Quando o Matrimônio é a solução para o concubinato

Não me lembro agora quem foi aquele sábio contemporâneo que disse, certa vez, que os jornalistas eram as pessoas mais desinformadas que ele conhecia. A veracidade da sentença é passível de ser confirmada à mais banal e corriqueira observação da realidade; é incrível como este ramo de atividade humana – responsável justamente pela propagação da informação – pode contar com tantas e tantas pessoas absolutamente ineptas em suas fileiras.

Uma matéria recente do Estadão fala que o “Papa realiza casamento de casais que já moram juntos e têm filhos”. O primeiro parágrafo, dando o tom de toda a matéria, dispara que o Papa Francisco «celebrou o casamento de 20 casais neste domingo [14/set], alguns dos quais já vivem juntos e tem filhos, no mais recente sinal de que o pontífice argentino quer que a Igreja Católica seja mais aberta e inclusiva».

Custa crer que exista alguma pessoa na face da terra que ignore que a Igreja, desde que é Igreja, casa casais. [Na verdade, quem celebra o Matrimônio são os nubentes e não o sacerdote que o assiste, como o sabe qualquer catequizando adolescente; mas seria demais exigir esse nível de refinamento de quem se espanta com o fato de casais que «já vivem juntos e tem (sic) filhos» casarem…] Custa crer que alguém enxergue nessa coisa banal e prosaica um sinal de que a Igreja deseje ser «mais aberta e inclusiva».

Ora, desde que o mundo é mundo, a Igreja regulariza as situações de fato que encontra. As pessoas que podem se casar são, apenas e justamente, os casais que ainda não estão casados! Um absurdo inaudito, digno de manchetes, seria se fosse diferente. Se um homem e uma mulher vivem juntos maritalmente e não estão ainda casados – nem, óbvio, estão impedidos de casar por algum matrimônio prévio, por votos religiosos ou por qualquer outra razão -, então é lógico que a situação deles regulariza-se, da maneira mais simples possível, com a celebração do seu casamento. Isso sempre foi assim e qualquer pessoa com um mínimo de vivência eclesial sabe disso. No fato da Igreja casar casais que ainda não estão casados não se encontra nenhum sinal de “inclusividade”, no péssimo sentido que esta palavra tem na novilíngua contemporânea, mas sim da catolicidade da Igreja que, sempre, convida a Si todos os homens e anseia por congregar a todos no Seu seio.

Aqui, nos sertões do nosso Nordeste, uma das coisas que frei Damião fazia com suas missões [cf. “Em defesa da Fé”] era, justamente, ajustar o casamento dos que viviam amancebados. Ou seja: trata-se de prática extremamente “reacionária”, no sentido de que se preocupa com as formas tradicionais [= o matrimônio religioso] em preferência às novas configurações de fato [= o amor livre]. Na verdade, casar pessoas que já vivem juntas e têm filhos não é “incluir” essa realidade marginal – o concubinato – na Igreja Católica, mas precisamente o contrário: é arrancar o homem à mancebia para reintroduzi-lo nas práticas santas da religião católica, é elevar a amásia e concubina a cônjuge e esposa legítima. É, em suma, dizer que não se aceita que os casais simplesmente “vivam juntos e tenham filhos”, mas que, além disso, é imperioso que eles contraiam matrimônio válido e lícito diante da autoridade religiosa competente. Trata-se, evidentemente, de [mais] uma condenação do concubinato, e não de uma sua “inclusão” na Igreja.

Uma Igreja “aberta e inclusiva”, na mentalidade moderna, seria uma Igreja que permitisse o sexo fora do casamento, que aceitasse o casamento gay ou permitisse que divorciados tornassem a casar. Ora, não consta que as pessoas que recentemente se casaram diante do Papa Francisco tivessem algum impedimento canônico; não eram gays mas, muito ao contrário, casais de verdade, com filhos próprios inclusive; e o fato mesmo do Papa exigir-lhes o casamento é, por si só, sinal evidente de que faltava algo à situação de «vive[re]m juntos» em que já se encontravam. Muito ao contrário, portanto, de ser um “sinal” dessa realidade apocalíptica pela qual anseiam em vão os bárbaros modernos, o recente gesto do Papa Francisco foi uma reafirmação da Doutrina Católica: longe de ser uma realidade social dotada de valor, o concubinato é um mal que deve ser sanado – se possível, com o Matrimônio. E o Papa quis passar clara e abertamente essa mensagem para o mundo. E esta verdade é suficientemente inclusiva para valer para todos os homens.

A grama é verde e o sol brilha lá fora

Acho que foi no Facebook que eu vi recentemente alguém glosando um dito de Chesterton. Dizia o grande polemista inglês que haveria de chegar o tempo em que teríamos que provar aos nossos interlocutores que a grama era verde. E o comentarista facebookiano sentenciava que este fatídico dia enfim chegara.

As últimas manchetes sobre a família que li me provocaram uma sensação curiosa. Por um lado, as coisas lá ditas são de uma obviedade atroz; por outro, provoca-nos uma certa sensação de inesperado encontrá-las, ali, expostas assim em toda a sua clareza. Como se vivêssemos em tempos onde certas coisas óbvias se esforçam por serem mantidas escondidas, e de repente um raio de sol indomável encontra uma fresta para adentrar na sala que alguém se esmera por manter escura à força de grossas e pesadas cortinas.

Primeiro, alguém diz que a prostituição se encontra em processo de extinção. A notícia – que soa à primeira vista alvissareira – parece chocar-se com a nossa percepção imediata dos costumes degenerados do mundo ao nosso redor; mas a leitura do texto deixa claro que não se trata propriamente de uma extinção, e sim de uma metamorfose. A idéia do texto é a de que o sexo tornou-se tão fácil e tão banal que em breve não haverá mais razão para se lhe atribuir um preço de mercado e se lhe sujeitar a anacrônicas regras de comércio. É como se fosse uma versão em micro-escala da idéia comunista de fim do comércio por meio da distribuição universal dos bens de consumo, tendo no caso o sexo por commodity.

