respondens autem Petrus et apostoli dixerunt obœdire oportet Deo magis quam hominibus
(Pedro e os apóstolos replicaram: Importa obedecer antes a Deus do que aos homens)
[Actus Apostolorum 5, 29]
Uma reportagem do Gazeta do Povo, jornal paranaense, anuncia o inexplicável: “a Diocese de São José dos Pinhais aconselha os padres a usar vinho sem álcool ou suco de uva natural nas missas”. A razão? A absurda Lei Seca. Segundo foi noticiado,
o clero foi liberado para usar suco de uva ou vinho sem álcool durante a missa, ao invés do vinho canônico tradicional.
E isso é ridículo. O clero não pode simplesmente ser “liberado” de utilizar o vinho na celebração da Santíssima Eucaristia! Retomando as lições básicas de teologia sacramental que parecem ter sido esquecidas: todo Sacramento precisa, para “acontecer”, de matéria, forma e ministro com a intenção de fazer o que faz a Igreja. E todos os sacramentos foram instituídos por Jesus Cristo, Nosso Senhor, pois somente Ele, que é Deus Encarnado, tem poder para “ligar” um sinal sensível aqui na terra a um efeito sobrenatural. Disto, decorre que absolutamente ninguém tem potestade para alterar aquilo que foi determinado por Cristo Nosso Senhor; nem mesmo o Papa, e muito menos a Diocese de São José dos Pinhais.
A matéria do Sacramento da Eucaristia é o pão de trigo (para o Corpo de Cristo) e o vinho de uva (para o Seu Preciosíssimo Sangue). De facto, assim prescreve a Instrução Redemptionis Sacramentum:
O vinho que se utiliza na celebração do santo Sacrifício eucarístico deve ser natural, do fruto da videira, puro e dentro da validade, sem mistura de substâncias estranhas [Cf. Lc 22, 18; Código de Direito Canônico, c. 924 §§ 1, 3; Missale Romanum, Institutio Generalis, n. 322.]. Na mesma celebração da Missa se lhe deve misturar um pouco d’água. Tenha-se diligente cuidado de que o vinho destinado à Eucaristia se conserve em perfeito estado de validade e não se avinagre. Está totalmente proibido utilizar um vinho de quem se tem dúvida quanto ao seu caráter genuíno ou à sua procedência, pois a Igreja exige certeza sobre as condições necessárias para a validade dos sacramentos. Não se deve admitir sob nenhum pretexto outras bebidas de qualquer gênero, que não constituem uma matéria válida [RS 50, grifos meus].
Não tenho certeza quanto ao vinho sem álcool (posto que a “desalcoolização” do vinho vai, certamente, deixar alguma quantidade ínfima de álcool presente, o que pode ser suficiente para a subsistência da matéria válida), mas o suco de uva não constitui matéria válida para a celebração da Santíssima Eucaristia. Ou seja: celebrar missa com suco de uva é a mesma coisa que celebrar missa com coca-cola, com suco de maracujá ou com cajuína: a Missa não é válida. Suco de maracujá não se transubstancia no Sangue de Cristo, e suco de uva também não. Este assunto é da mais alta gravidade – estamos falando da possibilidade dos fiéis católicos serem enganados com caricaturas de missas – e não pode ser menosprezado.
Vale salientar que existe um documento da Congregação para a Doutrina da Fé, assinado pelo então cardeal Ratzinger, que afirma ser o mosto matéria válida para a celebração da Eucaristia. Segundo a definição do próprio documento,
per mustum si intende il succo d’uva fresco o anche conservato sospendendone la fermentazione (tramite congelamento o altri metodi che non ne alterino la natura);
[por mosto se entende o sumo de uva fresco ou mesmo conservado, suspendendo-se-lhe a fermentação (através de congelamento ou de outro método que não lhe altere a natureza) – tradução livre minha]
E a wikipedia define mosto como sendo “o sumo de uvas frescas obtido antes que passem [pelo] processo de fermentação”. Ou seja: não se trata de “suco de uva” simpliciter, e sim de vinho (ainda) não fermentado. A natureza do mosto é a mesma do vinho; a do suco de uva, não é. Mosto é matéria válida para a celebração da Eucaristia; suco de uva, não é.
