“Este São Francisco não existe!” – Papa Francisco

A paz franciscana não é um sentimento “piegas”. Por favor: este São Francisco não existe! E nem é uma espécie de harmonia panteísta com as energias do cosmo… Também isto não é franciscano! Também isto não é franciscano, mas é uma ideia que alguns construíram! A paz de São Francisco é aquela de Cristo, e a encontra quem “toma sobre si o seu jugo”, isso é, o seu mandamento: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei (cfr Gv [Jo] 13,34; 15,12).  E este jugo não se pode levar com arrogância, com presunção, com soberba, mas somente se pode levar com mansidão e humildade de coração.

Dirigimo-nos a ti, Francisco, e te pedimos: ensina-nos a sermos “instrumentos da paz”, da paz que tem a sua origem em Deus, a paz que nos trouxe o Senhor Jesus.

– Papa Francisco
Missa na Praça São Francisco de Assis, em Assis
04/10/2013

Papa Francisco pede que não acreditem em quem diz que ele dá «receitas novas»

Do «Discurso do Papa ao clero» de hoje, em Assis:

Mas se pode ir às periferias somente se se leva a Palavra de Deus no coração e se caminha com a Igreja, como São Francisco. Caso contrário, levamos a nós mesmos, e não a Palavra de Deus e isto não é bom, não serve para ninguém! Não somos nós que salvamos o mundo: é o Senhor que o salva!

Então, queridos amigos, eu não dei a vocês receitas novas. Não o fiz e não acreditem em quem diz que eu o fiz. Não existem. Mas encontrei no caminho da vossa Igreja aspectos belos e importantes que vão fazê-los crescer e quero confirmar vocês nestes. Escutar a Palavra, caminhar junto em fraternidade, anunciar o Evangelho nas periferias! O Senhor vos abençõe, Nossa Senhora vos proteja e São Francisco vos ajude todos a viver a alegria de ser discípulos do Senhor!

Destaco:

“Eu não dei a vocês receitas novas.”

“Não o fiz e não acreditem em quem diz que eu o fiz.”

“Não existem.”

Ouçamos mais o Papa e menos os que se pretendem intérpretes de Sua Santidade. Ouçamos a Igreja e não a mídia. E rezemos, cada vez com mais afinco, pelo Doce Cristo-na-Terra.

A antiguidade e a novidade da Igreja

O texto abaixo é do prof. Luiz Delgado e foi publicado no Jornal do Commercio de hoje. Em meio à confusão midiática sobre a Igreja Católica e o novo Papa, é importante termos certos referenciais seguros para que não nos percamos em meio aos torvelinhos que a imprensa suscita a nosso redor. Em uma passagem famosa das suas Confissões, Santo Agostinho chama Deus de «Beleza tão Antiga e tão Nova». À Igreja, perpetuadora da presença de Deus no mundo, nós também podemos atribuir o mesmo duplo adjetivo: tão Antiga e tão Nova!

Sim, a Igreja é antiga como a própria Encarnação do Verbo a partir da qual o nosso calendário conta os anos. Mas para nós, que vivemos agora, Ela é sempre de uma novidade que o decurso dos séculos não foi capaz de tornar obsoleta; de uma maravilhosa novidade, sempre atual e necessária. É importante não perdermos de vista o quanto a Igreja é Antiga, sim. Mas é igualmente importante que possamos perceber, sempre, o quanto Ela é Nova. As «novidades do Papa» decerto não podem obscurecer a venerável Antiguidade da Igreja de Cristo. Mas, ao mesmo tempo, a face antiga da Igreja não nos pode levar a perder de vista a Sua perene Novidade.

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Papa Francisco: «a melhor herança que possamos dar a alguém: a fé!»

[A] catequese constitui uma coluna para a educação da fé, e são precisos bons catequistas! Obrigado por este serviço à Igreja e na Igreja. Embora possa às vezes ser difícil – trabalha-se tanto, empenha-se e não se vêem os resultados desejados –, mas educar na fé é maravilhoso! É talvez a melhor herança que possamos dar a alguém: a fé! Educar na fé, para que essa pessoa cresça.

[…]

Quando pensamos que temos de ir para longe, para uma periferia extrema, talvez nos assalte um pouco de medo; mas, na realidade, Ele já está lá: Jesus espera-nos no coração daquele irmão, na sua carne ferida, na sua vida oprimida, na sua alma sem fé. Vós sabeis uma das periferias que me faz tão mal, tão mal que me faz doer (senti-o na diocese que tinha antes)? É a das crianças que não sabem fazer o Sinal da Cruz. Em Buenos Aires, há muitas crianças que não sabem fazer o Sinal da Cruz. Esta é uma periferia! É preciso ir lá! E Jesus está lá, espera por ti para ajudares aquela criança a fazer o Sinal da Cruz. Ele sempre nos precede.

– Papa Francisco
Discurso aos catequistas
27 de setembro de 2013

Papa Francisco põe a imprensa a serviço de Cristo

A carta que o Papa Francisco enviou recentemente ao Eugenio Scalfari já começa a dar frutos. Foi publicada na edição de hoje do La Repubblica (original aqui, em inglês aqui; em português só encontrei esta tradução do Fratres in Unum) uma entrevista «exclusiva» que o fundador do jornal realizou com o Vigário de Cristo.

Foi o próprio Papa quem o convidou: «mercoledì non posso, lunedì neppure, le andrebbe bene martedì?» “Sim”, respondeu o ateu, «va benissimo». E lá se foram os dois veneráveis anciãos conversar sobre a Fé e sobre os problemas do mundo atual.

