CDF sobre projetos de lei contra a “discriminação” de pessoas homossexuais

Em tempos de PLC 122/2006 (e também – o tempora, o mores! – de Grito dos Excluídos apoiado por bispos brasileiros), vale a pena ler este documento da Congregação para a Doutrina da Fé chamado “Algumas reflexões acerca da resposta a propostas legislativas sobre a não-discriminação das pessoas homossexuais” que eu encontrei ontem fazendo umas pesquisas na internet. Reproduzo-o abaixo na íntegra, porque o considero extremamente pertinente, dada a situação delicada que estamos atravessando hoje no Brasil. Que bom seria se os nossos pastores fizessem eco a estas palavras tão claras da Santa Sé!

E viva a clarividência da Igreja! Estas orientações foram elaboradas em 1992, e são atuais como se houvessem sido escritas na semana passada e endereçadas especificamente ao Brasil atual.

Todos os negritos e grifos são meus.

* * *

Algumas reflexões
acerca da resposta a propostas legislativas
sobre a não-discriminação das pessoas homossexuais

INTRODUÇÃO

Recentemente, foi proposta uma legislação em vários lugares, que tornaria ilegal uma discriminação baseada num orientamento sexual. Nalgumas cidades, as Autoridades municipais puseram habitações públicas à disposição de casais homossexuais (e heterossexuais solteiros) – normalmente reservadas a famílias. Estas iniciativas, mesmo onde parecem mais dirigidas a defender os direitos civis básicos do que a tolerar a actividade homossexual ou um estilo de vida homossexual, podem, com efeito, ter um impacto negativo na família e na sociedade. Os casos, por exemplo, da adopção de crianças, dó trabalho dos professores, das necessidades habitacionais de famílias verdadeiras, das legítimas preocupações do proprietário, no que se refere aos eventuais inquilinos, são com frequência postos em discussão.

Ao mesmo tempo que seria impossível prever todas as eventualidades, em relação às propostas legislativas neste sector, tais observações procurarão identificar alguns princípios e distinções de natureza geral, os quais deveriam ser tomados em consideração pelo legislador, eleitor ou Autoridade eclesiástica consciente, no momento de enfrentar estes problemas.

A primeira secção recordará as passagens relevantes da «Carta aos Bispos da Igreja Católica sobre o Atendimento Pastoral das Pessoas Homossexuais», da Congregação para a Doutrina de Fé, de 1986. A segunda secção tratará a sua aplicação.

I.

PASSAGENS RELEVANTES DA «CARTA»
DA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ

1. A Carta recorda a «Declaração sobre alguns Pontos de Ética Sexual», da Congregação para a Doutrina da Fé, de 1975, a qual «levava em consideração a distinção feita comummente entre a condição ou tendência homossexual, de um lado, e, do outro, os actos homossexuais»; os últimos são «intrinsecamente desordenados» e «não podem ser aprovados em caso algum» (n. 3).

2. Todavia, «na discussão que se seguiu à publicação da Declaração, foram propostas interpretações excessivamente benévolas da condição homossexual, tanto que houve quem chegasse a defini-la indiferente ou até mesmo boa». A Carta continua e esclarece: «… a particular inclinação da pessoa homossexual, embora não seja em si mesma um pecado, constitui, no entanto, uma tendência, mais ou menos acentuada, para um comportamento intrinsecamente mau do ponto de vista moral. Por este motivo, a própria inclinação deve ser considerada objectivamente desordenada. Aqueles que se encontram em tal condição deveriam, portanto, ser objecto de uma particular solicitude pastoral, para não serem levados a crer que a realização concreta desta tendência nas relações homossexuais seja uma opção meramente aceitável» (n. 3). Não o é!

3. «Como acontece com qualquer outra desordem moral, a actividade homossexual impede a auto-realização e a felicidade, porque é contrária à sabedoria criadora de Deus. Refutando as doutrinas erróneas acerca do homossexualismo, a Igreja não limita, antes, pelo contrário, defende a liberdade e a dignidade da pessoa, compreendidas de um modo realista e autêntico» (n. 7).

4. No que se refere à tendência homossexual, a Carta afirma: «uma das tácticas usadas é a de afirmar, em tom de protesto, que qualquer crítica ou reserva às pessoas homossexuais, à sua atitude ou ao seu estilo de vida, é simplesmente uma forma de injusta discriminação» (n. 9).

5. «Em algumas Nações funciona, como consequência, uma tentativa de pura e simples manipulação da Igreja, conquistando-se o apoio dos Pastores, frequentemente em boa fé, no esforço que visa mudar as normas da legislação civil. Finalidade de tal acção é ajustar esta legislação à concepção própria destes grupos de pressão, para a qual o homossexualismo é, pelo menos, uma realidade perfeitamente inócua, quando não totalmente boa.

Embora a prática do homossexualismo esteja ameaçando seriamente a vida e o bem-estar de um grande número de pessoas, os fautores desta corrente não desistem da sua acção e recusam levar em consideração as proporções do risco que ela implica» (n. 9).

6. «Ela (a Igreja) é consciente de que a opinião, segundo a qual a actividade homossexual seria equivalente à expressão sexual do amor conjugal ou, pelo menos, igualmente aceitável, incide directamente sobre a concepção que a sociedade tem da natureza e dos direitos da família, pondo-os seriamente em perigo» (n. 9).

7. «É de se deplorar firmemente que as pessoas homossexuais tenham sido e sejam ainda hoje objecto de expressões malévolas e de acções violentas. Semelhantes comportamentos merecem a condenação dos Pastores da Igreja, onde quer que aconteçam. Eles revelam uma falta de respeito pelos outros, que fere os princípios elementares sobre os quais se alicerça uma sadia convivência civil. A dignidade própria de cada pessoa deve ser respeitada sempre, nas palavras, nas acções e nas legislações.

