Se houver verdadeira demonstração de que a Terra circunda o Sol, então é preciso reinterpretar as Escrituras

Alguém comentou aqui no blog:

Sou catequista, mas nunca engoli a história da criação do Mundo e do homem… mas finalmente o Papa se pronunciou (Que alívio).

Por for, fale-me à respeito…

Papa Francisco diz que Big Bang e Teoria da Evolução não são incompatíveis com cristianismo – Catholicus

http://catholicus.org.br/papa-francisco-diz-que-big-bang-e-teoria-da-evolucao-nao-sao-incompativeis-com-cristianismo/

A Igreja Católica é uma sociedade visível fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo para guardar e transmitir as verdades necessárias à salvação de toda criatura humana. O escopo d’Ela é, portanto, restrito e não ilimitado. Necessário aos homens para que se salvem é saberem em quê devem crer e como devem agir; por isso a Igreja é Mestra Infalível em Fé e Moral, mas não em ciências naturais.

Não cabe portanto propriamente à Igreja pronunciar-se sobre o “Big Bang” ou sobre a “Teoria da Evolução”: estas coisas estão em princípio fora da Sua esfera de competência. No entanto, como a realidade é uma só e como a Revelação contém uma série de afirmações a respeito do mundo (e.g. que houve uma Criação, que o homem cometeu um Pecado Original, que Nosso Senhor «padeceu sob Pôncio Pilatos» etc.), torna-se por vezes necessário aparar algumas arestas que eventualmente surjam de outras alegações feitas pelas ciências seculares — como a cosmologia, a biologia evolutiva ou a história.

De antemão é preciso dizer que o núcleo essencial de afirmações da Doutrina Católica a respeito destes temas é mínimo. Não é necessário que o sol gire em torno da terra, que estejamos atualmente em 5.777 anno mundi ou que Deus tenha criado direta, específica e separadamente cada raça de cachorro que existe na face da terra, por exemplo. Esses detalhes (conquanto, reconheça-se, provavelmente não tenham sido sempre assim considerados por muitos cristãos) são periféricos e meramente acidentais na história da Salvação: ou seja, eles tanto podem ser assim como de diversas outras maneiras sem que isso altere fundamentalmente a natureza humana ou a necessidade do Evangelho.

Hoje nós certamente vemos isso com mais clareza do que no passado; no entanto, esta consciência sempre esteve presente na Igreja. Cite-se, por todos, a afirmação do inquisidor de Galileu, São Roberto Belarmino, ao comentar sobre a hipótese heliocêntrica:

Digo que se houvesse uma verdadeira demonstração de que o Sol está no centro do mundo e a Terra no terceiro céu, e que o Sol não circunda a terra, mas a Terra circunda o Sol, então seria preciso ir com muita consideração em explicar as Escrituras que parecem contrárias, e antes dizer que não as entendemos do que dizer que é falso o que se demonstra (Carta a Antonio Foscarini, escrita durante o processo de Galileu).

Se houver verdadeira demonstração de que a Terra circunda o Sol então é preciso reinterpretar as Escrituras: penso que se deve conceder ousadamente ao princípio aplicação universal. É preciso ser generoso e conceder autonomia para que os distintos ramos das ciências humanas cheguem às suas próprias conclusões acerca dos seus objetos próprios de estudo: porque se houver verdadeira demonstração de qualquer coisa da natureza então é possível coaduná-la com a Doutrina Católica, porque um mesmo Deus é o autor dos dois livros e, sendo perfeitíssimo, não pode enganar-Se e nem nos enganar.

Sim, a razão humana está sujeita a falhas e, portanto, as afirmações da ciência podem estar simplesmente erradas. Rejeitá-las liminarmente, no entanto, somente porque elas pareçam contradizer algum aspecto do Catolicismo é indolência intelectual: a razão iluminada pela Fé é sem dúvidas capaz de soluções mais elaboradas. Além do mais, há aqui um risco muito mais grave: pior, muito pior do que rejeitar um avanço científico legítimo por não conseguir assimilá-lo coerentemente no interior de uma cosmovisão católica é repudiar a Doutrina Católica por julgá-la incompatível com o que “a Ciência diz” — e esta limitação da inteligência já levou muitos homens à perdição, é um verdadeiro obstáculo à Fé que qualquer apostolado que se pretenda eficaz precisa esforçar-se por eliminar.

Para ajudar os ignorantes a não caírem em tão funesto erro, assim, é importante mostrar como muitas coisas — mesmo as mais estapafúrdias e improváveis do mundo — poderiam ser compatíveis com o Catolicismo, ainda que não sejam efetivamente verdadeiras. É preciso seguir o exemplo de Santo Tomás. Uma vez o perguntaram se era verdade que os nomes de todos os Bem-Aventurados estariam escritos em um pergaminho no céu; o frade, com a sua peculiar genialidade, respondeu que não achava que fosse assim, mas ao mesmo tempo não havia problema em acreditar nisso (cf. o capítulo 5.2 da biografia de Santo Tomás escrita por Chesterton).

E não haver problema em acreditar que um dia vai existir um manuscrito quilométrico flutuando na troposfera significa exatamente isto: esta hipótese, por extravagante que seja, é compatível com a alegação católica de que Cristo há-de vir no fim dos tempos «para julgar os vivos e os mortos». E se isso é compatível com a Fé, quantas outras coisas não o poderiam ser igualmente?

Humanos evoluindo de animais? Universo criado a partir de uma explosão? Seres extraterrestres? Ora, o que são todas essas hipóteses perto do heliocentrismo copernicano ou do pergaminho adejante tomista? Se um inquisidor não se furtou a conciliar a hipótese de Galileu com a autoridade das Escrituras e se um frade medieval postulou a incolumidade do Catolicismo mesmo diante de um velino que cobrisse todo o céu, por que não haveríamos nós de também envidar esforços para mostrar a compatibilidade da Fé Católica com as hipóteses — por extravagantes que sejam! — aventadas por nossos contemporâneos?

A Igreja, em regra, não pode fazer afirmações sobre o mundo natural dotadas de um maior grau de certeza do que aquele alcançável pela razão humana. A autoridade d’Ela é espiritual. O que a Igreja pode — e o que todos os católicos podemos — é compatibilizar os dados da razão (não apenas os reais como também os meramente possíveis) com os da Fé. É nesta clave que devem ser enquadradas todas as questões referentes às interações entre religião e ciência que, hoje, são alardeadas com uma beligerância totalmente descabida — e que arrastam tantos à apostasia desnecessariamente.

Em tempo: o Big Bang jamais foi incompatível com o Cristianismo. Afinal de contas, quem primeiro concebeu a sua hipótese foi, precisamente, um padre católico.

E ainda, desde Pio XI Pio XII que «o magistério da Igreja não proíbe que nas investigações e disputas entre homens doutos de ambos os campos se trate da doutrina do evolucionismo, que busca a origem do corpo humano em matéria viva preexistente» (Humani Generis, 37).

O pecado original e as tragédias sociais

O status naturalis hobbesiano em que atualmente se encontra o estado do Espírito Santo por conta da greve da PM (parece que já foram registradas 90 mortes violentas desde sábado), bem como as chacinas nos presídios que rebentaram no início do ano (por exemplo, com presos decapitados e eviscerados em Manaus) dão ensejo a algumas considerações.

