Sim à Vida! 2014 – Pernambuco contra o aborto!

A oitava edição do Sim à Vida! ocorreu na manhã deste domingo, 19 de outubro, na Av. Boa Viagem. Mais uma vez, toda a Província Eclesiástica de Pernambuco foi às ruas para exigir, das autoridades públicas, o respeito à vida humana em todas as fases da sua existência, desde a concepção até a morte natural. Mais uma vez, milhares de fiéis católicos, de todas as idades, percorreram alegremente os já tradicionais quilômetros da orla recifense que, todos os anos, tornam-se palco deste ato de Fé e de cidadania. Mais uma vez, dissemos – e dissemos bem alto – que em nenhuma hipótese aceitamos o crime horrendo do aborto.

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Sete trios elétricos tomaram a avenida. Do alto de um deles, por volta das nove horas da manhã, D. Fernando Saburido, Arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife, proferiu o discurso de abertura do evento; após, uma oração, uma bênção episcopal e estávamos prontos para seguir ao longo da avenida. Sob o sol, sob a sede, sob o calor e o cansaço do dia; seguíamos.

No alto dos trios, músicas católicas; no chão, no asfalto, jovens e adultos, crianças e velhos, famílias e pessoas solteiras, sacerdotes e religiosos. Duas coisas, principalmente, chamaram a atenção este ano.

Primeiro, distribuímos o panfleto da Regional Sul 1 da CNBB sobre as eleições 2014. O momento que vivemos é delicado: a uma semana das eleições presidenciais, importa que todos os católicos tenham consciência do projeto de país que a Dilma e o PT têm para o Brasil. Importa reconhecer que, a despeito de quaisquer afinidades ou desavenças ideológicas que se tenham com qualquer um dos dois partidos que se enfrentam nas urnas no próximo domingo, o PT é, de longe, o partido mais abortista que já passou pela nossa presidência.

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Segundo, distribuímos também algumas réplicas, em tamanho natural, de um feto humano com doze semanas de gestação – aquelas que fizeram tanto sucesso durante a JMJ do ano passado. Tínhamos ainda algumas remanescentes, e achamos que o momento era por demais propício para a sua distribuição. É sempre impressionante ver como as pessoas recebem os bebezinhos: param, olham, sorriem, guardam e agradecem. E tudo isso é ainda fruto também da generosidade dos leitores do blog; os que àquela ocasião contribuíram com este projeto, saibam que ajudaram, também, a tornar mais bonita a caminhada pró-vida de Recife deste ano. Obrigado.

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Uma imagem, por fim, digna de atenção, eloquente e significativa: havia uma senhora fazendo protesto solitário contra a caminhada. Houve uma mulher que se deu ao trabalho de sair de casa, num domingo, portando um cartaz contra o Sim à Vida!. Só não prometo um doce para quem adivinhar o ParTido ao qual ela pertencia porque, de tão fácil, o cumprimento de tal promessa levar-me-ia à bancarrota. Sim, senhoras e senhores, uma eleitora de Dilma Rousseff incomodou-se com a caminhada! Por que será?

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Abaixo, algumas fotos do evento. Foi bonito! Que não tenhamos medo de fazer a nossa voz ressoar em público. Que a proposta possa crescer cada vez mais; que o nosso brado contagie um número cada vez maior de pessoas. A defesa da vida desde a concepção até a morte natural é uma bandeira que importa erguer corajosamente. Desfraldemo-la!

O Sínodo, a família e os homossexuais

A respeito do Relatio post disceptationem do Sínodo dos Bispos nesta segunda-feira divulgado – e que, desde então, vem provocando o estardalhaço da mídia católica e laica -, é preciso dizer o quanto segue:

1. Existe a respeito dos homossexuais uma norma há muito vigente na Igreja Católica, e que parece infelizmente gozar de bem pouca eficácia nos dias atuais. Ela se encontra no Catecismo da Igreja e diz que os homossexuais «[d]evem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza»; e ainda que, para com eles, «[e]vitar-se-á (…) qualquer sinal de discriminação injusta» (CCE 2358). Tudo isso tem se tornado nos últimos anos verdadeira letra morta, obscurecido por um lado pelo mais abjeto relativismo moral e, por outro, pela tendência a se enxergar, em todo homossexual, um raivoso militante do movimento LGBT.

[A bem da verdade, aliás, o problema não se restringe aos que se sentem atraídos pela prática de atos sexuais contrários à natureza: nas nossas paróquias, a imensíssima maior parte das situações de pecado encontra ou a conivência cúmplice (disfarçada sob um dar de ombros condescendente que diz que, hoje, “o mundo é assim mesmo”) ou – até em reação a esta – o enxovalhamento puro e simples. Este é um mea culpa que nós precisamos fazer. Está cada vez mais difícil ser católico: parece haver um amplo e vasto espaço para os que estão já bastante satisfeitos consigo próprios, mas pouquíssimo lugar para os que conhecem (ou ao menos entrevêem) os próprios defeitos e desejam (ou gostariam de desejar) mudar para melhor por amor a Cristo.]

2. Para não fugir muito ao tema do post (para além do qual, apenas à guisa de citação, eu poderia falar dos divorciados recasados, dos consumidores contumazes de pornografia, dos namorados que vivem juntos, dos políticos corruptos et cetera), concentremo-nos nos homossexuais. Sério, qual a chance que um homossexual dos dias de hoje tem de levar uma vida santa em decorrência do ambiente paroquial brasileiro médio? Qual o auxílio que alguém com essas tendências recebe, de ordinário, de nossas paróquias? Quantos grupos sérios para ajudar os homossexuais a viverem a castidade à qual os chama o Catecismo existem? Eu conheço o Courage, somente. Em quantas paróquias brasileiras o Courage está presente? Eu não conheço nenhuma. E importa, sim, reconhecer que há algo de muito errado com isso. A Igreja de Cristo existe para levar a salvação às almas, e não é porque meia dúzia de gatos pingados, soi-disant representantes da “categoria” dos homossexuais, militam contra a Igreja de Cristo que Ela deve erguer as Suas muralhas de modo a deixar perecer do lado de fora aquelas pessoas que, possuindo tendências homossexuais, entendem que o que está errado e precisa ser mudado encontra-se nelas próprias, e não na Doutrina Católica.

