Starbucks apóia “Casamento Gay”

No último mês de janeiro, a conhecida rede de cafeterias Starbucks anunciou o seu apoio entusiasmado a um projeto de lei que pretende legalizar o “casamento gay” em Washington. Segundo o The Seattle Times, a companhia vem engrossar uma vasta lista de outras empresas (incluindo, p.ex., a Microsoft e a NIKE) que têm a mesma política sobre esta mudança (verdadeiramente revolucionária) na legislação americana.

O Catholic Vote explica melhor a situação. Segundo ele, há este projeto de lei tramitando em Washington. A governadora, Christine Gregoire, católica, disse que assinaria a lei caso ela passasse pelas duas casas legislativas – o que parece que vai acontecer. Ainda segundo o blog:

Em outras palavras, eles [a Starbucks] aguardaram corajosamente até que a legislação se tornasse popular e tivesse os votos necessários para ser aprovada para então se jogarem na crista da onda [then jumped on the bandwagon]. É quase heróico.

A National Organization for Marriage lançou uma campanha contra a rede de cafeterias. “A Starbucks tomou, corporativamente, a decisão de dar apoio político à redefinição do casamento para toda a sociedade. Nós não vamos tolerar que uma companhia internacional tente impôr os seus valores desordenados aos cidadãos. A maior parte dos americanos – e praticamente todos os seus consumidores em alguns países nos quais a Starbucks está presente – acredita que o casamento é entre um homem e uma mulher. Eles não ficarão satisfeitos em saber que seu dinheiro está sendo utilizado para apoiar o casamento gay na sociedade”. A notícia de primeira mão está no site da NOM.

Drop Starbucks é uma campanha contra a rede de cafeterias, por ela ter anunciado apoio institucional ao "Casamento Gay"A campanha é a Dump Starbucks. “Tomando esta atitude, a Starbucks declarou uma guerra cultural a todas as pessoas de fé (e a milhões de outras) que acreditam que a instituição do casamento entre o homem e a mulher é algo que deve ser preservado. Uma parte [do dinheiro] de cada copo de café comprado na Starbucks em qualquer lugar do mundo vai financiar esta investida da companhia contra o casamento”.

A questão que se nos apresenta é complexa e já fora delineada no texto do Catholic Vote: consumir os produtos da rede de cafeteria contitui-se, então, cooperação [ao menos indireta ou remota] com o mal? Há o dever de evitá-lo, nem que seja apenas para evitar o escândalo?

Os princípios da moralidade (dos quais o ato humano tira a sua bondade ou maldade) são três, segundo Del Greco: o objeto, as circunstâncias e o fim. Parece-me claro que o objeto (o café) e o fim (satisfazer o paladar) são perfeitamente lícitos no caso em pauta; o problema, se houver, está nas circunstâncias. É a partir delas que é possível falar em colaboração (material, se houver, porque formal não é o caso – a menos que alguém passe a comprar na Starbucks precisamente por causa desta política da empresa de apoiar o “casamento gay”) próxima ou remota, direta ou indireta, etc.

Eu não sei a resposta a estas questões. O que sei é que é significativo que coisas como essa alcancem a grande mídia. O que acontece quando os interesses de grandes corporações chocam-se com os das pessoas que as mantêm? O que nós, enquanto católicos engajados na luta pela Família, podemos e devemos fazer em situações assim? A guerra cultural, antes travada em trincheiras e armadilhas, em conchavos e perfídias, às ocultas, agora se desenrola em campo aberto e à vista de todos. E isto, sem sombra de dúvidas, é um grande bem e uma vantagem para nós, que não temos nada a esconder. É já uma vitória.

“A Dignidade Cristã da Mulher” – Alice Von Hildebrand

[Excelente texto para o dia de hoje! Trago apenas um excerto para meditação. Que as mulheres nunca se esqueçam da especificidade do seu valor; que elas não sacrifiquem a sua feminilidade nos altares quiméricos da falsa “igualdade” pregada nos dias de hoje; que elas não caiam no canto-de-sereia das feministas que tanto mal causaram nos últimos anos – não apenas às mulheres, mas a toda a humanidade.]

Não se esqueça de que Ele, a Quem o universo inteiro não pode conter, foi “escondido” no ventre da Santa Virgem por nove meses. Uma vez que você percebe isto você ficará maravilhada pelo duplo mistério que Deus confiou a você: conceber um ser humano feito à imagem e semelhança de Deus, e dar à luz a ele em meio à dor e sofrimento. Não se esqueça que foi também em meio à dor e sofrimento que Cristo reabriu para nós os portões do paraíso – o qual foi fechado pelo pecado.