Antes de tudo, é relevante registrar que as tragédias oferecem uma demonstração concreta, empírica, quase produzida em balão de ensaio, de um dos postulados mais básicos do Cristianismo: com o pecado original, a desordem foi introduzida na criação e o homem passou a sofrer uma como que inclinação natural para a prática do mal. Foi Chesterton quem disse que o pecado original era um dogma quase auto-evidente, podendo ser inferido do prosaico fato de (p. ex.) um homem esfolar um gato: diante da crueldade sem propósito ou se nega a existência de Deus (posição dos ateus) ou se afirma que existe, atualmente, uma separação entre Deus e o homem (visão de mundo cristã).

Ironicamente, o inglês acrescentava que os modernos materialistas haviam chegado a uma genial solução inovadora, negando o gato. Um século depois do Ortodoxia, os intelectuais contemporâneos — tributários daqueles contra os quais Chesterton levantou o seu gênio — chegam hoje à mesmíssima “brilhante” conclusão com cem anos de atraso.

Sobre a crise penitenciária, um ministro do STF chegou a sugerir, a sério, a legalização das drogas. A dar crédito ao ministro Barroso, então, bandidos de facções rivais só estão se matando dentro das penitenciárias porque a maconha é proibida no Brasil. “Dando certo” com a maconha — seja lá o que isso signifique –, o visionário ministro acha que se deve, também, legalizar a cocaína (!). Tudo, claro, para «quebrar o tráfico». Parece não ocorrer ao senhor ministro a hipótese de o tráfico continuar funcionando a despeito da legalização — como, mutatis mutandis, os cigarros ilegais movimentam bilhões de reais anualmente no país, mesmo não havendo notícia de que o tabaco tenha sido algum dia criminalizado. Igualmente não interessa a Luís Roberto Barroso o singelo fato de a cocaína não ser legalizada em lugar nenhum do mundo; a legislação estrangeira só brilha aos olhos do ministro quando é para introduzir o aborto por vias escusas no país.

No mesmo contexto, um artigo da Carta Capital enumera diversos problemas dos presídios capixabas; curiosamente, é o último artigo do «Justificando» sobre o Espírito Santo, escrito pouco antes da barbárie que tomou conta das ruas do final de semana para cá. Longe do portal pretensamente jurídico, a página inicial da revista ostenta uma chamada dizendo que a culpa da crise é do «ajuste fiscal» do governador pemedebista. Last but not least, o Sakamoto acredita que o problema só se pode resolver com a desmilitarização da polícia, a qual o articulista considera mero «instrumento de uma parcela da sociedade com um grupo de poder econômico para a qual os domínios fora de seu castelo são terra de ninguém».

É preciso muito sangue frio, reconheça-se, para usar o assassinato de noventa capixabas com o fito de atacar o governo do PMDB; do mesmo modo se exige uma dose particularmente refinada de psicopatia para achar que uma rebelião penitenciária (onde os presos estão literalmente arrancando as cabeças dos membros das facções rivais) é uma boa oportunidade para defender a legalização da cocaína. Sob a tagarelice da mídia fica assim diluída a responsabilidade individual, à qual ninguém parece dar grande importância; ao mesmo tempo, pontificando soluções mirabolantes, as pessoas fingem se esquecer de que existe, no âmago de qualquer «crise social», (i) indivíduos humanos que respondem a estímulos e (ii) cujos atos exigem responsabilização.

Indivíduos que respondem à estímulos: se o número de assaltos, saques e assassinatos aumenta precisamente quando se sabe que o policiamento ostensivo não está nas ruas, e sendo esta a única variável relevante sofrendo alteração considerável, é imperativa a conclusão de que fulano é menos propenso a assaltar, saquear ou assassinar quando sabe que corre risco maior de ser pego pela polícia. Em poucas palavras, a sensação de impunidade favorece o crime. Isto, que é óbvio e empiricamente verificável, quase não se encontra no discurso público oficial — e, ao contrário, não falta quem defenda que o «poder de punir do Estado» precisa urgentemente ser revisto porque, na verdade, ele existe para garantir «a permanência de um projeto de exploração».

Atos que exigem responsabilização: toda ação humana tem consequências e todo ato mal realizado introduz no mundo uma desordem que cumpre ser reparada. Isso está no âmago da consciência moral de todo mundo; não é outra a razão pela qual a função retributiva da pena foi sempre universalmente aceita pela totalidade das civilizações, só passando a ser questionada em alguns estratos da sociedade decadente contemporânea — nada coincidentemente, uma sociedade que perdeu a própria noção de mal moral (a «negação do gato» de Chesterton erigida a senso comum). Sim, a pena de morte é uma leprosa; mas mesmo os que não querem nem ouvir falar dela sentem um certo incômodo diante da ideia de que não há nada que possa ser feito com um sujeito que, já preso, mata, esquarteja e eviscera seres humanos.

Mas tudo isso é somente a parte, digamos, externa da questão — aquela que diz respeito à proteção dos terceiros inocentes. Há que se falar também — e principalmente! — das questões envolvendo o indivíduo criminoso, tanto para evitar que ele delinqua quanto para a sua eventual redenção. A experiência de Vitória nos ensina que colocar a polícia nas ruas é uma forma eficaz de minimizar os saques e arrastões; no entanto, não seria melhor se as pessoas não fizessem o mal independente de haver ou não quem as castigue?

O mal é uma contingência permanente da liberdade humana e, como tal, não pode ser erradicado. Mas é possível e necessário consumir a nossa vida na luta contra ele. É preciso educar para a virtude — essa expressão que se encontra atualmente tão fora de moda. É preciso incutir nas pessoas a idéia de que existe no mundo uma ordem que as transcende. Um assaltante sabe que assaltar é errado e alguém que saqueia uma loja de eletrodomésticos não gostaria de ter a própria casa saqueada; por quê, então, ele saqueia?

Todo pecado é uma desordem no sentido de que é antepôr um bem menor a um bem maior. Um televisor é um bem, mas o fato de que este bem pertence ao seu dono legítimo (àquele que empregou tempo e dinheiro na sua produção ou aquisição) é um bem maior. O problema dos assaltantes não é que eles não entendam ou não reconheçam o direito de propriedade; o problema é que eles sacrificam o direito de propriedade alheio (o bem maior) à satisfação da própria vontade (o bem menor). Esta é a desordem essencial. Respeitar o direito alheio só é possível em detrimento da própria vontade, impondo-lhe limites, dizendo-lhe que ela não pode ter aqui, agora e sem mais o bem de que desejaria fruir já. Isto, na verdade, é o antiquíssimo exercício de mortificação da própria vontade proposto pela Igreja há vinte séculos e ao qual os poderosos há dois mil anos dão as costas.