3. O famigerado Relatio do Sínodo dos Bispos possui três parágrafos (50-52) dedicados ao acolhimento de pessoas homossexuais (Welcoming homosexual persons). Quero acreditar que o que lhes inspirou foram considerações afins às que fiz nos dois pontos acima; no entanto, o resultado foi um verdadeiro desastre. Traduzo livremente:

50. Homossexuais possuem dons e qualidades a oferecer à comunidade cristã; somos capazes de acolher essas pessoas, oferecendo-lhes um espaço fraterno em nossas comunidades? Frequentemente elas desejam encontrar uma Igreja que lhes ofereça um lar acolhedor. Estão nossas comunidades capazes de o oferecer, aceitando e valorizando sua orientação sexual [sic – accepting and valuing their sexual orientation], sem comprometer a Doutrina Católica a respeito da família e do matrimônio?

51. A questão da homossexualidade leva a uma séria reflexão sobre como elaborar caminhos realistas de crescimento afetivo e maturidade humana e evangélica, os quais integrem a dimensão sexual: isso surge, assim, como um importante desafio educacional. Outrossim, a Igreja sustenta que uniões entre pessoas do mesmo sexo não podem ser consideradas em pé de igualdade com o matrimônio entre o homem e a mulher. Além disso, não é aceitável que os pastores sejam pressionados ou que organismos internacionais tornem o recebimento de ajuda financeira dependente da introdução de regulações inspiradas na ideologia de gênero.

52. Sem negar os problemas morais ínsitos às uniões homossexuais, é preciso notar que há casos nos quais o auxílio mútuo – ao ponto do sacrifício – constitui um precioso apoio na vida dos parceiros (sic). Além disso, a Igreja presta especial atenção às crianças que vivem com casais do mesmo sexo [couples of the same sex], enfatizando que os direitos e necessidades destes pequeninos devem ser sempre priorizados.

[Os pontos acima destacados foram cotejados com a versão italiana, e quase não foram encontradas diferenças significativas: o texto na língua de Dante traz “accettando e valutando il loro orientamento sessuale”, “il mutuo sostegno fino al sacrificio costituisce un appoggio prezioso per la vita dei partners” e “coppie dello stesso sesso”. Digo “quase” porque, embora eu seja amador no italiano, ao que parece o verbo valutare não tem a conotação positiva que possui o “valorizar” português, que em italiano mais bem se diria valorizzare.]

É bem evidente que o texto pode ser catolicamente compreendido, às vezes com muita tranquilidade (é óbvio que as pessoas homossexuais possuem dons e qualidades), às vezes com menos (a única ótica sob a qual se pode “valorizar” – em aceitando essa tradução – uma orientação sexual objetivamente desordenada é a mesma segundo a qual se pode dizer “positiva” a concupiscência: é um dado da individualidade humana a partir de cuja mortificação os cristãos se santificam…). No entanto, preocupa, e muito, que os riscos da instrumentalização ideológica de um tal texto não tenham sido percebidos – ou tenham sido placidamente aceitos… – pelos seus responsáveis. Era evidente para além de qualquer evidência que o resultado da divulgação deste Relatio seria uma proliferação de manchetes do tipo «Documento do Vaticano defende mudança da Igreja em relação aos gays» mundo afora.

E assim fica difícil, tanto para os católicos que desejamos ser fiéis à Doutrina da Igreja quanto também (e talvez até principalmente) para os homossexuais que se esforçam todos os dias para vencer as suas más inclinações e levar uma vida como a a qual lhe chama o Evangelho de Jesus Cristo. Ora, para quê fugir do pecado? Para, depois, os pastores capitularem diante do lobby homossexual e dizerem (ou deixarem que os órgãos de mídia digam) que, bem, na verdade não era bem pecado e, portanto, se se quiser viver de tal ou qual maneira, bem, tudo bem? Sinceramente, isso é vergonhoso. É uma ofensa aos homossexuais sérios, aos quais este blogueiro desde já pede perdão e garante as suas pobres orações.

4. Como é bem óbvio, o documento não tem o menor peso doutrinal. Na verdade, não se trata nem de um documento stricto sensu, i.e., de um texto emanado de uma autoridade católica que tenha por destinatário uma porção do [ou todo o] povo de Deus; é, como o próprio nome diz, um relatório, uma ata de reunião, uma coletânea de assuntos tratados durante as assembléias sinodais. A própria Santa Sé julgou por bem precisá-lo, depois que uma enxurrada de protestos – dentre os quais o não menos relevante é o do prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé vociferando “indigno! Vergonhoso! Completamente errado!” – expôs o descontentamento generalizado. Mesmo entre os leigos, aqui e alhures, não faltou quem celebrasse o documento por um lado e, pelo outro, deplorasse-o enfaticamente. Só dois comentários.

Um, havia sinceramente alguma dúvida de que as coisas iriam se passar dessa maneira? Não era patente que, por um lado, a mídia – ávida por humilhar a Igreja – anunciaria vitoriosa uma mudança (ou sinal de mudança) na doutrina católica e, pelo outro, os católicos protestariam enfaticamente contra esta visão dos fatos? Não era óbvio que se iria instaurar esse conflito entre os católicos e os órgãos de imprensa? A troco de quê indispôr a Igreja com a opinião pública? Por qual motivo se desejou (ou se permitiu) esse deplorável espetáculo?