Problemas cuja expressão máxima o Papa identifica, logo de saída, com a falta de transcendência do mundo moderno: «si può vivere schiacciati sul presente?» “É possível viver esmagado pelo presente”, sem passado e sem futuro? Aqui o «desemprego» da juventude é mais acídia do que questão trabalhista e, a «solidão» da velhice, mais desespero do que carência emocional. Uma vez que se elimina Deus do mundo, uma vez que o materialismo é erigido como norte da vida humana, os velhos estão encurralados diante de um abismo que conduz ao nada e os jovens não se sentem motivados a trilhar o caminho que conduz a este crepúsculo inglório que eles já hoje enxergam nos seus pais e avós. Os dois extremos são, assim, parte de um só e mesmo problema: se a vida caminha inexoravelmente para a velhice e esta não tem sentido, então o próprio «caminho» não tem sentido. A vida se transforma numa estrada estúpida que conduz a lugar nenhum: é natural que muitos não tenham portanto sequer vontade de a trilhar. Não têm as coisas que dão sentido à vida, «e il guaio è che non li cercano più». “E o problema é que sequer as procuram mais”, como disse o Papa Francisco.

Ele não quer fazer proselitismo: «[o] mundo é cruzado por vias que se aproximam e se separam, mas o importante é que elas levem ao Bem». Grifo: levem, verbo conjugado no subjuntivo, que expressa desejo, dever, e não levam, no presente do indicativo, como se se tratasse já de um fato consumado. No original italiano, «portino», para não deixar dúvidas. É óbvio que as vias não necessariamente conduzem, assim em ato, ao Bem; mas é importante que elas conduzam para Ele. A história de nossas vidas não necessariamente nos há de levar para Deus. Mas, se existe algum Fim Último na História, o que importa é que as nossas histórias concretas conduzam a Ele. É esta a missão da Igreja. É esta a contribuição concreta que Ela pode dar à triste situação poucas linhas atrás delineada.

Para explicá-lo melhor, o Papa parafraseia Sto. Tomás: “Cada um de nós tem uma visão do bem e do mal. Temos que encorajar as pessoas a caminhar em direção ao que elas consideram ser o Bem”. No original italiano: «Noi dobbiamo incitarlo a procedere verso quello che lui pensa sia il Bene». É o mesmíssimo ensinamento que o Aquinate expõe de maneira lapidar na Summa: «hay que decir sin reservas que toda voluntad que está en desacuerdo con la razón, sea ésta recta o errónea, siempre es mala» (I-IIae, q. 19, a. 5, resp.). E se é evidente que Santo Tomás não é um relativista, tampouco o é o Papa Francisco. Ele sabe muito bem que, embora nem sempre desculpe (cf. id. ibid., a.6), a consciência – mesmo errônea – sempre obriga; e portanto é mister incentivar a segui-la. Simplesmente não há outro caminho.

Porque o papel da Igreja obviamente não é obrigar as pessoas a agirem contra a própria consciência, e sim levá-las a uma verdadeira conversão, uma metanóia, uma “mudança de mente”, de consciência, a fim de que façam o que é certo não como uma imposição exterior, mas em harmoniosa obediência ao mais íntimo do seu ser. Para isso precisam encarar a Fé Católica não como um conjunto desconexo de normas e proibições, mas como um encontro com uma Pessoa: Jesus Cristo. E para isso é preciso à Igreja “ir ao encontro” delas, usando uma expressão cara ao Papa Francisco, a fim de que possa mostrar-lhes o Bem a que elas almejam. Para isso é preciso «conhecer um ao outro, ouvir um ao outro e melhorar o nosso conhecimento do mundo ao nosso redor», como ele falou ao Scalfari nesta entrevista, e como já o repetiu tantas outras vezes de outras formas ao longo do seu pontificado.

E a conversa prossegue: Igreja, santos, mística, graça. Alfineta o Sumo Pontífice: «Mesmo o senhor, sem o saber, poderia ser tocado pela graça». O ateu diz que não acredita em alma. «[M]as você tem uma», riposta com maestria o Vigário de Cristo. O ateu sente o chão faltar-lhe aos pés e corta a conversa: «Santidade, o senhor disse que não tem a intenção de tentar me converter e não acho que o senhor conseguiria». E o Papa: «Questo non si sa», “isto não se sabe”, não dá para saber.

O Papa Francisco então pergunta no que crê o velho ateu. Ele responde: «Acredito no Ser, que está no tecido do qual surgem as formas e o corpos». Insiste o Vigário de Cristo: «Mas você pode definir o que você chama de Ser?». E a resposta do Scalfari é digna de ser reproduzida na íntegra, em português e no original italiano, para que se tenha uma noção do quão confusa é a única cosmogonia a que foi capaz de chegar um intelectual ateu após longos 89 anos de vida:

Ser é uma fábrica de energia. Energia caótica, mas indestrutível e caos eterno. As formas emergem da energia quando ela atinge o ponto de explosão. As formas têm as suas próprias leis, os seus campos de magnetismo, os seus elementos químicos, que combinam aleatoriamente, evoluem e eventualmente são extintos, mas a sua energia não é destruída. O homem é provavelmente o único animal dotado de pensamento, ao menos, no nosso planeta e no sistema solar. Disse que ele é guiado por instintos e desejos, mas eu acrescentaria que ele também contém dentro de si uma ressonância, um eco, uma vocação de caos.