Nietzsche chama isso pejorativamente de «moral de escravos»; mas não era preciso que o caos se instalasse em uma metrópole brasileira para que se percebesse que a satisfação universal das vontades particulares é impossível. É bastante evidente que se as pessoas forem condicionadas antes a satisfazer que a renunciar às próprias vontades a violência vai cedo ou tarde exsurgir. Nada surpreendentemente, a moral que o alemão desdenhava como «escrava» é a única possível em sociedade e, por isso mesmo, é a única que torna os homens livres. Fora dela o que existe é a barbárie e a lei do mais forte.

Há décadas a nossa sociedade ocidental vem publicamente rejeitando a moral cristã, e os resultados estão aí para quem quiser ver: demonstrados na teoria e verificados na prática. A mera repressão jurídica, policial, conquanto evidentemente necessária, fornecesse apenas um verniz de civilização: o verdadeiro problema é mais profundo. Vem lá do Éden! E para ele somente a Igreja tem solução. Franquear-Lhe publicamente o pastoreio das almas, assim, é o mais eficaz remédio para a paz e a prosperidade, quando todas as panacéias apresentadas pelos Seus detratores se mostraram catastróficas.

Deus e o ônus da prova

Um leitor do blog afirma que reclamar provas da inexistência de Deus é “inversão do ônus da prova” e “desonestidade intelectual”. O raciocínio dele, imagino, é que compete a quem faz uma alegação oferecer os fundamentos nos quais tal alegação se baseia: portanto, não é verdade que a crença ateísta e a Fé em Deus estejam no mesmo patamar epistemológico, quando menos porque uma das duas proposições detém um ônus que a outra não possui. Ora, esta pretensão não tem sentido, pelos motivos que passo a expôr.

Em primeiro lugar, cabe apontar que isto aqui não é uma lide jurídica, onde o Magistrado deve distribuir os encargos probatórios entre as partes e julgar desfavoravelmente àquela que não se desincumbir do ônus da prova. O Direito é eficiente para a solução de conflitos jurídicos, mas o seu método não deve ser aplicado indistintamente a tudo quanto existe no mundo. Em particular, aliás, é importante ter em vista que uma coisa não se torna “falsa” porque o seu patrono não a conseguiu provar em juízo: é perfeitamente possível que alguém não se desincumba do ônus da prova e, mesmo assim, factualmente, a sua alegação seja integralmente verdadeira. Nos termos mais genéricos que se já tornaram clássicos: ausência de evidência não é evidência de ausência. A frase, a propósito, é de Carl Sagan, que não é propriamente um fanático religioso.

Em segundo lugar, existem incontáveis provas da existência de Deus: o problema é que a crença irreligiosa as rejeita por princípio! Os maiores pensadores da humanidade, desde que o mundo é mundo, sempre se esmeraram por elaborar provas de que Deus existe. Há-as aos borbotões. Aristóteles universalizou o conceito de Primeiro Motor Imóvel. Duns Scotus abordou o problema em diversos lugares de sua obra. Santo Agostinho também esboçou a sua prova da existência de Deus n’O Livre Arbítrio. Santo Tomás de Aquino tem as clássicas Cinco Vias (em vídeo aqui). Santo Anselmo tem o argumento ontológico e, Leibniz, o cosmológico. Descartes escreveu as suas Meditações Metafísicas com o mesmo intuito. Enfim, para onde quer que olhemos, deparamo-nos sempre com o engenho humano que, nos mais arrojados vôos do intelecto, no ápice do pensamento de cada época, esforça-se por fazer teologia natural.

O problema, portanto, não é que os crentes em Deus se eximem de apresentar aos céticos as “razões de sua esperança”. O problema é que a cosmologia cética rejeita a priori tudo aquilo que seja com ela incompatível — e nisso ela é indistinguível de qualquer outra religião. A crença atéia não admite a investigação metafísica, e isso não porque falte à metafísica rigor metodológico ou envergadura intelectual, mas simplesmente porque a metafísica é, em princípio, incompatível com a crença atéia. Nisso os seus adeptos reproduzem perfeitamente a caricatura que de modo brilhante lhes fez Chesterton:

A questão histórica contra os milagres é muito simples. Ela consiste em considerar os milagres impossíveis, e então afirmar que apenas um idiota acredita em impossibilidades: então declarar que não há nenhuma clara evidência a favor dos fatos miraculosos. Todo o truque é feito por meio do uso alternado da objeção filosófica e da objeção histórica. Se dizemos que os milagres são teoricamente possíveis, eles dizem: “Sim, mas não há evidência deles.” Quando coletamos todos os registros da raça humana e dizemos “Eis nossa evidência”, eles dizem: “Mas esses povos eram supersticiosos, eles acreditavam em coisas impossíveis.” (Chesterton, G. K. Milagres e a Moderna Civilização).

Finalmente, em terceiro — e mais importante — lugar, se é no geral verdade que o ônus da prova cabe a quem afirma, este princípio comporta algumas importantes exceções. Uma coisa é a alegação isolada e extravagante de Sagan de que há, em sua garagem, um dragão invisível. Uma outra coisa, completamente diferente, é a convicção universal — de virtualmente todos os homens, de todos os tempos e lugares, povos e culturas — de que existe um (ou mais) Deus(es) a responder pela Criação. As duas coisas não estão, absolutamente!, no mesmo patamar epistemológico; e quem ainda não entendeu isso precisa, urgentemente, pôr a cabeça para fora da seita atéia onde anda enfurnado e cogitar ao menos a possibilidade de que exista vida inteligente fora dos seus estreitos círculos de referência intelectual.

Para explicar como pode ser falsa uma alegação extravagante de um indivíduo isolado — como o dragão de Carl Sagan ou o bule de chá de Bertrand Russell –, basta classificar o seu propagador de louco, ou de ignorante ou de mentiroso, e não há nenhum problema com isso. É perfeitamente razoável que um único indivíduo se engane, ou que tenha a intenção de enganar terceiros, ou que detenha alguma deficiência dos sentidos ou do intelecto que lhe faça acreditar em coisas que não são verdadeiras. No entanto, uma alegação feita unanimemente por um número incontável de pessoas, das mais diversas classes sociais, das culturas as mais díspares, dos hábitos o mais incompatíveis possível, uma alegação, em suma, para a qual convergem, independentes entre si, «tantos povos distantes no tempo e no espaço» exige uma explicação mais convincente do que “essa gente era supersticiosa”. O erro de um único indivíduo é uma coisa perfeitamente natural, prosaica até, e que se aceita sem maiores dificuldades; o erro universal, no entanto, no qual teimam em incorrer os seres humanos mais diferentes do mundo, é uma coisa verdadeiramente extraordinária. E alegações extraordinárias exigem evidências extraordinárias. Quem afirma, portanto, que estavam — e estão — erradas multidões inumeráveis de seres humanos, dos mais simplórios às mentes mais extraordinárias, dos humildes aos poderosos, detém, sim, o ônus de provar esta alegação extravagante. É óbvio que detém, e não se pode considerar irrefutavelmente demonstrada a sua tese por meio de um lacônico “ah, essa gente é ignorante” que raia a puerilidade.