Dois, como muito bem disseram uns amigos, é incrível como os liberais dentro da Igreja parecem não perceber que o objetivo do mundo é coagir a Igreja à aceitação das imoralidades contemporâneas para, depois, relegarem-Na à irrelevância – como fizeram com a igreja anglicana. E é incrível também a desonestidade dos revolucionários que, no afã de fazer avançar a sua agenda impossível, pretendem que um documento “ata-de-condomínio” se sobreponha a uma miríade de outros documentos indiscutivelmente doutrinais que apontam a Doutrina da Igreja mil-vezes repetida sobre o homossexualismo…

5. Resumo da ópera. Segue o Sinodo Straordinario Sulla Famiglia, até o próximo domingo (19); e as boas conseqüências que dele poderiam advir – e as questões sérias do mundo moderno que lá poderiam ser tratadas – ficam completamente soterradas por essa estirpe de polêmica estéril e daninha, tão sobejamente anunciada e, no entanto, em relação a qual as autoridades da Igreja parecem agir com a mais angustiante leniência. É desalentador. No meio das trevas e da tempestade, contudo, no meio da fumaça de Satanás que irrita os olhos e conduz os homens a despencarem no abismo do erro e da mentira, importa aferrar-se com segurança e determinação à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, que permanece firme e inabalável – diz o lema cartuxo – enquanto o mundo dá voltas. Não passarão as palavras d’Aquele por Quem céus e terras foram criados. Deus vê…! Do Alto há-de vir o nosso socorro. Do Céu há-de orvalhar a Justiça de Deus; e, sobre os justos, Ele há-de fazê-la chover em profusão.

Defensio Fidei, de Francisco Suárez: campanha de financiamento coletivo

Com um pouco de atraso, gostaria imensamente de divulgar esta campanha – graças a Deus já em avançado curso – de crowdfunding para a edição de «obras fundamentais» à formação de uma alta cultura brasileira. O projeto atualmente em andamento é para a tradução de uma seleta do Defensio Fidei de Francisco Suárez, tratado apologético do século XVII redigido, a pedido do Papa, contra os erros do anglicanismo.

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Nas palavras da própria editora:

O primeiro projeto de financiamento coletivo da Concreta é a tradução compilada de uma obra de fôlego de um dos maiores pensadores da Idade Moderna, o jesuíta, jurista, filósofo e teólogo Francisco Suárez.

O século XVII foi marcante para a história da Igreja Católica na Inglaterra. Desde o reinado de Isabel, os católicos ingleses enfrentavam problemas de perseguição. A tese central da legitimação política do rei segundo a tradição anglicana inglesa centrava-se na ideia de que o príncipe reunia em si a autoridade espiritual e o poder temporal sobre toda a sociedade, obrigando a consciência dos súditos mediante um juramento de fidelidade. Frente a isso, os católicos solicitaram uma resposta do Papa Paulo V, que prontamente convocou o Cardeal Roberto Bellarmino e o Pe. Suarez para redatar, com base no magistério, um parecer sobre o assunto.

A Editora Concreta publicará, em formato 14×21, a tradução de cerca de 300 páginas da obra “Defensio Fidei Catholicae” (1613), de Francisco Suárez, em versão compilada sob a coordenação do prof. Marcus Boeira, com introdução, notas e comentários explicativos.

Em outras palavras, trata-se de uma editora nova e muito promissora, que se destaca por duas principais características:

i) quanto à seleção das obras a serem publicadas, almejando contribuir para a disponibilização, em língua portuguesa, de textos essenciais (dos quais o mercado editorial brasileiro padece de uma indigência atroz) à formação de uma alta intelectualidade; e

ii) quanto aos meios empregados para a produção de suas obras, através de campanhas de financiamento coletivo, divulgadas pela internet, onde o público pode contribuir para o projeto editorial e receber em primeira mão o livro (em formato digital ou físico, exemplares típicos ou personalizados, etc – a depender da cota de contribuição escolhida) que ajudou a publicar.

O Deus lo Vult! contribui com esse projeto e o recomenda aos seus leitores, tanto para a presente campanha quanto para as outras que no futuro virão, se assim aprouver ao bom Deus e for servir à Sua maior glória. Para maiores informações, basta clicar aqui.

5ª Campanha Nacional de Consagrações à Santíssima Virgem

Já foi lançada, pelo pessoal do Consagra-te!, a 5ª Campanha Nacional de Consagrações à Virgem Maria. À semelhança do que acontece já há alguns anos, o Deus lo Vult! vem incentivar enfaticamente os seus leitores a conhecerem essa santa consagração e, caso a isso se sintam chamados, a se fazerem generosamente escravos de Nosso Senhor Jesus Cristo por meio das mãos maternais da Santíssima Virgem Maria.

Trata-se de eficacíssima devoção que, como diz o próprio S. Luís de Montfort, é um «segredo» na ordem da graça para alcançar tesouros espirituais maravilhosos «em pouco tempo, suavemente e facilmente» (cf. Tratado, §82). A promessa pode parecer enganosa aos que estão convencidos da importância da ascese lenta e trabalhada para o próprio aperfeiçoamento espiritual; mas a oposição é apenas aparente. Primeiro porque este «segredo» exige o desapego de si mesmo, o que é um dos fins mais evidentes da ascese; segundo porque as suas «suavidade» e «facilidade» são as do seguimento incondicionado de Cristo, cujo jugo é suave e cujo fardo é leve; e terceiro porque é um caminho de vida que nunca está perfeitamente concluído, mas que pressupõe um acúmulo cada vez maior de graças através do serviço quotidiano à Virgem Mãe de Deus. Não se trata, assim, de uma inexistente alternativa à ascese, mas ao contrário: é uma ascese radical, de cuja radicalidade mesma jorram as graças que o coração de Deus reserva aos que se Lhe entregam sem reservas.

É um segredo por causa do qual ousamos também nós repetir as palavras de gratidão da Bem-Aventurada Virgem Maria: «fecit nobis magna qui potens est», fez-nos maravilhas o Todo-Poderoso. E, como temos o dever de distribuir de graça aquilo que de graça recebemos, apraz-nos sair em apaixonada pregação da devoção verdadeira à Santíssima Virgem Mãe de Deus, fonte de tantas e tantas graças que nós próprios, pecadores e limitados, não as podemos esgotar. Nossas almas, por mais inflamadas de amor que se tornem, não passam de pequenas chamas bruxuleantes do fogo que Nosso Senhor quer atear à terra; para que ela arda, urge que sejamos um exército maior do que temos sido até então. Urge que alcancemos mais almas para Deus, a fim de suprir – um pouco que seja! – a nossa própria pequenez na multiplicidade dos nossos irmãos na Fé.