Todavia, a necessária reacção diante das injustiças cometidas contra as pessoas homossexuais não pode levar, de forma alguma, à afirmação de que a condição homossexual não seja desordenada. Quando tal afirmação é aceita e, por conseguinte, a actividade homossexual é considerada boa, ou quando se adopta uma legislação civil para tutelar um comportamento, ao qual ninguém pode reivindicar direito algum, nem a Igreja nem a sociedade no seu conjunto deveriam surpreender-se se depois também outras opiniões e práticas distorcidas ganharem terreno e se aumentarem os comportamentos irracionais e violentos» (n. 10).

8. «Em todo o caso, deve-se evitar a presunção infundada e humilhante de que o comportamento homossexual das pessoas homossexuais esteja sempre e totalmente submetido à coacção e, portanto, seja sem culpa. Na realidade, também às pessoas com tendência homossexual deve ser reconhecida aquela liberdade fundamental, que caracteriza a pessoa humana e lhe confere a sua particular dignidade» (n. 11).

9. «Ao avaliar eventuais projectos legislativos, (os Bispos) deverão pôr em primeiro plano o empenho na defesa e na promoção da vida familiar» (n. 17).

II.

APLICAÇÕES

10. «A tendência sexual» não constitui uma qualidade comparável à raça, à origem étnica, etc. no que se refere à não-discriminação. Diferentemente destas, a tendência homossexual é uma desordem objectiva (cf. Carta, 3) e requer solicitude moral.

11. Existem sectores onde não se trata de discriminação injusta tomar em consideração a tendência sexual, por exemplo, na adopção ou no cuidado das crianças, nó trabalho dos professores ou dos treinadores atléticos e no recrutamento militar.

12. As pessoas homossexuais, como seres humanos, têm os mesmos direitos de todas as pessoas, inclusivamente o direito de não serem tratadas de maneira que ofenda a sua dignidade pessoal (cf.Ibid., 10). Entre outros direitos, todas as pessoas têm o direito de trabalhar, de ter uma habitação, etc. Todavia, estes direitos não são absolutos. Podem ser legitimamente limitados por motivos de conduta externa desordenada. Isto, às vezes, é não só lícito, mas obrigatório. Além disso, não se trata apenas de casos de comportamento culpável, mas até mesmo de casos de acções de pessoas física ou mentalmente doentes. Assim, aceita-se que o Estado limite o exercício dos direitos, por exemplo, no caso de pessoas contagiadas ou mentalmente deficientes, para proteger o bem comum.

13. Incluir a «tendência homossexual» entre as reflexões, na base das quais é ilegal discriminar, pode facilmente levar a afirmar que a homossexualidade é uma fonte positiva de direitos humanos, por exemplo, no que se refere aos chamados direitos de acção afirmativa ou ao tratamento preferencial no que se refere à admissão ao trabalho. Isto é ainda mais deletério se considerarmos que não existe um direito à homossexualidade (cf. Ibid., 10), o que não deveria, portanto, constituir a base para reivindicações jurídicas. A passagem do reconhecimento da homossexualidade como factor, na base do qual é ilegal discriminar, pode facilmente levar, se não de modo automático, à protecção legislativa e à promoção da homossexualidade. A homossexualidade de uma pessoa seria invocada em oposição a uma discriminação declarada e, assim, o exercício dos direitos seria defendido exactamente mediante a afirmação da condição homossexual, em vez de em termos de uma violação dos direitos humanos básicos.

14. A «tendência homossexual» de uma pessoa não pode ser comparada com a raça, o sexo, a idade, etc., também por outro motivo, além do supracitado, que merece atenção. A tendência sexual de uma pessoa individualmente não é, de modo geral, conhecida pelos outros, a não ser que ela se identifique em público como alguém que tem esta tendência ou com a manifestação de comportamento exterior. Geralmente, a maioria das pessoas com tendências homossexuais, que procuram viver uma vida casta, não tornam pública a sua tendência sexual. Por conseguinte, o problema da discriminação, em termos de trabalho, de habitação, etc., normalmente não se apresenta.

As pessoas homossexuais que manifestam a própria homossexualidade, tendem a considerar o comportamento ou o estilo de vida homossexual «indiferente ou até mesmo bom» (cf. n. 3) e, portanto, digno de aprovação pública. Muito provavelmente, é no âmbito destas pessoas que se encontram aqueles que tentam «manipular a Igreja, conquistando-se o apoio dos Pastores, frequentemente em boa fé, no esforço que visa mudar as normas da legislação civil» (cf. n. 9), aqueles que usam a táctica de afirmar, em tom de protesto, «que qualquer crítica ou reserva às pessoas homossexuais… é simplesmente uma forma de injusta discriminação» (cf. n. 9).

Além disso, existe o perigo de a legislação, que faz da homossexualidade uma base para certos direitos, encorajar deveras uma pessoa tendencialmente homossexual a declarar a sua homossexualidade ou até mesmo a procurar um parceiro, aproveitando-se assim das disposições da lei.

15. Já que na avaliação de uma proposta legislativa deve ser dada a máxima importância à responsabilidade da defesa e da promoção da vida familiar (cf. Ibid., n. 17), é fundamental prestar atenção a cada uma das intervenções propostas separadamente. Como é que terão influência na adopção das crianças e no acto de as confiar à sua responsabilidade? Constituirão uma defesa dos actos homossexuais, públicos e privados? Conferirão às uniões homossexuais uma condição equivalente à da família, por exemplo, no que se refere à habitação, ou concedendo ao parceiro homossexual os privilégios que derivam do trabalho e que incluem, entre outras coisas, a participação «familiar» nos benefícios hospitalares concedidos aos trabalhadores? (cf. Ibid., n. 9).

16. Por fim, quando a questão do bem comum entra em jogo, não é conveniente que as Autoridades eclesiásticas apoiem, nem que permaneçam neutrais perante legislações adversas, mesmo que elas admitam excepções às Organizações e Instituições da Igreja. A Igreja tem a responsabilidade de promover a vida familiar e a moralidade pública da sociedade civil inteira, com base nos valores morais fundamentais, e não unicamente de se defender a si mesma das aplicações de leis nocivas (cf. Ibid., n. 17).