Lembro-me do “Admirável Mundo Novo” e da idéia lá retratada – incutida à força de condicionamentos hipnóticos desde a mais tenra infância nos habitantes daquela Londres futurista – de que o sexo é livre e ninguém tem o direito de se negar a ninguém. A imagem da sociedade descrita no livro é talvez a mais ilustrativa do fim do comércio sexual nos moldes em que trata o artigo acima; pode-se até constatar que a diferença entre ela e a em que vivemos hoje é mais de grau do que de essência. No entanto, ninguém hesita em classificar o romance de Huxley como uma distopia. E realçar o modo tão similar com que uma prática é socialmente aceita no nosso mundo evoluído e no pesadelo futurista é, de alguma maneira, trazer à luz um interessante paralelo entre a sociedade que estamos construindo e aquela onde nenhum de nós deseja chegar.

Depois eu encontro esta sentença entre aspas: “Divórcio eleva pobreza e afeta estabilidade”. Ninguém quer elevar a pobreza, é óbvio. Todo mundo quer que as pessoas sejam estáveis, é evidente. No entanto, parece que não há uma única pessoa – nem mesmo a responsável pela afirmativa categórica em apreço – que some dois e dois e chegue à conclusão de que o divórcio deve ser portanto combatido, quando menos por conta desses seus efeitos sociais deletérios que ninguém ousa chamar nem mesmo de indiferentes.

Contudo, existe o dogma de que o divórcio é uma conquista da humanidade, é um direito que deve ser defendido a ferro e a fogo; mesmo que às custas do aumento da pobreza e da menor estabilidade das famílias. Essa última parte não se diz às claras, para que não restem patentes os absurdos a que pode conduzir o peculiaríssimo raciocínio dos nossos formadores de opiniões – daqueles que vêm a público afirmando saber os rumos que devemos tomar para alcançarmos um mundo mais moderno, uma sociedade mais evoluída ou qualquer outro chavão destituído de significado do tipo. Mas dessa vez a manchete jornalística estampou em letras garrafais o que todo mundo se esforça por esconder. Dessa vez deu para ver claramente através da janela o rufião pateticamente escondido atrás da cortina.

Chego por fim a esta manchete luminosa: «Papa vê imagem de Deus em casamento entre homem e mulher». Na mídia secular, nos grandes portais de notícias brasileiros. Assim falou Pedro: «a imagem de Deus é o casal conjugal». E ainda: «Não apenas o homem, não apenas a mulher, mas ambos».

Inacreditavelmente, a matéria saiu sem a histeria costumeira. Sem nenhum comentário ideológico a mais do que notar discretamente que o Papa falou tudo isso «[s]em mencionar as novas formas de casamento entre dois homens ou duas mulheres». E fazer esse comentário prestou até um grande serviço à causa do óbvio, pois fez resplandecer – por contraste – a particularidade da instituição familiar sobre as tais «novas formas de casamento» tão ao gosto dos ideólogos hodiernos. Em um mundo onde se interpreta ausência como discriminação e onde qualquer discurso precisa se encher de irritantes e redundantes masculinos e femininos sob pena de ser conivente com o machismo patriarcal e opressor da sociedade judaico-cristã, a catequese do Papa Francisco – convenientemente iluminada pela lembrança jornalística de que as duplas gays não mereceram ser elevadas pelo Vigário de Cristo ao mesmo patamar sociológico onde se vê a imagem de Deus – rescende assim a uma agradável “heteronormatividade”, para pegar o termo emprestado aos bárbaros. Ficou bonito, mais uma vez.

A lufada de ar fresco nos pegou de surpresa e nos revigorou. O mundo se tornou de repente mais belo e mais esperançoso. Percebemos, de súbito, que a grama é verde e o sol brilha lá fora. E isso faz toda a diferença sim.

O reino vazio dos sultões dos camarotes

Saí com alguns amigos ontem à noite. Numa mesa de bar, alguém me falava do “Rei do Camarote”. Eu não fazia idéia de quem se tratava; hoje, vi o vídeo no celular de um amigo, a reportagem original da Veja e as notícias sobre a estrondosa repercussão do assunto. Cheguei a esboçar um sorriso com algumas das piadas feitas: mais um meme para compôr a incontável história da internet brasileira no século XXI.

Memes são efêmeros; esqueçamos as piadas que só vão durar alguns dias e nos concentremos no que chama a atenção aqui: fortunas torradas noite após noite, balada após balada, em repetida monotonia. O que explica isso?

Eu consigo entender pessoas equilibradas gastarem pequenas fortunas numa festa, contanto que o acontecimento seja realmente digno de ser celebrado em grande estilo. Um casamento, por exemplo: aqui, é precisamente a importância e exclusividade do evento na vida dos envolvidos que justifica a extravagância da comemoração. Ao contrário, tratar com prodigalidade todos os dias da vida é, no fundo, negar importância a todos eles. Se tudo é extraordinário, então é tudo normal. Se todos os dias são excepcionais, então os dias são todos iguais e não existe excepcionalidade no mundo.

Existe algo de errado em quem dá uma festa suntuosa toda semana! Não interessa aqui se a pessoa tem dinheiro e, portanto, gasta porque pode gastar. O problema não tem somente a ver com a vultuosidade da quantia envolvida em cada comemoração: o fulano que toda noite precisa reunir os vizinhos para tomar uma caninha com limão ouvindo pagode num radinho de pilha padece, em essência, do mesmo mal do Rei do Camarote. O ponto é que ninguém tem tanta coisa pra comemorar assim. Em última análise, o problema reside na freqüência com a qual algumas pessoas têm a necessidade de comemorar nada.

E por que essa necessidade estranha? Só posso pensar que é por conta do niilismo que lhes toma conta da vida, do vazio no qual elas se acostumaram a viver. Falta-lhes algo e, assim, as próprias comemorações tomam o lugar das coisas a comemorar; tenta-se suprir a ausência destas por meio da multiplicação desordenada daquelas.

