguma espécie de prazer sórdido (e ignorante) em lançar lama a esta época gloriosa da civilização humana, o fato é que os homens de então eram tratados com muito mais dignidade do que os de outras épocas da história.

“Ah, foram queimados pela Igreja, foram torturados, fizeram guerras sangrentas, foram impedidos de manifestar livremente os seus pensamentos!”, hão de dizer os livres-pensadores modernos. Mas o fato – que os inimigos da Igreja se esquecem de mencionar – é que os homens foram queimados muito mais vezes fora da Igreja do que nas fogueiras às quais a Santa Inquisição ateou fogo. O fato – relevantíssimo, mas sobre o qual não se fala uma palavra – é que os homens foram torturados mais e de maneira mais cruel por civis do que por religiosos. O fato é que nunca houve guerras tão terríveis quanto as que o mundo assistiu no século passado – em pleno século XX, quando já se encontrava indubitavelmente livre da influência da Igreja (e, diremos  até, justamente por causa disso).

“Mas… mas… mas foram impedidos da livre-expressão de suas idéias, e isto não se pode negar!”, dir-nos-ão desesperados os nossos amigos anti-clericais. E, nisto (descontadas, é óbvio, as falsificações grosseiras), nós deles não discordaremos. Graças a Deus, houve repressão à veiculação de idéias errôneas e perniciosas ao longo da história, e este mecanismo foi fundamental para que a civilização pudesse ser mantida e nós, hoje, fôssemos capazes de discutir a repressão de idéias praticada em épocas passadas.

Isto porque a liberdade é algo que não se pode atribuir às coisas de um modo absoluto. A excessiva e imoral (assim intitulada) “liberdade de expressão” vigente nos dias de hoje jamais seria permitida em outras épocas – nisto, concordamos integralmente com os inimigos da Igreja! Com o que não concordamos é que tal fato demonstre uma superioridade moral do nosso século sobre aqueles que o precederam – aliás, muito pelo contrário.

Como dizíamos acima, o ser humano é detentor de uma dignidade intrínseca que faz com que seja preciso respeitá-lo. Assim, a mera possibilidade de que alguém possa dispôr livremente da vida de outrem – matando-o ou escravizando-o, por exemplo – provoca-nos (ainda…) um sentimento de injustiça; no entanto, aquilo que os revolucionários não percebem é que este “sentimento de injustiça” está alicerçado sobre a dignidade humana, sobre o fato do homem ter sido criado por Deus à Sua imagem e semelhança e, portanto, possuir – intrinsecamente – um quê de sagrado e de inviolável. E permitir que esta verdade fundamental seja questionada ou – pior ainda – negada abertamente não é sinal de avanço, e sim de terrível retrocesso. Não é característica de pessoas civilizadas, e sim de bárbaras.

Não é verdade que nós, hoje, conhecemos o valor do ser humano porque nos livramos do obscurantismo católico medieval, é exatamente o contrário: é devido aos resquícios daquele glorioso tempo – repitamos – no qual a Filosofia do Evangelho guiava as nações que, hoje, nós (ainda) não caímos na barbárie completa e ainda não nos esquecemos (muito) que o ser humano possui uma dignidade intrínseca e que, portanto, deve ser protegido de arbitrariedades de outrem. Por qual outro motivo, afinal de contas, deveríamos falar em “direitos humanos”?

No entanto, na contramão de tudo isto, a brilhante “solução” dada por alguns dos nossos ilustres pensadores para proteger os seres humanos da opressão dos seus semelhantes é postular uma “moral” positivista baseada não em nada objetivo, mas nas “conveniências” e nas “convenções sociais”. Assim, matar pessoas passa a ser errado (ou, melhor dizendo, “ilegal”) não porque as pessoas possuam intrinsecamente um direito inviolável à vida, mas porque “convencionou-se” que é “útil” para a sociedade como um todo que os seus cidadãos não se exterminem mutuamente. O problema, o grande e enorme problema com esta idéia estúpida é que a solução apresentada para proteger as pessoas das arbitrariedades… é ela própria uma arbitrariedade – uma vez que, eliminada a dignidade humana intrínseca, uma convenção social de que é importante para o país que os seus cidadãos não se matem em nada se distingue de uma outra convenção social de que é importante para o país que negros sejam escravizados ou que judeus sejam exterminados. Ou seja: o problema está “resolvido” apenas acidentalmente, uma vez que os princípios são imorais e continuam abertos às maiores injustiças que se poderiam cometer. Deste modo, a gloriosa marcha da vaca para o brejo segue solene e inexorável, e passa a ser somente uma questão de tempo a decadência da civilização na barbárie – cujos sinais já encontramos em profusão por aí.

