Caro Peter e comunidade,
Obrigado por suas cartas. Tenho recebido uma grande quantidade de correspondência a respeito de St. Mary’s, pedindo para que a paróquia não fosse fechada. A questão para mim não é tanto se St. Mary’s deve ser fechada, mas se St. Mary’s vai fechar a si própria através de práticas que a separam da comunhão com a Igreja Católica Romana.
Há muito que se admirar em St. Mary’s, especialmente sua paixão pela justiça social. Eu acho isso inspirador. No entanto, os problemas em St. Mary’s não são tanto sobre justiça social, tema importante como é, mas sobre a comunhão de St. Mary’s com a Igreja Católica Romana, com a qual ela está ligada e para a qual foi fundada. Este problema da sua comunhão surgiu somente nos últimos anos. Eu falei sobre ele em uma carta ao senhor no dia 19 de julho de 2004. A controvérsia naquela época era a respeito da prática de administração do Batismo em St. Mary’s, mais tarde declarado inválido por um decreto da Congregação para a Doutrina da Fé de 2008 .[Nota do VS: Esta foi uma das paróquias cuja prática resultou neste documento da CDF). Infelizmente, minha carta de 2004 sobre esta questão da comunhão com a Arquidiocese foi largamente desprezada pela paróquia e suas lideranças como não importante, talvez até ridícula. A mais recente acusação contra St. Mary’s refere-se à colocação de uma estátua budista na Igreja, junto com questões sobre a ortodoxia de suas orações eucarísticas e a administração da Eucaristia.
Uma estátua budista numa Igreja ou Santuário Católico simplesmente não faz sentido. Sua presença, entretanto, de nenhuma maneira justifica a utilização de violência para destruí-la. Não obstante, somente uma imprudência extrema poderia colocar uma estátua budista numa Igreja Católica. Não importa onde ela esteja, há total possibilidade de que ela desperte sentimentos de fúria, particularmente entre cristãos de diferentes culturas religiosas.
Entretanto, o incidente da estátua é apenas um exemplo de prática inapropriada na paróquia. St. Mary’s parece ser a sua própria autoridade. A despeito do bem que faça, ela se coloca fora das práticas da Igreja Católica. Conseqüentemente, nós podemos muito bem perguntar: é ela uma paróquia em comunhão com a Igreja Católica, ou uma comunidade em cisma? Não há duvidas de que St. Mary’s promove um forte senso de comunidade, mas o mesmo fazem muitas outras comunidades como Hillsong em Sydney, que acolhe a todos e se achega aos pobres, mas visivelmente não está em comunhão com a Igreja Católica Romana.
Mais uma vez, eu gostaria de indicar algumas matérias que rompem a comunhão com a Igreja Católica Romana:
1 – A questão de Fé
Os católicos acreditam em um Deus Trino, Pai, Filho e Espírito Santo. Nosso Deus é um Deus de amor. As pessoas da Trindade vivem em uma comunhão de mútuo amor. Tão grande é o amor dentro da Trindade que ele transborda na Segunda Pessoa da Trindade, que se faz homem e vive entre nós como Jesus Cristo, Filho de Deus e Salvador, único mediador da nossa Salvação. Em St. Mary’s, Jesus Cristo é aceito como Senhor e Salvador, como Filho de Deus, ou é Jesus considerado apenas como outra pessoa sagrada como Buda ou Maomé? Certamente, em tais circunstâncias, a colocação de uma estátua budista em uma Igreja Católica provoca extrema confusão. Em St. Mary’s há uma forte ênfase em Jesus como profeta da justiça social, como campeão dos pobres e necessitados, o que é bom. Mas é dada uma ênfase igual a Jesus como amante do Pai e homem de oração, que em Lucas 5,16 deixa pessoas doentes e sofridas para retirar-se e orar ao Seu Pai, tão importante é a “vontade do Pai”? O Papa Bento XVI escreveu em 2004: “A primazia do culto é o pré-requisito fundamental para a redenção de todos os homens”. Hoje em dia, freqüentemente é dada muito pouca atenção a Deus e ao culto, e muita atenção à ação, importante em si mesma, mas necessitada de estar absolutamente ligada à oração e ao culto. Hoje, em nosso mundo secular, nunca houve uma grande necessidade de se entender Jesus e Sua visão. Infelizmente, hoje o aspecto mais excitante da visão cristã dificilmente é entendido pelos cristãos. É impressionante o número de pessoas que se satisfazem perguntando “o que Jesus faria?”. Somente pessoas muito humildes e santas aceitariam responder a esta questão e, se elas o fizessem, seria com a maior cautela. É impressionante como algumas pessoas têm certeza de que sabem o que Jesus faria, ao mesmo tempo em que neglicenciam 2000 anos de sabedoria do Espírito Santo disponível na Igreja.
2 – A questão da Liturgia
Decisões “ad hoc” foram tomadas em St. Mary’s a respeito da Liturgia, com certeza nos Sacramentos do Batismo, da Confirmação e do Matrimônio, e especialmente no Sacramento da Eucaristia. A respeito do Batismo, eu ainda não estou certo de que, mesmo agora, o ritual válido seja sempre utilizado. Foi sugerido que pedidos ainda podem ser feitos para a utilização de diferentes formas, de acordo com o desejo dos envolvidos. Outrossim, o Sacramento do Matrimônio às vezes despreza completamente os requisitos normais da Igreja para a validade. Alguns casamentos parecem acontecer sem o menor respeito à Lei Canônica.