L’Osservatore Romano,
Edição semanal, N. 32, 9 de Agosto de 1992, Pág. 6 (418)

 

Nota da CNBB sobre o aborto de Feto “Anencefálico”

[Fonte: Site da CNBB

Destaques meus.]

Nota da CNBB sobre o aborto de Feto “Anencefálico”

Referente ao julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB lamenta profundamente a decisão do Supremo Tribunal Federal que descriminalizou o aborto de feto com anencefalia ao julgar favorável a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 54. Com esta decisão, a Suprema Corte parece não ter levado em conta a prerrogativa do Congresso Nacional cuja responsabilidade última é legislar.

Os princípios da “inviolabilidade do direito à vida”, da “dignidade da pessoa humana” e da promoção do bem de todos, sem qualquer forma de discriminação (cf. art. 5°, caput; 1°, III e 3°, IV, Constituição Federal), referem-se tanto à mulher quanto aos fetos anencefálicos. Quando a vida não é respeitada, todos os outros direitos são menosprezados, e rompem-se as relações mais profundas.

Legalizar o aborto de fetos com anencefalia, erroneamente diagnosticados como mortos cerebrais, é descartar um ser humano frágil e indefeso. A ética que proíbe a eliminação de um ser humano inocente não aceita exceções. Os fetos anencefálicos, como todos os seres inocentes e frágeis, não podem ser descartados e nem ter seus direitos fundamentais vilipendiados!

A gestação de uma criança com anencefalia é um drama para a família, especialmente para a mãe. Considerar que o aborto é a melhor opção para a mulher, além de negar o direito inviolável do nascituro, ignora as consequências psicológicas negativas para a mãe.   Estado e a sociedade devem oferecer à gestante amparo e proteção

Ao defender o direito à vida dos anencefálicos, a Igreja se fundamenta numa visão antropológica do ser humano, baseando-se em argumentos teológicos, éticos, científicos e jurídicos. Exclui-se, portanto, qualquer argumentação que afirme tratar-se de ingerência da religião no Estado laico. A participação efetiva na defesa e na promoção da dignidade e liberdade humanas deve ser legitimamente assegurada também à Igreja.

A Páscoa de Jesus que comemora a vitória da vida sobre a morte nos inspira a reafirmar com convicção que a vida humana é sagrada e sua dignidade inviolável.

Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, nos ajude em nossa missão de fazer ecoar a Palavra de Deus: “Escolhe, pois, a vida” (Dt 30,19).

Cardeal Raymundo Damasceno Assis

Arcebispo de Aparecida

Presidente da CNBB

Leonardo Ulrich Steiner

Bispo Auxiliar de Brasília

Secretário Geral da CNBB

“A saúde vai muito além de um simples bem estar corporal” – Bento XVI

Para os cristãos, de modo particular, o lema bíblico é uma lembrança de que a saúde vai muito além de um simples bem estar corporal. No episódio da cura de um paralítico (cf. Mt 9, 2-8), Jesus, antes de fazer com que esse voltasse a andar, perdoa-lhe os pecados, ensinando que a cura perfeita é o perdão dos pecados, e a saúde por excelência é a da alma, pois «que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua alma?» (Mt 16, 26). Com efeito, as palavras saúde e salvação têm origem no mesmo termo latino salus e não por outra razão, nos Evangelhos, vemos a ação do Salvador da humanidade associada a diversas curas: «Jesus andava por toda a Galiléia, ensinando em suas sinagogas, pregando o Evangelho do Reino e curando todo o tipo de doença e enfermidades do povo» (Mt 4, 23).

Bento XVI
Mensagem por ocasião da Campanha da Fraternidade 2012

A Nota da CNBB e a resposta das seitas

A despeito de não se encontrar na parte de “Notas e Declarações” do site da CNBB (!), na semana passada a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil publicou uma relevante nota “sobre algumas questões relativas ao uso indevido dos termos: católico, igreja católica, clero e outros”. Vou publicar o texto na íntegra, abaixo, conforme se encontra na seção de notícias do site da Conferência. [P.S.: Hoje, 09/12, a nota está disponível na seção correspondente do site da Conferência. Aparentemente, eles demoram a atualizar.]

A coisa deu resultado. Vi hoje que a “Igreja Católica Carismática” publicou uma nota de repúdio em seu site (reproduzo-a também ao final deste texto) em nome – pasmem – da “ICAR – Igreja Católica Apostólica da Redenção”, cujo órgão de comunicação oficial é aparentemente este blog. Na referida nota, os responsáveis pela seita esbravejam contra Dom Damasceno e, num português de fazer inveja ao Seu Crêisson (os caras conseguiram escrever «pois dessa forma Vossa Eminência esta agindo como um ante Cristo»!), querem dizer à Igreja Católica como Ela pode ou não pode instruir os Seus fiéis.

Ora, isto só mostra como os esclarecimentos da CNBB são necessários. Enquanto houver usurpadores de ofícios eclesiásticos apresentando-se como ministros de Nosso Senhor sem que estejam contudo unidos ao Vigário de Cristo na Terra, os bispos têm mais é que nomear os lobos mesmo. O que têm a ver com os fiéis católicos estes “pastores” que não fazem parte da Igreja? Com que autoridade uma seita recém-fundada (segundo o blog, a tal ICAR foi “Fundada em 24 de Outubro de 1988”, é mais nova do que este que vos escreve!) pretende dizer à Igreja Católica como Ela deve guiar os Seus fiéis? Que se ponham no seu devido lugar. E todo o nosso apoio a Dom Damasceno e à CNBB que teve a coragem de publicar um documento importante como este.