O que é uma noite de sábado? É uma noite ordinária, que se repete infalivelmente uma vez por semana. Comemorar o que não tem nenhum significado especial é, no fim das contas, não entender por que os homens inventaram as comemorações. Uma noite de sábado ordinária é somente uma noite de sábado ordinária. Coisa bem diferente é, por exemplo, se aquela noite de sábado específica é, digamos, a noite do meu casamento. Isso por si só faz com que ela se distinga de todas as outras noites de sábado; isso por si só lhe confere um valor. A comemoração, aqui, surge como conseqüência de um fato especial já existente: é o casamento e não a festa de casamento que torna aquela noite diferente das outras. Eu celebro, assim, porque aquela noite é diferente, e não para torná-la diferente. É enorme a distância entre essas duas coisas.

Mas uma noite de sábado comum, no geral, não passa de uma noite comum de sábado. E uma festa sem razão de ser é, na verdade, o contrário de uma comemoração. Necessariamente, toda comemoração é precedida pelo fato comemorado: só se sai às ruas gritando “é campeão!” quando o time antes ganha o campeonato. Fazer festas sem sentido, ao contrário, é simplesmente não ter o que comemorar e buscar ocupar este vazio com uma “celebração” artificial e que, no fundo, não convence, não satisfaz. Como organizar uma carreata da vitória com a seleção que acabou de ser eliminada não é capaz de satisfazer os torcedores que ainda sentem na boca o amargor da derrota.

E, justamente por não convencerem, as falsas comemorações precisam ser multiplicadas, em uma tentativa vã de fazer a quantidade excessiva suprir a má qualidade dos eventos. Contudo, o fato é que um acontecimento especial na vida de alguém pode até ensejar mil festas, mas um milhão de festas não são capazes de transformar futilidades em um acontecimento especial. No fundo, a tentativa de esconder o vazio só o torna maior e mais incômodo. Esbanjar celebrações sem sentido é a pior forma de combater a falta de sentido da vida.

Há um episódio da quarta temporada de Breaking Bad (aliás, série excepcional, sobre a qual talvez um dia eu escreva alguma coisa) que termina de maneira fantástica. Um dos protagonistas da série, Jesse, conseguira com o tráfico mais dinheiro do que seria capaz de gastar; mas assombrado pelos seus crimes e sem família, trabalho ou objetivo na vida, cai no mais insuportável niilismo. Para combatê-lo, resolve dar uma festa em sua casa, com toda a extravagância de que só os milionários são capazes. Primeiro os amigos, música e bebida, depois estranhos, sexo e drogas: os dias passam e essa rave permanente degenera cada vez mais, com toda sorte de criminosos para lá atraídos pelos dólares que Jesse atira para cima com o objetivo de os manter por perto, de estender um pouco mais a já insuportável festa. Por fim, até esses vão embora. Enquanto a casa se está esvaziando, Jesse ainda apela aos seus dois únicos amigos: fiquem mais um pouco, vamos beber e dançar, vamos chamar umas garotas. Ambos recusam, dizem que não agüentam mais, voltam no próximo final de semana. Todos vão embora. E então Jesse se encontra sozinho na casa vazia e destruída, cujo estado é uma perfeita metáfora do vazio e da desolação que ele tem dentro de si.

Esta cena me parece um retrato perfeito da vida dos que vivem de festa em festa. Porque quem comemora tudo, na verdade, revela que não tem nada pra comemorar. Por debaixo da suntuosidade das festas que não têm fim, é fácil vislumbrar a falta de sentido da vida, o niilismo que tudo corrói e cujo sintoma mais evidente é a insistência em se celebrar… nada. Por mais que pareça exuberante esta vida noturna, o que ela esconde é de uma miséria atroz. A sua aparente riqueza é somente para disfarçar o angustiante vazio do reino dos sultões dos camarotes.

Acredite se quiser: «O Domingo» já foi um semanário católico!

[Encontrei no Facebook esta antiga edição d’O Domingo, de fevereiro de 1950 (30?). O conteúdo é tão bom que me permiti transcrevê-lo na íntegra. Quanta coisa mudou com o transcurso das décadas! É lamentável que um veículo de informação plenamente ortodoxo (a julgar por esse antigo exemplar) tenha se transformado no decrépito folhetim filo-herético que hoje encontramos nas nossas paróquias. Os antigos articulistas do semanário litúrgico da Editora Paulus devem estar se revirando no túmulo ao contemplarem com horror o que fizeram com seu «O Domingo»…

Seria  bom que a Paulus voltasse às suas origens, e tornasse a produzir material católico de qualidade. Seria bom que a editora católica honrasse a memória dos que a conduziram no passado! Porque, comparando este exemplar do jornal com os de hoje em dia, não podemos deixar de sentir vergonha. Colocando-os lado a lado, vemos com aterradora clareza as dimensões da crise que hoje assola a Igreja de Deus.]

o-domingo-1950

PREPARANDO-SE PARA O CASAMENTO

A crise de muitas famílias, que logo se esfacelam, é uma crise de preparação ao casamento.

Geralmente, os nossos noivos não se preparam convenientemente para o grande passo que vão dar com o casamento. É uma vida nova e decisiva de dois jovens que se encontraram, amaram e se uniram para sempre pelo enlace matrimonial. Muitos consideram a vida matrimonial com muita leviandade e sem [o] menor senso de responsabilidade. Outros fazem do casamento um bom negócio. E há muitos outros que entram na vida matrimonial levados tão somente pela primeira impressão ou por um sentimentalismo doentio.

É lógico que tais casais não encontram aquilo que procuravam: a felicidade. Vêm as decepções, os aborrecimentos mútuos, a eterna incompatibilidade de gênios e finalmente a destruição do lar. Tudo isto porque faltou preparação de ambos ou de uma parte. Tudo isso porque não souberam raciocinar antes e ver as coisas com bom senso. O moço não chegou a conhecer perfeitamente aquela com quem iria viver para sempre e não pensou com mais seriedade no passo que ia dar. A moça, talvez, ainda com mais leviandade, se aventurou na vida matrimonial para não perder uma boa partida…

E agora são duas criaturas infelizes, dois corações amargurados.

Em muitas paróquias já há os cursos preparatórios ao casamento, muitos livros já foram publicados em português sobre este assunto, tanto para moços como moças. Os que não quiserem fazer uma simples aventura, destruindo a própria felicidade e a de outra pessoa, procurem, com seriedade, objetividade e bom senso, dar o passo firme e seguro: preparem-se para o casamento!