Para a mulher foi concedido o impressionante privilégio de nobre sofrimento para que um novo ser humano, feito à imagem e semelhança de Deus, pudesse vir ao mundo. Medite sobre isto por um momento e você sentirá uma profunda reverência pelo seu corpo. Ele pertence a Deus, e não é um “brinquedo” que você pode dispor para própria satisfação.

Alice Von Hildebrand
A dignidade cristã da mulher

“Deus não está morto” – William Craig em São Paulo

O filósofo não-católico William L. Craig estará no Brasil na próxima semana. Ele dará uma aula no Mosteiro de São Bento de São Paulo no dia 12/03; o evento é gratuito. De acordo com a Dicta, «[p]ara quem não sabe, trata-se do homem que aterrorizou gente respeitável como A. C. Grayling e Christopher Hitchens  em debates públicos sobre ateísmo, ética e cosmologia». Enfatizo: cheguem cedo.

As quatro paredes do materialismo são as quatro paredes de uma prisão

[Tolkien e Lewis conversando sobre o mito. A passagem é clássica; recentemente, encontrei-a dramatizada neste vídeo do youtube. Vale acompanhar. Cliquem no botão de “Closed Caption” (CC, embaixo da barra de progresso, à direita) para ativar a legenda em português, caso ela já não apareça.]

TOLKIEN: – [A estória do Cristianismo] tem tudo o que o coração humano deseja, porque tem sido contada por Aquele que é a satisfação do próprio desejo. É uma estória que começa e termina com a alegria.

LEWIS: – Mas só porque uma estória traz alegria, isso não significa necessariamente que é verdadeira. Há muitos mitos alegres e eles não me parecem verdadeiros, me parecem falsos.

TOLKIEN: – E ainda ESSA estória tem a inconsistência da realidade. Não há nenhum outro conto jamais contado que os homens consideraram que era verdade, e nenhum que tantos céticos vieram a aceitar como verdade.

LEWIS: – Talvez seja apenas um artifício muito bem contado…

TOLKIEN: – Essa história tem o supremo convincente tom de arte primária, não ficção! Mas de Criação. E rejeitar isso leva a escuridão ou a ira. De fato, na minha própria vida ela me levou da escuridão para a luz.

LEWIS: – Surpreendente. Tollers, você me surpreendeu. Você absolutamente me surpreendeu.

O machismo teológico do pensamento cristão tradicional

Perdoem-me a sinceridade, mas o “perfume” deste “canteiro de obras chamado teologia” apresentado pelo pe. Elias Souza tem cheiro é de esterco. O texto é um ultraje tanto à teologia quanto às próprias mulheres em cuja defesa alegadamente se levanta. A seguir, comento os pontos que são mais escandalosos:

– O assunto “ordenação de mulheres” não tem nada de “polêmico”. Na verdade este assunto está encerrado, porque a Igreja já se manifestou de forma definitiva sobre a questão dizendo que Lhe era impossível conferir o sacramento da Ordem para mulheres. Para quem não lembra, o texto da Ordinatio Sacerdotalis de S.S. João Paulo II é o seguinte:

Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja.

Acrescente-se o fato de que a Igreja prevê excomunhão latae sententiae para quem tenta ordenar mulheres (bem como para as mulheres que tentam ser ordenadas). Mais claro do que isto é impossível.

– As idéias de “um inevitável tom machista” (!) na teologia clássica ou de uma “visão androcêntrica” (!!) do Cristianismo são um ultraje teológico, inconcebíveis na pena de um sacerdote católico. Além, é claro, de serem uma grosseira falsificação histórica. Bastaria ao pe. Elias abrir a Summa – este escrito escolástico machista! – para ver o que Santo Tomás diz sobre a origem da mulher; se ele cita a tese de Aristóteles de que a mulher é “um varão frustrado”, é justamente para precisar-lhe os limites de modo a não diminuir a dignidade feminina decorrente da Criação: com relação à totalidade da natureza, a mulher não é algo ocasional. Porque “a intenção de toda a natureza depende de Deus, Autor da mesma, o Qual ao produzi-la não fez somente o homem, mas também a mulher” (Ia, q.92, a.1, ad.1).

