Também o Papa Francisco celebra versus Deum

Já faz quase uma semana, mas eu não queria deixar de registrar que o Papa Francisco, na Festa do Batismo do Senhor, celebrou versus Deum na Capela Sistina. A foto abaixo é do pe. Z:

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A notícia me deixou sobremaneira feliz por dois motivos.

O primeiro é que, ao contrário do que aconteceu no túmulo de João Paulo II, aqui não há mais desculpas de ordem pragmática. “No túmulo de João Paulo II não dava pra colocar uma mesa”, disseram alguns à época; pois bem, ainda que isso seja verdade, na Sistina dava e o Papa dessa vez não a colocou. Celebrou, assim, versus Deum podendo ter escolhido celebrar versus populum. Celebrou porque quis.

O segundo é porque foi precisamente na Capela Sistina que o Papa Francisco resolveu colocar uma mesa na sua primeira Missa celebrada como Romano Pontífice. Lembro-me de que registrei dolorosamente o fato aqui no Deus lo Vult! e, agora, é como se uma espinha se nos tivesse sido arrancada da garganta, como se os fios houvessem percorrido o caminho inverso para desatar o nó: na Sistina um dia o Papa deu as costas ao Altar, na Sistina hoje o mesmo Papa celebra tendo diante de si o Juízo Final.

É óbvio que isso não significa o menor desmerecimento, por parte do Sumo Pontífice, da Missa celebrada de frente para o povo, e é igualmente óbvio que o Papa Francisco não vai adotar agora o ad orientem como posição oficial das celebrações pontifícias. O ponto não é esse. O que este gesto do Papa mostra é que não existe da parte dele a menor hostilidade para com o versus Deum. Não há nenhum preconceito ideológico – tão comum nos nossos dias! – com o padre celebrar “de costas para o povo” e, embora o Vigário de Cristo possa pessoalmente preferir celebrar na posição que se popularizou nas últimas décadas, entende que outros elementos litúrgicos extraordinários têm lugar na catolicidade da Igreja.

O Papa tanto entende que é legítimo celebrar ad orientem que ele próprio celebrou dessa maneira, para o mundo inteiro ver! Calem-se portanto os “liturgistas” modernos com suas teorias estapafúrdias, dêem lugar os ideólogos da moda ao exemplo que se nos chega do próprio Vigário de Cristo. Também o Papa Francisco celebra versus Deum. Aprendamos com o seu exemplo, respeitemos o que ele demonstra respeitar.

Tempo Comum

Um amigo mostrou-me pela manhã esta pequena mensagem do pessoal do Evangelho Quotidiano. Ontem, segunda-feira após a festa da Epifania, a festa do Batismo do Senhor encerrou o ciclo natalino e a Igreja passou a celebrar o Tempo Comum.

O Batismo do Senhor celebra-se no domingo após a Epifania; como a festa da Epifania (tradicional festa de Reis) é no dia 06 de janeiro, este ano o Domingo subseqüente foi justamente o domingo passado, 08 de janeiro; inclusive o Papa celebrou anteontem a festa do Batismo do Senhor. Como, no entanto, Epifania é festa de preceito e o Batismo do Senhor, não (cf. CIC 1246), no Brasil a Epifania é transferida para o domingo seguinte (e, neste caso, celebra-se o Batismo do Senhor na segunda-feira). Foi o que aconteceu esta semana.

Convém lembrar que o Tempo Comum não deve ser entendido como um tempo de somenos importância, como se nele o chamado à conversão fosse menos premente ou como se devêssemos descuidar dos cuidados com a nossa alma, dos nossos apostolados e da nossa vida espiritual. Desde a Encarnação do Verbo e a edificação da Igreja nós vivemos tempos extraordinários; os tempos em que o Senhor está conosco e nos quais todos os dias é ofertado à Trindade Santa o Augusto Sacrifício do Corpo e Sangue de Cristo sobre os altares de nossas igrejas. E nisto não há nada de “comum”, ao menos não no sentido corriqueiro da expressão.

Como o Oblatvs publicou há dois anos, o Tempo Comum é tempo de fidelidade: de ser fiel à Eucaristia, de manter uma caminhada constante e progressiva em direção a Cristo, de ser vigilante e de esperar. No Tempo Comum a Liturgia se reveste de verde; não conheço nenhum compêndio com explicações mistagógicas detalhadas sobre as cores do Ano Litúrgico, mas todas elas têm significados bem óbvios. O verde significa claramente esperança, especificamente aquela virtude teologal que tem tanto a ver com a fidelidade quotidiana enquanto esperamos e apressamos Aquele Dia Terrível do qual não sabemos a hora. Penso também na vitalidade à qual somos chamados, uma vez que o verde é a cor das plantas que estão vivas (dos ramos da videira que permanecem unidos à videira), em oposição aos sarmentos secos que, separados de Cristo e de Sua Igreja, não podem jamais dar frutos. E o verde aponta também para o sofrimento que nos acompanha sempre, pois nunca me esqueço das palavras de Cristo durante a Sua Paixão: Porque, se eles fazem isto ao lenho verde, que acontecerá ao seco? (Lc 23, 31).

Vivamos, portanto, este Tempo Comum com a fidelidade quotidiana que o Senhor exige e espera de nós; revestidos de Cristo a fim de darmos frutos, mesmo sabendo das incompreensões e dos sofrimentos que, por conta d’Ele, nos serão infligidos. Vivamos, acima de tudo, alimentando a esperança: a de que Cristo é Senhor do Mundo e virá, no fim, para nos conduzir Àquela Cidade Eterna onde toda a lágrima será enxugada e onde a semeadura que aqui fazemos – com o rosto molhado neste Vale de Lágrimas – resplandecerá enfim como uma colheita de alegria.