Urge fazer com que a Virgem Maria reine nos corações. Para que o Seu Filho possa reinar nesta terra que é d’Ele.

Convidam-se, portanto, «todos os católicos a se unirem conosco nesta Campanha, fazendo também a sua Consagração Total pelo método de São Luís [de] Montfort ou renovando a sua Consagração, no dia 12 de dezembro de 2014, sexta-feira (Festa de Nossa Senhora de Guadalupe, Padroeira da América Latina); ou, por razões locais, em outra data próxima». Maiores e mais detalhadas informações no já citado site do Consagra-te!, ou através da caixa de comentários ou do email deste blog. Confiemo-nos determinadamente e sem reservas à proteção da Virgem Mãe de Deus; Ela não desampara, jamais, os que a Ela humildemente recorrem. Ela não abandona, nunca, os que generosamente se colocam a Seu serviço.

Roma ruge; o Papa é monarca!

Confesso que me deixou desconcertado a notícia – estampada nos meios de comunicação seculares – de que o Papa Francisco «destitui[u] [um] bispo do Paraguai por acobertar casos de pedofilia». Trata-se do bispo de Ciudad del Este, no Paraguai, Dom Rogelio Livieres, cuja diocese passou recentemente por uma intervenção pontifícia; há não muito, comentei o assunto aqui.

Comentei no Facebook que o exercício do poder soberano e ilimitado do Sucessor de São Pedro era terrível e assustava. E isso por pelo menos três razões. Primeiro, não recordo a última vez em que uma determinação pontifícia foi executada assim, de maneira tão unilateral e implacável; dir-se-ia quase draconiana. Segundo, parece haver uma certa desproporcionalidade entre o delito e a pena; afinal de contas, o pe. Urrutigoity (em que pese a por mim já deplorada imprudência de ter sido ele recentemente alçado a cargos de confiança e destaque na Diocese) estava no Paraguai há quase dez anos, ao longo dos quais (até onde me conste) não houve quaisquer acusações contra a sua conduta. Em terceiro, por fim, há uma certa desarmonia entre o que está sendo divulgado pela mídia laica e pelos órgãos oficiais da Santa Sé.

Quanto à primeira, registre-se que o Papa é monarca plenipotenciário por direito divino, autoridade soberaníssima acima da qual não se encontra senão o próprio Deus. Ele é completamente livre para, a seu dispôr, criar e destruir dioceses; distribuir excomunhões, interditos e intervenções; sagrar, nomear e exonerar Bispos. Tal poder ilimitadíssimo, contudo, caíra em um certo desuso com o passar do tempo: não me recordo, como falei, da última vez em que um bispo foi assim sumariamente destituído.

Impossível não enxergar o aspecto positivo dessa atitude. Significa que o Bispo de Roma conhece e reconhece as suas próprias prerrogativas de Vigário de Cristo, e não hesita em empregá-las para aquilo que considera o bem da Igreja. O Pontífice que abriu mão dos sapatos vermelhos e da mozzetta papal – ditos símbolos de um poder anacrônico e que não encontrava mais lugar no mundo moderno – não se despiu, contudo, da sua autoridade soberana, e soube invocar o peso do supremo munus regendi da Igreja para governar, com mão férrea, a Barca de Pedro. Abdicando dos símbolos mas empregando sem pejo o poder neles simbolizados, o Papa Francisco, por incrível que pareça, termina por fortalecer o papado e empoderar aos olhos do mundo a figura do humilde bispo de Roma – que recusa as benesses materiais mas não abre mão das prerrogativas que o seu alto cargo lhe proporciona. É somente quando ouvimos o som tonitruante dos trovões que nos lembramos de que, afinal de contas, o Céu é capaz de trovejar. Roma ruge; o Papa é monarca.

Quanto à segunda, encontra-se aqui a parte mais dolorosa que essa situação enseja. Não parece que esteja muito bem um bom bispo ser, assim, laconicamente destituído da sua Diocese; um bispo que, ao que consta, jamais resistiu a nenhuma das disposições da Santa Sé, sempre colaborou com tanto quanto a Igreja de Roma lhe determinara, que nunca se envolveu em escândalos e cuja atuação pastoral nesses anos à frente de Ciudad del Este tem se mostrado, até onde se pode averiguar, profícua. Parece haver algo de exagerado na pena, o que desconcerta e provoca perplexidade.

No entanto, o Papa é o Papa é o Papa. Ele é o Monarca absoluto, a quem compete a guarda da Igreja Santa de Deus; em princípio, o Sumo Pontífice tem todo o direito de impôr o degredo a Santo Atanásio ou o trancafiamento a S. Pio de Pietrelcina. E às ordens legítimas dos superiores cumpre obedecer, ainda que nos pareçam injustas. É o conselho unânime dos mestres de formação espiritual; para ficar num só exemplo, medite-se neste primeiro ponto do décimo terceiro capítulo d’A Imitação de Cristo:

Aquele que não se sujeita pronta e de boa mente a seu superior, mostra que sua carne não lhe obedece ainda prontamente, mas muitas vezes se revolta e resmunga. Aprende, pois, a sujeitar-te prontamente a teu superior, se queres subjugar a própria carne, porque facilmente se vence o inimigo exterior quando o homem interior não está assolado. Pior inimigo e mais perigoso não tem a alma, que tu mesmo, quando não obedeces ao espírito. Se queres vencer a carne e o sangue, deves compenetrar-te do sincero e absoluto desprezo de ti mesmo. Mas porque ainda te amas desordenadamente, por isso te repugna sujeitar-te de todo à vontade dos outros.

