C’est fini. Gaudete!

Saiu hoje o tão esperado Decreto da Congregação para os Bispos que cancela a excomunhão de Dom Bernard Fellay, Dom Bernard Tissier de Mallerais, Dom Richard Williamson e Dom Alfonso de Galarreta, os quatro bispos da Fraternidade Sacerdotal São Pio X que, em 1988, ao serem sagrados bispos sem mandato pontifício, incorreram em excomunhão latae sententiae – junto com Dom Marcel Lefebvre e Dom Antonio de Castro Mayer, que foram os bispos ordenantes. Foi publicado na Sala de Imprensa da Santa Sé (original em italiano) e traduzido para o português pelo Fratres in Unum.

Uno-me ao júbilo geral: Deo Gratias, et iterum dico, DEO GRATIAS. O momento é de grande alegria, de festa na Igreja, porque uma dolorosa situação que se arrastava já há vinte anos por fim terminou. Os bispos da São Pio X não estão mais excomungados. Podem agora militar ao lado da Igreja, e não mais medindo forças com Ela; podem dar a própria valiosa contribuição (muitíssimo bem vinda) para que Cristo vença, a Cruz impere, as almas sejam salvas, a Igreja seja exaltada, Deus seja glorificado. Gaudete, iterum dico, GAUDETE!

Alguns ligeiros comentários sobre o decreto que merecem ser feitos, na minha opinião, são os seguintes:

1) Foi Dom Fellay, em nome dos outros três bispos, quem escreveu ao Santo Padre para pedir a retirada da excomunhão. Os trechos desta carta que constam no decreto são animadores, capazes de inflamar as almas católicas com um santo desejo de lutar pela unidade da Igreja, pondo de lado todo orgulho e amor-próprio; falam em aceitar “os seus [do Papa] ensinamentos com ânimo filial”, e em “colocar todas as nossas forças a serviço da Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo, que é a Igreja Católica Romana”. Trata-se de uma mudança de postura dos líderes da São Pio X, que esperamos seja seguida pelos seguidores da Fraternidade: esperamos (e rezamos para) que o período das agressividades possa por fim dar lugar ao profícuo diálogo teológico sério.

2) O Santo Padre, “paternamente sensível ao desconforto espiritual manifestado por pelos interessados por causa da sanção de excomunhão, e confiando no compromisso expresso por eles na cidade carta de não poupar esforço algum para aprofundar as questões ainda abertas em necessárias conversações com as Autoridades da santa Sé, e poder assim chegar rapidamente a uma plena e satisfatória solução do problema existente em princípio”, resolveu aquiescer. O cancelamento das excomunhões é, portanto, um ato de “sensibilidade paternal” do Santo Padre, que confia no “compromisso expresso” na carta do Superior da Fraternidade. Não é o fim de todas as divergências, mas esperamos que seja o fim da situação irregular estéril. Que a Virgem Santíssima abençoe aos bispos da FSSPX, a fim de que consigam ser fiéis ao compromisso firmado.

3) A excomunhão não foi “declarada nula”, e sim “cancelada”. O final do decreto não deixa margens para as dúvidas: o que houve foi uma suspensão de uma sanção canônica existente. “[D]eclaro privado de efeitos jurídicos a partir do dia de hoje o Decreto então [em 1988] publicado”; é a partir de hoje, ex nunc, que os efeitos jurídicos da excomunhão deixam de existir. Permanece, portanto, e este decreto o diz expressamente, que havia uma situação irregular que – graças a Deus! – foi superada. Quanto aos dois bispos ordenantes, permanece o fato histórico de que morreram excomungados – que a Virgem, Janua Coeli, seja em favor deles – e não há sentido em se fazer uma “reabilitação póstuma” fazendo cessar a partir de agora os “efeitos jurídicos” que já foram cessados pela morte (pois é evidente que não há jurisdição da Igreja Terrestre no outro mundo).

4) Ainda há coisas que estão faltando; por exemplo, a situação jurídico-canônica atual da Fraternidade Sacerdotal São Pio X. Lembro-me de ter ouvido dizer que os bispos da Fraternidade gostariam de alguma coisa como uma Prelazia Pessoal, mais ou menos aos moldes do Opus Dei; mas o fato é que nada disso consta no Decreto que foi hoje tornado público. É de se esperar, então, que nos próximos dias sejam publicadas mais coisas sobre o assunto.

5) O momento é de alegria e de perdão; as feridas que certamente foram acumuladas ao longo dos anos em que perdurou a situação irregular obviamente não podem ser curadas por decreto pontifício, mas é momento de rezarmos e nos esforçarmos seriamente para, pondo de lado as divergências secundárias e perdoando as mágoas passadas, combatermos lado a lado pela exaltação da Santa Madre Igreja. O decreto é justo; afinal, existem hoje em dia muitos membro do clero que, a despeito de nunca terem sofrido sanções jurídicas no foro externo, afastam-se da Igreja – em suas posições – muito mais do que os membros da FSSPX jamais foram capazes de fazer. Oremus et pro unitate Ecclesiae; que o Espírito Santo possa nos iluminar a todos a fim de que, superando as divisões, alcancemos juntos a comunhão afetiva e efetiva com a Igreja de Cristo, que é a Católica Romana, fora da qual não se pode encontrar nem salvação e nem santidade.

