O Haiti e os castigos de Deus

Discute-se se o terremoto do Haiti foi um castigo de Deus. Dividem-se os opinantes: não, Deus não castiga; sim, é por causa do vodoo praticado pelo povo. Obviamente, há outras opiniões mais sensatas; estas duas, no entanto, são simplórias demais e, na minha opinião, devem ser desconsideradas.

Quanto à primeira, é óbvio que Deus castiga. As Escrituras estão repletas de exemplos: do Dilúvio passando pela destruição de Sodoma e Gomorra, até os egípcios morrendo afogados no Mar Vermelho e outros episódios menos conhecidos. Não é possível ao católico simplesmente dizer “Deus não castiga”, porque isso é contrário ao que se sabe ter ocorrido ao longo da história da Salvação.

Obviamente, o castigo de Deus não é um mal absoluto, porque Deus não pode querer o mal em si. Santo Tomás de Aquino explica isso na Summa, II-IIae, q. 19, a.1 (tradução livre):

Em verdade, de Deus pode-nos sobrevir o mal da pena [castigo], que não é mal absoluto, mas sim mal relativo e bem absoluto. Efetivamente, dado que o bem estabelece ordem para um fim e o mal consiste na privação desta ordem, é mal absoluto aquilo que exclui totalmente a ordem ao fim último, que é  o mal da culpa. O mal da pena, ao contrário, é certamente um mal, enquanto nos priva de um bem particular; mas em absoluto é bem, porque está ordenado ao fim último.

Deus, portanto, castiga sim, e o castigo de Deus é sempre um bem absoluto, porque está ordenado ao fim último do homem, que é Ele próprio. Como, por exemplo, um pai que castiga o filho para o educar.

Pode-se objetar que não pertence ao pátrio poder espancar um filho até a morte, e que bem pouco aprendizado alguém pode obter de uma experiência se não sobreviver a ela. Esta visão, no entanto, é puramente materialista e não serve para impugnar a visão católica segundo a qual os castigos divinos – quaisquer que sejam eles – estão ordenados ao fim último do ser humano. Ela – a visão materialista – parte de dois pressupostos que não são aceitos pelos católicos: o primeiro, que a vida é um bem absoluto e, o segundo, que o castigo deve servir sempre e somente para os indivíduos castigados. Nós, católicos, sabemos que o fim último ao qual deve almejar o ser humano não é a preservação da própria vida física, e sim a salvação da sua alma. Ninguém pode dizer o que se passa no íntimo de uma pessoa vitimada por uma tragédia nos seus instantes derradeiros e, portanto, não se pode afirmar que o mal relativo não tenha redundado em um bem absoluto – ao contrário, é exatamente por isso que rezamos. Igualmente, o mal sofrido pela parte pode, ainda que não redunde em bem para ela, servir ao todo: como a amputação de um membro gangrenado que, embora não cause bem ao membro amputado, provoca bem ao corpo, ou como aquela história do rei que perdeu um dedo numa caçada. Portanto, uma catástrofe qualquer não pode, a priori, ser excluída como castigo divino por conta de objeções naturalistas como as que são ordinariamente apresentadas.

Quanto à segunda opinião – a de que o terremoto foi, sim, castigo de Deus por conta do vodoo praticado pelo povo -, ela também não pode ser pressuposta assim, sem mais nem menos. Vale salientar que 80% da população do Haiti é católica, e o catolicismo é inclusive a religião oficial do Estado. Obviamente, Deus pode ter castigado a infidelidade de um povo que, honrando-o com os lábios – com a Constituição… -, não Lhe presta louvor verdadeiro com a própria vida. Sim, Deus pode ter feito isso, mas Deus pode igualmente não ter feito isso – ou não pode? Há incontáveis exemplos de ímpios que parecem ser imunes a tragédias, bem como de pessoas inocentes que são vitimadas por desgraças sem que mereçam. Não dá, também, para dizer a priori que Deus resolveu castigar o Haiti por conta da feitiçaria praticada pelo povo católico. Deus não “funciona” com o determinismo de causa-efeito de uma lei física.

Então, afinal, o que dá para dizer? Na verdade, não dá para dizer rigorosamente nada, porque ninguém conhece os desígnios do Altíssimo. Que os terremotos são causados pelos movimentos das placas tectônicas é simplesmente um detalhe técnico – aliás, evidente e incontestável – que não vem ao caso nesta discussão. Os fenômenos naturais, afinal de contas, estão sujeitos ao Autor das leis da natureza.