Alguém comentava no Facebook que as pessoas confundiam a legitimidade da ordem com a sua justiça e, do fato de ser ordem legítima, concluíam erroneamente que era também necessariamente boa, santa e justa. De fato, essa confusão existe e cumpre ser sanada. Mas existe uma outra confusão que é muito mais daninha: trata-se do raciocínio inverso, i.e., o de quem, por não considerar a ordem justa, santa ou boa, conclui que por causa disso ela é ilegítima. E este caso é muito pior do que o primeiro, porque aquele conduz no máximo a um erro de valoração a respeito de uma situação de fato e, este, desloca todo o eixo da relação do fiel católico com a hierarquia eclesiástica para o subjetivismo individualista por cujo crivo tudo precisa passar. Não se discutem ordens: obedece-se-lhes. Se todo mundo estivesse autorizado a ponderar as determinações dos superiores para só aquiescer àquelas que lhe parecessem razoáveis, acabar-se-ia com a própria razão de ser da autoridade hierárquica.

Sim, certas ordens vaticanas podem nos parecer injustas e dolorosas, e talvez até o sejam de verdade; contudo, mesmo quanto a essas importa seguir o sábio exemplo do ex-bispo de Ciudad del Este (esta carta merece a leitura na íntegra):

Como filho obediente da Igreja, aceito, contudo, esta decisão, por mais que a considere infundada e arbitrária, pela qual o Papa terá que prestar contas a Deus e não a mim.

Gravem-se estas palavras em pedra, estampem-se-lhes nos frontispícios de nossos templos religiosos – é assim que se reconhece o valor de um Sucessor dos Apóstolos.

Por fim, quanto à terceira, diferentemente do que saiu nos meios de comunicação seculares (e do que eu próprio comentei aqui, da outra vez), a questão das acusações de pedofilia contra o padre Urrutigoity parece que não foi aludida nas informações oficiais que nos chegaram. A nota da Sala de Imprensa da Santa Sé diz simplesmente que «[a] árdua decisão da Santa Sé, determinada por sérias razões pastorais, obedece ao bem maior da unidade da Igreja de Ciudad del Este e da comunhão episcopal no Paraguai». O comunicado de imprensa da Diocese de Ciudad del Este fala em «falta de unidade na comunhão com os outros bispos do Paraguai». Na já citada carta de D. Livieres, o prelado fala abertamente em «oposição e perseguição ideológica». Parece que o problema não é o que parece, e isso – mais uma vez – nos choca e atordoa.

No entanto, repita-se quantas vezes forem necessárias, estamos diante do Papa, e do Papa empregando a sua autoridade pontifícia de um modo muito mais duro do que tem sido o habitual nos tempos que correm…! Não é possível tergiversar. Aquele adágio sobre Roma locuta, causa finita tem um significado maior do que a mera afirmação da infalibilidade da Prima Sedes em questões doutrinárias: denota também a necessidade de uma comunhão efetiva mesmo naquelas decisões de governo sobre as quais não cabe falar em infalibilidade. Papas houve que mudaram a sede do Papado para a França, que negociaram o ultrajante armistício cristero, que dissolveram a ordem dos jesuítas, que permitiram a César executar os cavaleiros da Ordem do Templo; a Igreja, ainda assim, permanece sem mácula e ruga, indefectível esposa de Cristo – e quem não consegue entender isso é porque não entendeu ainda o que significa a indefectibilidade católica. Rezemos pelo Papa, rezemos por D. Rogelio, rezemos pela Igreja Santa de Deus. Afinal de contas, tudo coopera para o bem dos que O amam; passarão pela História Bispos e Papas, e essas palavras não hão de passar.

CNBB Sul 1 sobre as eleições 2014: considerações importantes

Eu também recebi por chat do Facebook este folheto assinado pela Comissão em Defesa da Vida do Regional Sul 1 da CNBB, que até o presente momento só se encontra, na internet lusófona, no blog do Carmadélio e no Fratres in Unum. À parte o extraordinário furo jornalístico, é imperioso fazer algumas observações e questionamentos.

1. Por qual motivo o texto não foi divulgado pelos canais oficiais? A Conferência dos Bispos do Brasil tem uma página na internet e o Regional Sul 1 da CNBB tem ali uma área específica, além de um site próprio. Em nenhum desses lugares está presente o folheto que estou divulgando aqui. Penso que a mensagem  – aliás importantíssima, como já detalharei – adquiriria maior credibilidade e alcance se fosse tornada pública com o peso da Conferência Episcopal (ou mesmo de um de seus regionais!), ao invés de estar sendo difundida unicamente pela blogosfera católica.

[P.S.: Na verdade, como fui informado, o documento encontra-se no site específico da «Comissão Regional em Defesa da Vida», ocupando lugar de destaque na página principal (link direto aqui). Importa ler também esta Declaração do pe. Berardo Graz, coordenador da Comissão em Defesa da Vida do Sul 1 da CNBB.]

2. Dois outros documentos podem ser encontrados, em lugar de relativo destaque, nos sítios acima referidos. Um deles é este “Pensando o Brasil: desafios diante das eleições 2014”; o outro, estas “Orientações para as Comunidades Católicas da Arquidiocese de São Paulo”. Em que pese a sua possível pertinência, nenhum dos dois contém as informações detalhadas e concisas no que concerne à «defesa da vida» que o pessoal do Sul 1 sistematizou. Não se vê como os documentos possam ser concorrentes, ou mesmo com a presença destes dois possa suprir a lacuna daquele, quando os assuntos nuns e noutro abordados possuem enfoques diferentes.