Aquela clássica exegese da passagem do Gênesis – segundo a qual a mulher é igual ao homem por ter sido feita de uma sua costela – encontra-se também nesta questão da Summa: “a mulher não deve dominar o varão (1 Tm 2, 12), motivo pelo qual não foi formada de sua cabeça. Tampouco deve o varão desprezá-la como se ela lhe estive submetida servilmente: por isso ela não lhe foi formada dos pés” (id. ibid., a.3, resp.). E, no último artigo (id. ibid., a.4), o Aquinate defende sem pestanejar que a mulher foi criada diretamente por Deus, contra os que tentavam diminuir-lhe a dignidade por ter sido ela feita a partir de uma costela do homem.

– O que o sacerdote quer dizer com “[é] tempo de (…) questionar a hierarquia da natureza humana sobre a não-humana”?! Por acaso desconhece o padre que a natureza humana é, sim, superior – e muito! – à natureza bruta, à vegetal ou mesmo à animal? Nunca leu o padre nas Escrituras Sagradas que Deus fez o homem quase igual aos anjos e o coroou de glória e de honras (Sl 8, 6), dando-lhe poder e submetendo-lhe “todo o universo,  rebanhos e gados, e até os animais bravios, pássaros do céu e peixes do mar, tudo o que se move nas águas do oceano” (Sl 8, 7b – 9)? Como assim “questionar a hierarquia da natureza humana sobre a não-humana”, acaso o padre quer questionar o próprio Deus Altíssimo que fala através das Escrituras Sagradas? E é com este cabedal de fecundidade teológica que o sujeito abre a pouca para chamar de “machistas” os santos da Igreja de Deus?

– Por fim, é outro absurdo ignorante a idéia de que hoje “é tempo da mulher fazer teologia”. O Pe. Elias está profundamente atrasado. Afinal de contas, nas profundezas da Idade das Trevas – no ano de mil trezentos e tantos – Santa Catarina de Sena (doutora da Igreja!) já fazia teologia. E hoje, dois de janeiro, celebramos o aniversário natalício de outra mulher que também fez teologia: Teresa de Lisieux, nossa Santa Teresinha de Jesus, que inscreveu o seu nome entre os Doutores da Igreja justamente porque soube muito bem beber das fontes da Teologia Cristã (ao contrário do Pe. Elias, que prefere cuspir no passado da Igreja). Ao contrário das teólogas-eco-feministas-holísticas-revolucionárias-ultrajovens que o Pe. Elias apregoa – e que aliás nunca produziram absolutamente nada que fosse útil à Igreja de Cristo, mas enfim… -, são as santas católicas – estas insignes personalidades femininas – que verdadeiramente dignificam a mulher: e estas mulheres foram notáveis justamente por se esforçarem para estar em estreita comunhão com a Igreja Católica, fora da qual só existe confusão e onde todas as “teologias” sempre foram estéreis e vãs.

Deus – uma hipótese desnecessária? – John C. Lennox

Deus – Uma Hipótese Desnecessária?

A ciência tem alcançado êxito impressionante na investigação do Universo físico e na elucidação de como ele funciona. A pesquisa científica também levou à erradicação de muitas doenças horríveis e nos deu esperanças de eliminar muitas outras. E a investigação científica alcançou outro efeito numa direção completamente diferente: ela serviu para libertar muita gente de medos supersticiosos. Por exemplo, ninguém precisa mais pensar que um eclipse da Lua é causado por algum demônio assustador, que necessita ser apaziguado. Por tudo isso e por inúmeras outras coisas devemos ser muito gratos.

Porém, em algumas áreas, o próprio sucesso da ciência tem também conduzido à ideia de que, por conseguirmos entender os mecanismos do Universo sem apelar para Deus, podemos concluir com segurança que nunca houve nenhum Deus que projetou e criou este Universo. Todavia, esse raciocínio segue uma falácia lógica comum, que podemos ilustrar como segue.