Pe. Adalberto de Paula Nunes

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INVICTA

Os malvados destroem-se a si mesmos. Os maus passaram ou estão passando. Os perversos se atufam em sombras tenebrosas, onde afinal submergirão fatalmente. Os coveiros de Deus e da Igreja desaparecem um após outro do cenário da vida.

Enquanto isso acontece fragorosamente, o Altíssimo permanece vivo, potente, soberano e invencível, vencendo sempre todas as batalhas, as mais ferozes e infernais. Nem mesmo os comunistas – lobos burgueses em pele de cordeiro – conseguirão apagar o nome divino.

A Igreja Católica, a exemplo do seu divino Fundador, domina os séculos. Ri das ferrenhas perseguições. Zomba dos brutais perseguidores. Desafia os figadais inimigos: “As portas do inferno não prevalecerão!”

O supremo chefe visível da grei de Cristo, o Papa, do alto do Vaticano de Roma, continua, com mão firme de piloto adestrado, regendo os destinos dos homens e das nações. Porque a Igreja de Cristo será sempre invicta!

Frei Benvindo Destéfani, OFM

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BOM HUMOR

No exame de geografia

O examinador: – Se todos os rios desagüam no mar como se diz, por que então o mar não transborda?

O aluno (atrapalhado):

– É porque no mar tem muita esponja!…

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O CHAMADO CASAMENTO CIVIL NÃO É CASAMENTO PARA OS CRISTÃOS, PORQUE NÃO É SACRAMENTO

Nec rubricat, nec cantat

A frase acima é um antigo adágio latino aplicado aos jesuítas: diz-se que eles nem se preocupam com as rubricas litúrgicas [nec rubricant] e nem cantam [nec cantant]. Não sei qual a origem do ditado, mas ele parece se aplicar muito bem ao Papa Francisco.

Que ele não era um grande liturgista foi uma das primeiras coisas que eu falei aqui no blog, logo após a sua eleição: «Acho pouco provável que voltemos aos piores pesadelos litúrgicos da época de João Paulo II, mas infelizmente penso que tampouco iremos nos embevecer com a sacralidade do ethos de Bento XVI». Hoje o Rorate Caeli pôs uma pequena nota sobre a Missa Pontifícia do último domingo: pela primeira vez, o Papa Francisco distribuiu a Comunhão sem o genuflexório que Bento XVI introduzira nas liturgias papais. No último domingo, portanto, as pessoas que receberam a Eucaristia das mãos do Romano Pontífice, fizeram-no de pé e não de joelhos. E sem a patena, o blog faz questão de frisar.

É certo que se trata de uma notícia profundamente triste, uma vez que a nossa opinião particular é a de que existe uma estreita correlação entre sacralidade litúrgica e ortodoxia; e isso de tal modo que, no meio da terrível crise de Fé que a Igreja atravessa nos dias de hoje, o exemplo é uma das formas mais eficazes e seguras de transmitir os conteúdos da Fé da Igreja. Mas não nos esqueçamos de que o Papa Francisco não está fazendo nada de inesperado ou revolucionário. Não é inesperado, porque – como dissemos antes – os detalhes litúrgicos não nos parecem fazer parte das preocupações mais próximas do Sumo Pontífice. E não é revolucionário porque a rigor é lícito receber a comunhão de joelhos ou de pé, como dizem os documentos vigentes sobre o assunto.

Do fato da comunhão de joelhos expressar mais perfeitamente a Fé Católica na Eucaristia, não segue que recebê-La de pé equivalha a cair em heresia: mesmo quando as regras para a distribuição da comunhão eram mais rígidas, sempre se permitiu que comungassem de pé as pessoas que, por questões de saúde, não podiam se ajoelhar. Ainda, do fato da comunhão de joelhos ser o modo mais perfeito de receber a Nosso Senhor Sacramentado, não segue que um sacerdote não possa distribuir a Eucaristia para comungantes de pé, se julgar prudente em determinadas circunstâncias concretas (*). Por fim, do fato do Papa Francisco ter distribuído a comunhão para comungantes de pé na missa que celebrou na paróquia de Santi Elisabetta e Zaccaria, não segue que este deva ser doravante o modo ordinário de distribuição da Eucaristia. Nem nas liturgias papais, e nem muito menos nas missas celebradas mundo afora.

[(*) É fato que a Primeira Comunhão trata-se exatamente de uma ocasião que, por sua própria natureza, justificaria – quase exigiria até – uma maior solenidade na administração do Santíssimo Sacramento, sendo portanto o mais natural distribuí-Lo com o genuflexório… mas é dever de caridade pensar que o Santo Padre não fez considerações de caráter ideológico quando distribuiu a Eucaristia para crianças de pé no último Domingo. Nada nos autoriza a julgar mal as intenções do Romano Pontífice.]

Enfim… Nec rubricat. Já o sabíamos. Até o próprio pe. Lombardi já havia aludido ao adágio. Mas e quanto ao “nec cantat”? O significado mais literal nos diz que ele simplesmente não canta, o que em linhas gerais é verdade. Mas gosto de pensar em um sentido mais metafórico para a expressão: o Papa Francisco não canta, quer dizer, ele não [se preocupa em] agrada[r]. Ele não busca aplausos, não está em Roma para fazer espetáculos recreativos, e sim para anunciar a Religião do Crucificado com todas as exigências que ela acarreta. Não faz concessões, por mínimas que seja. Não tem palavras bonitinhas para o mundo moderno, mas somente duras admoestações. Já citamos aqui alguns exemplos disso, mas eles se multiplicam a cada dia. Trago mais dois.

Na semana passada, falando sobre o dia de oração pelos católicos chineses, o Papa não fez lamentações genéricas sobre as perseguições sofridas pela Igreja na China e nem se limitou a admoestar os poderes públicos para que respeitassem os direitos humanos, a liberdade religiosa e coisas do tipo. Muito pelo contrário, pediu que os católicos do mundo inteiro rezassem por estas intenções para a China: «para implorar de Deus a graça de anunciar com humildade e com alegria Cristo morto e ressuscitado, de ser fiel à sua Igreja e ao Sucessor de Pedro, e de viver a cotidianidade no serviço a seu país e aos seus compatriotas de modo coerente com a fé que professam». Fidelidade à Igreja de Roma e testemunho público da Fé Católica a despeito do ateísmo estatal: eis o que o Vigário de Cristo acha importante pedir para a China!