E tem mais: o citado documento da Congregatio Pro Doctrina Fidei diz que a utilização do mosto só é permitida nos casos em que o padre possui alguma doença (como alcoolismo) que lhe impeça o consumo de álcool mesmo em mínimas quantidades; não pode ser usado “a torto e a direito”. Temos, portanto, que
a) se a declaração da Pro Doctrina Fidei salvaguarda a validade da Missa celebrada com mosto, o mesmo não pode ser dito quanto à sua licitude, posto que as condições que permitem a utilização do mosto não se encontram presentes no caso atual de São José dos Pinhais; e
b) se, ao invés do mosto [que aliás não é citado uma única vez no jornal], for utilizado suco de uva normal, a missa é inválida mesmo.
O assunto é sério. E, ao lado do absurdo da tentativa de se modificar o que foi instituído por Nosso Senhor, tem uma parte da notícia que é menos grave, mas ainda muito preocupante:
Em 11 de julho, um padre não-identificado da região de Ribeirão Preto (SP) foi flagrado no teste do bafômetro. Após rezar uma missa, o padre seguia em direção a outra paróquia, para fazer mais uma celebração, mas foi parado pela Polícia Militar. Durante a cerimônia religiosa, o pároco havia ultrapassado os limites de vinho permitidos pela nova legislação – 0,1 miligrama de álcool por litro de ar expelido no bafômetro ou 2 decigramas de álcool por litro de sangue. O padre não recebeu as sanções devidas – multa, apreensão da habilitação e detenção – porque um Policial Militar o reconheceu e o liberou.
“Um padre tem direitos e deveres”, afirma Douglas Marchiori. “O soldado agiu errado nessa situação. Não se deve abrir exceções, as pessoas devem conhecer a lei e respeitá-las. Os padres não estão acima disso.”
Esta liberação é sensata, mas acontece que não está prevista na Lei e, portanto, não temos nenhuma garantia de que ela será aplicada sempre, ficando os padres à mercê do bom ou mau humor dos policiais que lhes abordarem; e isto, francamente, é um absurdo. E, para acabar de completar a desgraça, o tal “Douglas Marchiori” que afirmou ter o soldado agido errado é… diácono permanente da Diocese de São José dos Pinhais!!
Que São Pedro, o primeiro Papa, aquele que afirmou ser mais importante obedecer a Deus que aos homens, possa interceder por esta terra de Santa Cruz, para que os bispos brasileiros sejam fiéis ao seu sucessor, a fim de que, por causa de uma lei positiva absurda, uma Igreja Particular não venha a deixar de oferecer o Sacrifício Santo e Imaculado que é devido ao Deus Todo-Poderoso.
Eu já imaginava.
Seria o caso de entrar em contato com a Diocese em questão?
Paz e Bem!
Fabrício, pra mim é caso de entrar em contato com algum Dicastério Romano [a própria Congregação para a Doutrina da Fé, ou a Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos].
Mas, para isso, é preciso (i) ter a certeza exata do que está acontecendo na Diocese [vai que o Bispo liberou o mosto, e o jornal não diferenciou, e vai que o Bispo já consultou a Santa Sé e obteve resposta positiva na questão…], e (ii) de preferência fazer parte de lá.
Se tivéssemos alguém que faz parte da Diocese, já seria uma mão na roda…
Abraços, em Cristo,
Jorge
Em que tempos sinistros vivemos!!! Quando uma diocese tem a presunção de liberar os padres de celebrarem a Santa Missa com vinho, por mero respeito a uma lei positiva do estado, é sinal de que há algo de muito errado por aki!
É claro que a pergunta é meramente retórica, mas ONDE ESTÁ A CNBB QUE NÃO SE PRONUNCIOU SOBRE ESTA LEI??!!
Nao quero apimentar as coisas,mas,absurdos em sao jose ja é rotina,eu estou sendo vitima de preconceito na igreja catolica de um bairro humilde desta regiao,sou catolico desde quando nasci e esta igreja de sao jose pois em duvida minha integridade religiosa com a igreja,meu sobrinho caso nao apresente nesta semana um comprovante de frequencia ,apesar de eu apresentar o cherox da indentidade,certidao de comunhao e crisma e batizado,ele nao fará a crisma simplismente porque eu como padrinho sou de joinville sc ,por isso tanta burocrasia.
o comprovante de frequencia é o meu ,pra ilustrar mais ainda a piadinha deles, ja me sinto um marginal.
