A maior parte dos meus leitores já sabe que eu tive a honra de passar o último Tríduo Santo em tratamento de Quimioterapia. Na tarde da Quinta-Feira eu estava na clínica hematológica, de onde saí ao cair da noite; pude, assim, passar os últimos dias da Semana Santa sob os efeitos da medicação contra o câncer.
A melhor Quaresma da minha vida – iniciada com uma QT no dia seguinte à Quarta-Feira de Cinzas, encerrada com outra QT na Quinta-Feira Santa… – chegava assim ao seu término. Tenho medo de não a ter aproveitado tanto quanto poderia; que Deus tenha misericórdia das minhas muitas limitações e fraquezas. Mas sou ao mesmo tempo grato e confiante pelo tempo que me foi concedido. Não é sempre que nos vêm ventos favoráveis à santificação e a penitência; quando eles nos vêm, é preciso pois aproveitá-los.
Será que os aproveitei bem…? É difícil se furtar ao exame de consciência. Tenho aquele problema (sobre o qual já devo ter falado aqui) de, às vezes, não saber ao certo se estou sendo muito rigoroso ou muito condescendente comigo mesmo. Há decerto muito espaço entre o escrúpulo e a lassidão; mas, em se tratando da nossa vida espiritual, às vezes parece que esse espaço é mínimo e muito difícil de nele se equilibrar! Ó almas que se dilaceram entre o reclamar muito e o aceitar demais, eu vos entendo. Isso não é um problema exclusivamente espiritual. Apenas adquire contornos mais vívidos quando é encarado sob o prisma da nossa salvação ou danação eterna.
Quais as notícias que tenho para dar? Em dezembro, a minha hematologista prescreveu-me um tratamento composto de seis ciclos de quimioterapia (R-CHOP). E na quinta-feira passada eu tomei a sexta dose. Cheguei até aqui; graças ao bom Deus, eu cheguei até aqui. E cheguei muito bem: não tive nenhuma doença oportunista ao longo desses quatro meses em que estou em tratamento, a minha imunidade somente uma vez baixou para níveis preocupantes, o meu hemograma sempre esteve bom, a minha alimentação, idem, meus rins mantiveram-se funcionando. O maior contratempo foi mesmo a trombose que sigo tratando. Já é tempo de se perguntar: e agora?
E agora… vamos precisar ver. Na próxima semana farei outra tomografia com contraste do tórax e do abdômen. A partir dela verei a minha ascite, o meu derrame pleural e os meus linfonodos; se isso ainda existe e em que medida. Com base nisso é que será refeito o meu prognóstico e serão determinados os próximos passos.
Quais as possibilidades? Na mais otimista, não tenho mais nada. Sim, é possível. Se isso acontecer, entro na fase de manutenção (com não sei quantas doses de Rituximab para prevenir a recidiva), e depois é só monitorar pelos próximos anos. E aí, com um pouco de sorte, eu termino a segunda graduação em 2020 com a mesma expectativa de vida que possuía quando me formei pela primeira vez. É o que todos esperamos.
Mas pode ser, ao contrário, que ainda haja alguma coisa. Aí tudo se complica e tudo depende. Então eu posso tomar mais dois ciclos de QT (completando oito, ao invés dos seis originalmente previstos). Ou posso iniciar um outro ciclo de quimioterapia, com seis ou oito ciclos (ou outro número qualquer, sei lá). Posso tomar o mesmo R-CHOP ou iniciar outro protocolo. Ou qualquer outra coisa. Tudo isso é também possível.
O que será, sabe-o Deus. De qualquer modo, eu já cheguei até aqui. O futuro ainda é incerto; mas qual o futuro que se pode dizer “certo” nessa vida? Volto a agradecer a todos os que me acompanham e perguntam notícias, que me dedicam as suas orações e a sua torcida, a todos enfim os que estão caminhando comigo nesses últimos meses com muito mais dedicação e amor do que eu mereço: e peço que fiquem comigo ainda mais um pouco! Keep praying, que ainda preciso de orações. Foram alcançadas, sem dúvidas, vitórias espetaculares nessa minha luta; recebi, indiscutivelmente, graças extraordinárias durante esse tempo. Mas, agora como há quatro meses, ainda sou um pecador miserável que suplica a caridade de todos vocês.
Cheguei aqui: Deo Gratias! Vamos em frente. Os próximos passos, não sei ainda quais serão. Mas sei que quero caminhá-los como aprouver ao Bom Deus. De fronte erguida, como tenho feito até aqui. Aliás, melhor do que tenho feito até aqui. Sim, é o que quero. É o mínimo que posso fazer.