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Anexos: Notas citadas Continuar lendo A Nota da CNBB e a resposta das seitas

Bento XVI em Assis: “O «não» a Deus produziu crueldade e uma violência sem medida”

[Publico a íntegra do primeiro discurso do Papa Bento XVI no III Encontro de Assis, proferido hoje na Basílica de Santa Maria dos Anjos. Todos os grifos são meus.

Alguns podem estranhar que este discurso não se assemelhe tanto a uma defesa da Fé Católica diante dos que recusam a Religião Verdadeira. Isto é verdade. Mas nem todos os discursos papais precisam ser tratados de apologética, e nem os não-católicos só podem ser abordados sob a alcunha explícita de inimigos de Cristo. O dia é “pela Paz e a Justiça no Mundo”, e não diretamente “ut inimicos Sanctae Ecclesiae humiliare”. Há um tempo para cada coisa debaixo dos Céus.

O que não significa que não seja possível extrair coisas boas de uma abordagem distinta. Entre outras coisas, o Papa consegue, neste discurso, i) criticar o terrorismo islâmico; ii) demonstrar que são improfícuos os esforços naturalistas por paz; iii) defender abertamente a santidade da Igreja a despeito dos erros dos católicos; iv) criticar o Iluminismo; v) chamar os cristãos à conversão e ao aperfeiçoamento moral; vi) acusar o ateísmo assassino; e vii) separar os agnósticos (imensa maioria dos incrédulos) dos ateus fanáticos radicais (Dawkins et caterva), privando estes últimos do “número” que alegam ter.  É bastante coisa. Que as pessoas o possam perceber. E que este dia possa dar bons frutos.

Fonte: Discurso do Papa Bento XVI, Assis, 27 de outubro de 2011.]

DISCURSO DO PAPA BENTO XVI

Assis, Basílica de Santa Maria dos Anjos
Quinta-feira
, 27 de Outubro de 2011

Queridos irmãos e irmãs,
distintos Chefes e representantes das Igrejas
e Comunidades eclesiais e das religiões do mundo,
queridos amigos,

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Sobre opiniões errôneas na interpretação dos decretos do Concílio Vaticano II [1966]

[Por incrível que pareça, foi publicada pela CNBB (in “Documenta: documentos da Congregacao para a Doutrina da Fe 1965-2010”, Brasília, Edições CNBB, 2011). Dir-se-ia de tal carta “profética”, se o mais provável não fosse que ela simplesmente apontava os problemas que já aconteciam em 1966 e que, desde então, generalizaram-se de uma maneira horripilante. Convém ser lida e relida, estudada e apresentada com vigor aos católicos dos dias de hoje! Rezemos pela Igreja.

Fonte: Cartas a Probo.]

CARTA SOBRE OPINIÕES ERRÔNEAS NA INTERPRETAÇÃO DOS DECRETOS DO CCONCÍLIO VATICANO II
Congregação para a Doutrina da Fé

Depois da promulgação do Concílio Ecumênico Vaticano II, concluído recentemente, sapientíssimos documentos, tanto sobre questões doutrinais, quanto disciplinares, para promover eficazmente a doutrina da Igreja, incumbem a todo o Povo de Deus a lutar com todo o empenho para que se realize tudo o que, com a inspiração do Espírito Santo, foi solenemente proposto ou decretado naquele sínodo de Bispos, presidido pelo Romano Pontífice.

À hierarquia compete o direito e o dever de vigiar, dirigir e promover o movimento de renovação que o Concílio começou, de modo que os documentos e decretos do referido Concílio recebam uma reta interpretação e sejam levados a efeito com exatidão segundo a força e o sentido dos mesmos. Portanto, esta doutrina deve ser defendida pelos Bispos, já que, como tais, gozam do poder de ensinar com autoridade, unidos à cabeça de Pedro. É digno de elogio que muitos Pastores do Concílio já tomaram a iniciativa de explicá-la convenientemente.

Sentimos, contudo, que de diversas partes chegam notícias de como não somente pululam os abusos na interpretação da doutrina do Concílio, como também de como aqui e ali surgem opiniões estranhas e audazes, que perturbam não pouco a alma de muitos fiéis. Devemos louvar os trabalhos ou intentos que buscam penetrar mais profundamente na verdade, distinguindo retamente entre aquilo em que se deve acreditar e o que é opinião; porém, pelos documentos examinados nesta Sagrada Congregação, consta que existem não poucas sentenças que, passando por alto facilmente os limites da simples opinião, parecem afetar o mesmo dogma e os fundamentos da fé.

Convém que expressemos, como exemplo, algumas das sentenças e erros, tal como são conhecidos através da relação de doutores e das publicações escritas.

1) Primeiramente, referimo-nos à Sagrada Revelação: há quem recorra à Sagrada Escritura, deixando de lado intencionalmente a Tradição, porém restringem o âmbito e a força da inspiração e da inerrância, já que pensam equivocadamente sobre o valor dos textos históricos.

2) No que se refere à doutrina da Fé, diz-se que as fórmulas dogmáticas devem ser submetidas à evolução histórica, de tal modo que o sentido objetivo das mesmas seja exposto a mudanças.

3) Esquece-se ou subestima-se o Magistério ordinário da Igreja, principalmente do Romano Pontífice, de tal maneira que se relega ao plano das coisas opináveis.

4) Alguns quase não reconhecem a verdade objetiva absoluta, firme e imutável, expondo tudo a um certo relativismo, alegando o falaz argumento de que qualquer verdade deve seguir necessariamente o ritmo da evolução da consciência e da história.

5) Ataca-se a admirável pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, quando, ao refletir sobre a Cristologia, utilizam-se tais conceitos de natureza e pessoa, que apenas podem se conciliar com as definições dogmáticas. Insinua-se certo humanismo pelo qual o Cristo é reduzido à condição de simples homem, que foi adquirindo pouco a pouco consciência de sua filiação divina, Sua concepção virginal, seus milagres e sua Ressurreição são concedidos de palavra, porém frequentemente reduzem-se à mera ordem natural.