Aborto e CTEHs, no Brasil e no mundo

– No Brasil: o número de abortos “com amparo legal” cresceu 43%. Vale salientar que não existe aborto com amparo legal, como (entre outras pessoas) o padre Lodi já mostrou muito bem. O que existe é o assassinato ilegal e imoral de crianças sendo praticado graças aos impostos pagos pelos cidadãos de bem e à sanha assassina do Ministro da Saúde et caterva. Rezemos pelo Brasil, a fim de que Deus tenha misericórdia e o sangue de inocentes derramado nesta Terra de Santa Cruz não atraia a justa ira do Todo-Poderoso.

– No mundo: Estados Unidos aprovam testes de CTEHs em humanos. A FDA autorizou que uma empresa na Califórnia fizesse testes (que devem começar “ainda no verão deste ano”) com dez pacientes, dos quais oito estão completamente paralisados. É estranho, porque há bem pouco tempo – em outubro do ano passado – a agência reguladora norte-americana havia recusado estes testes clínicos

A sra. Lygia Pereira, que encabeça o assassínio de embriões humanos tupiniquim, havia dito em setembro último: “agora já acho que no ano que vem teremos o primeiro teste clínico com células-tronco embrionárias no mundo”. Infelizmente, parece que a pesquisadora vai acertar no seu palpite. Que Deus tenha piedade dos Estados Unidos.

– Não sei se todos já leram o padre Lodi: cadeia para as mulheres que fazem aborto? Vale muito a pena, e é crucial que entendamos muito bem o jogo dos abortistas, nestes tempos em que a vida humana é tão atacada e o Governo Brasileiro está tão diligentemente empenhado na implantação, per fas et per nefas, a ferro e a fogo, do assassinato de crianças no Brasil. Que Nossa Senhora da Conceição Aparecida livre esta Terra de Santa Cruz da maldição do aborto.

Obama financia o aborto

[Original disponível no site da Catholic League

Fazemos eco ao que disse o presidente da Liga Católica: é bastante significativo que uma das primeiras atitudes do presidente norte-americano tenha sido justamente direcionar fundos federais para financiar o aborto. Esperamos que os católicos verdadeiros vejam isso, a fim de que não assistam atônitos e impassíveis ao genocídio silencioso.]

Obama financia o aborto

23 de janeiro de 2009

As notícias recentes dizem que o Presidente Barack Obama vai derrubar as restrições de financiamento de abortos [realizados] em alto mar [overseas] hoje. A política da Cidade do México, que negava financiamento federal para organizações privadas que fazem e promovem abortos, será rescindida por uma ordem executiva.

O presidente da Liga Católica, Bill Donohoue, informou-nos sobre esta decisão hoje:

“Eis que temos um presidente negro pegando dinheiro dos pagadores de impostos, em uma época de crise econômica, e entregando-o para organizações – muitas das quais são anti-católicas – a fim de que elas possam gastá-lo matando bebês não-brancos em países do Terceiro Mundo. E Obama é conhecido como um progressista.

Obama falou repetidas vezes que não é pró-aborto, e alguns católicos, babando [salivating] por um trabalho na sua administração, acreditaram nele. Ele está no cargo há apenas alguns poucos dias e uma das primeiras coisas que ele decidiu fazer foi financiar o aborto. Isto poderia ser equiparável [on a par with] a alguém que dissesse ser a favor do controle de armas e fornecesse fundos para a NRA [National Rifle Association]. De fato, ninguém gasta dinheiro para apoiar algo que ele realmente abomine. Em suma, é o tempo em que os grupos pró-aborto podem simplesmente dizer que, quaisquer que sejam as reservas que eles possam ter referente ao aborto (e alguns não têm nenhuma), elas [as reservas] estão compensadas [outweighed] pelo seu total apoio a ele.

Exatamente na Segunda-Feira passada, a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos tornou pública uma carta enviada para Obama pedindo-lhe que mantivesse a política do Estado do México. Obama tomou sua decisão, e nós esperamos que todo católico que é realmente pró vida entenda isso”.

Levantando as excomunhões…

Já faz algum tempo que vem sendo noticiado, no meio católico, que o Santo Padre Bento XVI estaria para levantar a excomunhão na qual incorreu Dom Marcel Lefebvre quando sagrou quatro bispos sem mandato pontifício há vinte anos. Nos últimos dias, no entanto, os rumores se intensificaram e, segundo o Fratres in Unum (reproduzindo Andrea Tornielli), já está consumado. A qualquer momento, será tornado público o histórico decreto.

É necessário fazer algumas precisões. Em primeiro lugar, é diferente “retirar as excomunhões” de “declarar a nulidade das excomunhões”; no primeiro caso, era uma pena canônica válida mais que foi retirada e, no segundo, uma pena canônica inválida (e os bispos excomungados nunca estiveram realmente excomungados). Não se sabe ainda qual é, exatamente, o teor do decreto. Pelo que comentam por aí, a FSSPX quer não quer simplesmente a retirada, e sim a declaração de nulidade. Esperemos e rezemos pelas negociações.

No entanto, o que foi publicado pelo Andrea Tornielli foi que o Papa havia assinado o decreto con cui (…) ha deciso di cancellare la scomunica comminata ai quattro nuovi vescovi ordinati da monsignor Lefebvre nel 1988. “Cancellare” é pouco preciso e não deixa saber o quê, exatamente, o Papa fará (ou já fez…); no entanto, a excomunhão cancelada é aquela aplicada sobre os quatro bispos atualmente vivos, ordenados em 1988, e não sobre Dom Lefebvre e Dom Antonio de Castro Mayer (os bispos ordenantes), já falecidos.