Ora, as idéias de um povo determinam a maneira como aquele povo vai se comportar e, em última instância, garantem ou impossibilitam a sua sobrevivência – donde se vê a importância que elas possuem. Diante das loucuras do mundo moderno, é possível que paremos um pouco para nos perguntar: como foi possível que chegássemos a edificar uma sociedade sobre tão frágeis alicerces? A resposta é bastante óbvia: se as idéias corretas não são defendidas e as erradas não são combatidas, o pensamento degenera-se, e isto acontece de modo tão claro e óbvio como uma casa se estraga se não houver quem dela tome conta, ou como um terreno produz abrolhos e ervas daninhas se não houver quem o cultive. E, se é criminoso construir edifícios com material de baixa qualidade pondo em risco a estabilidade da estrutura… quão mais criminoso não será edificar uma sociedade inteira sobre a areia movediça e inconstante destas idéias que são o lugar comum do pensamento moderno?

A civilização moderna não existe por conta do pensamento moderno – ao contrário, ela sobrevive (ainda) dos influxos benéficos do Cristianismo, e apesar de todas as loucuras modernas que a ameaçam destruir a cada instante, solapando-lhe as bases. Aprendemos com os construtores das catedrais medievais que uma base sólida é fundamental para a sustentação do edifício, e sempre soubemos que isto era aplicável tanto aos templos católicos quanto às sociedades. No seu ódio irracional ao glorioso passado da Igreja, os anti-clericais fazem questão de – irresponsavelmente – esquecer este ensinamento tão elementar que os nossos antigos nos legaram. E, agora, os prédios ameaçam ruir, e já aparecem as rachaduras, enquanto os livres-pensadores modernos, perdidos, tentam jogar mais e mais areia em uma patética tentativa de fechar as fendas abertas.

#Acampadavida em Madrid

Agradeço ao Wagner Moura por me ter mostrado o que está acontecendo em Madrid, na Espanha (às portas da Jornada Mundial da Juventude que acontecerá no mês que vem): desde o domingo passado alguns jovens pró-vida estão acampados no Marco Zero da cidade.

A notícia está em HazteOir.org desde a segunda pela manhã. Lá no link há fotos e vídeos do evento, que em princípio continuará até a próxima sexta-feira 15 de julho.

Digo “em princípio” porque estes jovens estão recebendo uma forte oposição dos abortistas et caterva espanhóis. A polícia inclusive chegou a pedir-lhes autorização para permanecerem em lugar público; e os tolerantíssimos paladinos da nova moral chegaram a propôr, no Twitter, que os jovens fossem estuprados enquanto dormiam (inclusive infectando-os com o vírus da AIDS) para que depois viessem falar de aborto, como pode ser visto nos printscreens que estão disponíveis aqui.

Ainda hoje, HazteOir.org publicou uma matéria sobre “a Batalha do Sol”, na qual traz uma curiosa história. Ao tomar conhecimento do acampamento, uma senhora de uns cinqüenta anos disse aos jovens: “Eu vou apoiá-los neste manifesto contra o aborto porque eu utilizo todos os métodos anticoncepcionais que existem, todos e ainda mais. Porque não se deve ficar grávida e é preciso fazer de tudo para que não se fique grávida, como eu; contudo, se ficar grávida, nada de abortar. E saibam que eu sou atéia, comunista e multi-orgásmica, mas nada de abortar”.

Estas lufadas de bom senso, no entanto, parecem infelizmente ser a minoria – pelo menos em se tratando das pessoas que assim se manifestam. Na Porta do Sol, as coisas seguem com a incrível civilidade tolerante dos abortistas; aliás, vale a pena ver de novo que… não há nada de novo debaixo do sol. E eu sigo acompanhando a hashtag #AcampadaVida. Que o Altíssimo proteja e recompense estes jovens; que Santiago combata ao lado deles; e que a Virgem Santíssima interceda pela Espanha.

Pais e Filhos modernos

Eu fique estupefato quando, na semana passada, soube que um pai estava tentando convencer um milhão de pessoas a “curtirem” a sua página no Facebook para que seu filho se chame “Jaspion”. Houve um caso, ainda pior, em que o sujeito prometera convencer a irmã a batizar o filho dela de “Megatron” – mas a irmã não o aceitou nem mesmo com o milhão de like’s alcançado. Neste momento em que escrevo, 268.143 já querem que um bebê Jaspion venha ao mundo. Ainda está bem longe do objetivo, mas eu não sei se é impossível; não duvido mais de nada.