Tomemos um carro motorizado Ford. É concebível que alguém de uma parte remota do mundo que o visse pela primeira vez e nada soubesse sobre a engenharia moderna pudesse imaginar que existe um deus (o sr. Ford) dentro da máquina, fazendo-a funcionar. Essa pessoa também poderia imaginar que quando o motor funcionava suavemente o sr. Ford gostava dela, e quando ele se recusava a funcionar era porque o sr. Ford não gostava dela. É óbvio que, se em seguida a pessoa passasse a estudar engenharia e desmontasse o motor, ela descobriria que não existe nenhum sr. Ford dentro dele. Tampouco se exigiria muita inteligência da parte dela para ver que não é necessário introduzir o sr. Ford na explicação de funcionamento do motor. Sua compreensão dos princípios impessoais da combustão interna seria mais que suficiente para explicar como o motor funciona. Até aqui, tudo bem. Mas se a pessoa então decidisse que seu entendimento dos princípios do funcionamento do motor tornavam impossível sua crença na existência de um sr. Ford, que foi quem de fato projetou a máquina, isso seria evidentemente falso – na terminologia filosófica ela estaria cometendo um erro de categoria. Se nunca houvesse existido um sr. Ford para projetar os mecanismos, nenhum mecanismo existiria para que a pessoa entendesse.

John C. Lennox,
Por que a ciência não consegue enterrar Deus?
in Folha de São Paulo

Sobre as “provas” (!) da inexistência de Deus

A existência de Deus, como ensina a Doutrina Católica, é alcançável pela razão humana: «Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana, por meio das coisas criadas» (Concílio Vaticano I, Seção III, Cap. II). Assim, os que dizem que Deus não existe são, nas Escrituras Sagradas, chamados de estultos, i.e., insensatos, tolos, ignorantes. A expressão na Vulgata Latina é ainda mais clara: dixit insipiens in corde suo non est Deus (Ps. XIII, 1). “Insipiente” (descobri-o agora) é inclusive dicionarizado em português (ao menos em Portugal): aquele “que nada sabe”, em oposição a “sapiente”.

Neste sentido, gostaria de tecer alguns comentários sobre este texto que se propõe a provar a inexistência de Deus (!). Ele foi apresentado aqui. As tais absurdas “provas” podem ser sistematizadas no seguinte:

1. «Há uma óbvia contradição entre ser “onisciente, onipotente, onipresente” e “imaterial, atemporal” simultaneamente».

Só na cabeça do estulto arrogante. A justificativa apresentada, de um materialismo tão absurdamente grosseiro, chega a ser pueril: «Conquanto informação no universo é, necessariamente, energia, particularmente energia eletromagnética, qualquer entidade que se supõe onisciente deve, imperiosamente, ser capaz de ler as informações que são transmitidas por estas ondas energéticas. Tem de haver pelo menos um receptor sensível, vale dizer material, para todas as informações, capaz de detectá-las e permitir o efeito da onisciência. (…) Seriam necessários infinitos receptores para que o atributo da onisciência fosse verdadeiro, o que implica que em todos os lugares do universo haveria receptores presentes – a onipresença material».

O que dizer? Nego, óbvia e simplesmente, a necessidade (imperativa, segundo o filósofo!) de um “receptor sensível” (!) para “ler” a “informação” do Universo. O insipiente autor destas alegadas provas está, na verdade, aplicando um reducionismo grosseiro ao problema – no caso, reduzindo a existência à matéria e pressupondo a necessidade de um sensor material para se conhecer a matéria. Isto não é, absolutamente, uma prova, e sim uma petição de princípio: que não exista uma Inteligência imaterial está já contido na premissa adoptada pelo estulto de que é necessário haver receptores sensíveis para que haja possibilidade de conhecimento do Universo. Naturalmente, os crentes negam esta premissa estapafúrdia.

É talvez com relação à Onipresença que o argumento pode impressionar um pouco, mas ele padece do mesmo vício acima apontado. Diz o ignorante: «Nenhuma presença que não pode ser traduzida, experimentada, efetivada em algum tipo de matéria, que não assuma uma corporalidade material, que não ocupe algum lugar no espaço – ainda mais supostamente presente em todo o espaço – pode ser detectada e interagir neste universo».

Percebam o salto lógico: de “não pode ser detectada” (coisa com a qual naturalmente concordamos, se “detectada” estiver no sentido de “detectada por meio de instrumentos de medição”), o ateu passa imediatamente para “não existe”! Isto, sim, é um primor de lógica. De novo a petição de princípio: prove primeiro o estulto ateu que não existe o que não pode ser detectado, para só depois vir falar em “provas” sobre o que quer que seja.