E os grandes expoentes do ateísmo sabem perfeitamente que o precisam demonstrar. Tentam-no. Que outra coisa é o Blind Watchmaker de Dawkins senão uma hipótese metafísica alternativa à Quinta Via tomista? Em quê as diatribes lançadas por Christopher Hitchens às religiões no seu “Deus não é grande” são diferentes da apologética religiosa tradicional que almeja apresentar a própria visão de mundo superior às demais? As contrarrazões que Dawkins — ainda ele — tenta apresentar à teologia natural no seu “Deus, um delírio”, não são porventura o reconhecimento simultâneo tanto de que os crentes têm historicamente apresentado evidências que dão suporte às suas crenças quanto de que os incrédulos precisam, igualmente, demonstrar o seu ponto de vista?

A cosmologia incrédula é, ela própria, uma alegação, e precisa portanto ser demonstrada. É uma alegação, aliás, extraordinária — como pode a noção da existência de Deus se ter generalizado, espontânea e independentemente, por toda a humanidade? Como pode a admirável ordem do Universo ter surgido ao acaso de todas as infinitas possibilidades de configurações da existência? Por que existe algo e não o nada? Como podem existir e continuar existindo coisas que não têm em si mesmas a razão da própria existência? — e que por conseguinte demanda evidências extraordinárias em seu favor. É louvável que os partidários do ateísmo busquem argumentar em defesa de suas crenças. Mas não se pode pacificamente pretender que tenham já logrado êxito em provar as suas alegações com o rigor que o assunto exige. Merecem, sim, um lugar no panteão da humanidade; imaginar que lhes caiba mais do que um nicho neste templo, no entanto, e pretender impô-lo a todos, aí já é fanatismo delirante, que é dever civilizacional combater.

Miscelânea: manuscritos, Beleza, divórcios, senso comum, ateísmo

– A descoberta de uma Bíblia de 1500 anos, dizem, «preocupa [o] Vaticano». Por quê? Por se tratar de um «original» (sic) do «Evangelho de Barnabé» que, entre outras coisas, teria previsto «a vinda do profeta Maomé, mostrando a verdade da religião do Islã» (!).

Como é possível que um manuscrito «do século V ou VI» possa ser o «original» de Barnabé se este viveu no século I da Era Cristã é um mistério que está para muito além da capacidade de entendimento dos meros mortais. Afora esse prodígio verdadeiramente portentoso, contudo, não há nada de novo na descoberta. O Evangelho de Barnabé (inclusive com a suposta profecia sobre o Islã) já é conhecido. A única coisa digna de nota aqui é a data: a dar crédito às notícias, o manuscrito recém-descoberto seria de um século antes do próprio nascimento de Maomé. A julgar pelo que já se sabe do livro, contudo, isto seria claramente impossível. Provavelmente estamos diante de mais uma falsificação, com a qual não é necessário desperdiçarmos o nosso tempo.

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– O culto à feiura no mundo revolucionário – merece (e muito) uma leitura. «Tragicamente, nosso mundo não reconhece sequer o que é o feio. Já dissemos que a beleza é aquilo que quando visto agrada e, portanto, o lógico seria que o feio fosse aquilo que quando visto desagrada. Mas olhem para a nossa sociedade, na qual o que agrada é o macabro, o esquisito, o torto e o deformado; na qual, por muitos anos, a peça mais popular de cinema — número um durante semanas — foi um filme sobre um canibal. São o mal e o feio que agora deleitam. Bem-vindos ao bravo novo mundo: o que em outra época teria sido chamado de mau agora é qualificado como bom, e o que era considerado feio é agora considerado bonito».

Nestes tempos em que mesmo a nossa arquitetura sacra é destituída do mais elementar senso estético, encontrar um padre defendendo o valor da Beleza é um verdadeiro refrigério. Ouçam-no! No meio do turbilhão de valores em que vivemos, é a Beleza que salvará o mundo.

* * *

– Este texto do Ad Hominem conclama à leitura de “Claro Escuro”, de Gustavo Corção. Faço coro ao pedido; a coletânea de artigos do grande jornalista foi uma das leituras mais prazerosas e instrutivas sobre o assunto que eu já fiz na minha vida. O transcurso dos anos não foi capaz de mitigar o impacto que as palavras de Corção ainda hoje provocam em mim; ainda hoje, leio-o com o deslumbramento de quem estivesse lhe pondo os olhos pela primeira vez. Não são todos os autores os que são capazes desse prodígio.

Para exemplificar isto que estou tentando dizer, trago apenas um excerto do excerto trazido pela Day Teixeira, enfaticamente recomendando aos meus leitores que procurem a íntegra da obra:

Assim como se abrem os olhos [da criança] para o jogo das leis naturais, abrem-se também para essa realidade de pedra que a protege, que a envolve, como paredes de uma casa viva. Por isso, a separação dos cônjuges terá para a criança um aspecto de alucinação. Não se trata apenas de um afastamento livremente consentido de duas pessoas que livremente se uniram. Não será apenas a quebra de um juramento ou a rescisão de um contrato. A separação dos pais, para a criança, é um absurdo. Não é um drama moral, é uma tragédia cósmica. Não é conflito de duas pessoas, é conflito dos elementos constitutivos do universo. O mundo enlouqueceu se os pais se separam. Na mente infantil, a repercussão afetiva e intelectual significa um abalo de todas as fundamentais experiências até então colhidas. É como se a água deixasse de molhar, o sol deixasse de brilhar, a pedra deixasse de ser dura. Não é muito difícil extrapolar as consequências de tão brutal experiência: os psiquiatras estão aí para dizer no que dão os filhos do divórcio.

Sensacional.

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– “A filosofia do senso comum”, na Revista Vila Nova. Dentre os quatro «elementos fundamentais do senso comum» que Chesterton coloca como premissas necessárias à compreensão das coisas ao nosso redor, destaco um:

2. Todo homem em sã consciência, acredita não somente que este mundo existe, mas também que ele tem importância. Todo homem acredita que há, em nós, um tipo de obrigação de nos interessarmos por esta visão da vida. Não concordaria com alguém que dissesse, “Eu não escolhi esta farsa e ela me aborrece. Fiquei sabendo que uma senhora idosa está sendo assassinada no andar de baixo, mas eu vou é dormir”. O fato de que há um dever de melhorar coisas não feitas por nós é algo que não foi provado e não se pode provar.

E este «dever de melhorar coisas não feitas por nós» é talvez um dos elementos mais indispensáveis à vida em sociedade. No entanto, que importância se lhe dá hoje em dia…? De tanto serem cerceadas as investigações sobre a sua gênese, talvez um dos maiores desafios atuais seja limitar o efeito social deletério dos que, de tanto se desinteressarem por essas coisas, chegam a negar a sua própria existência.

* * *

«Na primeira condenação no Brasil por discriminação contra religiosos, a justiça condenou este ano a rede de televisão Bandeirantes depois que um de seus apresentadores afirmou que o assassinato de uma criança só podia ter sido cometido por ateus, também acusados por ele “da guerra, da peste, da fome e de tudo o mais”».