6) Igualmente, ao tratar da teologia dos sacramentos, alguns elementos são ignorados ou não se lhes presta a suficiente atenção. Sobretudo no que se refere à Santíssima Eucaristia. Não falta quem discuta sobre a presença real de Cristo sob as espécies de pão e vinho, defendendo um exacerbado simbolismo, como se pão e vinho não se convertessem no Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo pela transubstanciação, mas que simplesmente fossem empregados com certa significação. Há quem insista mais no conceito de ágape, com relação à missa, do que no de Sacrifício.

7) Alguns desejam explicar o Sacramento da Penitência como um meio de reconciliação com a Igreja, sem explicar suficientemente a reconciliação com Deus ofendido. Pretendem que, ao celebrar este Sacramento, não seja necessária a confissão pessoal dos pecados, mas somente se preocupem em expressar a função social da reconciliação com a Igreja.

8) Não falta quem menospreze a doutrina do Concílio de Trento sobre o Pecado Original, ou quem a interprete obscurecendo a culpa original de Adão ou, ao menos, a transmissão do pecado.

9) Não são menores os erros que circulam no âmbito da teologia moral. Com efeito, não poucos se atrevem a refutar a razão objetiva da moralidade; outros não aceitam a lei natural e defendem, por outro lado, a legitimidade da chamada “moral de situação”. Propagam-se opiniões perniciosas sobre a moralidade e a responsabilidade em matéria sexual e matrimonial.

10) A todos estes temas, temos de acrescentar uma nota sobre o Ecumenismo. A Sé Apostólica, certamente, louva todos os que, no espírito do Decreto Conciliar sobre o ecumenismo, promovem iniciativas para fomentar a caridade com os irmãos separados e atraí-los à unidade da Igreja; porém lamenta que não falte quem, interpretando a seu modo o decreto Conciliar, exija uma ação ecumênica que vá contra a verdade, assim como contra a unidade da Fé e da Igreja, fomentando um perigoso irenismo e indiferentismo, que é totalmente alheio à mente do Concílio.

Espalhada esta classe de erros e perigos, apresentamo-los sumariamente, nesta Carta aos Ordinários do lugar, para que cada um, segundo seu cargo e ofício, cuide de refreá-los e preveni-los.

Este Sagrado Dicastério roga encarecidamente para que os Ordinários do lugar tratem disso nas reuniões de suas conferências episcopais e enviem relações à Santa Sé, aconselhando o que creem oportuno, antes da festa da Natividade de Nosso senhor Jesus Cristo do ano em curso.

Esta carta, que, por uma óbvia razão de prudência, nos impede de fazê-la de domínio público, deve ser guardada sob estrito segredo pelos Ordinários e por todos aqueles que com justa causa a ensinam.

Roma, 24 de julho de 1966.
A. Card. Ottaviani,
Pró-prefeito.

Decreto sobre indulgência plenária para JMJ 2011

[Original: Vaticano.

Tradução: Canção Nova. Grifos neste.]

Decreto sobre indulgência plenária
para JMJ 2011

Concede-se a Indulgência Plenária aos fiéis que, em ocasião da 23ª Jornada Mundial da Juventude, estarão em Madri em espírito de peregrinação; também poderão conseguir a indulgencia parcial todos aqueles que, onde quer que estejam, rezarão pelos propósitos espirituais deste encontro e para o seu feliz êxito.

Chegou à Penitenciaria Apostólica a suplica de Sua Eminência Reverendíssima Antonio Maria Rouco Varela, cardeal arcebispo de Madrid e Presidente da Conferencia dos Bispos da Espanha, para que os jovens pudessem obter os esperados frutos de santificação da 23ª Jornada Mundial da Juventude, que se celebrará de 16 a 21 de agosto, na capital, e que terá como tema: “Enraizados e fundamentados em Cristo, firmes na fé” (cfr Col 2,7).

A Penitenciária Apostólica, tendo exposto ao Santo Padre estas considerações, foi munida de faculdades especiais para conceder, mediante o presente Decreto, o dom da Indulgência, segundo a mente do próprio Pontífice, como se segue:

Concede-se a Indulgência Plenária aos fiéis que devotamente participarão a todas as funções sacras ou exercícios que se desenvolverão em Madrid durante a 23ª Jornada Mundial da Juventude até a sua conclusão solene, fazendo, além disso, a confissão, e depois disso recebendo a Santa Comunhão e a oração pelas intenções de Sua Santidade.

Concede-se a Indulgência parcial aos fiéis, onde quer que se encontrem, durante o referido encontro, desde que com a alma contrita elevem as suas orações a Deus Espírito Santo, a fim que os jovens sejam motivados pela caridade e tenham a força para anunciar com a própria vida o Evangelho.

A fim que depois os fiéis possam mais facilmente tornar-se participantes destes dons celestes, os sacerdotes legitimamente aprovados para a escuta das confissões sacramentais, com alma pronta e generosa, se prestem a recebê-las e proponham aos fiéis orações publicas para o bom êxito da “Jornada Mundial da Juventude”.

O presente decreto tem validade para esta ocasião. Mesmo diante de qualquer contrária disposição Roma, da Sede da Penitenciária Apostólica, 2 de agosto, ano da Encarnação do Senhor 2011, na pia memória da “Porciùncola”.

FORTUNATO Card. BALDELLI
Penitenciário Maior

60 horas de adoração eucarística pelo Santo Padre

CONGREGATIO PRO CLERICIS

Vaticano, 13 de maio de 2011
Nossa Senhora de Fátima

Prot. N. 2011 1477

Eminência / Excelência Reverendíssima,

No dia 29 de junho próximo, celebrar-se-á o sexagésimo aniversário da Ordenação Sacerdotal do nosso amado Papa Bento XVI, [ocorrida] justamente no dia da Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo de 1951.