Sábia decisão. Vale ressaltar, ainda, que existem importantes estudos, realizados por respeitáveis teólogos e outros investigadores das Sagradas Escrituras, que demonstram, com argumentos sólidos e insofismáveis, que o Senhor Jesus utilizou o puro suco da uva, não o vinho fermentado, na celebração da Santa Comunhão. Ademais, fica aqui uma reflexão: se o pão, sem fermento, representa o corpo santo do Salvador, porque o vinho, fermentado, deveria representar o sangue imaculado do Filho de Deus? Seria, de fato, uma enorme contradição, um clamoroso contra-senso se a bebida alcoólica e que tanta desgraça causa, devesse simbolizar o sangue pelo qual teremos vida eterna.
Prezado Sandro,
O senhor é católico?
Em primeiro lugar, não existe um único estudo realizado por “respeitáveis teólogos” demonstrando que Nosso Senhor usou suco de uva. Só quem diz esse tipo de besteira são meia dúzia de dementes protestantes.
Em segundo lugar, a posição da Igreja é claríssima e insofismável, afirmando de maneira inequívoca que somente o vinho de uva constitui matéria válida para a celebração da Eucaristia (é também válido o mosto – que não é suco de uva -, mas sua utilização só é lícita em condições bem específicas).
Em terceiro lugar, o vinho não “representa” o Sangue de Cristo, e sim é o Sangue de Cristo.
Em quarto lugar, a bebida alcóolica não causa “tanta desgraça”. O que causa desgraça é o abuso que as pessoas fazem das bebidas alcóolicas.
Abraços, em Cristo,
Jorge Ferraz
Prezado Senhor Jorge Ferraz,
Minha intenção, ao postar o comentário que expressa a compreensão que tenho a respeito do assunto, pela luz que meu entendimento alcançou, não é o debate. Quanto à pergunta, se sou católico ou não, posso responder que não sou. Entretanto, também creio em Deus e amo ao Senhor Jesus e por Ele obtenho o dom da vida eterna. Se, todavia, você entender que não há espaço aqui para a manifestação de um “irmão separado”, entenderei e respeitarei sua vontade, de antemão pedindo desculpas. Agora, quanto a forma como você se expressa em relação aos estudos e teólogos que defendem o uso do suco de uva na Santa Comunhão, não direi uma só palavra em resposta, pois entendo que qualquer pessoa, com um mínimo de bom senso, sabe que nenhum pensamento, nenhuma tese, principalmente uma tão importante como esta de que estamos tratando, poderia ter uma só interpretação, uma só vertente, um só pensamento, ou seja, o pensamento que você defende. Sei que parece ingênuo, mas até mesmo uma simples pesquisa no “google”, já poderia indicar textos e bibliografias sobre o tema. Não manifeste, senhor Jorge Ferraz, orgulho de opinião, pois a verdadeira sabedoria reside unicamente em Deus, o único que não falha jamais.
Abraços e felicidades!
Sandro Carvalho
Se o senhor Sandro Carvalho citar algum desses “respeitáveis teólogos e outros investigadores das Sagradas Escrituras”, aí sim podemos começar a debater!
Caro Francisco,
Como disse, não desejo o debate. Entretanto, seguem referências a dois teólogos :
Samuele Bacchiocchi, Ph.D., Pontificia Universita Gregoriana
Professor Jubilado de Teologia e História Eclesiástica
Universidade Andrews, Berrien Springs, Michigan, EUA
Foi premiado com uma medalha de ouro pelo Papa Paulo VI.
Site com inúmeras obras de grande valor teológico:
http://www.biblicalperspectives.com/books/wine_in_the_bible/
http://www.biblicalperspectives.com/books/
Pedro Apolinário, foi Professor de Grego e Crítica Textual no Seminário Adventista Latino-Americano de Teologia.
Um exemplo de texto: http://www.nistocremos.net/2007/09/o-vinho-na-bblia.html
Quem desejar, certamente encontrará muito mais. Basta dedicar-se ao estudo sincero e perseverante.
Abraços e felicidades.
Sandro Carvalho
Concordo, com o Sandro. Sr. Jorge, não existe uma verdade ,a sua nem a de ninguém, tenho certeza que Jesus Cristo, não ficaria desapontado, dos padres usarem suco de uva, em vez de vinho , o que importa é a fé , as atitudes no dia a dia, o respeito ao ser humano, a paciência, a resignação, e principalmente saber, que não sabemos tudo , temos muito a aprender.