Trata-se de uma matéria do Diário de Pernambuco sobre o ateísmo, e a condenação à qual ela se refere é a que o Datena sofreu por conta de denúncia da Atea. Já a conhecia, mas ainda não atentara para o fato de que o ateu foi beneficiado pela lei que proíbe a «discriminação contra religiosos». De fato, no relatório da referida sentença, há o seguinte:

Este atuar, no entendimento do autor, extrapola os limites da liberdade de expressão, estando tipificado penalmente no artigo 20, parágrafo 2°, da lei 7.716-89.

E o que é que diz o Art. 20 da 7716/89? Simplesmente tipifica o crime de «[p]raticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional». Ora, como ateísmo evidentemente não é “raça”, “cor”, “etnia” e nem “procedência nacional”, segue-se que a única discriminação que o apresentador da Bandeirantes pode ter cometido é a de «religião». Quando lhes convém, os ateístas aparentemente não têm nenhum problema em serem contados entre os religiosos.

Não deixa de ser irônico. Quando nós dizemos que o ateísmo é claramente uma posição religiosa com no máximo tanto valor quanto qualquer outra religião da humanidade, começa a chover ateísta protestando. No entanto, quando a religião ateísta se sente ofendida em cadeia nacional, a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos não se faz de rogada e passa a exigir que seja aplicada em seu favor uma lei que proíbe o preconceito de «religião».

«Se não acreditamos em Thor, por que crer no Deus cristão?»

“Se não acreditamos em Thor, por que crer no Deus cristão?”, questiona-se (incrivelmente, a sério) o Richard Dawkins. A estapafúrdia pergunta, feita por uma pessoa que vergonhosamente lidera uma recente lista “com os maiores intelectuais do mundo” (sic!), causa-nos perplexidade e angústia. Como ele pode ser tão burro?

Os ateístas fanáticos (dos quais o Dawkins é um excelente exemplar) padecem de uma grave deficiência intelectual que, aparentemente, lhes veta à razão o mais rudimentar raciocínio abstrato. Qualquer crente do mundo sabe responder a esta pergunta simplória e sem sentido. É embaraçosamente evidente: nós acreditamos em Deus e não em Thor porque Deus existe, e Thor não. Como é possível que uma pessoa supostamente estudada não consiga entender isso?

Se fosse possível escolher um sentimento para descrever o que estas patacoadas do Dawkins provocam, tal seria “vergonha alheia”. Ser ignorante não é vergonha; ser ignorante e julgar-se inteligente, contudo, é degradante. Mas nem o Dawkins nem os seus asseclas percebem o patético espetáculo que desempenham em público: cega-lhes a bazófia que não conseguem conter. Pensam que seus dogmas obtusos são verdades apodícticas. São manifestamente incapazes de pensar fora da minúscula caixinha que lhes estreita o horizonte intelectual. É verdadeiramente espantoso.

A pergunta relevante não é e nem pode ser por que acreditar em Deus e não em Thor. A pergunta relevante, como o percebe qualquer pessoa sã, é como saber que Deus existe mas Thor não; ou, dito de outra maneira, como saber qual é o Deus verdadeiro. A isto responde a Igreja com o que tradicionalmente se chama de praeambula fidei, os “preâmbulos da Fé”, ou seja, verdades alcançáveis à luz da razão natural que preparam e apontam para a verdade do Cristianismo. Tais são, por exemplo, o conhecimento natural a respeito da existência de Deus e a verdade histórica do Cristianismo, coisas que qualquer pessoa honesta é capaz de alcançar. O grande problema é que os fanáticos ateístas desprezam a Filosofia e a História e, depois, vêm reclamar “provas”. Comportam-se mais ou menos como aquele sujeito do qual falava Chesterton (inglês como Dawkins, mas mais inteligente do que este), que pede testemunhos da existência do sobrenatural e, quando apresentado a um sem-número de vozes unânimes de todos os tempos e culturas que o atestam, simplesmente responde que não servem porque se tratam de “pessoas supersticiosas que acreditavam em qualquer coisa”. Ora, para respondermos às gabarolices do Dawkins, poderíamos dizer simplesmente isso e mais nada: se não acreditamos em Chesterton, por que crer no biólogo inglês? E já estaria bem respondido.

A grande verdade é que não existe nenhuma razão plausível para que devamos dar mais crédito às sandices de Dawkins et caterva do que à voz dos sábios de todos os tempos. O fato daqueles não entenderem Filosofia não anula o acerto das conclusões metafísicas mais do que a ignorância de um aluno desleixado a respeito da Física Moderna compromete a Teoria da Relatividade. As alegações de explicações mirabolantes para fenômenos históricos incontestes não se assemelham em nada a “desmenti-los” ou “refutar-lhes” o significado que sempre se lhes atribuiu. A crendice pueril que eles têm numa “Ciência” etérea e endeusada [v.g. «[e]u não sei ainda, mas estou trabalhando para saber» – Dawkins, C.R., op. cit.] não tem o condão de tornar falso todo o conhecimento religioso humano acumulado ao longo dos séculos. O que lhes sobra?

Sobram os espantalhos sem sentido, todos eles versões mais ou menos sofisticadas do Bule Voador de Russell. Mas isso já cansou de ser respondido e, aliás, é muito fácil responder. Não há nada de novo sob o sol (o negrito é meu):

O “Bule Voador” realmente existe!

Ele foi crido por índios americanos que deram a ele nomes e varias personalidades, dedicaram cultos e acreditaram nele. […]

Os pagãos abundaram em “Bules Voadores”, e de muitas formas o cultuaram, seus ritos muitas vezes incompreensíveis aos não iniciados, carregavam definições milenares de contatos com estes “Bules Voadores”, que tanta influência em suas vidas exercia.

[…]

E os Judeus? Sempre acreditaram que seu “Bule Voador”, voava por eles e assim viveram e vivem a milhares de anos, pode ser que todo o contato que diziam ter com seu “Bule Voador” fosse ilusão, desespero e desejo, mas este “Bule Voador” que jamais viram foi sempre sem dúvida determinante na história deste povo e não foi preciso descobrir quem colocou o “Bule Voador” a voar.

Eu jamais pedira que Russel provasse sua história do “Bule Voador”, se sua existência fosse a única explicação plausível, do porquê tantos povos distantes no tempo e no espaço, desejassem chá de um mesmo bule.

Se o fanatismo ateísta permite aos que dele padecem entender ou não isto, é um outro problema. Mas o fato que salta aos olhos a quem analisa o fenômeno religioso é que Thor mais evidencia a existência de Deus do que a nega! Muito ao contrário de constituírem um empecilho à Fé, os inumeráveis panteões pagãos que juncaram a história da humanidade dão eloqüente testemunho em favor da existência de um Deus. Chesterton, de novo ele, diria com seu tradicional bom humor que os falsos deuses não lançam dúvidas sobre a Religião Verdadeira mais do que as notas falsas de vinte libras implicam na inexistência do Banco da Inglaterra. Que os ingleses de hoje tenham mais dificuldade para entender isto do que os de outrora apenas nos revela o quanto fomos capazes de regredir em cem anos.