O que dá para saber com certeza é que Deus não permitiria o mal se, dele, não pudesse tirar um bem ainda maior – como diz Santo Agostinho. E, se um terremoto que deixou milhares e milhares de mortos, feridos e desabrigados é obviamente um mal, importa dar sentido ao sofrimento. Não faz diferença (e, aliás, nem é humanamente possível) saber com certeza se foi castigo divino ou fatalidade permitida pelo Onipotente. O que importa é unir as próprias dores àquelas sofridas pelo Homem das Dores. Como falou o Papa João Paulo II na Salvifici Doloris:

Todo o homem tem uma sua participação na Redenção. E cada um dos homens é também chamado a participar naquele sofrimento, por meio do qual se realizou a Redenção; é chamado a participar naquele sofrimento, por meio do qual foi redimido também todo o sofrimento humano. Realizando a Redenção mediante o sofrimento, Cristo elevou ao mesmo tempo o sofrimento humano ao nível de Redenção. Por isso, todos os homens, com o seu sofrimento, se podem tornar também participantes do sofrimento redentor de Cristo.

[SD, 19]

Que os sofrimentos humanos – em particular estes de memória tão recente – não sejam inúteis, é o que pedimos à Virgem Santíssima, Mater Dolorosa, Nossa Senhora das Dores, Aquela que tão perfeitamente soube unir os próprios sofrimentos aos de Seu Divino Filho.

Stat Crux!

Foto: Globo

Vi no Fantástico. É um vídeo que mostra os primeiros instantes após o terremoto que devastou o Haiti na terça-feira passada. A igreja que aparece em ruínas é a do Sacré Coeur de Tugeau, em Porto Príncipe, onde estava a doutora Zilda Arns. A única coisa que ficou de pé foi o crucifixo.

O vídeo pode ser visto aqui. As imagens foram feitas pelo soldado Luís Diego Moraes. Dá pra ver as pessoas passando pela rua e se ajoelhando diante da igreja em ruínas, onde a cruz permaneceu intacta. No meio do terremoto, da poeira, das ruínas, da dor e do sofrimento, a Cruz permaneceu de pé. Stat crux – como dizem os cartuxos – dum volvitur orbis. Enquanto o mundo desmorona. Como a nos mostrar qual é o único apoio seguro. A única tábua de salvação em meio à catástrofe. O único alicerce sólido nas adversidades.

Ave, Crux, spes unica! Que o Crucificado possa dar sentido ao sofrimento. Que as pessoas possam, em meio à dor, olhar para a Cruz que se ergue acima da poeira e dos escombros, e n’Ela encontrar o conforto necessário para este momento doloroso.

A tragédia no Haiti

Como os pássaros, que cuidam de seus filhos ao fazer um ninho no alto das árvores e nas montanhas, longe de predadores, ameaças e perigos, e mais perto de Deus, deveríamos cuidar de nossos filhos como um bem sagrado, promover o respeito a seus direitos e protegê-los.

Íntegra do discurso de Zilda Arns no Haiti

Pedem-me que escreva sobre a tragédia no Haiti e, em particular, sobre o trágico falecimento da dra. Zilda Arns. Não o tinha feito antes por motivos diversos; faço-o, agora, mais em tom de justificativa do que para agregar alguma coisa a tudo o que já foi falado.

Muita coisa já foi escrita sobre o assunto, e de maneira muito melhor do que eu próprio poderia escrever. Basta procurar no Google. Há uma nota de solidariedade da CNBB, a insensível posição do Cônsul do Haiti no Brasil, há um pastor culpando o diabo pela tragédia e muito mais.

Em particular, o Reinaldo foi um dos primeiros a escrever, e o texto dele destaca aquilo que eu próprio destacaria na vida da pediatra: “[a] médica católica, a trabalhadora incansável em defesa das crianças (…) era contra o aborto e se opunha à aprovação das pesquisas com células-tronco embrionárias”. Este texto vale a leitura.

Não havia escrito também porque não tenho palavras para me expressar diante de uma tragédia da magnitude desta que se abateu sobre o Haiti. Quando ouvi, apressado, as primeiras notícias, achei que se tratava de um terremoto normal que havia vitimado algumas dezenas de pessoas. Quando soube depois que a cifra dos mortos está na casa das dezenas de milhares e, a dos desabrigados, na dos milhões, foi um verdadeiro choque. Diante desta multidão de seres humanos mortos, a perda de uma médica brasileira parece pequena, e soa-me quase como uma ofensa às vítimas da tragédia reduzir o luto ao falecimento da dra. Arns. O nosso luto é primeiramente pelo Haiti e – ainda mais – pela fragilidade da condição humana, que não pode acrescentar um côvado à duração da própria vida.

Acredito já ter dito aqui outras vezes que tragédias assim devem nos levar a considerar a brevidade de nossas vidas, quase como se fossem uma tentativa desesperada do Todo-Poderoso de fazer os homens relembrarem os novíssimos cuja meditação esqueceram. Lembro-me de Santo Agostinho, o qual cito de memória: todos os dias celebramos funerais e, no entanto, continuamos a nos prometer longos anos de vida. Na verdade, ninguém pode se prometer longos anos de vida. Ninguém pode garantir que vá viver até a próxima semana, até amanhã, até o fim do discurso que se está pronunciando. O terremoto do Haiti lembra-nos disso. Importa estarmos sempre vigilantes.