Ainda na semana passada eu conversava com um amigo sobre um livro que lera há alguns anos: o Cien años de soledad de Gabriel García Márquez. Falávamos mais especificamente sobre a questão dos nomes. Para quem não leu, só um rápido esclarecimento: o livro conta a história de gerações e mais gerações de membros de uma família, os quais vão sendo, um após o outro, batizados de Aureliano Buendía e José Arcadio Buendía. Chega a ser difícil às vezes distinguir tantos personagens que têm o mesmo nome (veja-se, à guisa de exemplo, esta árvore genealógica).

Em um dado momento, já no fim do livro, os tataranetos (ou sei lá o quê) do primeiro “Aureliano” que aparece no livro – o Coronel Aureliano Buendía, que lutara e perdera 32 guerras na juventude – estão para ter um filho. Pretendem dar-lhe enfim um nome diferente dos nomes tradicionais da família (agora não lembro qual era – digamos, “Rafael”). Levam esta intenção até o último momento; contudo, quando nasce o menino e a mãe dele diz que vai se chamar Rafael, o pai pega o pequeno nos braços e sentencia: “não. Vai se chamar Aureliano Buendía, e vai ganhar 32 guerras”.

Eu nunca esqueci da cena, que é apoteótica. Imagem eloqüente da impotência humana diante da bênção (ou maldição) familiar, da completa incapacidade dos protagonistas frente à inexorabilidade do destino: “vai se chamar Aureliano Buendía”! E por que eu cito agora esta passagem do romance?

Porque é exatamente o oposto do garoto que quer pôr o nome de “Jaspion” no filho. Este, age com um desprezo ainda maior do que o dos personagens do romance espanhol que “só” queriam mudar o nome do filho de Aureliano para Rafael, renegando assim a família Buendía. Quem quer pôr o nome de Jaspion no próprio filho renega toda a humanidade, na qual aparentemente não existe uma única pessoa digna de admiração o bastante para legar um nome ao seu filho. Não há e nem houve jamais um único ser humano que mereça ser homenageado mais do que o super-herói japonês. Às nossas ruas e praças nós damos os nomes de pessoas ilustres; mas, aos nossos filhos (que valem infinitamente mais do que ruas e praças), damos nomes de robôs e de super-heróis. Nomes escolhidos não por nós mesmos, mas por desconhecidos que votam na internet.

As nossas civilizações católicas aprenderam a dar nomes de santos aos seus filhos [“meu filho vai ter / nome de santo… / Quero o nome mais bonito!”], confiando-lhes desde o berço à intercessão do seu Onomástico. Hoje, desejam confiá-los a fantasias de super-heróis japoneses… é triste. É outro sinal da ausência de referências na qual está imerso o mundo moderno, onde a “tradição” da ficção infantil é mais valiosa do que a tradição de toda a raça humana.

Jesus Christ in every book of the Bible

Esta eu vi no Contra o Aborto: um nada convencional ato litúrgico de adoração eucarística, quando um frade capuchinho – do nada – chegou no meio de uma praça em Preston (UK), pôs uma estola branca e elevou o Santíssimo que trouxera consigo, expondo-O ao povo que passava. Enquanto isso, uma outra pessoa recita um poema – Jesus Christ in every book of the Bible – e ao final de cada estrofe convida as pessoas a se ajoelharem diante d’Ele: come and kneel before Him now!

O texto (que pode ser encontrado no link acima, em inglês) é bonito: “o mundo não O pode entender, os exércitos não O podem derrotar. Os acadêmicos não O podem explicar e os líderes não O podem ignorar”. Aplausos do povo: “Ele é meu Redentor, Ele é meu Salvador, Ele é meu Deus, Ele é meu Sacerdote, Ele é minha alegria, Ele é meu conforto, Ele é meu Senhor e Ele guia minha vida”!

Às vezes eu penso que gestos assim fazem falta. Gestos públicos de adoração a Nosso Senhor. De catequese. De apologética. De convite à conversão e ao reconhecimento de que Deus é Deus, neste mundo secularizado onde vivemos. Gestos como os das primeiras ordens religiosas de frades pregadores, ou como os das santas missões que praticamente até ontem eram realizadas nas nossas cidades do interior. E, hoje em dia, estas coisas não são nem um pouco menos necessárias. É necessário ter a coragem de mostrar Cristo ao mundo!