“O susto e a maravilha do bebê que chega logo”

Achei deliciosamente provocante esta imagem abaixo sobre o feminismo que está circulando no Facebook. Estampa uma frase de um texto de Chesterton sobre controle de natalidade que eu não sei se existe traduzido para o português; no entanto, de um excelente frasista como Chesterton sempre vale a pena ler uma única proposição que seja.

feminismo

Ela complementa um outro texto da Lúcia Guimarães que eu lia recentemente no Estadão. Não conheço as posições religiosas da autora do artigo, mas fica claro pelo texto que não se trata de nenhuma fundamentalista cristã despejando misoginia na internet; na feliz expressão do amigo que me indicou o texto, o que parece é que ela, simplesmente, deparou-se com a imposição da realidade. Longe de fazer apologia ideológica, ela fala com aquela constatação mais básica do mundo ao seu redor que tanto falta às militantes feministas radicais.

Não preciso me debruçar sobre publicações médicas para observar o que mudou para pior. No começo, ao notar a idade das mães que empurram carrinhos no meu bairro, um epicentro de adoções e casais ambiciosos que adiam a primeira gravidez, olhava com admiração a elaborada dedicação ao ritual reprodutivo planejado. O sucesso profissional exige mais anos de instrução superior. Educação e saúde de boa qualidade se tornaram luxo. Mas estas crianças do meu bairro começaram a falar e se manifestar como pequenos Mussolinis. Dominam as refeições noturnas. Não conseguem se distrair sozinhas. São exibidas como troféus. Seus ombros suportam o mundo e ele pesa mais do que a mão de um adulto narcisista e ansioso.

As objeções ao adiamento da gravidez apresentadas no artigo são as mais naturalistas possíveis; os problemas dos «filhos dos chamados pais-avós» são de ordem biológica, econômica, social, como p.ex.:

  1. são «mais afligidos por mutações genéticas»;
  2. têm mais «problemas de desenvolvimento psicológico»;
  3. estão «expostos ao trauma da perda prematura dos pais»;
  4. estão sujeitos ao «fardo de cuidar de idosos no começo da vida profissional».

Tudo isso está dentro da esfera de estudos das ciências naturais e mesmo do senso comum; ninguém precisa ser católico para o constatar. Mais vai harmonicamente ao encontro daquilo que a Igreja, que tem o irritante costume de sempre estar certa, ensinou e praticou ao longo dos séculos. O Código de Direito Canônico vigente estabelece o seguinte quanto à idade mínima para a contração de núpcias:

Cân. 1083 — § 1. O homem antes de dezasseis anos completos de idade e a mulher antes de catorze anos também completos não podem contrair matrimónio válido.

O parágrafo seguinte diz que as Conferências Nacionais «podem estabelecer uma idade superior para a celebração lícita do matrimónio» (ibid., §2). Parece-me que, no Brasil, a CNBB exige a idade de dezesseis e dezoito anos, respectivamente para a mulher e o homem que desejam contrair núpcias. Mas eu chamo a atenção para a escolha dos adjetivos: se a mulher tem menos de 14 anos o Matrimônio não é válido (i.e., não existe Matrimônio), mas a partir daí só cabe falar em liceidade das núpcias – isto é, se uma coisa (pressupostamente válida) pode ou não ser feita. Em outras palavras: uma mulher de 14 anos sempre pode receber o Sacramento do Matrimônio (logicamente, com um homem de dezesseis anos ou mais), mas em algumas circunstâncias ela não o deve fazer. Já uma mulher de treze anos não pode recebê-lo absolutamente [a propósito, e para reforçar a tese, esta é a mesma idade – 14 e 16 anos – que constava no CIC de 1917].

Graças principalmente ao feminismo ironizado por Chesterton no começo deste artigo, estas idades soam completamente irreais nos dias de hoje. Ouve-se falar – e muito! – em mil e um pré-requisitos a serem cumpridos pelas mulheres antes que elas possam sequer cogitar o ingresso na vida matrimonial; na arguta constatação da Lúcia Guimarães, hoje em dia «[é] impossível desvincular a fertilidade do mercado de trabalho hostil à procriação e da ideia de que procriar cedo é um problema da mulher». No entanto, é preciso ter a ousadia de questionar o paradigma vigente e de tentar, ao menos, cogitar a hipótese de que as coisas possam ser diferentes – mesmo que isto seja hoje muito dificultado pelas atuais conjunturas em que vivemos.

É preciso defender, ao menos como possível e desejável, o casamento já no desabrochar da juventude. Se não é possível chegar à idade canônica, ao menos que nos esforcemos para não nos afastarmos demasiado dela sem justa causa; se formos forçados a adiá-la, ao menos que isto seja feito com a consciência de que se trata de um mal a nós imposto pelo modelo de vida que hoje se leva. E termino citando mais uma vez a articulista do Estadão: oxalá as pessoas possam ter a graça de «redescobrir o susto e a maravilha do bebê que chega logo». Mesmo com todas as dificuldades que disso possam advir; «[m]esmo que ele ainda não tenha um berço para repousar».

Corrão para as montanhas!

* O título deste post não está “errado”, e sim em português arcaico: veja-se, p.ex., Camões n’Os Lusíadas ou estes versos de Nicolau Tolentino de Almeida: «Cuja alma não conhece vís mudanças, / Ou corrão tempestades, ou bonanças».

Todo mundo sabe que o fim do mundo está marcado para este mês e, portanto, qualquer coisa relativamente fora do comum que acontece é apresentada como um dos muitos indícios de que o mundo está acabando mesmo e só não vê quem não quer. Naturalmente, os melhores indícios do Fim são os apresentados em caráter lúdico. A nós, católicos, não interessa a hora exata em que o mundo vai acabar porque todos nós sabemos que podemos morrer a qualquer momento e, portanto, para cada um de nós o Juízo sempre pode ser nos próximos minutos. Mas isto não nos impede de saborear os memes.

Ontem morreu o Oscar Niemeyer, e a já proverbial longevidade do arquiteto carioca era uma piada pronta. Não pude evitar pensar que isto era mais um sinal de que estamos mesmo na iminência do fim do mundo, mas o pior ainda estava por vir. O verdadeiro sinal de que o Armageddon já começou e não nos avisaram é a celebração de uma Missa de corpo presente para o recém-falecido arquiteto ateu!

Ateu! Não estamos falando simplesmente de um “católico não-praticante” ao qual o repentino interesse pelas coisas divinas no ocaso da vida provoca nos céticos uma suspeição de hipocrisia. Muito diferente disso, aqui se trata de um ateu público e convicto! Qual o sentido de que se lhe celebrem exéquias católicas?

Não se trata, absolutamente, de sentenciar o pobre arquiteto a cruzar aquela Porta Terrível que, na Comédia de Dante, manda a todos os que por ela entram deixar fora toda a esperança. É claro que somente Deus é Juiz de todos e, portanto, qualquer pessoa, até mesmo um ateu de carteirinha, pode em princípio ter-se aberto à graça de Deus na hora da morte e partido deste mundo na amizade com Ele. É claro que devemos rezar pela salvação de todos os homens, não-católicos inclusive, cujo destino eterno não conheceremos até o Dia do Juízo Final. É claro que os familiares e amigos – aliás, qualquer pessoa que o deseje – podem rezar a Deus pela alma do Niemeyer: que o Todo Poderoso tenha dele misericórdia.