Ontem eu voltava para casa e, no Marco Zero (a praça pública do centro antigo da cidade), uma banda tocava cover de Raul Seixas. A música era outra, mas me lembrei do “Canto para a minha morte” que, se não tivesse sido composta pelo nada religioso baiano, eu diria ter sido feita para se meditar sobre o fim de nossas vidas. “Cada vez que eu me despeço de uma pessoa, pode ser que essa pessoa esteja me vendo pela última vez! A morte, surda, caminha ao meu lado, e eu não sei em que esquina ela vai me beijar”.

Não sabemos quando a morte vai nos encontrar – lembremo-nos do Haiti! Importa vivermos como se fosse na próxima esquina. Importa estarmos sempre preparados.

Gostaria de ter aqui em mãos o meu missal quotidiano, porque me lembro de que há algumas orações – não sei se de uma missa votiva – para tragédias e, especificamente, para terremotos. Pedindo ao Altíssimo que dê conforto às vítimas, que nos livre dos terremotos – aliás, isso tem também na Ladainha de Todos os Santos. A flagello terraemotus, libera nos, Domine. Já houve quem dissesse que nunca a terra tremeu tanto como nestes nossos dias, nos quais as orações que pedem a Deus proteção contra tragédias naturais foram abandonadas; não saberia dizer se é verdade. Mas saberia dizer, sim, que é útil pedir a Deus proteção contra as intempéries da natureza, e que não o fazer faz falta aos homens de hoje. E só o percebemos quando a terra treme, quando o mar se levanta revolto e engole cidades, quando os ventos raivosos destroem tudo. A fulgure et tempestate, libera nos, Domine – bem que poderíamos rezar mais vezes.

E não havia também escrito antes sobre a morte da Dra. Arns por não querer ser injusto ou leviano. Aliás, até mesmo agora tenho medo de o ser. Não morro de amores pela família Arns e não posso, em consciência, dizer que a mesma é um exemplo de fidelidade a Cristo e à Igreja. Por outro lado, também não posso, em consciência, negar a beleza do trabalho feito pela dra. Zilda Arns com a Pastoral da Criança, bem como naquilo que foi dito pelo Reinaldo Azevedo e que, na minha opinião, é a forma como ela gostaria de ser lembrada: “era contra o aborto e se opunha à aprovação das pesquisas com células-tronco embrionárias”. Daria um belo epitáfio.

Podem dizer que isso, sozinho, é meramente uma obra naturalista, sem valor sobrenatural. É verdade. Não quero canonizar desde já, no calor da comoção, a irmã do Cardeal Arns. No entanto, seria estúpido e profundamente injusto negar a importância do trabalho desta mulher para as crianças do Brasil e do mundo. A caridade verdadeira e a mera filantropia – concedamos! – podem ser materialmente indistinguíveis. Mas, se a distinção entre ambas é formal, torna-se temerário questionar de maneira leviana as intenções da dra. Zilda, as quais são somente de Deus conhecidas. Diante do Justo Juiz, cada um vai comparecer com as próprias culpas e as próprias boas obras, não as da família. E, boas obras, é indiscutível que Zilda Arns possui.

Disse acima que a perda de uma médica brasileira parecia pequena perto da multidão de mortos no terremoto do Haiti. No entanto, sem querer, absolutamente, relativizar a dor das famílias cujos membros sofrem no Haiti, seria também de uma injustiça atroz não lembrar, de modo particular, a dra. Zilda Arns. É importante dizer que a perda desta médica em particular, da fundadora da Pastoral da Criança, é sem dúvidas grande. Ela era contra o aborto, e era corajosamente contra o aborto; e, hoje em dia, isso faz falta.

E, para o cúmulo da hipocrisia, Lula e Dilma vão ao velório de Zilda Arns em Curitiba. O mesmo presidente Lula que desistiu de fazer novas mudanças no decreto e, assim, vai manter o compromisso do Governo com a descriminalização do aborto. Volto a citar o Reinaldo Azevedo: “Enquanto a esquerda de gabinete celebrava a sua tara pela morte naquele decreto vagabundo, Zilda celebrava a vida no Haiti. Os contrastes são ainda mais evidentes: enquanto ela morreu para dar a vida — e se opunha ao aborto —, outros viveram para matar, consideram o aborto uma redenção e tentam impô-lo à sociedade como medida de mero bom senso”. É incrível a cara de pau dessa gente.

Que o Deus Altíssimo tenha misericórdia de todos nós, pecadores. Que a Virgem Santíssima, Consoladora dos Aflitos, possa ser em favor dos que sofreram as terríves conseqüências da tragédia no Haiti; e que Ela, Porta do Céu, possa receber o quanto antes na Casa do Pai os que perderam as suas vidas sob a fúria do terremoto.