[L’Essere è un tessuto di energia. Energia caotica ma indistruttibile e in eterna caoticità. Da quell’energia emergono le forme quando l’energia arriva al punto di esplodere. Le forme hanno le loro leggi, i loro campi magnetici, i loro elementi chimici, che si combinano casualmente, evolvono, infine si spengono ma la loro energia non si distrugge. L’uomo è probabilmente il solo animale dotato di pensiero, almeno in questo nostro pianeta e sistema so-lare. Ho detto è animato da istinti e desideri ma aggiungo che contiene anche dentro di sé una risonanza, un’eco, una vocazione di caos.]

Aqui a entrevista praticamente termina. Diz o Papa, em tom condescendente: «Está certo. Não quero que você me faça um resumo de sua filosofia e o que você me disse é o suficiente». Um pouco antes das afabilidades finais, uma última coisa disse o Papa Francisco:

Demos um passo à frente em nosso diálogo. Observamos que na sociedade e no mundo em que vivemos o egoísmo tem aumentado mais do que o amor pelos outros, e que os homens de boa vontade precisarão trabalhar, cada qual com os seus pontos fortes e experiência, para garantir que o amor aos outros aumente até que seja igual e possivelmente exceda o amor por si mesmo.

Na redação que lhe conferiu o fundador do La Repubblica, este é o clímax da entrevista, o ponto de chegada ao qual ela conduz. E um jornal secular estampando na primeira capa uma reportagem onde se fala de deveres morais, de santos, de mística, de graça, e que termina conclamando as pessoas a se esforçarem por amar mais ao próximo do que a si próprias é uma vitória e tanto do Sumo Pontífice. Pela primeira vez em muito tempo, talvez a primeira vez desde que eu me entendo por gente, um Papa pautou o tom das reportagens sobre ele ao invés de ser pautado por elas. Bravo, bravissimo! Que Deus abençoe o Papa neste terreno pantanoso em que ele se move com tão assombrosa desenvoltura. Que os inimigos dele sejam confundidos e dispersados diante desta Rocha imponente contra a qual não prevalecerão as portas do Inferno. Que, olhando para ele, o mundo creia e se coloque aos pés do Crucificado. A fim de que (re)encontre o caminho. A fim de que seja salvo.

A “reforma histórica” do Papa Francisco (I) – A Liturgia

Diz-nos a mídia secular que o Papa Francisco está para fazer uma “reforma histórica”. Nós bem sabemos o quão estapafúrdia é a cobertura da grande mídia em assuntos eclesiásticos; inobstante, por detrás de cada manchete mentirosa ou reportagem deturpada há sempre alguma coisa de verdade que convém escarafunchar, quer seja para desmentir os prognósticos disparatados da imprensa, quer seja para nos informarmos realmente sobre o que está acontecendo – esta que deveria ser a função da imprensa, mas que ela obviamente não cumpre e, portanto, sobra para nós corrermos atrás dos fatos por conta própria.

O que há de verdade neste burburinho que ouvimos ao nosso redor? O Papa vai fazer algumas coisas. Fato, aliás, completamente simples e banal: é lógico que o Papa está sempre fazendo coisas, pois precisa administrar uma Igreja com um bilhão de fiéis e, se nunca houvesse nada a ser feito, não seria necessário sentar um monarca plenipotenciário no Trono de São Pedro. O Papa vai tomar as decisões de governo que compete a ele como Romano Pontífice: é lógico que vai. Chamar isso de «reforma», contudo, é a primeira armadilha midiática que precisamos evitar como o diabo: «reforma» é uma palavra que traz em si um programa, indicando que as coisas vão mal e é necessário “mudar tudo” para colocá-las novamente nos eixos.

Quando a mentalidade contemporânea pensa em «reforma», ela pensa automaticamente em abandonar coisas velhas para abraçar novas coisas: dificilmente “reformar” uma casa, por exemplo, significa – como se deveria esperar pelo étimo da palavra – conduzi-la novamente ao que ela era quando foi originalmente construída. Reformar uma casa é mudá-la: é construir um outro cômodo, é substituir toda a cozinha, é levantar um outro pavimento, et cetera. Na vida da Igreja é tudo muito diferente: a reforma do Carmelo, por exemplo, é o retorno à espiritualidade carmelita original. Ora, se é a mídia quem está falando em «reforma», convém entender a expressão no sentido corriqueiro do termo. O que a imprensa está aventando é que o Papa vai fazer «coisas novas» na Igreja.

Eu infelizmente não acredito que o Papa Francisco vá fazer uma «reforma» no sentido teresiano. Precisamos rezar, e muito, pelas decisões de governo que ele vem tomando e está na iminência de tomar, porque antevejo incontáveis mudanças plausíveis que ele poderia introduzir na Igreja, e das quais eu sinceramente não consigo enxergar o bem que poderia advir.

Por exemplo, com relação à Sagrada Liturgia. É bem sabido que o Papa Francisco distancia-se bastante do estilo de Bento XVI; para ficar apenas em dois exemplos que são de partir o coração, ele colocou uma mesa na Capela Sistina no dia em que foi eleito para não precisar celebrar versus Deum, e adotou o italiano nas liturgias pontifícias em abandono ao latim que o seu predecessor restaurara. Possui igualmente uma estética litúrgica à qual eu me permito fazer um comentário: embora os paramentos que enverga tenham aquela «nobre simplicidade» que minimamente se exige no Rito Romano, é de se lamentar o virtual abandono das vestes antigas. Bento XVI – disse o «Departamento das Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice» em 2010 – «apresenta[va] um modelo em suas celebrações, quando usa[va] tanto vestes de estilo moderno como, em alguma ocasião solene, as “clássicas”, também usadas por seus antecessores». Enche-me de tristeza que este «exemplo do escriba (…), comparado por Jesus com um chefe de família que tira do seu tesouro nova et vetera» não seja compartilhado pelo atual Vigário de Cristo.