3. Os que têm um pouco de memória hão de se lembrar do papel ostensivamente profético que o Regional Sul 1 da CNBB realizou nas eleições de 2010, mormente no épico episódio dos panfletos apreendidos e censurados pelo PT. Aqueles bispos elevaram-se acima, muito acima dos seus irmãos de báculo e mitra, e conquistaram para si a honra de serem os únicos nomes eclesiásticos imediatamente lembrados quando se fala em boas orientações católicas para o exercício da cidadania no Brasil. Não se entende, portanto, por qual razão não consta, entre as várias comissões de que se compõe o Regional Sul 1 da CNBB, o nome da Comissão em Defesa da Vida no sítio eletrônico do Regional:

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4. Entrando por fim no mérito da mensagem, creio já ter dito outras vezes aqui o seguinte: decerto existem muitas posições políticas que são lícitas ao católico, mas a indiferença diante da questão do aborto não se encontra entre elas. O ensinamento universal do Magistério é taxativo: «[a] lei divina e a razão natural excluem, portanto, todo o direito a matar directamente um homem inocente». Aqui não há espaço para dúvidas ou tergiversações: não se pode tolerar o aborto nem mesmo para a promoção de um “bem maior” e, portanto, não é lícito apoiar um candidato ou partido pró-aborto sob a justificativa de que o seu programa de governo é [o] melhor em outros pontos. Os direitos mais importantes são os primeiros critérios de exclusão: alguém que não defenda a vida «desde a concepção até a morte natural» não é uma opção legítima para o católico, mesmo que em outros pontos – como v.g. os direitos de propriedade, a liberdade da Igreja Católica e o justo socorro aos órfãos e viúvas – seja, por absurdo, a mais perfeita encarnação da Doutrina Social da Igreja. Alguém que promova o aborto não pode receber o apoio dos católicos, ainda que se apresente o mais justo dos governantes em todos os outros aspectos do exercício do poder.

Isso posto, merecem atenta consideração as informações trazidas pela Comissão do Sul 1. Em particular:

  • «[A]o se fazer um balanço sobre a atuação do atual governo na questão da defesa da vida, os resultados obtidos foram indiscutivelmente sombrios».
  • «[D]esde setembro de 2007, o PT assumiu em seu programa estatutário a legalização do aborto e a execução dessa prática em todos os casos no serviço público. Além do PT mais oito partidos políticos, registrados no Tribunal Superior Eleitoral, incluem explicitamente em seus estatutos ou programas a legalização do aborto, a saber: o Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Popular Socialista (PPS), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB), o Partido da Causa Operária (PCO), o Partido Democrático Trabalhista (PDT), o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) e o Partido Verde (PV)».
  • «[A] candidata do PSB à Presidência da República apoia a realização de um plebiscito sobre a legalização do aborto no Brasil. Esse posicionamento contradiz o direito à inviolabilidade da vida humana desde a concepção até à morte natural, sempre defendido pala Igreja».

Por mais que o nosso futuro político próximo seja inescapavelmente sombrio, não se pode perder a oportunidade de usar o efervescente período pré-eleitoral para colocar alguns pingos nos is e pontuar algumas coisas que, em outras épocas, ficam longe dos holofotes da mídia. Todo homem está obrigado a respeitar certos princípios universais da Lei Natural, independente da filosofia de vida que particularmente processe ou do partido político em cujas fileiras milite. Dizê-lo alto e claramente, ainda que diante de ouvidos moucos, é um dever ao qual não nos podemos furtar.

Dom Fabien Raharilamboniaina, OCD, fala-nos do Papa e de Teresinha

[FonteThérèse de Lisieux
Tradução: Pedro Ravazzano]

Quando de nossa visita “ad limina”, dos bispos de Madagascar, no momento em que me apresentei como bispo carmelita, diante de todos os meus confrades, o Santo Padre tomou a palavra para partilhar conosco da sua experiência com Santa Teresa do Menino Jesus.

Ele nos disse que descobriu a espiritualidade de Santa Teresinha em 1991 e que depois desta data Teresa não deixou de realizar surpresas em sua vida, inclusive nos tempos atuais. A santa sempre envia um sinal quando intercede por ele. Teresa está além das nossas expectativas e nos dá o que sequer imaginamos.

O Papa nos convidou a celebrar a Missa no outro dia pela manhã na Casa Santa Marta. Ele celebrou em ação de graças pela intercessão de Santa Teresinha. Depois da Eucaristia, perguntou o meu nome sem eu saber o porquê.

Alguns minutos depois, surpreendi-me quando o próprio Papa me buscava pelo telefone, em meu quarto em Santa Marta. Infelizmente ou providencialmente, eu estava ausente. Contudo, ele enviou uma pessoa em minha procura quando já estava a ponto de partir. Este funcionário me guiou até os seus aposentos.

O Papa estava orgulhoso de me mostrar as relíquias de Santa Teresinha e dos seus pais que se encontravam ao lado do seu escritório. Eu estava maravilhado. O Papa Francisco confirmou a sua proximidade com a espiritualidade de Teresa, tão simples e essencial, mas de modo eficaz. Ele me convidou à oração, pedindo a Teresinha pela minha missão. Nós dois rogamos a Teresa a fim de que seus pais realizassem um milagre para a canonização e sobretudo neste momento do sínodo sobre a família.

Eu estava maravilhado pela simplicidade e pela confiança do Papa, pelo seu amor à Teresinha. Ele novamente me convidou à Casa Santa Marta: “Venite a dialogare”, conforme a sua expressão.

Durante a nossa estadia em Santa Marta, nós tomamos café-da-manhã, almoçamos e jantamos junto ao Santo Padre no mesmo refeitório. Alegrava-me ao vê-lo falando diretamente com os cozinheiros, entrando na cozinha para perguntá-los da comida, de prepara-nos e servir-nos um arroz que é próprio nosso, refeição principal malgaxe.

De volta ao meu país, Madagascar, estamos agora nos preparando ativamente para a visita das relíquias da família Martin, de Santa Teresinha e dos Beatos Luís e Zélia, que virão em nossa casa em 2015, durante o período da JMJ local que reunirá cerca de 40.000 jovens.