Requiem aeternam dona eis, Domine,
Et lux perpetua luceat eis.

Requiescant in Pace.
Amen.

Akallabêth – A queda de Númenor

Existem alguns escritores geniais. Tolkien é um deles. Após ter lido (tardiamente, reconheço) os três volumes d’O Senhor dos Anéis, estou terminando O Silmarillion agora. Especificamente, acabei de ler ainda há pouco Akallabêth, que trata sobre a queda de Númenor; para quem ainda quiser ler o conto – na edição da Martins Fontes, tem apenas 35 páginas -, aviso desde já que ESTE TEXTO CONTÉM SPOILERS.

Númenor é o nome do reino próspero dos homens, entre a Terra Média e o Reino Abençoado. Lá, eles eram amigos dos Valar, espécie de semi-deuses que eram senhores do mundo e serviam a Ilúvatar, o Deus Criador e Providente, a Quem também adoravam os númenorianos. Havia em Númenor um templo erigido a Ilúvatar, onde os homens sempre Lhe ofereciam “os primeiros frutos”. E viviam em paz e harmonia.

Com o tempo, porém, os homens começaram a sentir inveja de imortalidade de Valinor, o Reino Abençoado, onde viviam, sem conhecer a morte, os Valar e os elfos. E os homens começaram a murmurar entre si, acusando os Valar de negarem aos homens a dádiva de serem imortais. E romperam as suas boas relações com os Valar. Quando isso aconteceu, Sauron (sim, o mesmo d’O Senhor dos Anéis), inimigo dos Valar, instigou os homens a se mostrarem cada vez mais auto-suficientes e a se apresentarem cada vez mais hostis aos Valar. E, seguindo os conselhos malignos de Sauron, os homens foram se afastando cada vez mais dos Valar e, por conseguinte, degradando-se cada vez mais.

Duas coisas são bem interessantes nesta narrativa. A primeira delas é que os númenorianos, seguindo os maus conselhos de Sauron, abandonaram o culto a Ilúvatar e passaram a adorar o “Senhor do Escuro”, Melkor, que no princípio havia sido um Vala mas, depois, decaíra e, devido às suas maldades, havia sido expulso da terra e trancado no Vazio que fica além do mundo.

Os homens de Númenor abandonaram o culto a Ilúvatar para adorar a Melkor! Somente o fato deste assunto ser já conhecido e re-conhecido por todos nós impede-nos, à primeira vista, de dizer que a metáfora é genial; no entanto, é exatamente nesta insistência, nesta repetição, que consiste a sua genialidade: não importa onde nem quando, se nos judeus de Jerusalém à época do Rei Salomão, se em Númenor das fantasias de Tolkien ou se na vida particular de cada um de nós, os homens sempre fazem besteira. Sempre dão ouvidos a conselhos que não prestam. Sempre abandonam o Deus Verdadeiro para servir a Satanás.

A história de Númenor é, na verdade, uma paráfrase da história da humanidade e da história de cada um de nós, com um toque bastante interessante: não existem desculpas para os homens daqui, deste mundo, abandonarem a Deus. Porque não importa o quão diferente seja o mundo, mesmo que haja elfos e orcs, mesmo que os homens tenham vida longa e próspera, mesmo que eles falem face a face com os emissários dos Valar e contemplem, do litoral, as fronteiras do Reino Abençoado, mesmo assim, eles erram e se desviam do caminho. Adorar ao “senhor do Escuro” não é apanágio dos homens que vivem no claro-escuro no qual nós próprios vivemos – mesmo que vivêssemos em Númenor, não estaríamos imunes a esta tentação.

E a segunda coisa interessante na Akallabêth é sobre o progresso de Númenor após os homens terem abandonado os Valar: “Não obstante, por muito tempo pareceu aos númenorianos que eles prosperavam: e, se sua felicidade não era maior, eles ainda assim estavam mais fortes; e seus ricos, cada vez mais ricos. Pois, com o auxílio e os conselhos de Sauron, multiplicavam seus bens, inventavam engenhos e construíam naus cada vez maiores” [Tolkien, J. R. R., “O Silmarillion”, p. 349; Ed. Martins Fontes, 4ª Edição, São Paulo, 2009].

Prosperavam sem, no entanto, serem mais felizes: quem poderia ler um trecho desses sem pensar imediatamente no homem moderno que, enamorado cada vez mais do progresso e da técnica, e esquecido de Deus, consegue avanços cada vez maiores que, no entanto, não servem para lhe dar sentido à vida? Repito o que disse no início: há autores que são geniais, como Tolkien. Impressiona-me a maneira como ele consegue reescrever a história do mundo por meio de uma mitologia que a torna mais palatável, e na qual certos aspectos que ele deseja destacar aparecem com clareza. A Queda de Númenor faz as vezes de uma excelente parábola para os nossos tempos modernos, que bem poderíamos entender para que errássemos menos: na Akallabêth, Tolkien nos ensina que os homens erram ao se afastar de Deus, e nos ensina também que prosperidade nem sempre é sinônimo de felicidade.