Vale salientar que, como lembrou muito bem um amigo, não se tem muito claro o que pode significar a “retirada”, propriamente dita, de uma excomunhão sobre alguém que já está falecido. O Papa não tem jurisdição sobre o outro mundo; a resposta à 82º tese de Lutero (Por que o papa não esvazia o purgatório por causa do santíssimo amor e da extrema necessidade das almas – o que seria a mais justa de todas as causas –, se redime um número infinito de almas por causa do funestíssimo dinheiro para a construção da basílica – que é uma causa tão insignificante?) é muito simples: simplesmente porque o Papa não tem jurisdição para “decretar” o esvaziamento do Purgatório, sendo a redenção das almas que lá estão realizada pelas boas obras dos fiéis católicos (no caso criticado por Lutero, as doações), e não por um decreto papal. Não é o “funestíssimo dinheiro” em si que redime as almas; e sim a obra de caridade dos fiéis de fazerem uma doação. O Papa não pode “esvaziar o Purgatório”. O que ele pode fazer é conceder indulgências (ou, melhor dizendo, “obras indulgenciadas”) para serem lucradas pelos fiéis defuntos.

Não sei portanto qual o sentido (e, aliás, nem sei se é possível) retirar, post-mortem, uma pena canônica. A própria morte já se encarrega de fazer com que elas não tenham mais razão de ser. Talvez exatamente por isso, o Tornielli fale somente sobre a retirada das excomunhões que (ainda) pesam sobre os quatro bispos vivos. Resta, no entanto, ainda uma dúvida: se o decreto, ao invés de retirar estas excomunhões, declará-las nulas, mesmo que o “alvo” do decreto seja somente os bispos vivos, ele estaria, ipso facto, atingindo também os dois bispos já falecidos, pois a nulidade da excomunhão dos ordenados implicaria igualmente na nulidade da excomunhão dos ordenantes [*].

Declarar a nulidade das excomunhões de 1988 seria dizer que João Paulo II errou em um ato de governo (pois o motu proprio Ecclesia Dei diz taxativamente que Lefebvre e os quatro bispos “incorreram na grave pena da excomunhão prevista pela disciplina eclesiástica”). Não há nada de escandaloso ou de absurdo nisso; atos de governo são atos de governo, sobre os quais não faz nem mesmo sentido falar em “infalibilidade”, estando esta circunscrita à autoridade magisterial da Igreja sobre assuntos referentes à Fé e à Moral. Não obstante, não muda o fato de que tais atos, emanados pela autoridade legítima, devem ser acatados, cabendo sem dúvidas recursos e negociações (o que não é possível, p.ex., na definição de um dogma), mas não sendo passíveis de mera desobediência unilateral.

Vale, por fim, frisar que, independente de qual seja o teor do histórico decreto (que rezamos para que seja tornado público o quanto antes), ele de maneira alguma significa referendar em sua totalidade as posições tomadas pela FSSPX, em particular no tocante ao Concílio Vaticano II e ao Novus Ordo Missae. Já antevendo o que pode advir desta retirada de excomunhões, importa deixar logo dito de maneira bem clara que o decreto significa somente o que vier decretado e nada mais. Como, mutatis mutandis, a aprovação pontifícia dos estatutos da Canção Nova não significa, de nenhuma maneira, um apoio irrestrito às práticas dos carismáticos, também este decreto que devemos conhecer muito em breve não significa “de per si” um apoio irrestrito a todas as teses da Fraternidade. Rezemos pelo Santo Padre, a fim de que esta Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos possa dar frutos, e as ovelhas desgarradas possam retornar ao redil, cum Petro et sub Petro, fora do qual nenhuma Unidade é possível.

Está consumado

Ontem foi a tomada de posse do presidente eleito dos Estados Unidos. Está consumado: o país mais poderoso do mundo tem, agora, um presidente abortista. Há quem reclame (aliás, quase todo mundo) que eu insisto demasiado no assunto, que é bobagem ficar olhando somente para um aspecto do programa de governo do sr. Obama, que as pessoas precisam fazer algumas concessões se quiserem chegar ao poder e blá-blá-blá. Acontece que não dá para ser diferente, porque este “pequeno detalhe” da gestão Obama é o detalhe mais importante de todos. Como confiar no discernimento moral de um sujeito que defende o assassinato sistemático de crianças por suas próprias mães? Já citei aqui Madre Teresa, segundo a qual o maior inimigo da paz é o aborto, porque, se dissermos para uma mãe que ela pode matar o próprio filho, não poderemos dizer às pessoas que elas não podem se matar umas às outras. E isso é lógico. Do mesmo modo, se o homem mais poderoso do mundo diz que as crianças podem ser assassinadas por suas mães… que garantia pode haver para o resto das decisões que ele será capaz de tomar? Como confiar num sujeito que promove o assassinato de crianças inocentes? Se o seu senso moral falha numa coisa tão crucial, como garantir que não vai falhar também em outras coisas?

Por isso que o aborto não é somente “uma” questão. É a questão. Dela dependem todas as outras, pelo duplo motivo de que (1) ela evidentemente precisa ser tratada com a máxima prioridade e (2) descuidar dela faz com que nada garanta o cuidado com todas as demais; afinal, por que motivo alguém que despreza as coisas mais importantes estaria imune ao desprezo daquelas que são menos importantes?