A ocasião é particularmente propícia para unimor-nos mais ao Sumo Pontífice, para darmos testemunho da nossa gratidão, afeto, e comunhão no serviço que oferece a Deus e à Igreja. Mas, sobretudo, em sinal de gratidão por aquele “resplendor da Verdade do Mundo” que o seu Magistério continuamente realiza.

Em espírito de sobrenatural sobriedade, por ocasião do 60º Aniversário – e cremos que [tal gesto] muito agradará ao Santo Padre – convidamos todas as circunscrições eclesiásticas, esperando uma especial participação dos sacerdotes, a oferecer “Sessenta Horas de Adoração Eucarística”, continuadas ou distribuídas no mês de junho próximo, pela santificação do clero e para obter de Deus o dom de novas e santas vocações sacerdotais.

O cume deste percurso de oração poderia coincidir com a Solenidade do Sagrado Coração de Jesus (Jornada de Santificação dos Sacerdotes), que será no dia 1º de julho, sexta-feira. Desta forma, presentiaríamos o Santo Padre com uma extraordinária coroa de oração e de união sobrenatural, capaz de mostrar o real centro da nossa vida, do qual promana todo esforço missionário e pastoral e autêntica face da Igreja e dos Seus sacerdotes.

Com a certeza [de] que poderemos contar com uma cordial e solícita colaboração de cada um dos Ex.mos Ordinários, em espírito de profunda e permanente comunhão também neste importante Aniversário, [e] na expectativa de uma sinceração adesão, despeço-me, enquanto aproveito a ocasião para confirmar os melhores sentimentos de distinto obséquio.

de Vossa Excelência / Eminência Reverendíssima
dev.mo no Senhor

Mauro Card. Piacenza
Prefeito

+ Celso Morga Iruzubieta
Arcebispo tit. de Alba marítima
Secretário

Fonte: Presbíteros

Nota da CNBB sobre as “Católicas pelo Direito de Decidir”

[Não é de hoje; tem já três anos, e foi publicada por ocasião da Campanha da Fraternidade cujo tema era a “defesa da vida” – e cujo material (posteriormente recolhido), desgraçadamente, continha também intervenções das próprias “Católicas pelo Direito de Decidir”. Como não mudaram as referidas senhoras, no entanto, esta desautorização da CNBB é válida até hoje. Perceba-se, aliás, o que não teve que ser necessário para que tal grupo tenha merecido uma nota de desaprovação da CNBB por defender “vários pontos contrários à doutrina e à moral católicas”…

Fonte: CNBB]

Nota da CNBB sobre as Católicas pelo Direito de Decidir

Têm chegado à sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB – inúmeras consultas sobre a ONG denominada “Católicas pelo Direito de Decidir”, uma vez que em seus pronunciamentos há vários pontos contrários à doutrina e à moral católicas.

Esclarecemos que se trata de uma entidade feminista, constituída no Brasil em 1993, e que atua em articulação e rede com vários parceiros no Brasil e no mundo, em particular com uma organização norte-americana intitulada “Catholics for a Free Choice”. Sobre esta última, a Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos já fez várias declarações, destacando que o grupo tem defendido publicamente o aborto e distorcido o ensinamento católico sobre o respeito e a proteção devidos à vida do nascituro indefeso; é contrário a muitos ensinamentos do Magistério da Igreja; não é uma organização católica e não fala pela Igreja Católica[1]. Essas observações se aplicam, também, ao grupo que atua em nosso país.

A Campanha da Fraternidade deste ano de 2008 reafirma nosso compromisso com a vida, especialmente, com a vida do ser humano mais indefeso, que é a criança no ventre materno, e com a vida da própria gestante. Políticas públicas realmente voltadas à pessoa humana são as que procuram atender às necessidades da mulher grávida, dando-lhe condições para ter e a criar bem os seus filhos, e não para abortá-los.

“Escolhe, pois, a vida” (Dt 30,19). Ainda que em determinadas circunstâncias se trate de uma escolha difícil e exigente, reafirmamos ser a única escolha aceitável e digna para nós que somos filhos e filhas do Deus da Vida.

Conclamamos os católicos e a todas as pessoas de boa vontade a se unirem a nós na defesa e divulgação do Evangelho da Vida, atentos a todas as forças e expressões de uma cultura da morte que se expande sempre mais.

Brasília, 03 de março de 2008

Dom Geraldo Lyrio Rocha
Arcebispo de Mariana
Presidente da CNBB

Dom Dimas Lara Barbosa
Bispo Auxiliar do Rio de Janeiro
Secretário-Geral da CNBB

 

[1] Cf. http://www.usccb.org/comm/archives/2000/00-123.htm

Carta da Congregação para a Doutrina da Fé – diretrizes sobre abusos sexuais

[Fonte: Rádio Vaticano. Foi publicada hoje (segunda-feira, 16 de maio de 2011).]

CARTA CIRCULAR

Para ajudar as Conferências Episcopais na preparação de linhas diretrizes no tratamento dos casos de abuso sexual contra menores por parte de clérigos

Dentre as importantes responsabilidades do Bispo diocesano para assegurar o bem comum dos fiéis e, especialmente das crianças e dos jovens, existe o dever de dar uma resposta adequada aos eventuais casos de abuso sexual contra menores, cometidos por clérigos na própria diocese. Tal resposta implica a instituição de procedimentos capazes de dar assistência às vítimas de tais abusos, bem como a formação da comunidade eclesial com vistas à proteção dos menores. Tal resposta deverá prover à aplicação do direito canônico neste campo, e, ao mesmo tempo, levar em consideração as disposições das leis civis.