Benedictus fructus ventris Tui

Et benedictus fructus ventris tui, Iesus (Lc I, 42).

Ontem, celebramos a festa da Virgem Maria Mãe de Deus. Dia santo de guarda. Às vezes, passa despercebido no meio das festividades do Reveillon, e às pessoas parece que estão assistindo “missa de Ano-Novo”. Tecnicamente, não deixa de ser; mas não é esse o nome da festividade nem é o Ano-Novo mais importante que a comemoração da Maternidade Divina de Nossa Senhora. Dia primeiro de janeiro, a Igreja celebra não o novo ano que chega, mas sim Aquela de Quem nasceu Deus.

Como Santa Isabel falou um dia à Virgem Santíssima, e como repetimos todos os dias, todas as horas, na oração da Ave-Maria: bendito é o fruto do Vosso ventre. A excessiva familiaridade com as palavras impede-nos de meditarmos adequadamente no que elas significam. Bendito é Nosso Senhor Jesus Cristo, que é Deus Verdadeiro, e que é Verdadeiro Filho de Maria Santíssima. Que é fruto – como rezamos, muitas vezes sem prestar atenção – do ventre da Virgem Imaculada.

“Bem-aventurado o ventre que te trouxe” (cf. Lc 11, 27), disse certa vez uma mulher do meio do povo. É sem dúvidas uma verdade, que inclusive já havia sido dita por Santa Isabel: afinal, bendito é o ventre cujo fruto é bendito. E, bem diferente do que apregoam alguns protestantes, Nosso Senhor não “desdiz” a mulher na seqüência da passagem bíblica. Ao contrário, louva ainda mais Sua Mãe Santíssima, ao afirmar os Seus méritos próprios: afinal, Ela também é Aquela que ouve a palavra de Deus e a observa (cf. id. ibid., v. 28). Como explica São João Crisóstomo na Catena Aurea, de nada nos vale ter um pai, um irmão ou um filho virtuoso, se nós próprios carecemos de virtude. Respondendo à mulher que louvou Maria Santíssima simplesmente pelo Seu parentesco com o Salvador,  Nosso Senhor afirma que não é somente por isso que Ela é  digna de ser louvada: além de ter sido a Mãe do Salvador, a Virgem também permaneceu sempre fiel. Ouviu sempre a palavra de Deus, e a pôs em prática todos os dias de Sua vida.

Porque, afinal de contas, Nosso Senhor ornou a Sua Mãe Santíssima com todas as virtudes passíveis de serem concedidas a uma criatura. Era a Sua Mãe! Que filho não daria à sua mãe todas as coisas boas que pudesse lhe dar? Acaso Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus e Deus verdadeiro, o mais perfeito dos filhos, faria por Sua Mãe menos do que um filho terreno qualquer? Se os filhos naturais, que são maus, sabem fazer o melhor para suas mães, o que não faria Deus por Aquela de Quem Ele nasceu?

E, por outro lado, o que Ele, Onipotente, não poderia fazer por Sua Mãe…? Bem-aventurada és, ó Virgem Santíssima, porque o Teu Divino Filho fez de ti a mais graciosa das criaturas. Bem-aventurada és, ó Virgem Santíssima, porque foste escolhida pelo Rei para seres Rainha, e jamais houve majestade que chegasse aos pés desta que Te foi concedida pelo Rei dos reis. Bem-aventurada és, ó Virgem Santíssima, porque Nosso Senhor Te concedeu graças em profusão e, já que foste sempre fiel a Ele, foste e és uma Mãe digna para o Deus que tens por Filho. Bem-aventurada és, ó Virgem Santíssima, porque bendito é o fruto do Teu ventre, porque do Teu ventre nasceu Aquele que foi a Salvação do Mundo e, por isso, todas as gerações até hoje proclamam a Tua  bem-aventurança.

Salve a Santíssima Virgem, salve a Virgem Mãe de Deus, salve a Mãe do Redentor, salve Maria Imaculada. Ó Santa Mãe de Deus, rogai por nós, para que sejamos dignos – ou, ao menos, para que sejamos menos indignos! – das promessas do Vosso Divino Filho.

Feliz Ano Novo!

Mais um ano passado. Para mim, passou muito depressa. É a idade… quanto mais velho se é, mais o tempo passa rápido. Deveria ser o contrário, pois é com a experiência adquirida que se pode fazer o tempo ser melhor aproveitado… Mas, como diz a sabedoria popular musical recifense contemporânea, “o tempo passa, o mundo gira, o mundo é uma bola”. É verdade: o tempo passa, inexorável.

Passou 2009 e, ao final dele, eu me lembro de uma frase de um santo que ouvi certa feita; não lembro quem é, mas sempre associo a um dos místicos espanhóis. A frase dizia que a vida é como uma noite mal dormida em péssima estalagem. Sofre-se, sim, mas é passageira: quando mal se percebe, chegou o dia. Findou a noite, findou a vida.