Já ontem, fustigando impiedosamente a mentalidade moderna – presente e atuante mesmo entre muitos ditos católicos! – a respeito do casamento, o Papa Francisco afirmou: «Quantos casais se casam e pensam em seu coração, sem ousar dizer: ‘enquanto houver amor e, então, veremos depois'[?]»; e ainda, colocando-se ironicamente “no lugar de um pai católico de hoje”: «Não, eu não quero mais um filho [p.s.: a melhor tradução é “não, não, mais de um filho não!”, como se depreende do original italiano «No, no, più di un figlio, no!» disponível no site do Vaticano], porque não poderemos viajar de férias, não poderemos ir a tal lugar, não poderemos comprar uma casa! (…) Nós queremos seguir o Senhor, mas até certo ponto». A contundência da mensagem foi tamanha que mesmo a mídia secular (pela primeira vez de que eu me recorde) se viu obrigada a compará-lo com Bento XVI não para antagonizá-los, mas para demonstrar a harmônica continuidade entre o Papa reinante e seu predecessor: «[o Papa] Francisco retomou fielmente, mas em termos concretos que podem estar na mente das pessoas, temas que seu antecessor Bento XVI expunha em termos abstratos: casamento concebido como temporário, medo de compromisso, preguiça e recusa de abandonar seu conforto pessoal».

Nec cantat! O Papa não busca a aprovação do mundo moderno, graças a Deus. Não mede esforços por fazer a mensagem cristã conhecida, ainda que isso vá ferir susceptibilidades contemporâneas. A sua pregação não é melosa ou condescendente, muito pelo contrário: as suas palavras são duras! Como as do Cristo de quem ele é vigário [cf. Jo VI, 60]. Mas, para os que somos católicos, elas são uma doce e agradável melodia. O Papa não canta, mas as suas homilias soem ser como música para os nossos ouvidos.

Curtas: divórcio no Brasil, medidas pró-vida, Dom Evaristo Arns e o esvaziamento das igrejas, erro médico salva bebê

Brasil tem recorde de divórcios em 2011. «O número de divórcios chegou a 351.153, um crescimento de 45,6% em relação a 2010, quando foram registrados 243.224».

A razão? Naturalmente, o afrouxamento das exigências para o divórcio. «Conforme a pesquisa, um dos fatores foi a mudança na Constituição Federal em 2010, que derrubou o prazo para se divorciar, tornando esta a forma efetiva de dissolução dos casamentos, sem a etapa prévia da separação».

Pode-se argumentar que estas pessoas já não estavam vivendo um “casamento de verdade” mesmo, e que o fim do prazo legal para o divórcio só fez diminuir a burocracia necessária para regulamentar de direito uma situação que já existia de fato. Data venia, discordo. Casamento tem muito mais a ver com responsabilidade do que com os cônjuges “sentirem-se bem”, “amarem-se romanticamente” ou qualquer outro critério subjetivo do tipo. O casamento existe enquanto não se desiste dele; e conferir facilidades à desistência conjugal, longe de meramente regulamentar uma situação de fato, é contribuir positivamente para o fim do casamento – e, por conseguinte, para a banalização de um dos pilares necessários à vida em sociedade.

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– É antiga, mas merece dois tostões: “Proibir o aborto está longe de ser uma medida pró-vida”. «Eu nunca vou chamar de “pró-vida” alguém que faz piquete contra o programa Planned Parenthood e que faz lobby contra as leis relacionadas ao controle de armas regido pelo senso comum».

O que dizer? São comparações descabidas em cima de comparações descabidas! Ninguém é a favor da destruição ambiental ou do morticínio por armas de fogo. As bandeiras são pelo (verdadeiro!) desenvolvimento sustentável, que resguarda a primazia do homem na escala de valores da natureza, e pelo exercício do direito à legítima defesa, que dá a cada um a capacidade de proteger a si próprio e aos seus. Ao contrário, o aborto é a destruição direta de um ser humano. Causa espécie que existam pessoas incapazes de distinguir entre um espantalho e uma reivindicação literal!

Bem característico da qualidade argumentativa do texto é este período aqui: «O respeito pela santidade da vida, se você acredita que ela começa no momento da concepção, não pode terminar no nascimento». Oras, em primeiro lugar, ninguém “acredita” que a vida começa na concepção. Nós sabemos, com sólido e inabalável fundamento científico e filosófico, que a união dos gametas masculino e feminino produz um novo ser, distinto da mãe e pertencente à espécie humana. Isto é um fato, não uma coisa na qual se “acredita”. Se os “pro-choice” defendem que certos seres humanos são mais passíveis de proteção do que outros, que assumam abertamente as suas posições. Mas não venham querer jogar fatos objetivos e incontestes para o cômodo terreno das crendices e opiniões.

Em segundo lugar, é bastante óbvio que ninguém que é contra o aborto afirma que os cuidados com o ser humano devam terminar no momento do nascimento: isto é só mais um espantalho grosseiríssimo do sr. Thomas Friedman. Mas para quem tem o admirável dom de escrever um texto falacioso do primeiro ao último parágrafo, tal sofisma deve brotar com a naturalidade de um cacoete involuntário e incontrolável. Talvez ele nem perceba; mas isso, embora possa talvez escusá-lo da patifaria intelectual, não transforma esta tagarelice em argumento que deva ser levado a sério.

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– Dom Evaristo Arns admite que suas homilias esvaziavam a igreja. Simplesmente faço coro [p.s.: ao trecho abaixo que é d’O Catequista, e não de D. Arns]:

O crescimento das igrejas evangélicas se deu, em grande parte, graças ao bla-bla-blá marxista dos padres da Teologia da Libertação. O fiel ia pra paróquia querendo ouvir palavras de vida eterna, e, em vez disso, tinha que aturar um sermão enfadonho contra o “capetalismo”, sobre os oprimidos etc. (tudo muito teórico e distante da realidade do povo, pra variar). Um belo dia, cedendo ao convite de um amigo crente, o sujeito resolvia dar uma passadinha no culto, e o que ele via? Um pastor falando das coisas de Deus, falando de Cristo, explicando as coisas da Bíblia… Opa, finalmente!

