Siamo tutti conigli

conigli

Certas verdades são bastante óbvias para serem problematizadas. É bastante evidente que homens são criados à imagem e semelhança de Deus e, únicos seres no mundo sensível dotados de inteligência e vontade, possuem uma dignidade intrínseca que os coloca a uma distância virtualmente infinita dos animais irracionais – inclusive dos coelhos. É óbvio, portanto, que não são coelhos os seres humanos em geral e nem muitíssimo menos os católicos em particular.

Uma outra coisa que é evidente para além de toda a evidência é que a Igreja Católica possui uma doutrina peculiar e bem conhecida a respeito da contracepção, segundo a qual – na conhecida formulação da Humanae Vitae – é “de excluir toda a ação que, ou em previsão do ato conjugal, ou durante a sua realização, ou também durante o desenvolvimento das suas conseqüências naturais, se proponha, como fim ou como meio, tornar impossível a procriação” (HV 14). E à Igreja, Mestra infalível em Fé e Moral, pode-se até acusar de ser pretensiosa; jamais, no entanto, de ser incoerente consigo mesma. Admitindo que a um observador externo seja legítimo perguntar se o ensinamento católico é verdadeiro ou falso, uma sua característica ninguém pode negar: ele é incomodamente constante.

Causou certo frisson a última declaração do Papa Francisco, segundo o qual católicos não devem se reproduzir como coelhos. Ora, trata-se de verdadeira evidência. É lógico que os católicos não devem se reproduzir “como coelhos”, e sim como filhos de Deus – a quem foi dirigido aquele mandato de “crescei e multiplicai-vos”. Não foi aos coelhos que Deus ordenou encher a terra e a submeter, e sim aos homens! Cumpre, pois, a estes procriar como convém à sua dignidade – que é muito maior, repita-se, do que a dos coelhos.

Ainda, simplesmente não é possível aos católicos reproduzirem-se como os simpáticos leporídeos. Isso porque, como disse Chesterton em certa ocasião, um homem nunca age igual a um animal: ou age de modo muito superior a ele, quando se comporta como homem; ou, então, muito inferior a ele, quando se esquece de sua dignidade e age de maneira irracional, instintiva, animalesca. Os seres humanos, portanto, jamais se reproduzem como animais: caso se esqueçam de que são homens, então agirão de maneira muito mais baixa, vil e degradante do que os pobres coelhos. E uma das formas de se esquecerem de que são homens está, precisamente, na busca irresponsável e egoísta pelo prazer venéreo em si mesmo, que é marca registrada dos dias de hoje. Um homem que viva praticando relações sexuais “casuais” e sem compromisso está agindo muito mais como um animal no cio do que outro, que tenha com a sua esposa um número de filhos maior do que a nossa sociedade decadente julga “conveniente”.

Houve quem pensasse que, com a sua declaração sobre coelhos, o Papa Francisco estivesse a legitimar de algum modo o controle de natalidade. Tal é insustentável por um sem-número de razões. Em primeiro lugar, como disse um santo – recente! – da Igreja, “são criminosas, anti-cristãs e infra-humanas, as teorias que fazem da limitação da natalidade um ideal ou um dever universal ou simplesmente geral” – e o Papa, que já se disse outras vezes “filho da Igreja”, sabe perfeitamente disso.

Em segundo lugar, a doutrina da Igreja a respeito da natalidade encontra-se, por excelência, na citada Humanae Vitae de Paulo VI. E o que já disse o Papa Francisco a respeito do seu predecessor? Em duas ocasiões recentes:

1. No “Encontro das Famílias” praticamente da véspera (sexta, 16 de janeiro): “Num período em que se propunha o problema do crescimento demográfico, [Paulo VI] teve a coragem de defender a abertura à vida na família. (…) Mas ele olhou mais longe: olhou os povos da terra e viu esta ameaça da destruição da família pela falta de filhos. Paulo VI era corajoso, era um bom pastor e avisou as suas ovelhas a propósito dos lobos que chegavam. Que ele, lá do Céu, nos abençoe nesta tarde! O nosso mundo tem necessidade de famílias sãs e fortes para superar estas ameaças. As Filipinas precisam de famílias santas e cheias de amor para proteger a beleza e a verdade da família no plano de Deus e servir de apoio e exemplo para as outras famílias. Toda a ameaça à família é uma ameaça à própria sociedade”.