Retirado e traduzido de “Thérèse de Lisieux – La revue du Sanctuaire, Juin 2014”

Solicitada abertura de inquérito por ultraje a culto na Catedral da Sé

Já não deve ser novidade para ninguém o recente vandalismo perpetrado por um indivíduo na Catedral da Sé de São Paulo, desfilando pelo interior da igreja com vestes dignas de uma Parada Gay. Muito satisfeito e muito orgulhoso do seu gesto libertador e revolucionário, o celerado em questão – que atende pelo nome de Yuri Tripodi – vinha se vangloriando em seu Facebook da “performance”. A depender dos desdobramentos que o caso tomou, é de se esperar que ele em breve ponha de lado o sorriso zombeteiro ora estampado no rosto.

Na última segunda-feira (28/07), foi protocolado junto ao 1º Distrito Policial da Capital (SP) um pedido de abertura de inquérito policial para a averiguação dos possíveis crimes de ultraje a culto e ato obsceno praticados pelo sr. Tripodi (cf. aqui). A notícia alvissareira me foi enviada pelo caríssimo Rodrigo Pedroso, um dos requerentes, a quem duplamente agradeço: em primeiríssimo lugar pela própria atitude tomada junto aos órgãos competentes de polícia e, em seguida, pela sua divulgação.

Não é de hoje que acontecem esses gestos covardes contra a Igreja, motivados por uma falta de respeito ao próximo que transcende qualquer credo religioso ou mesmo ausência de credo: esse tipo de agressão gratuita, tenho certeza, é percebido não apenas pelos que têm Fé, mas por qualquer pessoa capaz de um mínimo de empatia, tanto como ofensivo aos católicos quanto como de mau gosto e desnecessário. Ninguém precisa ser religioso para entender que expôr as partes íntimas dentro de um templo católico é profundamente agressivo: aliás, o próprio fato do “artista” tomar isso como um libelo contra a opressão religiosa ou o que seja já demonstra, por si só, que ele tem completa consciência do significado do seu gesto. Não se trata, portanto, de nenhum pobre-coitado sobre cujo “jeito de ser” a Igreja está lançando censuras descabidas e injustos vitupérios: trata-se, isso sim, de alguém que deliberadamente se comporta de modo a ofender e escandalizar católicos que estavam pacificamente reunidos no seu lugar próprio de culto. Não é questão de melindre religioso, e sim de civilidade pura e simples.

Não é de hoje, eu dizia, que gestos covardes assim encontram quem os realize alegremente; mas o número desses “corajosos”, estou certo, seria bastante diminuído se eles sofressem na pele alguma mínima conseqüência pelas suas ações. Se ao lado dos tapinhas amigáveis nas costas e das manifestações rasgadas de admiração despejadas nas redes sociais caíssem-lhes alguns pedidos de esclarecimentos por parte das autoridades públicas, estou certo de que os desocupados arranjariam rapidamente outras coisas para fazer: quando menos para não ter que perder tempo às voltas com delegacias e fóruns de justiça. Porque atitudes assim têm o espírito de corpo de um punhado de baratas: basta acertar uma delas para as demais fugirem, desorientadas e perdidas, para todas as direções.

Se por um lado é de se lamentar profundamente a leniência das autoridades religiosas no tocante a estas questões, que nelas parecem não ver nenhum problema de suficiente monta, por outro merecem louvores as atitudes dos fiéis particulares que, em seu próprio nome, gastam um pouco de tempo e de energia para tornar um pouco mais difícil a zombaria das coisas sagradas. Oxalá o exemplo do sr. Rodrigo Pedroso e colegas possa levar outras pessoas a tomarem a mesma iniciativa. Não somos em menor número do que os vândalos e baderneiros. Não é justo que assistamos, inertes, a esses ataques ao sentimento religioso, que escarnecem da própria civilização.

São João Batista, um santo que já nasce santo

De São João Batista comemora-se não o dia da morte (*), mas o do seu nascimento; porque ele, ao contrário dos outros santos e santas de Deus, já nasceu santo. Quando a Santíssima Virgem saudou santa Isabel e o menino pulou de alegria no ventre dela (cf. Lc I, 40ss), naquele momento aconteceu o primeiro milagre do Novo Testamento, depois do Milagre supremo da Encarnação do Verbo: naquele instante, uma mulher ficou cheia do Espírito Santo e uma criança – ainda no ventre da sua mãe – foi santificada.

[(*): Na verdade, a festa da Decapitação de São João Batista existe, e é celebrada (tanto no calendário novo quanto no antigo)  no dia 29 de agosto. Mas a festa do nascimento do Batista é maior e mais conhecida do que a de sua morte, e é ele o único santo (à exceção, claro, do próprio Cristo e da Virgem Santíssima) de quem se celebra o nascimento.]

São João Batista nasceu santo, assim com a Santíssima Virgem e assim como Nosso Senhor. Mas a razão desses três nascimentos luminosos é bastante distinta. Cristo nasceu santo porque é Deus e, por Sua própria natureza, não poderia jamais nascer de nenhuma outra maneira. A Santíssima Virgem nasceu santa porque foi preservada, no instante em que foi concebida, da mácula do pecado original: é o dogma católico da Imaculada Conceição. Já São João Batista nasceu santo porque, embora tenha sido concebido no pecado, foi santificado ainda no ventre de sua mãe. Cristo não teve e não poderia ter jamais a mancha do Pecado Original; a Virgem Santíssima poderia tê-la, e a teria, se dela não tivesse sido salva por Deus no instante da Sua concepção; São João Batista teve-a de fato, mas dela foi purificado ainda no ventre materno.

É um santo que já nasce santo quem hoje se celebra: tal acontecimento privilegiadíssimo não se tem notícia de que tenha voltado a ocorrer depois daquela noite bendita nas montanhas de Judá! O “precursor” que hoje nos nasce mereceu do próprio Cristo aquele elogio rasgado: dos nascidos de mulher, não surgira jamais outro que fosse maior do que João Batista (cf. Mt XI 11). Não é de se espantar que a Igreja lhe reserve esse lugar privilegiado. Não é de estranhar, portanto, que ele seja celebrado com tanta pompa no mundo inteiro e principalmente no Brasil.