Findou o ano! É oportunidade para se meditar sobre a efemeridade da vida, sobre o tempo que passa mais depressa do que gostaríamos. Se, ao invés do ano, fosse a vida que chegasse ao fim? Se, ao invés de encontrarmos 2010, fôssemos nos encontrar com o Justo Juiz que há de pôr os nossos atos a descoberto e determinar a nossa sorte eterna?

O escoar dos anos deve nos fazer pensar que a nossa vida também passa. E passa depressa. Um ano a menos… aproveitemos bem o nosso tempo.

E um feliz ano novo a todos. Que o próximo ano encontre-nos melhores do que este que agora termina nos encontrou – são os meus votos mais sinceros. Continuemos na liça, também em 2010.

A luz que refulge nas trevas

E a Luz refulgiu nas trevas. A luz da estrela, claro, que guiou os Reis Magos através da escura noite de inverno até o lugar onde Se encontrava o Recém-Nascido, e fez com que eles encontrassem o Deus Menino nos braços de Sua Mãe. Mas também – e mais importante – a Luz da Graça, derramada sobre a humanidade pecadora.

Dois mil anos passados. A Luz ainda brilha. E grande parte do mundo ainda está em Trevas, e – como daquela vez primeira – continua sem compreender a Luz que vem. Afinal, como compreender um Deus feito homem, um Infinito fazendo-Se limitado, um Eterno adentrando no Tempo? O Menino nos braços de Sua Mãe Santíssima é incompreensível para o mundo. Deus fazer-Se homem? E nascer de uma Mulher?

Os pastores ouviram do anjo o anúncio da Boa Nova. Os reis magos viram a Estrela no Céu e puseram-se a caminho do Salvador que havia nascido. Porque Ele nasceu pobre, mas nasceu para todos. Herodes não O encontrou porque era mau, e não porque era rico; os sábios do Oriente também eram ricos. Ofereceram ouro ao Menino, que era Rei, embora recém-nascido. E Sua Mãe Santíssima era Rainha. O Seu trono na terra era uma manjedoura, mas Ele estava também em Seu Trono no alto dos Céus. Em Belém, n’Aquele dia feliz, aquela manjedoura transformou-se no trono do Rei dos Céus e da Terra. E os reis magos puderam prostrar-se diante do Criador de tudo o que existe.

Portentoso mistério de Luz e de Graça! E tão incompreendido, até os dias de hoje. No burburinho do mundo de hoje, as pessoas não ouvem mais os anjos cantando gloria in excelsis Deo: é preciso o silêncio dos campos para escutar este cântico angelical. Encantadas com mil e uma futilidades passageiras, as pessoas não percebem a Estrela que cruza os céus indicando o nascimento do Messias: é preciso perscrutar o Céu com atenção para encontrá-la. Herodes não viu a Estrela nem ouviu os anjos cantando. Estava muito ocupado enquanto Deus descia à terra.

E perdeu o grande espetáculo do nascimento do Salvador, de uma Virgem dando à luz o Sol da Justiça em uma noite fria, do Senhor de todas as coisas guiando a história a partir do Seu trono em uma manjedoura, em Belém. Não compreendeu a Luz refulgindo nas Trevas, porque era Trevas e gostava das Trevas, porque a luz era odiosa aos seus olhos enfermos, e ele não queria ser curado. Quando o Altíssimo fez-Se homem para curar as nossas feridas, nós não quisemos ser curados.

E este é talvez o maior mistério do Natal: Deus vem salvar os homens e os homens não querem ser salvos. As estalagens de Belém não quiseram hospedar a Rainha, Herodes procurou matar o menino, a noite mais importante da história da humanidade passou despercebida por quase todos. Em breve, no Calvário, a história vai se repetir, e os homens vão preferir Barrabás a Nosso Senhor. Agora, no entanto, o Menino passa frio, e já começa a sofrer por nós, e nós sequer o percebemos.

Eu quero ser curado das minhas feridas, e isso eu não posso sem o Deus Menino. Não quero ser contado entre as Trevas que não compreenderam o refulgir da Luz que veio ao mundo para a salvação do mundo. Quero que o nascimento do Salvador seja motivo de grande alegria também para mim; quero ouvir o cântico jubiloso dos anjos e, seguindo a Estrela, quero prostrar-me diante do Deus que descansa nos braços de Sua Mãe Santíssima.

Porque é do ventre desta Mulher que o mundo recebe o Salvador do mundo, e é nos braços d’Ela que repousa o nosso Deus e nossa Salvação. Eu te saúdo, ó Virgem, cheia de graça, e te agradeço por seres o que és: a Virgem Fiel, a Escrava do Senhor, a Mãe de Deus. Não existe Natal sem o Menino Jesus, e não existe Menino Jesus sem a Sua Mãe Santíssima. Que Ela possa interceder por nós e, à semelhança d’Aquela noite feliz, possa fazer mais uma vez a Luz refulgir nas trevas, e possa trazer-nos de novo o Deus Menino.