Sobre o mesmo assunto, são angustiantes estas duas notícias, uma delas por enquanto apenas um rumor, mas a segunda, já um fato consumado. O fato: «os consultores da Oficina de Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice foram todos – T.O.D.O.S – removidos dos seus postos». Foi uma remoção sutil, que consistiu somente na não-renovação da provisão de cinco anos que detêm todos os cargos consultivos da Cúria, mas ainda assim uma dolorosa remoção: está desfeita a retaguarda teórica que Bento XVI constituíra na Cúria Romana para zelar pelas liturgias pontifícias. O rumor: o arcebispo Piero Marini – não confundir com D. Guido Marini, [por enquanto ainda] cerimoniário pontifício do Papa Francisco – pode ser nomeado a qualquer instante «como novo Prefeito da Congregação para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramentos». O “mau Marini” era cerimoniário pontifício à época de João Paulo II, e foi o responsável direto pela situação deplorável à qual por incontáveis vezes se reduziram as celebrações do Bem-Aventurado Pontífice. A se confirmar esta malfadada nomeação, será um duro golpe em todos os católicos que têm amor pela Sagrada Liturgia e que entendem a importância da «reforma da Reforma» para a solução da crise atual.

Nuvens negras se assomam no horizonte! Precisamos rezar com mais afinco, que aparentemente ainda não estamos fazendo o bastante. Como dizem estas felicíssimas palavras do padre Tim Finigan citando S. Vicente Ferrer que o Fratres recentemente traduziu, «se você discorda do Papa, a oração não é simplesmente um conforto sentimental piedoso, mas o curso de ação apropriado, uma vez que ela é um apelo ao seu superior imediato». Rezemos pelo Papa, rezemos pelo bem da Santa Madre Igreja.

Debate sobre o aborto: prof. Hermes Nery x “Católica” pelo Direito de Decidir

Bastante oportuno o seguinte debate sobre o aborto que o prof. Hermes Rodrigues Nery travou na TViG com uma senhora das ditas “Católicas” pelo Direito de Decidir.

http://www.youtube.com/watch?v=ZuVzMfVMIjg

O blog do Shalom também repercutiu o assunto. Destaco:

Num dado momento, como é próprio da militância feminista, passou a atacar a Igreja, insinuando inclusive que Santo Tomás de Aquino era a favor do aborto, em seguida defendeu a Teologia da Libertação, dizendo que a Igreja não tem nada que falar de sexo e usou a velha estratégia de definir a defesa da vida como uma iniciativa meramente religiosa, e citando dr. Varella chamou a Igreja de assassina porque deixa que as mulheres sofram por não permitir o uso da camisinha e nem o aborto. Ou seja, deu uma aula para provar que segue a risca a cartilha pró-aborto regada à uma dose de marxismo cultural, provando ela mesma que o catecismo anda longe de sua biblioteca pessoal.

Nossos parabéns ao prof. Hermes, pela serenidade e firmeza que demonstrou neste programa “Desafio”. Sigamos em frente, fazendo a nossa parte, defendendo a vida «desde a concepção até a morte natural» em todas as oportunidades que se nos apresentarem.

Outro Papa escreve a outro ateu

À semelhança do que o Papa Francisco fez recentemente, Bento XVI também escreveu uma carta a um ateu italiano. Piergiorgio Odifreddi é matemático e escreveu um livro – Caro Papa, ti scrivo – onde expõe as suas opiniões no formato de uma missiva ao Bispo de Roma que, hoje emérito, dignou-se dirigir-lhe uma resposta. A íntegra da carta assinada por Bento XVI tem 11 páginas, algumas das quais foram publicadas pelo La Repubblica. O Marcio Campos traduziu-lhe alguns trechos e os colocou no Tubo de Ensaio. Destaco somente um:

[S]e o senhor quer substituir Deus com “a Natureza”, fica uma questão: quem, ou o que é essa Natureza. O senhor não a define em nenhum ponto; ela aparece, então, como uma divindade irracional que não explica nada. Queria, então, acima de tudo deixar claro que na sua religião da Matemática ficam de fora três temas fundamentais da existência humana: a liberdade, o amor e o mal. Eu me surpreendo com o fato de o senhor, em uma única tacada, destruir a liberdade, que foi e é um valor fundamental da época moderna. O amor, em seu livro, não aparece; e mesmo sobre o mal não há nenhuma informação. Independentemente do que as neurociências digam ou deixem de dizer sobre a liberdade, no drama real de nossa história ela está presente como realidade determinante, e deve ser levada em consideração. Mas a sua religião matemática não conhece informação alguma sobre o mal. Uma religião que despreze essas perguntas fundamentais se esvazia.

E, como eu já tive a oportunidade de dizer outras vezes no Deus lo Vult! [p.ex. aqui], simplesmente dizer que não há causas ou atribuí-las a entes indefinidos (a “Natureza”, o “Acaso”, etc.) não é explicar rigorosamente nada. É na verdade o contrário mesmo de uma explicação: é um atestado de ignorância, é se esquivar a enfrentar as perguntas para as quais, por vias complementares, Filosofia e Religião sempre se empenharam em buscar respostas. Que certas pessoas imaginem poder calar dúvidas históricas do ser humano à força de repetir «não sei» é um evidente indício de decrepitude da razão, e não de florescimento intelectual.