I. Apectos gerais:

a) As vítimas do abuso sexual:

A Igreja, na pessoa do Bispo ou de um seu delegado, deve se mostrar pronta para ouvir as vítimas e os seus familiares e para se empenhar na sua assistência espiritual e psicológica. No decorrer das suas viagens apostólicas, o Santo Padre Bento XVI deu um exemplo particularmente importante com a sua disposição para encontrar e ouvir as vítimas de abuso sexual. Por ocasião destes encontros, o Santo Padre quis se dirigir às vítimas com palavras de compaixão e de apoio, como aquelas que se encontram na sua Carta Pastoral aos Católicos da Irlanda (n. 6): “Sofrestes tremendamente e por isto sinto profundo desgosto. Sei que nada pode cancelar o mal que suportastes. Foi traída a vossa confiança e violada a vossa dignidade.”

b) A proteção dos menores:

Em algumas nações foram lançados, em âmbito eclesiástico, programas educativos de prevenção, a fim de assegurar “ambientes seguros” para os menores. Tais programas tentam ajudar os pais, e também os operadores pastorais ou escolásticos, a reconhecer os sinais do abuso sexual e a adotar as medidas adequadas. Os supracitados programas mereceram amiúde um reconhecimento como modelos na luta para eliminar os casos de abuso sexual contra menores nas sociedades hodiernas.

c) A formação dos futuros sacerdotes e religiosos

O Papa João Paulo II dizia no ano de 2002: “No sacerdócio e na vida religiosa não existe lugar para quem poderia fazer mal aos jovens” (n. 3, Discurso aos Cardeais americanos, 23 de abril de 2002). Estas palavras chamam à atenção para a responsabilidade específica dos Bispos, dos Superiores Maiores e daqueles que são responsáveis pelos futuros sacerdotes e religiosos. As indicações dadas na Exortação Apostólica Pastores Dabo Vobis, bem como as instruções dos Dicastérios competentes da Santa Sé, possuem uma importância sempre crescente com vistas a um correto discernimento vocacional e a uma formação humana e espiritual sadia dos candidatos. Em particular façam-se esforços de sorte que os candidatos apreciem a castidade, o celibato e a paternidade espiritual do clérigo e que possam aprofundar o conhecimento da disciplina da Igreja sobre o assunto. Indicações mais específicas podem ser integradas nos programas formativos dos seminários e das casas de formação previstas na respectiva Ratio Institutionis Sacerdotalis de cada nação e Instituto de Vida Consagrada e Sociedade de Vida Apostólica.

Uma diligência especial deve ser ademais reservada à indispensável troca de informações acerca daqueles candidatos ao sacerdócio ou à vida religiosa que são transferidos de um seminário a outro, de uma a outra Diocese ou de Institutos religiosos a Dioceses.

d) O acompanhamento dos sacerdotes

1. O Bispo tem o dever de tratar a todos os seus sacerdotes como pai e irmão. Além disso, o Bispo deve providenciar com atenção especial à formação permanente do clero, sobretudo nos primeiros anos seguintes à sagrada Ordenação, valorizando a importância da oração e do mútuo apoio na fraternidade sacerdotal. Os sacerdotes devem ser informados sobre o dano provocado por um clérigo à vítima de abuso sexual e sobre a própria responsabilidade diante da legislação canônica e civil, como também a reconhecer os sinais de eventuais abusos perpetrados contra menores;

2. Os Bispos devem assegurar todos os esforços no tratamento dos casos de eventuais abusos que porventura lhes sejam denunciados de acordo com a disciplina canônica e civil, no respeito dos direitos de todas as partes;

3. O clérigo acusado goza da presunção de inocência até prova contrária, contudo, o Bispo, por cautela, poderá limitar o exercício do ministério, enquanto espera que se esclareçam as acusações. Em caso de inocência, não se poupem esforços para reabilitar a boa fama do clérigo acusado injustamente.

e) A cooperação com as autoridades civis

O abuso sexual de menores não é só um delito canônico, mas também um crime perseguido pela autoridade civil. Se bem que as relações com as autoridades civis sejam diferentes nos diversos países, é, contudo importante cooperar com elas no âmbito das respectivas competências. Em particular se seguirão sempre as prescrições das leis civis no que toca o remeter os crimes às autoridades competentes, sem prejudicar o foro interno sacramental. É evidente que esta colaboração não se refere só aos casos de abuso cometidos por clérigos, mas diz respeito também aos casos de abuso que implicam o pessoal religioso ou leigo que trabalha nas estruturas eclesiásticas.

II. Breve relatório da legislação canônica em vigor relativa ao delito de abuso sexual de menores perpretado por um clérigo

No dia 30 de abril de 2001, o Papa João Paulo II promulgou o Motu Própio Sacramentorum Sanctitatis Tutela (SST), com o qual se inseriu o abuso sexual de um menor perpetrado por um clérigo no elenco de delicta graviora, reservado à Congregação para a Doutrina da Fé (CDF). A prescrição de tal delito foi fixada em 10 anos a partir do 18º aniversário da vítima. A legislação do Motu Próprio vale tanto para os clérigos latinos quanto para os clérigos orientais, igualmente para o clero diocesano como para o religioso.

Em 2003, o então Prefeito da CDF, o Cardeal Ratzinger, obteve de João Paulo II a concessão de algumas faculdades especiais para oferecer maior flexibilidade nos processos penais para os casos de delicta graviora, dentre os quais o uso do processo penal administrativo e o pedido da demissão ex officio nos casos mais graves. Estas faculdades foram integradas na revisão do Motu Próprio aprovada pelo Santo Padre Bento XVI aos 21 de maio de 2010. Segundo as novas normas a prescrição é de 20 anos, os quais nos casos de abuso de menores se calculam a partir do 18º aniversário da vítima. A CDF pode eventualmente derrogar às prescrições em casos particulares. Especificou-se também o delito canônico da aquisição, detenção ou divulgação de material pedopornográfico.

A responsabilidade de tratar os casos de abuso sexual contra menores é, num primeiro momento, dos Bispos ou dos Superiores Maiores. Se a acusação parecer verossímil, o Bispo, o Superior Maior ou o seu delegado devem proceder a uma inquisição preliminar de acordo com os cân. 1717 do CIC, 1468 CCEO e o art. 16 SST.