Marta,
<>
Esta sua afirmativa é uma verdade?
Marta,
“não existe uma verdade ,a sua nem a de ninguém”
Esta sua afirmativa é uma verdade?
Prezado sr. Sandro,
Sim, há espaço aqui para qualquer manifestação – evidentemente, contanto que seja mantido o nível mínimo de educação necessário – de qualquer pessoa; a minha pergunta foi porque o senhor não se identificou e a sua posição foi tão absurdamente contrária à Doutrina da Igreja (tema sobre o qual trata o post em questão) que eu precisava perguntar. Não foi minha intenção causar nenhuma espécie de mal-estar, e peço desculpas se o fiz.
Tanto o sr. Samuele Bacchiocchi quanto o blog que tu citaste são adventistas do sétimo dia. Pra ficar só em poucos exemplos, o texto do blog tem um gravíssimo erro lógico logo no início, ao dizer: “Se estas duas possibilidades antagônicas [a bênção e a maldição] provêm do vinho é fácil concluir que a Bíblia apresenta duas espécies distintas de vinho”, conclusão absolutamente descabida, pois as duas possibilidades antagônicas podem ser respectivamente decorrentes do uso e do abuso do vinho, que é a posição da Igreja. Ao nem mesmo considerar a interpretação mais óbvia das Escrituras, o texto perde completamente a credibilidade. Ademais, o texto mente grosseiramente ao dizer que “[t]odas as igrejas cristãs tradicionais conservam o costume de usar o vinho sem fermento para simbolizar o sangue de Cristo”, o que é completamente falso, pois todas as igrejas anteriores à Deforma de Lutero usam vinho com álcool e, mesmo dentro do protestantismo, esta posição nonsense de celebrar com suco de uva é francamente recente (tanto que calvinistas e luteranos, p.ex., usam vinho de verdade). Portanto, tais textos, longe de serem de grande valor teológico, são verdadeiros excrementos teológicos.
Não é necessário me alongar na demonstração disso, porque é evidente, e pode ser encontrado facilmente na internet (aqui, por exemplo).
Abraços, em Cristo,
Jorge Ferraz
O que vale é a fé que temos no coração e mais nda…
Creia em Deus acima de todas as coisas…
Se é suco de uva… vinho… água ou seja la o que for.. É Deus que se manifestará nesta santa ceia.
Debatendo com protestantes no Orkut chegamos a
seguinte conclusão:
Jesus usou vinho !!
Todas as citações do Novo Testamento se referem a vinho.
( não as coloco, pois são muitas).
Enquanto que, não há menção a “suco de uva”
A problemas principal relacionado refere-se a embriaguez, mas já é outro assunto.
Caríssimos:
Não há o espaço para debate acerca do tema “suco de uva” versus “vinho”. Estaríamos confrontando opiniões particulares com a definição inafastável – ao mínimo para católicos – da Igreja. Prosseguir no debate – ante a ilegitimidade de contestar a cátedra – é inócuo e absurdo, além de ferir, desnecessariamente, suceptibilidades.
Abraços a todos.
“Sim, há espaço aqui para qualquer manifestação – evidentemente, contanto que seja mantido o nível mínimo de educação necessário”.
“Só quem diz esse tipo de besteira são meia dúzia de dementes protestantes”.
Triste saber que existem cristãos assim, fala uma coisa, mas faz outra.
Sr. José Luiz,
Chamar os indivíduos que negam a utilização de Vinho na Santa Ceia de “dementes” é agir com muitíssimo mais educação do que eles merecem :-).
Abraços,
Jorge
Boa argumentação, meu querido! Porém, já parou para pensar naqueles sacerdotes que sofrem com a doença do alcoolismo?! Talvez não se trata apenas de “lei pela lei” o que está sendo tratado na igreja particular desta região, mas um olhar pastoral e zeloso para aqueles que padecem de um mal e têm de conviver com isso ao mesmo tempo que são pastores de um rebanho. Reflita.
Para os sacerdotes que sofrem com a doença do alcoolismo existe o MOSTO, que é vinho não-fermentado, conforme eu expliquei neste mesmo texto.
Nossa! Eu sou da Diocese de São José dos Pinhais, fiquei chocado!