Mas o mais engraçado dessa história é a genial perspicácia da nossa classe jornalística, rasa como um pires barato. A foto abaixo é a abordagem que o recifense Jornal do Commercio fez hoje sobre o assunto:

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Não vou nem mencionar a obviedade estampada na manchete (raios, o que eles esperavam que o Papa dissesse?!). Destaco o seguinte trecho, já no penúltimo parágrafo: «os textos [a carta anterior do Papa Francisco e esta agora de Bento XVI] mostram que o papa e o papa emérito têm a mesma opinião sobre determinados assuntos e alimentam especulações de que estejam trabalhando em conjunto».

Em nenhum momento parece ter passado pela cabeça do autor deste período que a «opinião» de ambos sobre Deus e o ateísmo é a mesma porque, ora bolas, todos os dois são católicos. O fato de ambos seguirem uma mesma religião parece não ser suficiente para explicar o curiosíssimo fato de todos os dois pensarem a mesma coisa a respeito do ateísmo. Ao invés disso, a opinião mais provável, a dar crédito ao Jornal do Commercio, é que os dois Papas «estejam trabalhando em conjunto»!

Eis o “senso crítico” que a mídia anda formando. A expressão não poderia ser mais exata: o senso adquirido por quem se acostuma a ler essas coisas é «crítico» como o estado de quem se encontra com uma doença terminal. Talvez já tenha até morrido há muito tempo e ainda não saiba. Que tempos…!

De que modo pode Satanás privar o mundo da Missa?

No meio das controvérsias envolvendo a Reforma Litúrgica das quais este blog está sendo palco nos últimos dias, parece-me oportuno considerar a seguinte citação de Sto. Afonso de Ligório:

“O demônio sempre procurou privar o mundo da Missa, por meio dos hereges, constituindo-os precursores do Anticristo, o qual, primeiro que tudo o mais, procurará abolir, e de fato conseguirá abolir, como punição pelos pecados dos homens, o Santo Sacrifício do Altar, conforme aquilo que predisse Daniel: ‘E foi-lhe dado poder contra o sacrifício contínuo, por causa dos pecados’ (Dan. VIII, 12).”

[No original: “il demonio ha procurato sempre di toglier dal mondo la messa per mezzo degli eretici, costituendoli precursori dell’Anticristo, il quale, prima d’ogni altra cosa, procurerà d’abolire, ed in fatti gli riuscirà d’abolire, in pena de’ peccati degli uomini, il santo sacrificio dell’altare, giusta quel che predisse Daniele: Robur autem datum est ei contra iuge sacrificium propter peccata.”]

(Santo AFONSO DE LIGÓRIO, La Messa e l’Officio strapazzati, Nápoles, 1760; cf. tb., do mesmo Santo Doutor da Igreja, o parágrafo 10 de sua obra de 1775: Del Sacrificio di Gesù Cristo, onde se alude ao mesmo acontecimento.)

Ora, deve-se dar valor às palavras dos santos. Se há um santo da envergadura de Sto. Afonso de Ligório dizendo que um dia – propter peccata homines – será dado a Satanás poder contra o Santíssimo Sacrifício do Altar, isto não podem ser palavras vazias. Ainda que haja divergências de fato sobre se estamos ou não assistindo ao cumprimento desta profecia, pode ser útil considerarmos como ela se pode cumprir, agora ou no futuro. Na esfera das meras hipóteses, de que maneira o Demônio poderia conseguir «abolir» o Santíssimo Sacrifício da Missa?

O Demônio, como bem o sabemos, é um cachorro acorrentado. O seu poder não é ilimitado – não é como se ele fosse um Deus Onipotente com o sinal invertido; ele só causa o mal que lhe é permitido causar, dentro dos insondáveis desígnios da Providência Divina à qual, de bom ou mau grado, estão sujeitos os homens e os demônios. Lembro-me do que li certa feita em um livro sobre exorcistas, se a memória não me trai do padre Gabriele Amorth: dizia o velho exorcista que não é possível fazer um “pacto de não-agressão com Satanás”, como se ele pudesse retaliar os que o combatiam mais diretamente por meio dos exorcismos. O Demônio – dizia – já nos causa todo o mal que lhe é permitido causar a nós, e portanto é besteira conceder-lhe cavalheiresca trégua. Ele mais nos odeia na exata medida em que mais somos aquilo que Deus nos chama a ser, isto é, santos; crescer no agrado de Deus e no ódio de Satanás é uma só e a mesma coisa. Estamos em guerra com um inimigo que ultrapassa em muito as nossas forças, mas combatemos do lado do Altíssimo! Pretender conduzir semelhante batalha sem “chamar a atenção” do Diabo não passa de mediocridade espiritual, que muito caro nos pode custar.

O Demônio, repitamos, já faz todo o mal que lhe é permitido fazer. Mas à sua ação o Todo-Poderoso estabeleceu limites muito claros; por exemplo, estabeleceu que contra a Sua Igreja não prevaleceriam nunca as hostes infernais. Todo e qualquer assalto dos infernos à Igreja de Cristo, portanto, existente ou possível, esbarra já a priori nesta muralha indestrutível que Cristo levantou em torno à Sua Esposa. Qualquer mal que o Diabo possa ter feito ou possa ser capaz de fazer um dia à Igreja, não pode nunca ser mais poderoso que a promessa d’Aquele por quem Céus e Terra foram criados.

Eu sempre pensei que aquele «robur» com o qual Satanás se levantaria no Fim dos Tempos contra o Sacrifício da Missa fosse na forma de uma perseguição física, como tantas pelas quais os cristãos já atravessamos ao longo dos séculos. Algo como um novo Império pagão lançando mais uma vez às feras os que ousassem adorar ao Deus Verdadeiro, ou um Governo a nível global que fizesse no mundo inteiro aquilo que o Governo do México logrou fazer na terra da Virgem de Guadalupe no século passado. Mas é forçoso reconhecer que esta não é a única forma possível de uma tal profecia se cumprir.