A temperança e a situação de pecado

Durante o almoço natalino em família, após estarmos satisfeitos, sentamo-nos para descansar. Alguém ligou a televisão. Estava passando uma cena de uma novela da Globo – “Alma Gêmea”. Não sei o nome dos atores ou dos personagens, nem o contexto. Mas a cena era a seguinte:

Um casal recém-casado discutia. O marido dizia à mulher que ela o tinha enganado e que, por isso, ela não esperasse dele um bom marido. Lançando ao rosto da esposa as mentiras que ela havia contado para que conseguisse se casar com ele, o esposo dizia que não iria nem mesmo tocá-la, jamais, e se retirou para um quarto à parte, deixando-a sozinha.

A mulher não se conforma. Diz para si mesma que é linda, e que vai conseguir ter para si o homem amado. Sobe ao quarto do esposo, deixa cair o vestido, e pergunta ao marido se ele não é homem. Um instante terrível de hesitação. E então o marido, diante do corpo nu dela, afirma que é homem, sim, e que tem vontade de lançá-la à cama, mas que consegue se controlar. Passa por ela, impassível, entrega-lhe o vestido, diz para que se vista, e que saia.

Meu lado Poliana rejubila-se. Em uma novela da Globo, a força de vontade vence a tentação carnal. A temperança vence a luxúria. Um “não” resoluto e irrevogável vence o pecado. É possível resistir, é possível ter princípios mais nobres do que os impulsos sexuais: há uma alternativa ao comportamento meramente instintivo. Há humanidade.

Mas meu lado “não-Poliana” não fica satisfeito. Lembro-me de uma coisa que já li em algum lugar, sobre os cátaros: lembro-me que os líderes da seita, por serem “superiores”, vangloriavam-se de serem capazes de resistir às tentações e, para prová-lo, dormiam com belas moças sem as tocarem. O resultado era que outros cátaros, tentando imitar os seus líderes, faziam a mesma experiência e cediam à tentação durante a noite. Não eram “superiores” e o descobriam da pior maneira possível.

A castidade é virtude que se guarda protegendo-a, e não a pondo à prova. As situações de pecado, como sempre ensinou a Igreja, são para serem evitadas, e não enfrentadas. É admirável, sem dúvidas, o heroísmo dos que conseguem se manter impassíveis diante de uma tentação avassaladora. Mas este heroísmo é uma exceção, e não a regra. Que ninguém o pretenda possuir! Para que não aconteça de só descobrir que não consegue após não conseguir…

O convento e o altar

Fundação Sarney aluga convento para festa sexy. A notícia é menos chocante do que parece à primeira vista, porque o convento em questão já não funciona como convento há anos; em 1990, ele foi doado pelo então governador do Maranhão à Fundação Sarney. É um prédio histórico no centro histórico de São Luís.

Sarney disse que não sabia nada sobre a festa. Li num comentário do Estadão que era, na verdade, uma festa à fantasia. O mais triste, no entanto, é a dessacralização, o que quer que tenha acontecido no Convento das Mercês.

Aliás, ela começou bem antes. O convento é de 1654. Não sei quando foi que ele fechou as portas; mas um convento vazio é um prédio triste. Mutatis mutandis, aqui em Recife temos muitas igrejas antigas com altares laterais belíssimos que não são mais utilizados: um altar sobre o qual não é oferecido o Santo Sacrifício da Missa é uma coisa muito triste.

Porque trata-se de algo que perdeu a sua finalidade. Se o sal perde o sabor, para mais nada serve senão para ser lançado fora. Se o convento perde as vocações, só serve para prédio histórico estéril (ou, pior ainda, para festas mundanas). Se o altar perde a Santa Missa, só serve para apoiar vasos de flores ou castiçais.

A perda de vocações é algo sintomático e preocupante. Não se dá de repente – como também não é do dia para a noite que o prédio se transforma, de convento, em salão de festas. O sal perde o sabor aos poucos… e, se não percebemos a tempo, o futuro é a festa realizada no prédio histórico.

Tarde demais…? Com o quê será restituído o sabor ao sal? Um sacerdote meu amigo disse-me outra vez que o seu sonho era “ressuscitar altares”, celebrando a Santa Missa nos altares das igrejas onde ela não é celebrada há muitos anos. É um belo sonho. Desejo-lhe muitas ressurreições. Porque, se aos homens é impossível reverter a crise que atravessa a Igreja, a Deus não é impossível. A Deus, nada é impossível.

Por meio da Santa Missa, nada é impossível. O convento e o altar têm muito em comum, ordenados que são ambos a Deus. Ressuscitar os altares é ressuscitar os conventos. Pedir ao Senhor da messe que mande operários é já antecipar os campos repletos de trabalhadores. Deus é fiel. A despeito de nossas infidelidades.