Defender o aborto é um indicativo infalível de se ter um senso moral radicalmente defeituoso. Isso não significa necessariamente que os abortistas sejam pessoas sem moral alguma; mas significa, sim, infalivelmente, que o senso moral destas pessoas tem um sério problema. É lógico que não merece confiança alguém que despreze a vida humana; as pessoas que me acusam de não olhar para as qualidades do presidente recém-empossado não percebem esta coisa tão evidente. Um senso moral sem bases sólidas pode ruir a qualquer momento: defender o crime do aborto é não ter solidez alguma na sua base moral.

* * *

Curiosa a reação nonsense da mídia à posse do presidente abortista; a tradução para o português deste artigo do New York Times aponta bem a concepção que virou senso-comum do messianismo obamista: o discurso de posse de Barack Obama foi um repúdio enérgico à era de George W. Bush e uma promessa de conduzir os Estados Unidos a “uma nova era”, com a reforma dos valores do período anterior. Com muita propriedade criticou o Reinaldo Azevedo (grifos no original):

Quem ouviu ou leu o discurso de Obama e prestou atenção a seus comentadores fica com a impressão de que, ontem, teve termo uma ditadura e se inaugurou nos Estados Unidos o regime democrático. E, no entanto, Bush pegou o helicóptero, depois o avião e se mandou para seu rancho no Texas. Ao longo de seus oito anos de mandato, vejam que coisa, o Congresso mais poderoso do mundo jamais deixou de funcionar — parte do tempo com maioria democrata. Não gostaria de deixar ninguém chocado, especialmente aqueles que foram às lágrimas, mas a democracia americana esteve vigilante durante todo esse tempo.

[…]

ELE VAI MUDAR TUDO NUMA SUPOSTA VELHA ORDEM A SER VENCIDA QUE, NÃO OBSTANTE, DEU À LUZ O DEMIURGO DA NOVA ORDEM.

Quando existe uma campanha tão vasta de desinformação em torno de um acontecimento contemporâneo, não sei o que se pode esperar. Se é triste  e não raro trágico para um povo ignorar o seu passado, quanto mais ignorar a sua história presente…? Que Deus tenha misericórdia dos Estados Unidos.

“Provavelmente, não existe motorista”

Esta eu vi no Fratres in Unum e é muito boa. Refere-se à campanha ateísta que começou recentemente – mas que já havia sido noticiada há algum tempo – na Grã-Bretanha, composta de slogans nos ônibus dizendo (tradução livre) “Provavelmente, Deus não existe”:

Provavelmente, não existe motorista.

Grã-bretanha. Segundo a rádio britânica (“Britische Rundfunk”), o motorista crente Ron Heather de Southampton, em Südengland, negou-se a dirigir um ônibus público com um slogan ateísta. Ao entrar em serviço, Heather viu o seguinte anúncio publicitário no ônibus: “Provavelmente, Deus não existe. Pare de se preocupar e desfrute a sua vida”. O motorista explicou ao seu chefe que não conduziria o ônibus e foi para casa.

Excelente.

As armas na defesa da Verdade

Recebi aqui no blog alguns comentários referentes à forma segundo a qual é lícito ao cristão travar os seus debates em defesa da Verdade. Em particular, foi atacada uma característica que sempre esteve presente na história da Igreja, que é a ironia direcionada contra os inimigos de Deus. Cabe, portanto, perguntar se é lícito ao cristão utilizar-se de ironia para defender a Deus e a Santa Igreja. A questão precisa ser analisada com um pouco de atenção.

Comecemos pelo Catecismo da Igreja Católica; o único momento em que ele fala sobre “ironia” é no parágrafo seguinte:

2481. A jactância ou vanglória constitui um pecado contra a verdade. O mesmo se diga da ironia que visa depreciar alguém, caricaturando, de modo malévolo, um ou outro aspecto do seu comportamento.

A ironia é, portanto, um pecado contra a Verdade. Mas cabe-nos ainda perguntar: isto se aplica a toda espécie de ironia? Ou ainda: a quê, exatamente, refere-se o catecismo quando coloca a ironia como sendo um pecado contra a Verdade?

Santo Tomás de Aquino também fala sobre a ironia na Suma Teológica (Secunda Secundae, q. 113). Para o Doutor Angélico, no entanto, a ironia é aquela coisa “pela qual alguém finge ser menos do que é na realidade”. E ele distingue a ironia que respeita a Verdade daquela que A falseia; esta última é sempre pecado mas, a primeira, não é pecado em si. Parece-nos, todavia, que ainda não é bem este o sentido da palavra que nós estamos buscando.

Sejamos um pouco mais insistentes e mergulhemos com mais afinco nos escritos do Aquinate. Em outro lugar da Summa, falando sobre a “burla” (Secunda Secundae, q.75) e principalmente sobre a “contumélia” (Secunda Secundae, q. 72), encontramos Santo Tomás falando de algo que se assemelha mais àquilo sobre o qual estamos tratando; esta última, aliás, refere-se justamente às injúrias verbais e, salvo melhor juízo, a “ironia” que nós estamos procurando encaixa-se justamente aqui. Santo Tomás nos ensina que “nos pecados de palavras parece que deve considerar-se, sobretudo, com que intenção se pronunciam as palavras. (…) [S]e alguém pronuncia palavras de insulto ou de contumélia contra outro, mas sem intenção de desonrá-lo, e sim para corrigi-lo ou por outro motivo similar, não profere um insulto ou contumélia formal e diretamente, senão acidental e materialmente. (…) Por isso, isto pode ser algumas vezes pecado venial e outras vezes nem sequer haver pecado” (II-IIae, q.72, a.2).