Algumas pessoas parecem acreditar que ela poderia ser cumprida se uma missa falsa fosse colocada no lugar da Missa Verdadeira. Tal hipótese é bastante problemática por um sem-número de razões. Atenta contra a indefectibilidade da Igreja ou – quando menos – contra a Sua visibilidade, uma vez que transforma a Igreja em Sinagoga em Satanás. Transforma o critério próximo e objetivo da Fé Católica – a Igreja Docente – em instrumento de perdição. Faz desaparecer o Sacrifício da «Nova e Eterna Aliança», instituído pelo Filho de Deus ao preço altíssimo do Seu Sangue vertido na Cruz do Calvário, e coloca a mais horrenda idolatria no seu lugar, impedindo assim Deus de ser adorado como convém à Sua Augusta Majestade. Mesmo considerar que tal coisa possa ser possível soa-me como impiedade, como uma injúria à Igreja Santa de Deus.

Mas eu avento uma hipótese conciliadora, que – é óbvio – não tem a pretensão de ser o diagnóstico preciso dos tempos em que vivemos e nem a interpretação exata das profecias do Fim do Mundo. Trata-se de uma reflexão particular minha, aqui apresentada como mera possibilidade ante tudo o que já foi exposto sobre o assunto. Pretendo, com ela, permitir às pessoas que tenham a real dimensão da crise presente (e de outras crises futuras possíveis), sem a subestimar com os olhos fitos somente na indefectibilidade da Igreja e nem tampouco voltar-se contra a própria Igreja por conta da consideração da enormidade daquela crise. Em uma palavra, intento aqui oferecer uma alternativa ao sedevacantismo ou ao tradicionalismo radical que não descuide da gravidade da situação presente (ou de outras possíveis).

Ora, sabemos que, em todos os Sacramentos, há o seu aspecto objetivo e o seu aspecto subjetivo; há a Graça enquanto deles decorre por aquilo mesmo que eles são – e, por isso, independente de quem os ministra ou quem os recebe, i.e., ex opere operato – e há a Graça enquanto beneficia concretamente quem os recebe – e, assim, dependente das disposições subjetivas destes, ex opere operantis. A primeira existe em virtude dos próprios sacramentos e portanto nunca falta e nem pode faltar; a segunda, dependente do ânimo do agente, pode ser diminuída ou mesmo deixar completamente de existir.

Se as pessoas não se santificam, não há por que colocar a culpa numa suposta falta de capacidade santificante dos Sacramentos. Quanto a isto, é possível parafrasear perfeitamente o pe. António Vieira no seu conhecidíssimo Sermão da Sexagesima:

Sabeis, cristãos, porque não faz fruto a palavra de Deus? – Por culpa dos pregadores. Sabeis, pregadores, porque não faz fruto a palavra de Deus? – Por culpa nossa.

E isto, que acontecia então com a palavra de Deus, pode perfeitamente acontecer com os Seus Santos Sacramentos: não por deficiência deles, mas pela malícia de quem os ministra e de quem os recebe.  Se a Graça Divina «por parte de Deus, não falta nem pode faltar», deve-se procurar o «porquê» dos seus (visíveis) parcos frutos não num impossível defeito dos canais, mas na deficiência dos que a eles acorrem.

E se os homens deixassem de saber que a Santa Missa é o Divino Sacrifício do Corpo e Sangue de Cristo, que aplaca a cólera de Deus e lhes obtém inefáveis tesouros dos Céus, ou pelo menos se deixassem de viver como se isso tivesse alguma importância? O que se poderia esperar como conseqüências desta hipotética terrível situação?

Ora, a graça é conferida a cada pessoa na medida de suas disposições interiores. Ensina-nos as Escrituras Sagradas que Deus não atende a quem não sabe pedir: «Pedis e não recebeis, porque pedis mal» (Tg 4, 3a). Ora, não pode pedir bem quem não sabe o que pode e deve pedir. Aufere mais graças do Sacrifício de Cristo quem, na medida de suas capacidades, melhor O compreende. Havia por certo muitos cegos em Jerusalém, mas Nosso Senhor só abriu os olhos aos que O pediram «Domine, ut videam»; e isso em absolutamente nada diminui o Seu poder ilimitado.

Assim, um padre que celebrasse a Missa sem levar em conta que está oferecendo à Trindade Santa o Sacrifício de Cristo com certeza continuaria celebrando Missa, uma vez que para a validade dos Sacramentos basta um genérico desejo de «fazer o que faz a Igreja», ainda que não se saiba com clareza o que a Igreja faz ou mesmo que se erre quanto a isso. É o que nos ensinam os teólogos; por exemplo, Ludwig Ott no seu Tratado sobre os Sacramentos:

Por lo que respecta a la faceta objetiva, basta la intención de hacer lo que hace la Iglesia. Por eso no es necesario que el ministro tenga la intención de lograr los efectos del sacramento que pretende lograr la Iglesia, v.g., la remisión de los pecados. No es necesario tampoco que tenga intención de realizar un rito específicamente católico. Basta el propósito de efectuar una ceremonia religiosa corriente entre los cristianos.