Porque as fogueiras, os fogos, as danças, as bebidas e tutti quanti são, também, em honra a esse grande santo: não é só com primeiras vésperas, liturgias de primeira classe e procissões solenes que são honrados os santos de Deus! A piedade popular tem a sua maneira própria de impregnar o seu quotidiano com as luzes do calendário litúrgico da Igreja. Infelizmente, muitas de nossas festividades juninas estão completamente secularizadas, paganizadas até; mas convém não esquecer que elas, em sua gênese e, portanto, por direito, foram instituídas para honrar São João Batista. Por conseguinte, pode-se (e se poderia até dizer: deve-se!) usar tudo o que é propriamente junino para homenagear São João. Mesmo os fogos. Mesmo a quadrilha. Mesmo a canjica. Mesmo o quentão.

E que São João Batista seja honrado não só no dia de hoje, mas em toda a nossa vida, que esta é a maneira pela qual se honram mais perfeitamente os santos de Deus: imitando-lhes as virtudes no sacrifício quotidiano de uma vida agradável ao Altíssimo. O santo, aliás, não é propriamente conhecido por seus arroubos festivos: dele se disse que «nem comia pão nem bebia vinho» (Lc 7, 33), e a frase que lhe ficou mais característica foi aquela terrível «O machado já está posto à raiz das árvores. E toda árvore que não der fruto bom será cortada e lançada ao fogo» (Lc 3, 9).

Hoje, claro, celebra-se o pequeno filho recém-nascido de Isabel, o São João do Carneirinho, e não o corajoso mártir cuja cabeça foi servida numa bandeja de prata por desafiar os poderosos; mas não convém esquecer que ambos são o mesmo homem e, portanto, os gritos de «Penitência!» que esta criança um dia há-de fazer ecoar no deserto aplicam-se, sim, sem dúvidas, também ao dia de hoje, quando ainda festejamos o seu nascimento. Que essas considerações iluminem as nossas noites juninas e todas as noites que nos forem concedidas nessa vida. Que São João Batista, hoje honrado no mundo inteiro, rogue e interceda sempre por todos nós.

“O Papa parou em nossa casa!”

Eu mal soube da viagem pontifícia a Cassano, cidade da Itália meridional cuja maior característica, a julgar pelo que dizem os órgãos de mídia, é ser profundamente marcada pela atuação da Máfia. E foi bastante por acaso que eu fiquei sabendo deste pitoresco fato que aconteceu nas estradas italianas do sul:

Trata-se de um vídeo amador, certamente de celular, feito pelas pessoas que estavam à beira da estrada para acompanhar a passagem do automóvel pontifício. O mais impressionante não é nem a bênção concedida ao doente (depois do sr. Vinicio Riva, esse tipo de atitude vinda do Papa Francisco não deveria nos surpreender mais). O mais belo está nos detalhes.

Chama a atenção sobremaneira o título que deram ao vídeo: Papa Francesco si e fermato a casa nostra, algo como “o Papa Francisco parou em nossa casa”. Parece clichê e piegas, eu sei, mas não consigo ler essa legenda – colocada, repitamos, pelas próprias pessoas que estavam acompanhando a comitiva papal na beira da estrada; moradores do lugar – sem me lembrar das diversas passagens do Evangelho em que o hagiógrafo faz insistente questão de registrar que Jesus parou em certas casas: na de São Pedro (cf. Mt 8, 14), na de São Mateus (cobrador de impostos – cf. Mt 9, 10), mas também em algumas casas anônimas: «Em seguida, deixando aquele lugar, foi para a terra de Tiro e de Sidônia. E tendo entrado numa casa, não quis que ninguém o soubesse» (Mc 7, 24a).

Nem a Catena Aurea e nem a prestigiada “Vida de Jesus Cristo” de Lafayette dão maior relevância ao detalhe; mas eu fico pensando naquela casa precedida de artigo indefinido na qual Nosso Senhor um dia entrou. E embora não seja capaz de saber ou mesmo especular nada sobre ela (Quem eram aquelas pessoas? Será que já O esperavam? Será que já O seguiam como discípulos? Será que Ele pousava lá sempre que ia a Tiro e Sidônia? Será que Ele simplesmente chegou à porta e pediu para entrar?), uma coisa se me impõe à imaginação com clareza: a alegria que deve ter tomado conta daquele lugar, alegria da qual eu penso ver um lampejo naquele «se e fermato a casa nostra» com que rotularam um vídeo que mostra o Vigário de Cristo parando no meio de uma viagem para cumprimentar alguns moradores que estavam no caminho para o ver passar.

Uma parada singela, longe dos protocolos oficiais e das agendas diplomáticas; que ficaria para sempre desconhecida se a tecnologia atual não tivesse transformado qualquer celular em uma câmera filmadora. O Papa desceu do carro para abençoar um doente e cumprimentar alguns fiéis, e não havia nenhum fotógrafo d’Osservatore para o registrar. O fato em si é banal e corriqueiro, eu sei; mas não o é para as pessoas que o vivenciaram. Aquela casa in fines Tyri et Sidonis era tão comum que não recebeu do evangelista mais do que uma menção en passant: mas lá esteve Nosso Senhor, e isso por si só é um fato extraordinário. Por aquelas ruas do sul da Itália passou o Doce Cristo na Terra, naquela estrada o Papa Francisco parou para saudar alguns fiéis. Isso nada muda no Catolicismo; mas penso na alegria que não deve ter tomado o coração daqueles italianos que lá estavam. Na alegria que transparece do vídeo que vejo ainda mais uma vez.

E a Igreja são vários membros, e n’Ela o que acontece com um membro reverbera por todo o Corpo. A alegria daquelas pessoas é também a minha alegria; o contentamento com a ligeira delicadeza pontifícia chega também a mim. Mesmo quando dirigida a um grupo particular de católicos, toda boa obra atinge toda a Igreja. Felicito-me junto com os italianos que não conheço, mas com os quais compartilho a mesma Fé. Alegro-me com eles. E com eles também posso dizer: grazie, Papa Francesco.