Isso nos explica melhor o sentido do parágrafo 2481 do Catecismo; a ironia que é pecado contra a Verdade é aquela “que visa depreciar alguém”, que é feita “de modo malévolo”. Se, ao contrário, for usada no meio dos embates apologéticos, com o intuito de defender a Verdade e condenar o erro, para desmascarar os sofismas levantados contra Deus e expôr ao ridículo os inimigos da Santa Igreja, então a ironia pode ser não apenas lícita como também meritória. E, desta boa aplicação da ironia, há abundantes exemplos na História da Igreja.

Uma das passagens bíblicas que melhor ilustra isso encontra-se no Primeiro Livro dos Reis. Elias fez um desafio aos profetas de Baal: tanto um quanto outros colocariam um novilho sobre uma pilha de lenha, e invocariam, estes Baal, aquele o Senhor. O Deus que respondesse seria o verdadeiro Deus. Os sacerdotes de Baal foram os primeiros a fazer a prova. Após gritarem pelo ídolo pagão durante a manhã inteira sem obterem resposta, Elias começou a zombar deles:

Sendo já meio-dia, Elias escarnecia-os, dizendo: Gritai com mais força, pois (seguramente!) ele é deus; mas estará entretido em alguma conversa, ou ocupado, ou em viagem, ou estará dormindo… e isso o acordará. [1Rs 18, 27]

E eles gritaram. “Mas não houve voz, nem resposta, nem sinal algum de atenção” (v. 29). Foi quando Elias preparou um altar, e invocou o nome do Senhor, e então “o fogo do Senhor baixou do céu e consumiu o holocausto, a lenha, as pedras, a poeira e até mesmo a água da valeta” (v. 38). Elias debochou duramente dos seguidores de Baal, expondo-os ao ridículo diante do povo de Israel; depois disso, clamou ao Senhor e foi escutado.

E os santos que se envolveram em polêmicas foram por muitas vezes ácidos e irônicos. Existe um escrito de São Jerônimo que, na minha opinião, todos os católicos deveriam ler e reler: trata-se do Tratado da Virgindade Perpétua da Santíssima Virgem. Foi uma polêmica que o santo travou com um herege chamado Helvídio, que negava a Virgindade de Maria Santíssima. Já nas primeiras linhas da obra, São Jerônimo deixa claro qual é o seu estilo:

1. Há algum tempo, recebi o pedido de alguns irmãos para responder a um panfleto escrito por um tal Helvídio. Demorei para fazê-lo, não porque fosse tarefa difícil defender a verdade e refutar um ignorante sem cultura, que dificilmente tomou contato com os primeiros graus do saber, mas porque fiquei preocupado em oferecer uma resposta digna, que desmoronasse os seus argumentos.

Havia ainda a preocupação de que um discípulo confuso (o único sujeito do mundo que se considera clérigo e leigo; único também, como se diz, que pensa que a eloquência consiste na tagarelice, e que falar mal de alguém torna o testemunho de boa fé) poderia passar a blasfemar ainda mais, caso lhe fosse dada outra oportunidade para discutir. Ele, então, como se estivesse sobre um pedestal, passaria a espalhar suas opiniões em todos os lugares.

Também temia que, quando caísse na realidade, passasse a atacar seus adversários de forma ainda mais ofensiva.

Mas, mesmo que eu achasse justos todos esses motivos para guardar silêncio, muito mais justamente deixaram de me influenciar a partir do instante em que um escândalo foi instaurado entre os irmãos, que passaram a acreditar nesse falatório. O machado do Evangelho deve agora cortar pela raiz essa árvore estéril, e tanto ela quanto suas folhagens sem frutos devem ser atiradas no fogo, de tal maneira que Helvídio – que jamais aprendeu a falar – possa aprender, finalmente, a controlar a sua língua.

Não é um exemplo isolado. De muitos que poderiam ser citados, também Santo Ireneu, quando atacava os gnósticos do seu tempo, não tinha melindres sentimentalistas e lançava-se com ardor à batalha que precisava travar para defender a Sã Doutrina:

Vejamos agora as inconstantes doutrinas deles [dos gnósticos]. São duas ou três, e como falam de forma diferente sobre as mesmas coisas e, servindo-se de nomes iguais, indicam objetos diferentes.

[…]

Outro ilustre mestre deles, dotado de gnose mais sublime e profunda, expõe assim a primeira Tétrada: existe, antes de todas as coisas, um Pró-princípio pró-ininteligível, inexprimível e inominável que chamo Unicidade. Com ele está uma Potência que chamo Unidade. Estas, Unicidade e Unidade, que são uma coisa só, emitiram, sem emitir, um Princípio inteligível, ingênito e invisível, ao qual dou o nome de Mônada. Com esta Mônada está uma Potência da mesma substância, que chamo Um. Estas Potências, isto é, Unicidade e Unidade, Mônada e Um emitiram os restantes Eões.