No Sacramento da Eucaristia, membros da assembléia parecem recitar as palavras da Consagração, que dentro de um ortodoxo rito Católico devem ser ditas somente pelo ministro ordenado. As orações eucarísticas aprovadas pela Igreja são completamente desprezadas, em favor de orações selecionadas aleatoriamente.
3 – A questão de Governo
Padre Petter Kennedy tem sido administrador de South Brisbane por muitos anos. Ele foi indicado legitimamente pela Arquidiocese. Padre Terry Fitzpatrick nunca foi indicado para St. Mary’s. Ele é um padre da Diocese de Toowoomba que se apossou da paróquia de St. Mary’s no início dos anos 90 com a aprovação dos paroquianos. Ninguém nega que ele tenha praticado o bem, mas em nenhum momento ele foi indicado oficialmente para St. Mary’s pela Arquidiocese de Brisbane. A despeito de sua falta de autoridade, em numerosas ocasiões ele falou à mídia sobre St. Mary’s como se fosse o pároco. Como eu falei em minha carta de 19 de julho de 2004, St. Mary’s tende a ser “congregacional em governo e em cultura”. Ela não parece ser conduzida por um líder apontado oficialmente como as paróquias católicas geralmente o são. A relutância de seus padres em serem vistos como ministros liturgicamente ordenados, diferentes dos membros leigos de sua congregação, parece ser outro indicativo de sua recusa em aceitar qualquer diferença entre os membros ordenados e os não-ordenados. A estrutura pastoral da Igreja Católica foi desenvolvida ao longo de milhares de anos. E ela certamente não é baseada em liderança congregacional.
4 – A questão da Autoridade
A Igreja Católica Romana tem uma certa estrutura que precisa ser respeitada. Às vezes, o seu poder pode ser abusado. Ao mesmo tempo, o reconhecimento da autoridade e do Magistério da Igreja é necessário para a comunhão com a Igreja. A autoridade da Igreja brota em última instância de Jesus, a Palavra de Deus, que entregou a Sua autoridade para os Apóstolos. A Tradição Apostólica, que perpetua a autoridade de Jesus, é expressa através do Papa junto com os Bispos da Igreja. Rejeitar deliberadamente esta autoridade apostólica é colocar-se fora da comunhão com a Igreja Católica Romana.
Na verdade, St. Mary’s de South Brisbane tomou uma paróquia católica e estabeleceu lá sua própria marca de religião. Indubitavelmente ela pratica o bem, ela promove um forte senso de comunidade, abre suas portas para todos os que desejam vir, mas o seu estilo próprio de culto e administração sacramental dificilmente pode ser descrito como Católico Romano. Como tal, ela está fora da comunhão com a Arquidiocese Católica Romana de Brisbane e com a Igreja Católica Romana Universal sob a liderança do Bispo de Roma.
Minha autoridade como Arcebispo da Arquidiocese de Brisbane é escassamente reconhecida pela paróquia de St. Mary’s. Não é fora de propósito considerar que, em St. Mary’s, sempre houve criticismo contra o Papa João Paulo II. Se tal criticismo aos Papas amplia-se ainda mais, eu não sei. Um criticismo básico contra a Igreja ainda parece florescer em sua comunidade. Desde o tempo de São Pedro e Judas, a Igreja nunca repudiou a humanidade. Não obstante a fraqueza de alguns dos seus membros e algumas vezes de seus líderes, não há outro caminho para encontrar Jesus que não seja a Igreja. As palavras de São Pedro ditas a Jesus (Jo 6, 68), quando parecia que os Apóstolos iam abandoná-lo, foram: “Senhor, para quem iremos? Só tu tens palavras de Vida Eterna”. A despeito de suas culpas e falhas, os católicos sabem que o lugar de encontro supremo com Jesus é na Igreja. Entre as cartas escritas a mim nesta semana, uma delas disse muito claramente que St. Mary’s acredita que “é a Igreja Institucional no mundo moderno, e não St. Mary’s, que está em descompasso com o que Jesus falou e o exemplo que Ele deu”. É precisamente aqui que repousa o problema. St. Mary’s parece reivindicar para si própria isoladamente uma autoridade e autenticidade que pretencem somente à Igreja Católica Romana inteira. Quando a paróquia de St. Mary’s foi estabelecida originalmente, ela estava em comunhão com a Arquidiocese, com a Igreja Católica Romana, e com a multidão de paróquias que, juntas, formam a comunhão desta Arquidiocese. Infelizmente esta comunhão de St. Mary’s com a Igreja parece não existir mais. St. Mary’s existe independentemente da Arquidiocese. Minha esperança é que St. Mary’s coloque-se novamente em comunhão com a Igreja Católica Romana à qual ela esteve originalmente ligada e na qual ela se rejubilou. Agora, só depende de St. Mary’s tomas quaisquer decisões que sejam necessárias à sua existência futura. Vou rezar para que estas decisões sejam tão sábias no presente quanto o foram no passado. E rezarei também para que Maria, a Mãe de Jesus, em homenagem a quem St. Mary’s é nomeada, possa interceder a fim de que a sabedoria do Espírito Santo de Deus desça sob a Sua paróquia.
Sinceramente em Cristo,
+ John Bathersby
Arcebispo de Brisbane