E aí, entre uma paróquia transformada em filial do partido comunista e uma igrejola cheia de gente histérica, mas que, ao menos, ainda lembra que Jesus existe, com quem vocês acham que o povo simples fechava?

Estes resultados são tão deprimentes quanto previsíveis. O povo simples tem sede de Deus e, portanto, não se deixa engabelar facilmente pelo materialismo grosseiro e estéril da Teologia da Libertação. Foram às seitas protestantes para beber água suja, sim, mas muitas vezes forçados pelas circunstâncias eclesiásticas católicas – onde nem sequer água barrenta lhes davam. Foram à pocilga comer o farelo dos porcos porque, para vergonha nossa, nas paróquias só lhes davam pedras para comer.

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Erro médico salva bebê prematuro. Há «um código ético seguido pelos hospitais do Reino Unido que diz que os médicos não devem se esforçar para manter vivos esses bebês prematuros». E então aconteceu o seguinte:

Mas Maddalena sobreviveu, e, quando foi pesada, a balança marcou 1 libra (aproximadamente 453 gramas), número considerado razoável que fez com que os médicos decidissem agir para mantê-la viva. Acontece que a bebê pesava, na verdade, apenas 382 gramas, e uma tesoura esquecida em cima da balança havia aumentado seu peso. Se não fosse por isso, provavelmente eles teriam seguido o código e deixado os esforços de lado.

Ela sobreviveu e agora já está em casa. Um amigo perguntou que espécie de código de ética é este que proíbe os médicos de se esforçarem para salvar a vida de bebês prematuros; a perplexidade dele é plenamente justificável. É o tecnicismo colocado acima do mais elementar respeito à vida humana frágil e indefesa! E ainda querem nos fazer acreditar que estamos evoluídos. Ao contrário, parece-me bastante óbvio que o progresso moral não acompanhou o extraordinário desenvolvimento técnico que alcançamos. E é claro que a técnica é uma coisa muito boa, mas ela é um meio que se deve orientar ao bem do ser humano. Afinal de contas, se isto for esquecido, de que nos serve a técnica? Mais vale um médico sem perícia e sem tecnologia preocupado em salvar uma criança prematura do que um que, embora possua excelentes habilidades e tecnologia de ponta, prefira deixar um bebê frágil morrer sem cuidados! E a saúde moral de qualquer sociedade está fortemente relacionada ao quanto ela percebe que esta proposição é evidente.

Hoje à noite eu vou ser Cristo

Muitas vezes é banalizada a força daquela expressão bíblica onde, após a narrativa da Criação do Homem, diz-se de Deus que “homem e mulher Ele os criou”. E esta sagrada união natural entre os sexos – destinatária da única bênção que não foi abolida nem pelo Pecado Original e nem pelo castigo do Dilúvio, como se diz em uma das orações do Ritual do Matrimônio – é talvez aquilo de mais sublime que, na ordem da natureza, faz parte da Criação do Altíssimo. Porque foi precisamente esta união entre o homem e a mulher que o próprio Deus escolheu para simbolizar a Sua relação com o Seu povo e, como diz Dietrich Von Hildebrand, aquilo que não fosse já naturalmente sublime não seria digno de ser usado para representar a sublimíssima união entre Cristo e a Sua Igreja. Se esta união mística e sobrenatural é excelsa em grau máximo, quão digna de honra e louvor não é a relação humana que – dentre todas as existentes! – foi elegida pelo próprio Deus para ser sinal da Sua relação com a humanidade?

Hoje é o dia mais importante da minha vida. Logo mais, à noite, subirei ao altar do Senhor para tomar por esposa aquela que escolhi por companheira, para me completar e me auxiliar nesta caminhada da minha existência terrena, para estar a meu lado na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, por todos os dias da minha vida. A responsabilidade chega a ser assustadora, porque “todos os dias da minha vida” é um intervalo de tempo bastante difícil de se abranger de um lance de vista! No entanto, preciso fazê-lo. Talvez o valor de um homem seja medido menos por aquilo que ele faz com as coisas que estão sob seu controle do que pelos seus esforços para obter controle sobre as coisas que ele precisa fazer. Não sei se me faço claro: oferecer os dias passados é simples, porque estes já está feitos. Oferecer os dias futuros, aqueles que você não sabe como serão… isto, sim, é desafiador. E o Matrimônio, assim, afigura-se-me não meramente como uma entrega daquilo que é seu, mas como – a partir de então – uma luta ferrenha e perpétua para conquistar a cada dia aquilo que, diante de Deus, foi um dia entregue. Conquistar para entregar. O Matrimônio consuma-se na noite de núpcias, claro, mas é aí que ele começa. A entrega da própria vida foi feita, mas – justamente por ter sido um feita um dia – precisa ser consumada a cada dia. Por todos os dias da vida. Sim, é o que eu quero.

E esta doação generosa de si é, como eu dizia, figura d’Aquela união mística entre Cristo e a Sua Igreja. Uma entrega total e permanente, pessoal e exclusiva, amorosa e fecunda: a mera consideração do significado teológico do Matrimônio bastaria (permito-me o ligeiro parêntese) para fazer com que todos os fantasmas que andam à ronda da Família ávidos por Lhe destruir (do divórcio ao sexo livre, da poligamia à união gay) desvanecessem-se como as trevas ao alvorecer. E importa multiplicar pelo mundo estes reflexos do Amor de Deus pelo Seu Povo, estas pequenas Igrejas Domésticas, estas instituições que perpetuam na terra um pouco da glória d’Aquela Sagrada Família de Nazaré: importa fazê-lo, para que Deus seja mais louvado e para que as pessoas, relacionando-se ordenadamente nesta terra através das coisas que vêem, possam mais facilmente relacionar-se com o Deus Invisível com o Qual se relacionam mediante a Fé. E assim, subindo das coisas visíveis para as invisíveis, dos sinais para a realidade, possam consumar um dia as Núpcias para a qual foram criadas. Em cada homem e em cada mulher que se unem pelos sagrados liames do Matrimônio, está presente a união mística entre Cristo e a Sua Igreja Santa.