Ha! he! ah! ah! Valem estas exclamações trágicas diante desta audácia em inventar nomes e aplicá-los despudoradamente a esta mentirosa invenção. Com efeito, quando diz: Existe antes de todas as coisas um Pró-princípio pró-ininteligível que chamo Unicidade e com ele está uma Potência que chamo Unidade, mostra claramente que são ficção todas as palavras que pronunciou e que deu a estas ficções nomes que ninguém antes dele lhes deu. Se não tivesse esta ousadia, segundo ele, ainda hoje a verdade estaria sem nome. Por isso, nada impede que outro qualquer, ao tratar deste assunto, use estes nomes: Existe certo Pró-princípio soberano pró-esvaziado-de-inteligibilidade, pró-esvaziado-de-substância e Potência pró-pró-dotada-de-esfericidade, que chamo Abóbora. Junto com esta Abóbora coexiste uma Potência que chamo Super-vacuidade. A Abóbora e a Super-Vacuidade, sendo um só, emitiram sem emitir um Fruto visível de qualquer lugar, comestível e saboroso, ao qual dou o nome de Pepino. Junto com este Pepino existe uma Potência da mesma substância, que chamo Melão. Estas Potências, isto é, Abóbora e Super-vacuidade, Pepino e Melão emitiram a multidão restante dos Melões delirantes de Valentim. Com efeito, se é necessário ajustar a fala comum à primeira Tétrada e se cada um escolhe os nomes que quer, o que impede usar estes nomes muito mais inteligíveis, usuais e conhecidos de todos?
[Santo Ireneu, Contra as Heresias, Livro I, Parte II, 11,1-11,4]

Ora, se os santos – que nos são propostos pela Igreja como modelos de virtude – souberam atacar virulentamente os inimigos da Igreja, como poderemos sustentar que a ironia seja algo de mau em si? Como pode a ironia ser contra a caridade, se tantas pessoas piedosas e tementes a Deus souberam utilizá-la tão bem? Na verdade, o bom católico não tem o sentimentalismo piegas que parece ser característica dos nossos dias. O verdadeiro católico é um soldado de Cristo, é uma alma corajosa, dotada de fibra e de zelo na defesa da Fé e na exaltação da Igreja de Nosso Senhor. O bom católico sabe – à imitação dos santos – agir com dureza quando estão em jogo coisas importantes. O bom católico, como no lema de São Bento, ora et labora: reza, como na Ladainha de todos os Santos, a fim de que os inimigos da Igreja sejam humilhados (ut inimicos Sanctae Ecclesiae humiliare digneris – Te rogamus, audi nos!) e trabalha, com afinco, para que a Verdade triunfe sobre os erros e sejam desmascarados os inimigos de Deus. Inclusive utilizando-se da ironia, se necessário for, ad Majorem Dei Gloriam. Note-se que ninguém está obrigado a ser irônico; mas aqueles que souberem, quiserem e puderem sê-lo, não precisam ficar com escrúpulos de consciência. A ironia não é condenável em si mesma.

Obviamente, é necessário haver parcimônia; claro que a ironia pode por vezes degenerar em deboche grosseiro, em agressão gratuita, e pode se transformar sim em falta de caridade. Além do mais, o tom irônico não dispensa os argumentos, como é óbvio, sob a gravíssima pena de ser contraproducente. Mas – e isso é o mais importante aqui – nem toda ironia é falta de caridade, e é lícito empregá-la na defesa de Nosso Senhor. Que a Virgem Santíssima nos faça católicos de fibra; e que os santos nos ensinem a fugir do “politicamente correto”, sabendo reconhecer o valor e a importância de dedicar-se com zelo ao Bom Combate que todos nós somos chamados a travar.

O disfarce dos lobos

Vindo sabe-se lá de qual recôndito do inferno, um certo “Anjo” apareceu aqui no Deus lo Vult! para defender o indefensável e contrariar a Igreja de Nosso Senhor no tocante ao homossexualismo. Lançando mão de um vazio jogo de palavras e citando “autoridades” desconexas da Igreja e a Ela frontalmente contrárias, pretende este sujeito ter autoridade de ensino e pregar a própria moral à margem da Moral Católica, apresentando-a no entanto como se fosse a mais pura expressão do Cristianismo.

A coerência é em si uma virtude, que se pode encontrar também entre aqueles que não cerram fileiras com a Igreja de Cristo. É coerente que um homossexual, que não queira renunciar aos seus maus hábitos, opte por não ser católico; no entanto, é profundamente indignante quando este homossexual, não contente em ter a sua própria concepção de mundo, quer negar à Igreja o direito de ter a Sua e, por meio de um palavrório vazio, tenta obscurecer a clareza da posição católica sobre o assunto e apresentar o anti-catolicismo como se catolicismo fosse. As “Católicas Pelo Direito de Decidir” fazem, sobre o tema do aborto, a mesmíssima coisa que o tal site da “Diversidade Católica” faz sobre o tema do homossexualismo: ambos os grupos de pessoas apresentam a própria visão de mundo (clara e insofismavelmente contrária à católica) como se fosse a visão da Igreja. Urge desmascarar os mentirosos.

O tal “Anjo” citou um artigo (desgraçadamente, da autoria de um padre) chamado “Eles também são da nossa estirpe”, publicado numa revista da Vozes da década de 60, no qual é apresentada uma “teologia” (i)moral completamente independente e destoante da Teologia Moral Católica. Convém insistir: uma coisa é a apresentação das próprias idéias como sendo próprias, e outra muito diferente é apresentá-las indevidamente como se fossem de outrem. Neste último caso, é fraude e engodo. É exatamente o que o padre Jaime Snoek faz no artigo citado.