Acontece que as exéquias católicas são para os católicos, pois assim prescreve o Direito e isto tem uma razão de ser. Com efeito, lemos no Direito Canônico:

Cân. 1184 — § 1. Devem ser privados de exéquias eclesiásticas, a não ser que antes da morte tenham dado algum sinal de arrependimento:

1.° os apóstatas notórios, os hereges e os cismáticos;
2.° os que escolheram a cremação do corpo próprio, por razões contrárias à fé cristã;
3.° os outros pecadores manifestos, aos quais não se possam conceder exéquias eclesiásticas sem escândalo público dos fiéis.

Todo auto-declarado ateu é, por definição, um “apóstata notório”. Quando o ateu, além disso, é uma figura pública que sempre deu claras e ostensivas mostras do seu ateísmo, torna-se um “pecador manifesto” para o qual a celebração de uma Missa de Requiem provoca perplexidade e “escândalo público dos fiéis” – portanto, tal Missa não deveria ser celebrada. A questão aqui não é privar a alma do falecido da – necessária! – misericórdia divina, mas sim demarcar clara e publicamente o abismo que separa a Fé da Incredulidade. Afinal, se o culto público da Igreja de Deus não se destina aos Seus fiéis… o que ele é, então? Se celebram-se missas igualmente por católicos fervorosos e por ateus convictos, como convencer as pessoas de que não se trata de um “evento social” filantrópico qualquer que se realiza para qualquer um e por qualquer motivo? Se um ateu tem direito a uma Missa Pro Defunctis, como evitar que as pessoas percam de vista o significado profundo do Sacrifício Eucarístico?

Houve um tempo em que aos suicidas – mesmo os católicos! – era negada sepultura eclesiástica. E isto nunca teve nada a ver com afirmar a impossibilidade do arrependimento final “entre a ponte e o rio”: Deus sempre foi o único Juiz dos homens! Mas a sepultura da encruzilhada, embora não determine a sorte eterna do que lá jaz, tem um profundo valor catequético para os que cá ficam. Trata-se – como expôs brilhantemente Chesterton – de reconhecer no suicida «um homem que se preocupa tão pouco com tudo o que está fora dele que ele quer ver o fim de tudo». Trata-se simplesmente de testemunhar aos homens como se deve viver. E a morte, ainda que seja uma tragédia, não autoriza ninguém a mitigar a necessária força deste testemunho.

Enfim, está morto Niemeyer: que lhe possa ter valido a Virgem Soberana no instante derradeiro. Mas não nos é lícito pressupô-lo tão ligeira e levianamente, conferindo funerais católicos a quem viveu longamente como inimigo da Igreja. Em suma, que o Altíssimo não nos negue a ninguém a Sua Infinita Misericórdia da qual somos, todos, absolutamente necessitados. Supliquemo-Lha! Mas que isto não se faça às custas de semear o indiferentismo e disseminar ainda mais a confusão entre os homens do nosso tempo, que já vivem suficientemente longe da Igreja de Deus e para a Qual precisam voltar-se muito antes da sua Missa de corpo presente.

As questões espirituais estão para muito além do alcance da ciência

Eu sempre fiquei impressionado com a capacidade que os cientistas alegam possuir de fazer inferências comportamentais complexas a partir de vestígios arqueológicos ínfimos. Já comentei aqui outro dia sobre o gay pré-histórico, mas este é apenas o exemplo mais extremado. Coisas mais simples, como a habilidade de construir ferramentas ou a prática de um “estilo de vida parcialmente arbóreo” dos nossos antepassados são divulgadas quase todos os dias por nossos meios de comunicação. Não raro, eles pensam fazer com isto um importante trabalho de “desmistificação” da realidade, às vezes com ataques mais ou menos velados aos que insistem em se afirmar religiosos a despeito de todo este avanço científico acumulado pela humanidade.

Naturalmente, eu não tenho muita coisa contra estes exercícios adivinhatórios que, vá lá, na maior parte dos casos são bem razoáveis mesmo e se apresentam à razão humana quase que como uma decorrência necessária do que se tem diante dos olhos, sem a necessidade de nenhum Sherlock Holmes para fazer a dedução oculta e dizer “elementar”. Por exemplo, digamos, encontrar uma tigela muito antiga com vestígios de comida do lado de dentro e de carvão do lado de fora nos autoriza, sim, a deduzir com bastante segurança que estamos diante de uma panela rudimentar e que, se alguém um dia a utilizou, certamente foi para algum exercício primitivo da milenar arte da culinária. É igualmente aceitável dizer que isto revela uma certa sensibilidade gastronômica dos homens primitivos, uma vez que eles provavelmente faziam um cozido para tornar a carne da caça mais saborosa, e não por razões de ordem profilática então pouco ou nada conhecidas. O que extrapolaria os limites arqueológicos seria, por exemplo, encontrar uma tigela dessas que fosse muito grande e, com base nisso, passar a fazer ilações sobre a gula pré-histórica, demonstrando por a + b que os homens da tribo tal não tinham questões morais sobre a necessária temperança à mesa – supondo que mesas houvesse à época.

A rigor, nem mesmo a existência de indícios fortes sobre a disseminação de uma certa prática num determinado povo (indícios, aliás, cuja existência é inversamente proporcional à distância temporal que nos separa de tal povo, por conta do decurso dos séculos que costuma ser bem eficiente em produzir escassez de vestígios) nos autoriza a fazer qualquer afirmação sobre o juízo moral que este povo fazia de tal prática. Por exemplo, algum arqueólogo que, estudando os hábitos dos judeus da época do Reino de Israel com base em vestígios não-escritos, chegasse à conclusão (correta) que a idolatria era comum àquele povo, enganar-se-ia redondamente se extrapolasse a sua “descoberta” para sentenciar que os filhos de Abraão não tinham nenhum interdito moral ao politeísmo. Um hábito é somente um hábito, e a sua classificação como virtuoso ou vicioso para quem o pratica não se pode depreender da mera constatação de que ele se realiza. Isto é bastante óbvio, mas por alguma estranha razão as coisas óbvias às vezes fogem à percepção de quem se deslumbra com a idéia de ser um Dr. Holmes a desvendar os mistérios de civilizações perdidas no tempo – cujos membros não estão mais aqui para se defender das barbaridades que falam sobre eles. Em uma palavra: as questões morais – que perfazem a fronteira mais indevidamente atravessada pelos fanáticos irreligiosos que se dizem cientistas – estão, tanto por princípio quanto por limitação de método, para muito além do alcance da ciência. Como é possível que haja verdadeira oposição entre ela e a Fé?