Rezemos ao Altíssimo. Peçamos vocações. Ofereçamos as nossas vidas em desagravo pelas dessacralizações, pelas festas nos antigos celeiros de almas consagradas, pelas flores murchas esquecidas nos altares onde Cristo era imolado. Ele é fiel. E não Se esquecerá do Seu povo. O sal há de recuperar o sabor. O convento e o altar voltarão a servir a Deus. Para a Sua maior glória.

Cânticos

Releio o Cântico Espiritual de São João da Cruz. O grande místico foi celebrado anteontem na Igreja. Confesso não conhecer muito sobre ele, mas gosto do pouco que conheço. Em particular, do Cântico Espiritual.

A Esposa procura pelo Amado; pergunta aos pastores, pergunta aos bosques e espesuras que a mão do seu Amado plantou. Procura-O desesperadamente: Decid si por vosotros ha pasado. E ouve falar do seu Amado, mas não O encontra.

Lembro-me imediatamente do Cântico dos Cânticos, e com certeza São João da Cruz tinha o texto bíblico diante de si enquanto escrevia o seu Cântico Espiritual. Mas julgo o livro sagrado mais triste. Porque, nele, fica mais clara a culpa da Esposa na separação:

“Eu dormia, mas meu coração velava. Eis a voz do meu amado. Ele bate. Abre-me, minha irmã, minha amiga, minha pomba, minha perfeita; minha cabeça está coberta de orvalho, e os cachos de meus cabelos cheios das gotas da noite. Tirei minha túnica; como irei revesti-la? Lavei os meus pés; por que sujá-los de novo? (…) Levantei-me para abrir ao meu amigo; a mirra escorria de minhas mãos, de meus dedos a mirra líquida sobre os trincos do ferrolho. Abri ao meu bem-amado, mas ele já se tinha ido, já tinha desaparecido; ouvindo-o falar, eu ficava fora de mim. Procurei-o e não o encontrei; chamei-o, mas ele não respondeu” (Cântico dos Cânticos, 5, 2-3. 5-6).

E gosto particularmente destes versos: Exspoliavi me tunica mea, quomodo induar illa? Lavi pedes meos, quomodo inquinabo illos? Chego quase a imaginá-los. Uma situação cômoda, e alguém que vem incomodar: um descanso merecido, que alguém vem interromper. Mas é Deus quem chama!

A Esposa levanta-se. Antes de levantar, no entanto, reclama; e esta murmuração, ela somente, tão pequena, é suficiente para que o Amado vá-se embora. Não havia de levantar-se? Por que não se levantou de uma vez? Teria encontrado o Amado à porta. No entanto, perdeu tempo. Ele Se foi.

Depois, Ela o procura pela cidade. Sofre, sem O encontrar. “Dizei-lhe”, Filhas de Jerusalém, “que estou enferma de amor” (v. 8). É a mesma coisa que diz São João da Cruz: si por ventura vierdes / aquel que yo más quiero, / decidle que adolezco, peno y muero. A Esposa sofre pelo Amado nos Textos Sagrados, sofre no poema do santo espanhol.

E quem dera a nossa alma sofresse pelo Deus Altíssimo! Porque a imagem da Esposa e do Amado é figura da alma humana que ama e busca a Deus. Tanto o Cântico Espiritual quanto o Cântico dos Cânticos terminam com a união da Esposa e do Amado. A alma, por fim, termina unida a Deus – eis a mística – depois de todo o sofrimento que passa em busca d’Ele – eis a ascese.

Quem dera nossa alma sofresse buscando o Deus Onipotente! Porque, muitas vezes, tenho a impressão de que ela permanece no exspoliavi me tunica mea… Permanece no tempo perdido. Permanece na apatia. Permanece no próprio comodismo, que a afasta de Deus. Precisa levantar-se, abrir a porta, buscar a Deus, sofrer. Só assim vai refazer os passos das Esposas dos dois Cânticos. Só assim poderá terminar na mesma felicidade delas.

É advento. É tempo de endireitar as veredas. É tempo de despertarem os que dormem – pois o Senhor vem. É necessário deixar o aconchego da cama, vestir novamente a túnica, sujar os pés. Ir à cidade, procurar pelo Amado, buscá-Lo nos bosques e nos campos. Mas buscá-Lo, mesmo que se vá sofrer nesta busca. Sabendo, aliás, que se vai sofrer nesta busca: porque a ascese precede a mística, e a união com Deus é para as almas que O procuram. Que a Virgem Santíssima conceda-nos a graça de nos prepararmos bem para o Natal. Que o final feliz do Cântico dos Cânticos e do Cântico Espiritual possa ser também o final do cântico de nossas próprias vidas. Soframos em busca de Deus, para que um dia rejubilemo-nos em Sua companhia.