Separemos desde logo os termos: a mera atração sexual por pessoas do mesmo sexo não é, em si, pecado. Quer isso seja chamado de “inclinação desordenada”, quer de “homofilia nuclear”, quer de “homossexualidade” [reservando “homossexualismo” para as relações sexuais], ou qualquer outra coisa. A nomenclatura utilizada para designar a coisa não muda a coisa em si; e, dentro do que ensina a Igreja, é muito clara a diferença entre “sentir” e “consentir”, não sendo passíveis de moralidade os atos que são involuntários. Não precisaria, portanto, o reverendíssimo sacerdote gastar tanto tempo na definição e utilização de termos estranhos ao leitor mediano, quando poderia simplesmente dizer as coisas de modo direto e acessível a todas as pessoas. Aliás, vale salientar que as discussões sobre a origem da “homofilia” e sobre as diferentes designações que manifestações distintas dela podem receber não têm nada a ver com o ponto em litígio, que é a licitude moral dos atos anti-naturais.

O que realmente interessa no artigo vem a partir da página 797, sob o título de “A Homofilia Perante a Moral”. Para fugir da clareza cristalina da posição católica e torcer a evidência das Escrituras e da Tradição, o pe. Snoek tergiversa sobre três sub-tópicos: a Bíblia, a Atitude das Igrejas e a Reflexão Teológica. Não se sabe qual dos três é mais digno de lástima.

Sobre a Bíblia, o problema é muitíssimo evidente, porque quem detém autoridade para a interpretação das Escrituras Sagradas é a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo, e ponto final. Torcendo de maneira absurda os mais claros textos escriturísticos, quer do Antigo Testamento, quer das Epístolas de São Paulo, ao final das contas o que o pe. Snoek faz é, simplesmente, expôr a sua própria e particular interpretação (não importa se referendada por fulanos ou sicranos, é mesmo assim interpretação particular pelo simples fato de não ser interpretação da Igreja). Não é necessário entrar no mérito da validade das suas interpretações, até porque isso não é possível, pois ou se reconhece uma autoridade capaz de dar a última palavra, ou haverá tantas interpretações quanto cabeças interpretantes. Basta mostrar que a interpretação da Igreja – única intérprete autorizada das Escrituras Sagradas – difere radicalmente da interpretação proposta pelo artigo da revista da Vozes. Citemos o Catecismo:

2357 A homossexualidade designa as relações entre homens ou mulheres, que experimentam uma atracção sexual exclusiva ou predominante para pessoas do mesmo sexo. Tem-se revestido de formas muito variadas, através dos séculos e das culturas. A sua génese psíquica continua em grande parte por explicar. Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves a Tradição sempre declarou que «os actos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados». São contrários à lei natural, fecham o acto sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afectiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados.
[Catecismo da Igreja Católica, 2357]

Mais claro, impossível. Para a Igreja, a Sagrada Escritura “apresenta [os atos de homossexualidade] como depravações graves”. Para o pe. Snoek, no entanto, parece ser “bastante claro que estas proibições [entre elas, “a severa condenação da homofilia”], no seu contexto, foram inspiradas pela idéia de pureza cultural, abolida pela Nova Lei”. São portanto duas posições contrárias e inconciliáveis. É, aliás, revelador que o artigo em análise cite o Catecismo Holandês, ao invés do Romano, para justificar a sua posição injustificável: fica, portanto, evidente que a posição do pe. Snoek não está de acordo com a posição da Igreja de Roma. Que se apresentem teorias escabrosas e imorais, vá lá, toleremos; mas não queiram enganar os incautos, fazendo crer que tais teorias são referendadas pela Igreja de Cristo.

Sobre a Atitude das Igrejas, incrivelmente, o autor do texto vai buscar a atitude das… igrejas protestantes! Uma única palavra retirada da Tradição da Igreja, dos escritos dos Padres, dos Decretos dos Concílios Ecumênicos, dos documentos papais, nada disso consegue o pe. Snoek aduzir em favor da sua tese. E é óbvio que não consegue, porque ela – como já foi dito – é radicalmente incompatível com o Cristianismo. Estranho que este padre queira apresentar as suas conclusões estapafúrdias como sendo católicas; baseando-se na livre-interpretação das Escrituras Sagradas e citando atitudes de igrejas protestantes, deveria o reverendíssimo sacerdote ser coerente com a sua argumentação e abraçar o protestantismo. No entanto, prefere disfarçar-se de católico para, assim, enganar mais pessoas e arrastar mais almas para longe do estreito caminho que conduz à Salvação.

Haurindo as suas premissas de fontes tão lamacentas, o que se poderia esperar da Reflexão Teológica que propõe o sacerdote? Nada além de falsas conclusões oriundas de falsas premissas, de desprezo ao ensino do Magistério da Igreja e de descalabros completos – não tenho mais fôlego para comentar, e isso só iria tornar este post (ainda mais) maçante. É suficiente ter bem claro que as posições defendidas pelo padre Jaime Snoek em particular e pelo site “Diversidade Católica” em geral estão em franca oposição à Moral da Igreja, e imagino que isso já tenha ficado mais do que evidente. Movido por um sentimento (justo) de compaixão para as pessoas que sofrem de problemas homossexuais, esforça-se contudo o pe. Snoek não para libertá-las de seu pecado, e sim para aprisioná-las ainda mais nos seus maus hábitos, ensinando-as não a lutarem contra as tentações, mas a se entregarem de maneira vil a elas. Assusto-me ao imaginar o mal que este tipo de atitude pode causar: ao invés de reconduzir as ovelhas desgarradas aos prados verdejantes, esforça-se o lobo vestido de pastor para convencer as ovelhas que é uma coisa muito boa viver cercada por lama nos pântanos e charcos do mundo.