Se a acusação for considerada crível – digna de crédito, pede-se que o caso seja remetido à CDF. Uma vez estudado o caso, a CDF indicará ao Bispo ou ao Superior Maior os ulteriores passos a serem dados. Ao mesmo tempo, a CDF oferecerá uma diretriz para assegurar as medidas apropriadas, seja garantindo um procedimento justo aos clérigos acusados, no respeito do seu direito fundamental à defesa, seja tutelando o bem da Igreja, inclusive o bem das vítimas. É útil recordar que normalmente a imposição de uma pena perpétua, como a demissão do estado clerical requer um processo penal judicial. De acordo com o Direito Canônico (cf. can. 1342 CIC) os Ordinários não podem decretar penas perpétuas por decretos extrajudiciários; para tanto devem se dirigir à CDF, à qual compete o juízo definitivo a respeito da culpabilidade e da eventual inidoneidade do clérigo para o ministério, bem como a conseqüente imposição da pena perpétua (SST Art. 21, § 2).

As medidas canônicas aplicadas contra um clérigo reconhecido culpado de abuso sexual de um menor são geralmente de dois tipos:

1) medidas que restringem o ministério público de modo completo ou pelo menos excluindo os contatos com menores. Tais medidas podem ser acompanhadas por um preceito penal; 2) penas eclesiásticas, dentre as quais a mais grave é a demissão do estado clerical.

Em alguns casos, prévio pedido do próprio clérigo, pode-se conceder a dispensa, pro bono Ecclesiae das obrigações inerentes ao estado clerical, inclusive do celibato.

A inquisição preliminar e todo o processo devem se desenvolver com o devido respeito a fim de proteger a discrição em torno às pessoas envolvidas, e com a devida atenção à sua reputação.

Ao menos que existam razões graves em contrário, o clérigo acusado dever ser informado da acusação apresentada, a fim de que lhe seja dada a possibilidade de responder à mesma, antes de se transmitir um caso à CDF. A prudência do Bispo ou do Superior Maior decidirá qual informação deva ser comunicada ao acusado durante a inquisição preliminar.

Compete ao Bispo ou ao Superior Maior prover o bem comum determinando quais medidas de precaução previstas pelo cân. 1722 CIC e pelo cân. 1473 CCEO devem ser impostas. De acordo com o art. 19 SST, isto se faz depois de começada a inquisição preliminar.

Recorda-se finalmente que se alguma Conferência Episcopal, excetuado o caso de uma aprovação da Santa Sé, julgue por bem dar normas específicas, tal legislação particular dever ser considerada como um complemento à legislação universal e não como substituição desta. A legislação particular deve, portanto harmonizar-se com o CIC/CCEO, bem como com o Motu Próprio Sacramentorum Sanctitatis Tutela (30 de abril de 2001) como foi atualizado aos 21 de maio de 2010. Se a Conferência Episcopal decidir estabelecer normas vinculantes, será necessário requerer a recognitio aos Dicastérios competentes da Cúria Romana.

III. Indicações aos Ordinários sobre o modo de proceder

As linhas diretrizes preparadas pela Conferência Episcopal deveriam fornecer orientações aos Bispos diocesanos e aos Superiores Maiores no caso em que fossem informados de possíveis (presunti) abusos sexuais contra menores perpetrados por clérigos presentes no território da sua jurisdição. Tais linhas diretrizes devem levar em conta as seguintes considerações:

a.) o conceito de “abuso sexual contra menores” deve coincidir com a definição do Motu Próprio SST art. 6 (“o delito contra o sexto mandamento do Decálogo cometido por um clérigo com um menor de dezoito anos”), bem como com a praxe interpretativa e a jurisprudência da Congregação para a Doutrina da Fé, levando em consideração as leis civis do País;

b.) a pessoa que denuncia o delito dever ser tratada com respeito. Nos casos em que o abuso sexual esteja ligado com outro delito contra a dignidade do sacramento da Penitência (SST, art. 4), o denunciante tem direito de exigir que o seu nome não seja comunicado ao sacerdote denunciado (SST, art. 24);

c.) as autoridades eclesiásticas devem se empenhar para oferecer assistência espiritual e psicológica às vítimas;

d.) o exame das acusações seja feito com o devido respeito do princípio de privacidade e de boa fama das pessoas;

e.) ao menos que haja graves razões em contrário, já durante o exame prévio, o clérigo acusado seja informado das acusações para ter a possibilidade de responder às mesmas;

f.) os órgãos consultivos de vigilância e de discernimento dos casos particulares, previstos em alguns lugares, não devem substituir o discernimento e a potestas regiminis dos bispos em particular;

g.) as linhas diretrizes devem levar em consideração a legislação do país da Conferência, especialmente no tocante à eventual obrigação de avisar as autoridades civis;

h.) seja assegurado em todos os momentos dos processos disciplinares ou penais um sustento justo e digno ao clérigo acusado;

i.) exclua-se o retorno do clérigo ao ministério se o mesmo for perigoso para os menores ou escandaloso para a comunidade.

Conclusão:

As linhas diretrizes preparadas pelas Conferências Episcopais pretendem proteger os menores e ajudar as vítimas para encontrar assistência e reconciliação. As mesmas deverão indicar que a responsabilidade no tratamento dos delitos de abuso sexual de menores pro parte dos clérigos compete em primeiro lugar ao Bispo diocesano. Por fim, as linhas diretrizes deverão levar a uma orientação comum no seio de uma Conferência Episcopal, ajudando a harmonizar do melhor modo os esforços dos Bispos em particular a fim de salvaguardar os menores.

Roma, da Sede da Congregação para a Doutrina da Fé, 3 de maio de 2011

William Cardinale Levada
Prefeito

X Luis F. Ladaria, S.I.
Arcebispo Tit. de Thibica
Secretário