Hoje à noite eu vou ser Cristo. De pé à porta da Igreja, esperando a minha amada noiva chegar – como o Senhor esperando o Seu povo -, oferecendo-lhe o braço para conduzi-la ao altar de Deus, tornando-me depois uma só carne com ela! Senhor, eu não sou digno de desempenhar tão sublime papel; mas, como disse um personagem de Chesterton, o Matrimônio é um duelo de uma vida inteira que, uma vez apresentado, os homens honrados não têm o direito de recusar. Sim, este papel é assustador! E só ouso fazê-lo por estar convencido de que sois Vós, Senhor, quem me chamais a ele. E, se Vós chamais, Senhor, adsum. Se Vós chamais, tenho certeza de que fareis com que eu o possa realizar.

Aos que por aqui passarem, peço uma Ave Maria por esta nova etapa da minha vida. Para que eu seja fiel, e corresponda às graças que Deus quer me conceder. Para que eu seja um bom marido e, amando a minha esposa, possa uma dia chegar com ela – junto a ela! – ao Banquete Nupcial do Cordeiro, às Bodas Eternas cujo sinal eu celebrarei logo mais.

Afinal, que diferença faz se Cristo foi ou não casado?

Têm recebido uma significativa repercussão as notícias a respeito da descoberta de um papiro que sugere que Nosso Senhor tenha sido casado. Vi a matéria hoje na INFO e ouvi, pela manhã, o assunto na CBN; ontem eu já vira a mesma notícia no site da Terra.

O que dizer sobre o assunto? É de se espantar o sensacionalismo com o qual a mídia costuma tratar qualquer velharia como se fosse a última descoberta científica de uma novidade revolucionária sobre a qual nunca se ouviu falar antes! É verdadeiramente impressionante: como é possível tratarem com tanto frisson um fragmento de texto antigo que alude a uma genérica “mulher de Jesus”, quando já se conhecem (e há muito tempo) textos que dão nome e sobrenome a esta alegada “esposa”?

O Apócrifo de Filipe fala de Maria Madalena como “companheira” de Jesus e afirma que Ele a beijava com freqüência – “na boca”, alguns gostam de completar em um impressionante exercício de leitura adivinhatória de lacunas. E, na Idade Média, nós sabemos que os cátaros foram acusados, justamente, de afirmarem que Cristo tinha um relacionamento com Maria Madalena (ora como esposa, ora como concubina). Se estas referências são eruditas demais para a nossa classe jornalística, temos aquele mega-best-seller, “O Código Da Vinci”, contando exatamente a mesma história caquética. Por qual motivo ela só agora seria digna de crédito?

[E antes que me venham com chorumelas dizendo que as comparações são injustas, respondo logo que, muito pelo contrário, são a mesmíssima coisa: historietas de comadres em tempo algum levadas a sério pelos cristãos. Continuemos.]

Com relação a este novo papiro antigo, uma reportagem de G1 diz que ele é questionado por especialistas. E estes questionamentos, parece, já produziram resultados: ontem o documento era do século II (Terra) e, hoje, já é do século IV (EFE, via INFO)! A continuar com este prodigioso processo de envelhecimento datacional, na próxima semana descobrem que o papiro se trata, na verdade, dos primeiros rascunhos do Dan Brown lançados fora pelo escritor em um surto de bom senso infelizmente passageiro. Mas, da matéria de G1, interessa-me particularmente a declaração do porta-voz da Santa Sé:

“Não muda em nada a visão sobre Cristo e os Evangelhos. Este acontecimento não tem influência alguma sobre a doutrina católica”, enfatizou.

Se ele fala do papiro, é verdade: não muda nada porque uma fábula espúria antiga não se torna verdadeira só pelo fato de estar escrita num fragmento de texto velho. Mas, se ele fala do alegado relacionamento de Cristo com Maria Madalena ou com qualquer outra, aí é preciso dizer que muda, sim, muita coisa.

Afinal de contas, durante séculos – melhor, milênios! – os cristãos professaram unanimemente que Nosso Senhor veio ao mundo para redimir a humanidade, e esta Sua missão redentora passou pelo sacrifício de Si na Cruz do Calvário. Jamais se afirmou que a missão do Redentor houvesse passado pela constituição de uma família, e isto importa sim. Tomar uma esposa não é um acidente de percurso na existência humana, como o seria por exemplo um jantar em Betânia ou um passeio de barco pelo Mar da Galiléia. Aqui sim, se Nosso Senhor certa feita jantou na casa de um coxo em Jericó ou se ele retirou-Se alguma vez para rezar sozinho no meio do Mar Morto, não faz de fato diferença alguma.

Mas um casamento não é um aspecto acidental da vida humana: é uma vocação positiva, um elemento constituinte do papel assinalado por Deus para cada um nesta terra. A plena realização do ser humano, a sua santificação, o tornar-se aquilo que Deus quer que ele se torne, passa estruturalmente pelas núpcias que ele contrai ou deixa de contrair. Se Cristo houvesse sido casado e a Igreja tivesse ignorado ou escondido este fato, isto representaria uma lacuna incompreensível na missão do Salvador, uma negligência injustificável sobre o papel do Sagrado Matrimônio: coisas que simplesmente não podem existir na indefectível Igreja de Cristo. Portanto, este assunto não é “indiferente”, porque um Matrimônio nunca é “indiferente”. Cristo não Se casou, porque assim sempre o afirmou a Igreja de Deus.

Quanto às estórias espúrias – por antigas que sejam – que digam diferente, elas por certo não conseguirão jamais abalar a solidez das referências documentais que temos a respeito da história de Cristo. Mas é preciso cuidar também para que elas não lancem dúvidas sobre o papel que o seu estado de vida exerce na salvação de cada ser humano concreto, sobre o lugar privilegiado que ocupa o Sagrado Matrimônio na economia da Salvação. Dizer que “tanto faz” é aviltar a concepção cristã de casamento e de família. Dos inimigos da Igreja (que tampouco têm consideração alguma pela Família) é esperado que pensem assim. Mas os cristãos não têm o direito de professar semelhante acinte à ordem que o Onipotente estabeleceu para a Sua criação.