Errando o alvo

Acho que tenho um amigo que é fã do Carlos Cardoso, sobre quem eu já teci alguns ligeiros comentários aqui. Vira e mexe, ele me manda algum post provocativo que dá vontade de comentar. As mais das vezes, declino. No entanto, preciso tecer umas rápidas linhas sobre um post da semana passada, sobre pecado e confissão.

O Cardoso fez uma lista dos pecados que só podem ser “perdoados pelo Papa em pessoa” – é o que chamamos de reservados à Sé Apostólica. Com o perdão do trocadilho, é preciso precisar. Em primeiro lugar, o que é reservada é a excomunhão e não o pecado; nunca ouvi falar em “pecado reservado à Sé Apostólica”, e sim em “excomunhão reservada à Sé Apostólica”. Em segundo lugar, a lista está pelo menos parcialmente incorreta; falta a Sagração Episcopal sem mandato pontifício (o caso, p.ex., de Dom Lefebvre – vide o motu proprio Ecclesia Dei), a agressão ao Sumo Pontífice não precisa ser “tentar assassinar” (é qualquer agressão física), e eu nunca ouvi falar nesta última que fala sobre o impedimento à ordenação sacerdotal (se bem que é verossímil, e eu posso estar enganado).

Terceiro lugar, e mais importante: o Cardoso fica escandalizado porque profanar a Santíssima Eucaristia faz incorrer em excomunhão reservada à Sé Apostólica e matar uma pessoa, não. Mas aí ele comete a grossíssima besteira de julgar a Igreja sob as convicções dele próprio. Acho razoável que este sujeito – que eu não sei quem é – não acredite no dogma católico da transubstanciação; o que não é razoável e nem honesto, sob nenhuma ótica, é transpôr a não-crença dele para as penas canônicas da Igreja Católica.

Todo mundo sabe que os católicos acreditam que a Eucaristia não é “um pedaço de pão”, e sim o Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem. Portanto, quando a Igreja estabelece uma pena para quem profanar a Eucaristia, evidentemente não está punindo quem faltar com o respeito devido para com “um pedaço de pão”, e sim quem faltar com o respeito devido ao Deus substancialmente presente sob as espécies do pão e do vinho. Acho razoável e perfeitamente normal que o Cardoso não acredite nisso, mas não é razoável que ele critique “a escala de valores desse pessoal” falseando aquilo no que “este pessoal” acredita. É um grosseiro erro de alvo.

Criticar a escala de valores de alguém evidentemente só faz sentido se se estiver criticando os valores deste alguém da forma como ele próprio os entende, e não como um estranho os concebe. O senso de proporções dos católicos está perfeito e intacto – afinal, o que é mais precioso (o Corpo de Deus) é mais severamente protegido, e não há nada mais natural do que isso. O que não está intacta é a “pontaria” do Carlos Cardoso. Se ele fosse criticar o dogma católico, a despeito de não conseguir, ao menos o seu esforço intelectual faria sentido. No entanto, criticando os valores católicos por algo que eles não são, ele só consegue mostrar-se incapaz de perceber até mesmo o conteúdo daquilo sobre o qual se propõe a falar.

Abusos Sexuais, Guerra de Israel, Lar Homossexual

Três comentários ligeiros:

– Sabe quando você lê alguma coisa e tem certeza absoluta de que é mentira? Foi a minha sensação ao ver esta notícia do Estado de São Paulo que diz que “[o] arcebispo de Santo Domingo, capital da República Dominicana, Nicolás de Jesús López, afirmou que roupas decotadas e mini-saias, por exemplo, provocam os homens, e por isso acusou as mulheres de serem culpadas pelos abusos de que são alvo”. Que as roupas inadequadas das mulheres são uma tentação para os homens, é evidente; mas daí a dizer, como na manchete, que as “mulheres são culpadas [pelos] abusos sexuais” que sofrem vai uma distância enorme, que ultrapassa de longe qualquer margem de equívoco de interpretação possível e só é explicável por uma tremenda má-fé. Desafio qualquer um a trazer aqui o texto completo do discurso do arcebispo de Santo Domingo, para vermos se Sua Excelência disse realmente o que o Estadão disse que ele disse.

– Israel está unido, como eu comentei aqui em outra ocasião; vi uma notícia ontem segundo a qual uma manifestação de judeus pela paz em São Paulo aprova a ação de Israel. Enquanto tem gente até chamando os israelenses de nazistas (!!), é bom saber que os próprios judeus sabem o que está em jogo. Rezemos pelas crianças da faixa de Gaza.

– No blog do professor Felipe Aquino: testemunho de uma mulher criada por um homossexual. Vale a pena ler. Excerto:

“Mais de duas décadas de exposição direta a estas experiências estressantes causaram insegurança, depressão, pensamentos suicidas, medo, ansiedade, baixa auto-estima, insônia e confusão sexual. Minha consciência e minha inocência foram seriamente danificadas. Fui testemunha de que todos os outros membros da família também sofriam”, sustenta Stefanowicz.