2. No próprio vôo onde foi feita a declaração “polêmica” dos coelhos (tradução do Fratres, aqui): “O que eu quero dizer sobre Paulo VI é que a verdadeira abertura à vida é condição para o sacramento do matrimônio. Um homem não pode dar o sacramento para a mulher, e a mulher dar para ele, se eles não estão em concordância neste ponto de estarem abertos à vida. […] Mas o que eu queria dizer era que Paulo VI não era muito antiquado, mente fechada. Não, ele era um profeta que com isso nos disse para tomarmos cuidado com o neo-malthusianismo que vem chegando. Era isso o que eu queria dizer”.

Ora, quem é Paulo VI? É o Papa da condenação ao controle de natalidade. O que é “abertura à vida”? É a atitude de um casal receber generosamente os filhos que a Divina Providência julgar por bem lhe confiar. O que é “neo-malthusianismo”? É a doutrina que prega uma superpopulação atual, com a consequente necessidade de reduzirmos as nossas taxas de natalidade. Como é possível, então, que um Papa que louva o campeão da causa católica anti-contracepção, que relembra aos casais que eles devem – sob pena de nulidade matrimonial! – estar dispostos a receber os filhos que Deus lhes enviar, que manda tomar cuidado com a estória de que estamos vivendo em uma superpopulação a nos exigir controle de natalidade – como é possível, em suma, que um homem desses esteja, justo ele!, fazendo coro aos inimigos da Igreja e condescendendo à mentalidade antinatalista que ele próprio, por todos os flancos, se esmera em desconstruir? Que sentido isso faz?

Em terceiro lugar, no seio da própria entrevista concedida no vôo, apenas por duas vezes o Papa Francisco fala em números de filhos:

  • “Conheci uma mulher há alguns meses numa paróquia que estava grávida de sua oitava criança, que tinha tido sete cesárias. Mas ela quer deixar 7 filhos órfãos? Isso é tentar a Deus.”
  • “Eu acho que o número de 3 filhos por família que você mencionou – me faz sofrer – eu acho que é o número que os especialistas dizem ser importante para manter a população “indo”. Três por casal. Quando isso diminuiu, o outro extremo acontece. Ouvi dizer, não sei se é verdade, que em 2024 não haverá dinheiro para pagar pensionistas por causa da queda na população.”

Ou seja, se existisse algum limite concreto que o Papa estivesse tentando determinar para os católicos – coisa que não há e nem pode haver; mas o imaginemos, para argumentar – tal seria um limite mínimo de três, e não máximo de nada. Ora, isso vai muito longe do que o mundo pagão entende por “responsabilidade” familiar!

Em quarto lugar, por fim, porque há não muito tempo – há menos de um mês – o Papa Francisco dirigiu um discurso à Associação Nacional das Famílias Numerosas. Ora, trata-se de pronunciamento com um objetivo específico e previamente preparado; portanto, a mais mínima honestidade intelectual há de reconhecer ser ele mais fidedigno – para entender o pensamento do Papa a respeito da natalidade católica – do que as sabatinas feitas num voo de retorno após uma viagem de uma semana na Ásia. E, no citado discurso, é possível ler – entre outras coisas – o quanto segue:

  • [O]s filhos e as filhas de uma família numerosa são mais capazes de comunhão fraterna desde a primeira infância. Num mundo muitas vezes marcado pelo egoísmo, a família numerosa é uma escola de solidariedade e de partilha; e destas atitudes beneficia toda a sociedade.
  • A presença das famílias numerosas é uma esperança para a sociedade.
  • Portanto espero, também pensando na baixa taxa de natalidade que desde há tempos se regista na Itália, uma maior atenção da política e dos administradores públicos, a todos os níveis, a fim de dar o apoio previsto a estas famílias. Cada família é célula da sociedade, mas a família numerosa é uma célula mais rica, mais vital, e o Estado tem todo o interesse em investir nela!
  • A este propósito, são João Paulo II escrevia: «As famílias devem crescer na consciência de serem protagonistas da chamada política familiar e assumir a responsabilidade de transformar a sociedade: de outra forma, as famílias serão as primeiras vítimas daqueles males que se limitaram a observar com indiferença» (Exort. ap. Familiaris consortio, 44).

Esta é, em suma, a posição de Paulo VI, de S. João Paulo II, de S. Josemaría Escrivá, do Papa Francisco, a respeito do “controle de natalidade”. Esta é a resposta de generosidade que somos chamados a dar ao mundo. Esta é a vida que a Igreja nos chama a viver. E a viveremos, por mais que se levantem contra nós as forças do mundo.

Quanto aos coelhos, que incendiaram a polêmica, há (pelo menos) duas possíveis comparações a respeito deles que é possível fazer. Por um lado, podem simbolizar o sexo irresponsável, animalesco, no cio, fugaz, instintivo: e, neste sentido, é preciso repetir fortemente, com o Papa Francisco, que evidentemente não podemos – ninguém pode! – procriar como coelhos! No entanto, os coelhos também são símbolo universal da fertilidade, de uma prole numerosa, de filhos como rebentos de oliveira ao redor de uma mesa – de uma mesa cheia de crianças. E, neste outro sentido, é preciso ter a coragem de dizer, ousadamente, com os santos, com os Papas, com a Igreja, contra quem quer que seja, che, sì, siamo tutti conigli – somos todos coelhos. Apraza a Deus que o sejamos.

Nota de Falecimento: Fernando Castro, “pai” das Famílias Numerosas

Recebi de um amigo de Portugal a notícia do falecimento do sr. Fernando Castro, «fundador e principal motor (…) da Associação Portuguesa das Famílias Numerosas (APFN)».

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Eu não o conhecia pessoalmente, mas já havíamos trocado emails. Foi ele quem disponibilizou os vídeos sobre envelhecimento da população que eu divulguei certa vez aqui no blog. Buscando agora as mensagens transatlânticas que dele recebi, encontrei numa delas um gentil post scriptum dizendo «[s]e calhar, qualquer dia, teremos oportunidade de nos conhecermos pessoalmente».

Infelizmente essa oportunidade não chegou. O Sr. Fernando foi convocado à Casa Paterna antes que eu pudesse encontrá-lo pessoalmente aqui neste Vale de Lágrimas; mas as nossas peregrinações se cruzaram ao menos por um instante, ao menos no combate comum a uma cultura decadente e suicida que leva as pessoas a enxergarem nos filhos uma ameaça ao presente ao invés da esperança do futuro. E isso foi engrandecedor para mim.

Quem não conhece o trabalho realizado pela APFN pode visitar o site da Associação. E faço eco ao que escreveu um amigo do Sr. Fernando por ocasião da sua morte:

É uma perda a sua morte, mas também um ganho: um reforço no Céu. Imagino-o espantado e contente (tinha um coração puro e ingénuo como uma daquelas criança das que nos falam os Evangelhos) junto de Deus  a Quem sempre serviu e já inquieto e mobilizador a ajudar-nos desde esse posto onde um dia, todos juntos, pela Sua Misericórdia, faremos uma grande festa!

Sim, que a Virgem Santíssima o receba depressa nas Moradas Celestes, e que de lá ele continue a interceder por nós outros que continuamos nessa caminhada, esperando merecer chegar também um dia ao Encontro definitivo com o Deus para Quem fomos criados.

Requiem aeternam dona ei, Domine,
et lux perpetua luceat ei.

Requiescat in Pace,
Amen.