Eu pensava sobre isto ao ler Chesterton que, genial como sempre, criticava em um artigo a idéia de que descobertas científicas pudessem abalar as crenças de alguém. Ora, as ciências físicas e as realidades espirituais pertencem a ordens distintas de conhecimentos. Do mesmo modo que é absurdo defender, p.ex., que a Lei da Gravitação Universal possa ser modificada à força de novas investigações teológicas sobre as relações entre a Graça e o Livre-Arbítrio, é igualmente nonsense pretender que a soteriologia católica tenha se tornado menos verdadeira depois que Einstein propôs a Teoria da Relatividade Especial. O avanço científico não restringe os horizontes da Fé, e isto independe completamente de quaisquer limitações contingentes do acúmulo do conhecimento humano em um determinado momento histórico. Nas eloqüentes palavras do polemista inglês:

Um homem pode ser um cristão até o fim do mundo, pelo mesmo motivo de que um homem poderia ter sido um ateu desde o começo do mundo. O materialismo das coisas está na cara das coisas; não requer nenhuma ciência para encontrar. Um homem que viveu e amou cai morto e as minhocas o comem. Isso é Materialismo, se você preferir. Isso é Ateísmo, se você preferir. Se a humanidade apesar disso tem crido, ela pode crer apesar de todas as coisas. Mas por que nossa sina humana se torna mais desesperada porque nós sabemos os nomes de todas as minhocas que comem ele, ou o nome de todas as partes dele que são comidas, é para uma mente pensativa algo difícil de descobrir.

Esta é a resposta definitiva aos que vaticinam o fim iminente da Religião sob o império da Ciência, estas são as noções que precisam ficar bem claras para quem se propõe a fazer filosofia natural ou teologia. O resto são falácias grosseiras de pseudo-cientistas ou histerias descabidas de falsos crentes.

Hoje à noite eu vou ser Cristo

Muitas vezes é banalizada a força daquela expressão bíblica onde, após a narrativa da Criação do Homem, diz-se de Deus que “homem e mulher Ele os criou”. E esta sagrada união natural entre os sexos – destinatária da única bênção que não foi abolida nem pelo Pecado Original e nem pelo castigo do Dilúvio, como se diz em uma das orações do Ritual do Matrimônio – é talvez aquilo de mais sublime que, na ordem da natureza, faz parte da Criação do Altíssimo. Porque foi precisamente esta união entre o homem e a mulher que o próprio Deus escolheu para simbolizar a Sua relação com o Seu povo e, como diz Dietrich Von Hildebrand, aquilo que não fosse já naturalmente sublime não seria digno de ser usado para representar a sublimíssima união entre Cristo e a Sua Igreja. Se esta união mística e sobrenatural é excelsa em grau máximo, quão digna de honra e louvor não é a relação humana que – dentre todas as existentes! – foi elegida pelo próprio Deus para ser sinal da Sua relação com a humanidade?

Hoje é o dia mais importante da minha vida. Logo mais, à noite, subirei ao altar do Senhor para tomar por esposa aquela que escolhi por companheira, para me completar e me auxiliar nesta caminhada da minha existência terrena, para estar a meu lado na saúde e na doença, na alegria e na tristeza, por todos os dias da minha vida. A responsabilidade chega a ser assustadora, porque “todos os dias da minha vida” é um intervalo de tempo bastante difícil de se abranger de um lance de vista! No entanto, preciso fazê-lo. Talvez o valor de um homem seja medido menos por aquilo que ele faz com as coisas que estão sob seu controle do que pelos seus esforços para obter controle sobre as coisas que ele precisa fazer. Não sei se me faço claro: oferecer os dias passados é simples, porque estes já está feitos. Oferecer os dias futuros, aqueles que você não sabe como serão… isto, sim, é desafiador. E o Matrimônio, assim, afigura-se-me não meramente como uma entrega daquilo que é seu, mas como – a partir de então – uma luta ferrenha e perpétua para conquistar a cada dia aquilo que, diante de Deus, foi um dia entregue. Conquistar para entregar. O Matrimônio consuma-se na noite de núpcias, claro, mas é aí que ele começa. A entrega da própria vida foi feita, mas – justamente por ter sido um feita um dia – precisa ser consumada a cada dia. Por todos os dias da vida. Sim, é o que eu quero.

E esta doação generosa de si é, como eu dizia, figura d’Aquela união mística entre Cristo e a Sua Igreja. Uma entrega total e permanente, pessoal e exclusiva, amorosa e fecunda: a mera consideração do significado teológico do Matrimônio bastaria (permito-me o ligeiro parêntese) para fazer com que todos os fantasmas que andam à ronda da Família ávidos por Lhe destruir (do divórcio ao sexo livre, da poligamia à união gay) desvanecessem-se como as trevas ao alvorecer. E importa multiplicar pelo mundo estes reflexos do Amor de Deus pelo Seu Povo, estas pequenas Igrejas Domésticas, estas instituições que perpetuam na terra um pouco da glória d’Aquela Sagrada Família de Nazaré: importa fazê-lo, para que Deus seja mais louvado e para que as pessoas, relacionando-se ordenadamente nesta terra através das coisas que vêem, possam mais facilmente relacionar-se com o Deus Invisível com o Qual se relacionam mediante a Fé. E assim, subindo das coisas visíveis para as invisíveis, dos sinais para a realidade, possam consumar um dia as Núpcias para a qual foram criadas. Em cada homem e em cada mulher que se unem pelos sagrados liames do Matrimônio, está presente a união mística entre Cristo e a Sua Igreja Santa.

Hoje à noite eu vou ser Cristo. De pé à porta da Igreja, esperando a minha amada noiva chegar – como o Senhor esperando o Seu povo -, oferecendo-lhe o braço para conduzi-la ao altar de Deus, tornando-me depois uma só carne com ela! Senhor, eu não sou digno de desempenhar tão sublime papel; mas, como disse um personagem de Chesterton, o Matrimônio é um duelo de uma vida inteira que, uma vez apresentado, os homens honrados não têm o direito de recusar. Sim, este papel é assustador! E só ouso fazê-lo por estar convencido de que sois Vós, Senhor, quem me chamais a ele. E, se Vós chamais, Senhor, adsum. Se Vós chamais, tenho certeza de que fareis com que eu o possa realizar.

Aos que por aqui passarem, peço uma Ave Maria por esta nova etapa da minha vida. Para que eu seja fiel, e corresponda às graças que Deus quer me conceder. Para que eu seja um bom marido e, amando a minha esposa, possa uma dia chegar com ela – junto a ela! – ao Banquete Nupcial do Cordeiro, às Bodas Eternas cujo sinal eu celebrarei logo mais.

Urgente e imperdível: Lançamento de novo livro de Chesterton em Florianópolis

Aos meus leitores que estejam hoje (14 de setembro) em Florianópolis ou adjacências, aviso que acontecerá logo mais (às 18h00) na capital catarinense o lançamento do livro “Tremendas Trivialidades” do genial escritor inglês G. K. Chesterton. O evento contará com uma palestra do Mateus Leme, tradutor da obra, e acontecerá na Livraria Catarinense (rua Felipe Schmidt, n. 60), no centro de Florianópolis. A participação é gratuita.

A propósito, aviso também que as conhecidas camisestas Chesterton podem ser adquiridas pelo site  www.vestesacra.com e saem com frete grátis para quem for ao evento de hoje e usar o cupom “FLORIPA” no site, na hora da compra [p.s.: promoção encerrada pois, como o lançamento do livro já é hoje, não vai mais dar tempo de levar os novos pedidos para o local do evento; mas comprem as suas camisas mesmo assim!]. Se você ainda não tem a sua, não perca esta oportunidade de a adquirir.