Na verdade, Deus é Onipresente não de presença material (óbvio, posto que senão cairíamos no panteísmo), mas de presença enquanto causa do ser das coisas que existem, “como o agente está presente no que faz” (Summa Ia, q. 8 – o ignorante ateu faria bem em ler ao menos esta questão da Summa antes de vir falar em onipresença “física”!). Deus não apenas cria o Universo como também o mantém na existência – e é neste sentido que Deus é Onipresente. Aliás, com um materialismo destes, espanta (positivamente!) que o autor do texto em análise não tenha “refutado” a Onipotência Divina com o exemplo do terrível embate entre as meias Vivarina e as facas Ginsu

2. «Porque (sic) um deus “onisciente, onipotente, onipresente, transcendental, imaterial, atemporal, pessoal e necessário” não é, afinal, auto-evidente?»

O que o ateu entende por “auto-evidente”? Parece ser “aquilo sobre o qual ninguém discorda”, o que é uma definição evidentemente errônea, visto que (principalmente nos dias de hoje!) não existe rigorosamente nada com o qual todo o mundo concorde.

Ademais, o Doutor Angélico também explica por que é que a existência de Deus não é evidente por si mesma (Summa Ia, q.2). E a resposta é, simplesmente, porque nós não conhecemos Deus – “não sabemos em quê consiste Deus [e portanto] para nós [a Sua existência] não é evidente”. É por isso que nós precisamos ensiná-la e demonstrá-la; uma vez que entendamos que Deus é o Ser Necessário e que o Ser Necessário existe necessariamente, a existência de Deus passará a ser evidente também para nós.

Note-se ainda que a queixa do estulto ateu é totalmente descabida. Não existe nada que «[t]odas as crianças do mundo, no nascimento ou quando se auto-descobrissem, sem qualquer outra influência» descubram por si sós. Até mesmo os princípios básicos como “o todo é maior do que as partes” precisam ser ensinados antes que sejam reconhecidos como evidentes, uma vez que as pessoas não nascem sabendo o que seja “todo” e o que seja “parte”. Por qual motivo, então, Deus não deveria ser ensinado?

3. «Ninguém seria insano de negar a existência do que necessita para viver».

Mas é óbvio que seria, uma vez que o número dos estultos é infinito – stultorum infinitus est numerus (Ecclesiastes I, 15): aí estão os ateus para o demonstrar! Por que não? Do fato de Deus – como explicado acima – ser a causa da existência dos seres não segue que todos os seres reconheçam imediatamente esta necessidade causal. Do fato de haver «muitos humanos que simplesmente continuam a viver sem saber sequer da existência deste debate, quanto mais deste deus» não segue que estes seres humanos vivam sem que Deus os mantenha na existência. Desde quando “saber” a respeito de alguma coisa é necessário para que esta coisa exista?

Para usar uma analogia bem rudimentar e materialista (como parece ser necessário para alguns adeptos radicais do materialismo cego), durante muito tempo as pessoas não souberam da existência das bactérias que vivem no intestino humano e regulam o equilíbrio do organismo. E a flora intestinal continuou existindo, a despeito de haver muitos humanos que simplesmente continuavam a viver sem saber sequer da existência de uma coisa chamada “bactéria”. No quê isto é minimamente um argumento contra a existência da flora intestinal? No quê a ignorância dos ateus é um argumento contra a existência de Deus?

É esta, enfim, a miséria intelectual de quem pretende “provar” que Deus não existe. As palavras das Escrituras Sagradas chegam a ser brandas: chamar “insipiente” uma pessoa dessas é até um tratamento honroso que lhe é dispensado. Mas a arrogância dos ignorantes parece não ter limites. Na contramão de qualquer metafísica minimamente séria, o que dizer de um sujeito que tem a coragem de afirmar que «o universo é a prova da não-existência de deus»? O autor de tal texto deveria envergonhar-se dele, se lhe resta ao menos um mínimo de amor-próprio para compensar a falta de entendimento das coisas mais básicas – sobre as quais, não obstante, ele insiste em discorrer. Mas a caravana passa enquanto os cães ladram. E, enquanto isso – diz outro salmo -, “Aquele, porém, que mora nos céus, se ri, o Senhor os reduz ao ridículo” (Sl 2, 4).

Chesterton vs. Clarence Darrow

Mais Chesterton dramatizado! Recentemente, eu dizia para alguém que posso ler um texto de vinte páginas, mas não tenho paciência para assistir um vídeo de três minutos. Estes dez minutos de Chesterton, no entanto, são deliciosos.

Do canal do youtube: «O debate que vocês assistirão abaixo é a reconstrução de um que realmente aconteceu em Nova York, em 1931. A reconstrução foi feita por Dale Ahlquist a partir de relatos do mesmo (não há dele transcrição conhecida) e de textos de Chesterton que tratam dos mesmos assuntos que animaram o debate. Ele é atual porque o agnosticismo é o mesmo — e tem muitos representantes na intelectualidade atual — a doutrina católica é a mesma e, sobretudo, porque “o elo perdido de Darwin continua perdido”, como nos lembra o grande escritor inglês».