Seria, portanto, válida a Missa celebrada por um padre que quisesse simplesmente realizar uma genérica «cerimônia religiosa corrente entre os cristãos». Mais ainda, seria válida ainda que o dito padre não tivesse a intenção de obter do Sacrifício que oferece os «efeitos» que a Igreja diz que Ele produz. No que tange à capacidade santificante objetiva dos Sacramentos, não há portanto o menor problema aqui. Mas e quanto às graças que eles de fato conferem aos que deles participam assim de maneira tão desleixada? Parece-me claro que não obtém – ou ao menos que obtém em muitíssimo menor medida – os frutos do Sacrifício da Missa quem não tem a intenção de os obter. E, portanto, para diminuir drasticamente os «efeitos» da Santa Missa no mundo não é necessário torná-la inválida: basta que não se queira subjetivamente receber o que Ela objetivamente tem a proporcionar.

E isto não seria, por fim, uma forma de «abolir» – ao menos metaforicamente – o Sacrifício do Altar? Fazê-lo ser celebrado sem que, contudo, (quase) ninguém disso se apercebesse? Fazer com que oferecessem a Deus o Sacrifício da Cruz como se Lhe não oferecessem? Eis, portanto, o que me parece que está – pelo menos em princípio – ao alcance de Satanás: nada podendo contra o Sacrifício oferecido, voltar-se ele com fúria contra os que O ofertam. Não podendo impedir a ira de Deus de ser aplacada, impedir contudo os homens de se beneficiarem desta santa Propiciação. Incapaz de agir contra Aquele que recebe o Sacrifício, dedicar-se com afinco a prejudicar os que O oferecem. E, em semelhante situação, é fácil ver o estado de miséria religiosa a que estariam reduzidos os filhos de Deus! Se uma situação assim não fosse abreviada, correr-se-ia o risco de que se perdessem até os predestinados. E, sinceramente, ela em nada se avantajaria sobre a triste situação em que hoje nos encontramos…

Aqui é o máximo, penso, até onde Satanás pode ir. A partir daqui Deus lhe impôs limites: «Chegarás até aqui, não irás mais longe; aqui se deterá o orgulho de tuas ondas» (Job 38, 11). Já aqui é suficiente estrago, é bastante desolação, é rigorosíssimo castigo pelos pecados dos homens! Aqui já se harmonizam as mais terríveis profecias sobre o Fim dos Tempos com a reconfortante promessa de Deus de estar conosco todos os dias até a consumação dos séculos. Aqui já é possível privar o mundo [dos benefícios] da Missa sem fazer com que Deus deixe de receber o Eterno Sacrifício do Seu Filho amado. Aqui o mysterium iniquitatis já encontra a sua mais perfeita encarnação. Aqui, por fim, já tudo se explica e encaixa, sem que nos seja necessário aventar mais extremadas hipóteses. Para além daqui, já é conceder a Satanás mais poder do que o próprio Deus lhe conferiu.

«Tem boi na linha; se não é boi, pelo menos é chifrudo» – Carlos Ramalhete

[Fonte: Facebook]

Tem boi na linha; se não é boi, pelo menos é chifrudo

Quando meus filhos eram pequenos, eu sempre fazia com eles uma brincadeira de palavras, um joguinho meio besta, mas muito útil, para ensiná-los a se expressar claramente. A maior vantagem da brincadeira é que ela também ensinava que é simplesmente impossível ser entendido claramente quando o receptor do discurso preocupa-se ativamente em **não** entender.

A brincadeirinha é muito simples: basta fingir que se tomou todas as palavras importantes do discurso por homófonos ou quase-homófonos. A criança – que, como toda criança, leva tudo a sério – fica exasperada e começa a tentar dizer a mesma coisa de outra maneira. Aí é só fazer a mesma coisa, com outro homófono e outra palavra.

Por exemplo: vem-nos o petiz, dizendo que “mamãe pediu pra me dar uma lista de compras”. A resposta mais evidente é, claro, “maleta de compras? Pra que é que ela quer que eu te dê uma maleta de compras?! Já não basta a sua mochila?!”. Daí a criança tenta dizer “não, pai, é a lista das coisas que tem que comprar no mercado”, apenas para se ver diante da barreira intransponível da resposta “mas se a lista é das coisas que têm, para quê comprar no mercado? Você quer comprar de novo o que você já tem?!”. E por aí vai.

A brincadeira não tem fim, e garante que a criança desenvolva sua capacidade vocabular ao ponto de, na adolescência, ter um controle ótimo da própria expressão. Meu filhos, graças a Deus, não intercalam “tipo” a cada duas palavras, por exemplo.

Outro dado interessante da minha experiência sensível, que, com o exposto acima, me ajuda a perceber o que está atualmente acontecendo, é o que eu me habituei a explicar dizendo que “o universo conspira em favor do Paulo Coelho”. Todo mundo sabe que o ilustríssimo imortal abeelístico supracitado, depois de – dizem as más línguas – vender a alma ao Capiroto, passou a afirmar que o universo conspiraria em favor dele. Seria uma espécie de domínio da sincronicidade, se se quiser tomar pelo lado junguiano da coisa, ou das probabilidades, quando a matemática é nossa praia. Se se quiser correr o risco da blasfêmia, seria possível até mesmo atribuir à Divina Providência esta suposta conspiração do universo.

O fato é que, decididamente, ainda que o universo conspire em favor do Paulo Coelho, em meu favor ele não conspira. Bom sinal, diriam todos os santos e doutores da Igreja. Na verdade, para mim esta realidade acaba sendo até mesmo um modo informal de ver como está indo o meu apostolado: se está indo bem, posso ter certeza de que tudo o que puder dar errado em meu entorno dará. Se eu deixo meu apostolado de lado, contudo, se eu não debato, não respondo, não prego, não escrevo, e me dedico a beber bom vinho e ouvir boa música, as coisas fluem. O universo que conspira em favor do Paulo Coelho me tem como aliado, e sempre sobra uma casquinha da conspiração lá deles.

