Todos devem ter visto aquela senhora que destruiu uma pintura do século XIX na sua tentativa de restaurá-la. Como eu comentei com uns amigos então, era evidente que a idosa não queria escarnecer de Nosso Senhor nem nada do tipo: claro estava que ela agiu com a melhor das intenções, cheia de boa-vontade. O que faltou foi, precisamente, alguém que lhe chamasse à realidade e lhe dissesse, caridosamente, que ela estava fazendo uma grande besteira. O que faltou foi alguém que afastasse o “yes, you can!” moderno que certamente ressoava em seus ouvidos para lhe dizer “não, querida, tu não podes”.
A história me fez lembrar imediatamente do início do “Ortodoxia” de Chesterton, onde ele critica o chavão vigente de que as pessoas que acreditavam em si mesmas estavam fadadas ao sucesso. O inglês diz (com uma clarividência impressionante) precisamente o oposto: as pessoas que acreditam em si mesmas estão é no hospício. De novo: não tenho dúvidas de que Cecilia Giménez acreditava na sua capacidade de restaurar a pintura espanhola… e aí deu no que deu. Faltou alguém que a fizesse duvidar um pouco de si. Faltou alguém que, com um pouco menos de respeito humano, recusasse a ajuda – evidentemente inadequada – da boa idosa.
Um detalhe, contudo, merece um pouco mais de ênfase: a história virou piada mundial e a pobre senhora se transformou rapidamente em motivo de chacota. Ora, isto tudo serve para demonstrar que as pessoas conseguem sim distinguir entre uma obra de arte bonita e uma ridícula. O pecado desta “restauração” não foi simplesmente ter imposto à obra anterior um outro estilo artístico diferente, mas o de fazer um desenho grosseiro, tosco e disforme, cuja feiúra a comparação com o Ecce Homo original só fazia acentuar.
Lembrei-me do assunto quando vi, hoje, esta imagem comparativa e provocativa no Facebook: a “restauração” que ganhou notoriedade recentemente e uma capa de um livro de um conhecido artista católico, o Cláudio Pastro. A semelhança é inegável; mas da sra. Giménez a gente pode ao menos dizer que ela fez o melhor que pôde.
Que o lamentável episódio espanhol possa servir para lançar um pouco de luz sobre este vergonhoso “relativismo estético” dos nossos dias que não poupa nem mesmo as nossas igrejas. Foi perdida a pintura de Elías García Martínez, mas não necessariamente o nosso bom gosto. Aliás, esta é uma excelente oportunidade para que o possamos afirmar em público e defender com coragem.