A união entre Cristo e a Igreja

E Deus criou a mulher para ser companheira do homem, pois não era bom que este estivesse só. Embora esta complementaridade entre os sexos aponte indubitavelmente para a transcendência humana (aqui entendida como a sua capacidade de relacionar-se com um outro diferente de si mesmo) em seu sentido latu, é também indiscutível que este plano divino realiza-se com maior perfeição e particular eloqüência dentro do Sagrado Matrimônio, por meio do qual o homem e a mulher se unem diante de Deus; tornando-se assim uma só carne e iniciando uma nova família no mundo.

Um casamento, como dizia o Carlos Ramalhete outro dia, deve sempre ser comemorado. Porque se trata de uma etapa da vida que é deixada para trás, ao mesmo tempo em que se tem diante de si a grande aventura da vida, a aventura verdadeiramente importante da vida. Eu já escrevi sobre isto aqui há mais de três anos, quando voltava da festa de casamento de pessoas que me são particularmente caras. Todo casamento é um drama que cumpre ser bem representado, um drama único e irrepetível como únicas e irrepetíveis são as pessoas – cada uma das pessoas – criadas por Deus. Todo casamento é chamado a ser santo como santos devem ser os seus protagonistas, e eu diria ainda mais: os que se unem nos laços do Sagrado Matrimônio têm uma responsabilidade ainda maior do que os solteiros, pois devem acrescentar ao testemunho de si próprios o testemunho público da sua família. Em um certo sentido, o marido deve ser melhor do que era até o dia em que tomou a sua mulher por esposa, e a esposa deve ser melhor do que foi até o momento em que subiu ao altar de Deus; de certo modo, os esposos estão obrigados a serem bons esposos mais ainda do que os filhos ou irmãos devem ser bons filhos ou bons irmãos.

Porque o Matrimônio tem esta gravíssima prerrogativa de ser, como disse o Apóstolo, sinal da união entre Cristo e a Igreja. Se já é naturalmente nobre a união dos esposos, nobilíssima é a missão dos que se unem sob o signo da Cruz e, banhados no Sangue do Cordeiro, ousam aproximar-se deste Sacramento que torna palpável e visível a relação entre Deus e o Seu povo, entre Cristo e Sua Igreja. É o único Sacramento que tem esta finalidade. À união entre os esposos foi concedida esta incomensurável honra de servir como metáfora para o deleite da visão beatífica, para o encontro definitivo com Deus: são as próprias Escrituras Sagradas que nos falam nas “núpcias do Cordeiro” (cf. Ap 19, 7). Eis a que estão obrigados os que se unem em Matrimônio! A amizade é nobre. O amor natural entre o homem e a mulher é sublime. O Matrimônio elevado sobrenaturalmente a Sacramento chega aos limites do Céu, aos umbrais da Jerusalém Celeste: é divino.

Dentro em breve vou pegar um avião. Amanhã, se o bom Deus assim permitir, estarei presente à cerimônia religiosa onde um amigo e uma amiga irão selar a sua união diante do Todo-Poderoso, e isto é belíssimo porque semelhante entrega ultrapassa os limites humanos e só é possível porque o amor de Deus é maior do que as misérias humanas. Sim, o amor de Deus é maior do que as nossas fraquezas, e isto se torna visível cada vez que um Matrimônio é celebrado; cada vez que, a despeito de nossas muitas faltas, Deus insiste em fazer do barro que somos um vaso de precioso conteúdo. Amanhã este milagre acontecerá mais uma vez. Amanhã Marcio e Cristina darão continuidade a esta tradição que remonta às Bodas de Caná e, ainda mais além, remonta aos próprios Primeiros Pais, ao Primeiro Homem e à Primeira Mulher que Deus criou para que fossem um do outro e, precisamente sendo um do outro, refletissem no mundo um pouco do amor que Deus tem por Seus filhos. Amanhã – isto é certo! – eu terei um vislumbre de Cristo Se unindo à Sua Igreja. E o que desejo sinceramente aos amigos que embarcam em tão grandiosa empreitada é que sejam fiéis e felizes: que esta família possa ser no mundo um reflexo tão límpido e fulgurante d’Aquela Família Sagrada de Nazaré, d’Aquela União Mística entre Cristo e Sua Igreja, que arraste mais e mais almas a Deus; e que assim eles possam um dia consumar plenamente a união que amanhã irão simbolizar.

Parabéns aos noivos! Que sejam santos. Que por meio deles o amor de Deus se difunda sobre o mundo – e se encontre nesta terra. Que o Sacramento do Matrimônio os leve a Deus.

“Amor, casamento, divórcio” – Gustavo Corção

Mas o divorcista — seja dito em sua homenagem — não percebe essa contradição; e não a percebe justamente porque renunciou, de antemão, usar aquilo com que se evidenciam as contradições. Para ele, como já disse, o casamento é casual, essencialmente irrefletido, e não pode deixar de ser assim uma espécie de loteria onde pesa mais a sorte do que a razão. Dizem por exemplo que o amor é cego, e que é impossível, em meses de noivado, conhecer perfeitamente a pessoa com quem se delibera fundar uma família.

Concedo que é impossível, em meses, conhecer perfeitamente o outro. Vou até mais longe. Se é preciso conhecer perfeitamente o outro em todos os seus recantos psicológicos, a vida inteira não basta, e deveríamos adiar todos os casamentos par o dia do juízo final. Ou então, para atender às flamas do mais impaciente amor, deveríamos estipular que os noivos esperassem a provecta idade dos senadores.

O que é evidente, nesse pessimista irracionalismo, é que a incapacidade de conhecer o outro, se destrói o casamento indissolúvel, destrói também o divórcio. Porque o divórcio se baseia justamente nessa idéia insensata de que, num certo ponto da vida conjugal, a gente esgota completamente o conhecimento do outro, a ponto de lhe recusar a mínima possibilidade de recuperação.

Gustavo Corção,
“Amor, casamento, divórcio”