“Tudo é absurdo” – Frei Leão José Moreau

Muitas formas, bem diversas, de ceticismo e de pessimismo, se encontram registradas na história do pensamento humano, desde os sofistas e os pirrônicos antigos até os modernos agnósticos, desde Çakya-Muni até Schopenhauer. Foi posta em dúvida a possibilidade do conhecimento objetivo. Com Heráclito talvez, e com Hegel, contestou-se mesmo o valor do princípio fundamental de todo pensamento, sem o qual êste se nega a si mesmo: o princípio de não-contradição. A vida foi declarada radicalmente má e preferido o nada ao ser. A história dos sistemas filosóficos oferece-nos tôdas as espécies de expressões – ao menos verbais – da dúvida e da recusa. Entretanto ter qualquer escola do passado jamais proclamado a absurdidade do ser tão explícita e tão abruptamente como nossos existencialistas ateus?

“No existencialista não cristão, a contingência da existência não mais toma o caráter de mistério provocante e sim de irracionabilidade pura e de brutal absurdidade. O homem é um fato nu, cego. Está ali, dêsse modo, sem razão. É isto que Heidegger e Sartre chamarão sua “factividade”. Cada um de nós por seu turno, se encontra ali (Befindlichkeit), ali, agora, porque aqui mais aqui, não se sabe, é idiota. Quando desperta para a consciência e para a vida, está já ali, não o pediu. É como se se o lançasse ali – quem? ninguém; para quê? para nada. Tal é o sentimento de uma situação originária, sentimento supremo para lá do qual nada existe. Acordo em plena viagem numa história de louco… O desvio é absoluto e sem esperança. Êste sentimento é de tal modo ofuscante que Sartre o traduz por uma nuance nova, cuja incidência ontológica é capital: o ente é por demais (de trop). Sua estupidez injustificável estorva como a asneira… Estou como atirado e abandonado por êste nada sem olhar e sem resposta num ponto perdido do universo… Cada segundo renova êste abandono entregando-me indefeso ao mundo estranho: introduz até em mim a estraneidade que me envolve e que me priva inclusive desta cálida intimidade comigo mesmo em que o desespêro encontraria uma promessa familiar” (E. Mounier, Introduction aux existencialismes, ed. Denoel, Paris, 1947, p. 35-36).

Êstes temas do ser que “é uma demasia (de trop) para a eternidade” do homem, “paixão inútil”, do nada, do absurdo, da estraneidade, etc., inspiram tôda uma literatura contemporânea, as obras dum J. P. Sartre, dum Camus e duma Simone De Beauvoir… O século XX, que viu o ateísmo chegar à consagração oficial de doutrina do Estado, viu-o também, no plano intelectual, chegar à inevitável conclusão lógica: tudo é absurdo.

Mas, será que se trata efetivamente duma “conclusão intelectual”?

Trata-se, é certíssimo, de uma atitude literária. Trata-se também – ao menos em certa medida – duma moda. Mas se queremos nos colocar do ponto de vista estritamente filosófico, é de todo impossível considerar êste “absurdismo” como uma conclusão intelectual. Isto por motivo bastante evidente: uma conclusão intelectual deve poder ser pensada. Ora, o absurdismo é – por definição – impensável… O absurdismo consiste em negar o pensamento, em sustentar que o ser é radicalmente incoerente.

Sustentar conscientemente uma proposição absurda, ou afirmar – o que dá no mesmo – a verdade objetiva do absurdo, é contradizer-se a si mesmo, é pôr uma afirmativa e declarar, ao mesmo tempo, que ela é destituída de fundamento: jôgo realmente impossível, que ninguém pretende realizar nas matemáticas, por exemplo, em que a precisão desnudada da expressão não permite artifício algum na linguagem. O que não é possível em matemática é verbalmente possível em filosofia, porque, dada a densidade e a riqueza do objeto desta, ela não pode exprimir-se de maneira tão rigorosamente adequada como aquela. Explica-se assim o dito de Cícero, que não há tolice que não tenha sido afirmada por algum filósofo.

Frei Leão José Moreau, O.P.,
“Ateísmo e Absurdismo”,
in “A ORDEM”, Vol. LIII, FEV/1955