[Às vésperas do conclave, reproduzo na íntegra este interessantíssimo artigo de D. Fernando Rifan que, sem menosprezar a gravidade da crise atual, ao menos nos revigora com uma lufada de esperança. A Barca de Pedro é sacudida e faz água no mar agitado deste mundo, sim; mas podemos ter a certeza de que o Senhor do mundo – e dono da Igreja! – é mais forte do que o mar revolto. Lembremo-nos de que Ele um dia fez com o que o mar e o vento se calassem a uma ordem Sua; e penso que deve ter desta vez mostrado visivelmente o poder da Sua palavra para que acreditássemos n’Ele quando, de outra vez, sem grandes milagres visíveis, Ele dissesse que as portas do Inferno não prevaleceriam sobre a Sua Igreja.
Amanhã começa o conclave. Rezemos pela Igreja de Deus!]
O Conclave e a Crise
A Igreja aqui na terra chama-se militante, quer dizer, continuamente em guerra, contra inimigos internos e externos, ou seja, “em crise”. Mas isso já há dois mil anos! A paz completa só será na Igreja triunfante do Céu, quando a “Barca de Pedro”, após passar pelas ondas do mar bravio desse mundo, chegar ao porto da salvação eterna.
“Para levantar a Igreja do estado de relaxamento e de confusão em que se encontram universalmente todos os níveis, nem toda a ciência e prudência humana conseguem remediar, mas é preciso o braço onipotente de Deus. Entre os bispos, poucos são os que têm verdadeiro zelo pelas almas. As comunidades religiosas, quase todas e mesmo sem o quase, estão relaxadas, porque nas congregações, na presente confusão das coisas, falta a observância e a obediência se perdeu. No clero secular as coisas estão piores e, por isso, faz-se necessária aí uma reforma geral para todos os eclesiásticos, de maneira a reparar a grande corrupção dos costumes, que existe entre os seculares”.
“Por isso é preciso rezar a Jesus Cristo que nos dê um Chefe da Igreja que, mais do que de doutrina e de prudência humana, seja dotado de espírito e de zelo pela honra de Deus, e seja totalmente alheio a qualquer partido e respeito humano, porque se, por nossa desgraça, acontecesse um Papa que não tem apenas a glória de Deus diante dos olhos, o Senhor pouco o assistirá e as coisas, como estão nas presentes circunstâncias, irão de mal a pior”.
“As orações podem trazer remédio a tanto mal, ao obter de Deus que ele mesmo ponha a sua mão e conserte… eu desejaria ver reformados tantos desarranjos presentes… Em primeiro lugar, gostaria que o próximo Papa escolhesse, entre aqueles que lhe serão propostos, os mais doutos e zelosos pelo bem da Igreja… Que se usasse diligência ao escolher os bispos (dos quais, principalmente, depende o culto divino e a salvação das almas), solicitando informações a mais pessoas sobre a sua vida digna e doutrina necessária para governar as dioceses. E que, também para aqueles que já estão em suas igrejas, se exigisse dos metropolitanos e de outros, secretamente, a informação sobre aqueles bispos que pouco atendem o bem de suas ovelhas… Sobretudo, desejaria que o Papa reconduzisse universalmente todos os religiosos à observância do seu primeiro Instituto, pelo menos nas coisas principais… Nada podemos fazer, a não ser rezar ao Senhor, que nos dê um Pastor pleno do seu espírito, que saiba estabelecer estas coisas que acenei brevemente, conforme for mais conveniente à glória de Jesus Cristo”.
Essas considerações acima foram feitas em 24 de outubro de 1774 e são trecho de uma carta de Santo Afonso Maria de Ligório ao Cardeal Castelli, que lhe havia solicitado observações sobre a eleição do novo Papa e os principais abusos que deveriam ser extirpados da Igreja, pretendendo o Cardeal levar a carta ao Conclave próximo. Essa descrição de Santo Afonso nos mostra que as crises na Igreja não são de agora. A “barca de Pedro” já venceu outras tempestades.
“Peçamos com insistência ao Senhor que nos ofereça um pastor segundo o seu Coração, um pastor que nos guie ao conhecimento de Cristo, ao seu amor, à verdadeira alegria” (Cardeal Joseph Ratzinger, na preparação para o Conclave de 2005).