Durante os dias da JMJ, a Antiga Sé do Rio de Janeiro ficou oficialmente sob os cuidados da Administração Apostólica São João Maria Vianney. A velha igreja se converteu, assim, em um cenáculo de espiritualidade católica tradicional, que pôde ser aproveitada pelos que lá passaram naqueles dias. Com missas diárias na Forma Extraordinária do Rito Romano (inclusive mais de uma ao mesmo tempo, nos altares laterais, como era costume antigamente) e catequeses ministradas por S. E. R. Dom Fernando Arêas Rifan, as atividades que lá se realizaram foram bastante proveitosas. E concorridas.
Pude estar presente em duas ocasiões. A primeira delas, na quarta-feira à noite, para participar do Pontifical que Dom Rifan celebrou. A igreja completamente abarrotada era uma coisa linda de se ver! Cheguei um pouco tarde e praticamente não havia mais espaço; inclusive um amigo desistiu de assisti-la ao ver como estava lotada a Antiga Sé. Entrando pelos corredores e salas internas, consegui sair lá na frente do lado esquerdo, próximo ao presbitério; a visão era péssima, mas havia lugar para ficar de pé e – principalmente – para ouvir com tranqüilidade.
Assisti ao Pontifical mesmo sem o ver. Participei do Santo Sacrifício sem contudo admirar os sinais externos tão ricos da cerimônia, castigado que fora por não ter chegado a tempo de conseguir um bom lugar. Mas foi espetacular mesmo assim. Não posso dizer que conheço em pormenores a celebração episcopal solene segundo os livros litúrgicos antigos: devo ter assistido somente a uns dois ou três pontificais na minha vida inteira. Naquela concorrida cerimônia da quarta-feira, contudo, aceitei contente que outras pessoas pudessem acompanhá-la com mais detalhes do que eu. Talvez tenha sido o primeiro Pontifical de alguém, e sabe-se lá quando aquelas pessoas terão a oportunidade de assistirem a outro novamente.
No dia seguinte eu voltei, e voltei de manhã cedo. Cheguei antes das nove, e Dom Rifan ainda não iniciara a sua catequese; tive tempo de encontrá-lo na sacristia e o cumprimentar. No interior da igreja, as músicas tradicionais animavam a multidão que já começava a se avolumar: provando que não é necessário fazer muito barulho para “acolher” a juventude, um órgão e um coral cantavam cânticos clássicos que eram alegremente acompanhados pelos que estavam presentes. Dessa vez, tendo chegado mais cedo, sentei mais confortavelmente num degrau que levava a uma capela lateral: os bancos já estavam todos ocupados.
Sua Excelência falou sobre o discipulado, explicando o étimo da palavra e dizendo que discípulos são aqueles que aprendem de alguém: a origem do termo é a mesma de “corpo discente”, o conjunto dos alunos de uma universidade. Um discípulo é portanto um aluno; um discípulo de Cristo, um aluno do Mestre. Vez por outra o bispo descia do presbitério para tocar alguma música no órgão, e era acompanhado animadamente e aplaudido com entusiasmo sempre que o fazia. Tudo acontecia em um clima suave e frutuoso: aqueles jovens recebiam doutrina sólida de uma forma leve, longe de ser cansativa.
Falando da SSma. Virgem, d’Aquela que soube aprender com perfeição do Seu Divino Filho, Dom Rifan nos instigava a recorrermos sempre à Sua maternal proteção. Guardei um ponto curioso da prédica. Lá pelas tantas, falando sobre a Virgindade Perpétua da Bem-Aventurada Virgem Maria, Sua Excelência lembrava que certas traduções antigas eram mais enfáticas sobre este assunto: elas, dizia ele, professavam a crença de que Cristo nascera “de Maria Virgem”, e isso era um pouco diferente (em ênfase, claro) de falar simplesmente que Ele nasceu “da Virgem Maria”. Porque a ordem das palavras às vezes importava. Afinal de contas, uma enxada cara era diferente de uma cara inchada. Escrito, o gracejo não tem o mesmo impacto de falado; mas dá para imaginar.
Meia hora antes da Missa, o senhor bispo franqueou a palavra aos presentes, abrindo uma sessão de perguntas e respostas. As perguntas, eram sobre assuntos os mais diversos, não necessariamente abordando o tema da catequese recém-findada. E perguntaram sobre a Missa e sobre interpretação bíblica, sobre a Presença Real de Cristo e sobre a possibilidade de se ser santo nos dias de hoje, sobre assuntos vários enfim. O bom bispo respondia com tranqüilidade: não era sempre possível proferir um tratado sobre aqueles temas, mas as sínteses que ele fazia eram preciosas. Penso que aqueles jovens devem ter saído satisfeitos. Não é sempre que os fiéis têm a oportunidade de interagir assim com o pastor.
Depois disso, a Santa Missa, dessa vez rezada: bem diferente do Pontifical da véspera, mas o mesmo Sacrifício de Cristo tornado presente de modo incruento sobre o altar. Findada a cerimônia, ainda me encontrei com Sua Excelência à porta da igreja, paramentado, cumprimentando os fiéis: despedi-me, agradecendo pela agradável manhã e dizendo-lhe não saber se conseguiria encontrá-lo ainda durante a Jornada.
De fato, não o encontrei mais, ocupado com o serviço de voluntário que a partir de então me deu pouca folga: mas aqueles dois dias foram muito bons. E quanto a tantas pessoas que puderam acompanhar com mais calma as atividades da Administração Apostólica na Antiga Sé do Rio de Janeiro… penso que devem ter sido muito edificadas. Rezo para que tenham sido.
Os que passaram naqueles dias por aquela velha igreja erigida em honra a Nossa Senhora do Carmo – nossa padroeira cá da Cidade do Recife – tiveram a oportunidade de presenciar atividades bem pouco usuais. Missas simultâneas, confissões, latim, órgão e coral, catequeses ministradas por um “bispo tridentino”, uma miríade de coisas antigas que muitos poderiam dizer já ultrapassadas, convivendo maravilhosa e harmoniosamente com os jovens peregrinos do século XXI que foram ao Rio de Janeiro para participar da Jornada Mundial da Juventude. Certas coisas antigas são sempre novas. Que aquela espiritualidade tradicional possa ter ajudado a alguns dos tantos – centenas! – de jovens que por lá passaram. Que a Santíssima Virgem do Carmo abençoe a cada peregrino que por lá passou naqueles dias. E que Ela olhe com maternal solicitude pela Administração Apostólica, por seu bispo, seu clero e seus fiéis. A todos os que dela fazem parte, nosso muito obrigado pela riqueza daqueles dias.
Olá amigo! Fiquei emocionado ao ler seu texto. Estive com mais 4 amigos, entre eles uma moça, assistindo às celebrações na Antiga Sé durante a Jornada. Participamos da Santa Missa na Forma Extraordinária do Rito Romano em nossa cidade, Santa Maria, no Rio Grande do Sul e nunca tínhamos participado de uma Pontifical. Quando escreveste “Talvez tenha sido o primeiro Pontifical de alguém, e sabe-se lá quando aquelas pessoas terão a oportunidade de assistirem a outro novamente.” parece que falaste diretamente a nós. Com toda certeza não será nossa última, mas que demorará para uma próxima… não há dúvida.
De nossa parte, estamos fazendo um esforço para divulgar a Missa celebrada em nossa cidade!
Salve Maria!