Pois bem, aparentemente o Santo Padre Papa Francisco, decididamente, não está no mesmo time do Paulo Coelho. Pessoas inteligentíssimas, que respeito profundamente, vêm apresentando dificuldades em entender o que ele diz que mais parecem a brincadeira que eu fazia propositadamente com meus filhos. Não é um nem dois: tenho visto este fenômeno se repetir em público e em particular, afetando engenheiros, filósofos, teólogos, jornalistas e o que mais vier.

Aí eu pego o texto que causou tantas dificuldades e, mutatis mutandis, é como se eu pegasse o diálogo com a criança que eu citei acima; é evidente que se entendeu tal e tal coisa em senso diverso do desejado pelo emissor do discurso, que “tem” significa, no contexto, “precisa”, não “possui”.

A coisa é ainda mais estranha quando nos damos conta de que muitos dos que ora apresentam dificuldades de compreensão vieram à Fé católica – ou pelo menos se aprofundaram nela e passaram a estuda-la – no pontificado de João Paulo II.

Ora, João Paulo II pode perfeitamente ter sido um santo – sê-lo-á com certeza quando de sua canonização –, mas certamente não era um bom explicador do que quer que seja. Seus textos eram coisas abstrusas, que precisavam ser lidas várias vezes, cheias de referências bizarras a idéias ainda mais esquisitas, que ele julgava necessário combater. Seus discursos de improviso eram piores ainda. Seus atos públicos – mais no que ele permitia que no que ele mandava fazer, mas também nisso – eram frequentemente escandalosos. Pombas, o encontro de Assis foi uma idéia de jerico tão absurda que Deus mandou um terremoto para que Sua voz Se fizesse ouvir. Para não falar da missa celebrada com uma louraça-belzebu fazendo as leituras de maminhas ao léu, enquanto o texto da Veritatis Splendor, acertadíssimo, dizia de maneira confusa e abstrusa que tudo aquilo era coisa a evitar.

Aí me vem um bom amigo, converso joão-paulino, com dificuldades enormes para entender que numa entrevista do Papa Francisco, as palavras “não é possível” não significam “não nos é permitido”, mas “é algo que não está ao alcance de ninguém”.

Ou seja: algo que “não é possível”. E tome idas e vindas por email até o sujeito entender, se é que entendeu!!! Como diria o marido da mulher feia, durma-se com um bagulho desses!

Ao mesmo tempo, o pessoal que já curte uma missa-negra, ou pelo menos que senta no banco dos reservas do time do Paulo Coelho, inventa leituras ainda mais delirantes e arrevesadas de tudo o que o papa fala, de tal modo que dificilmente se têm passado dois dias sem que aparecesse um delírio novo. Ora ele vai ordenar mulheres, ora ele liberou o aborto, era a sodomia-chique das revistas de moda teria ganho aval papal. Daqui a pouco ele vai ter dito que levaria um cartaz louvando grupos de pagode ao show do Iron Maiden.

Ora, a única explicação possível para isto, para tamanho fenômeno de incompreensão localizada, é interferência demoníaca. Não há outra razão; se a incompreensão fosse devida ao discurso propriamente dito, à falta de habilidade do emissor, ou bem a recepção dele seria sempre a mesma – ou seja, todo mundo acharia que o Papa estaria dizendo X, ao invés do Y que ele queria enunciar – ou bem o discurso seria claramente incompreensível. Mas não. O mesmo que vem me perguntar sobre um “não é possível” que ele não consegue entender como “não é possível” vem me dizer que é um absurdo que Fulano ou Beltrano (nunca ambos!) não tenha entendido outro ponto de um discurso papal.

Pelo que ensinam os sábios santos e doutores, e pela modesta experiência, só posso dizer uma coisa de todos estes aparentemente estranhíssimos fenômenos: o Inferno está apavorado com o Papa Francisco! É a versão séria dos probleminhas bestas que eu já encarei tantas vezes; se para mim mandavam um diabrete já velhusco, à beira da aposentadoria, com capacidade de trabalho não lá muito boa, para o Papa vai a elite, o Bope do Hades. Espalham-se pelo mundo, com metafóricos chumaços de algodão sulfuroso para tampas os ouvidos e distorcer as percepções. Não duvido nada que – como já vi acontecer tantas vezes em meu entorno quando meu apostolado estava andando melhorzinho – o Vaticano esteja cheio de problemas, com os aparelhos elétricos pifando, os canos entupindo, os documentos e chaves caindo atrás dos móveis, etc.

A solução, evidentemente, é rezar mais ainda e ir em frente, mesmo sabendo que o Tinhoso é tinhoso e vai continuar atentando. No caso das vítimas, na situação atual, daqueles que vêm tendo dificuldades absurdas para entender o que diz o Papa, eu recomendaria deixar de lado todo e qualquer discurso papal, dedicando-se ao invés à oração. A não ser que sejamos membros da hierarquia e que o discurso papal tenha sido dirigido diretamente a nós, como numa visita de um Bispo ao Papa, vale mais a pena dedicar-se à leitura de obras aprovadas pelo tempo, tão parafraseadas ao longo dos séculos que ficou impossível não encontrar a mesma coisa dita de várias maneiras, todas ortodoxas. Assim escapamos do grosso dos ataques do Chifrudo, ou ao menos não somos usados por ele para atacar a Igreja. Fazer da boa intenção um paralelepípedo para calçar a estrada que leva aos Quintos é, afinal, a especialidade dele.

Além disso, claro, vamos rezar pelo Papa, por este Papa que tanto apavora as hostes infernais!

Ave Maria

Carlos Ramalhete