A cada vinte casais, o Brasil perde um casal

A notícia é do mês passado, mas alterações significativas nestas coisas demoram muito para acontecer e, portanto, ela ainda é sem dúvidas muito atual: taxa de fecundidade no Brasil cai [de novo!] e é menor entre mais jovens e instruídas, segundo notícia de G1. O gráfico apresentado na matéria é assustador:

Como a gente sabe, a taxa de reposição da população é de 2,1 filhos por mulher, e é muito fácil entender o porquê disso: no mundo matematicamente perfeito esta taxa seria de 2 (i.e., estar-se-ia substituindo dois pais por dois filhos, ou seja, mantendo o número total de habitantes intacto), e este 0,1 é necessário para contemplar as exceções (sei lá, pessoas que morrem antes de chegar à idade adulta, talvez). Mas o fato matematicamente incontestável é que 1,9 filhos por mulher não consegue manter nenhuma população. A esta taxa, cada vinte pessoas (= dez casais) só estão deixando dezenove para o futuro; a cada vinte casais, o Brasil perde um casal, o que representa uma perda de no mínimo 5% a cada geração. E ninguém precisa ser gênio para entender que, trocando 100 por 95 ao longo dos anos, um dia a casa quebra.

O gráfico mostra a involução da taxa de fecundidade brasileiro num intervalo de 70 anos, de 1940 até 2010. A queda é vertiginosa e, no Brasil atual, somente a Região Norte mantém uma taxa de fecundidade acima da de reposição. Mas o pior talvez esteja justamente no fato que G1 apresenta logo na manchete: esta taxa de fecundidade é menor entre as mais jovens e mais instruídas.

As mais jovens e as mais instruídas, ou seja, exatamente aquelas que tinham maior obrigação (porque têm maiores possibilidades) de deixar uma contribuição humana mais generosa ao planeta! No entanto, são exatamente estas as que estão na vanguarda da mentalidade anti-natalícia irresponsável. Sempre que eu leio uma notícia assim, não consigo deixar de lembrar do Idiocracy – e de como os nossos maus costumes persistem estupidamente apesar do ridendo castigat mores generalizado a ponto de chegar aos besteiróis americanos.

E a situação é tanto mais angustiante quanto menos se vislumbra, no horizonte, uma possibilidade de reverter este quadro macabro. Taxas de natalidade não são números em máquinas cuja produção pode ser aumentada ou diminuída apertando-se dois botões. No fundo, o anti-natural controle de natalidade exige o cultivo de uma mentalidade egoísta e hedonista que, uma vez enraizada numa sociedade, é muito difícil de ser arrancada. E este já é o mundo em que vivemos: um mundo onde os outros não são bem-vindos porque já nos consideramos auto-suficientes demais. Um mundo onde a nossa adolescência mimada e mesquinha perdura por muitos e muitos anos depois de já termos entrado na vida adulta. Um mundo onde sacrificar um pouco de si em prol do futuro da humanidade simplesmente não faz mais sentido para muita gente. Um mundo que agoniza, porque parece não ter mais em si nem sequer vontade de sobreviver.

Filhos: o verdadeiro direito de escolher

Almocei hoje com um amigo que gosta de dissertar sobre a defesa da Família: mais particularmente sobre a necessária generosa abertura que os casais devem ter aos filhos que a Divina Providência achar por bem lhes confiar. Em uma palavra, sobre a importância – mesmo nos nossos dias! – de uma prole numerosa.

Naturalmente (e antes de qualquer outra coisa), ninguém deve ser a isso obrigado pelo Estado, de modo que a sadia liberdade humana deve ser respeitada inclusive nas questões de fato que precisam ser tratadas caso-a-caso pelos casais concretos que estiverem nelas envolvidos. Não é este o ponto. Trata-se muito mais de apresentar uma proposta positiva, que vai certamente na contramão da cultura moderna – mas o Papa não falou recentemente que devíamos dizer “não” a «um tipo de cultura, de um way of life, de um modo de viver, no qual não conta a verdade, mas a aparência, não se busca a verdade, mas o efeito, a sensação, e, sob o pretexto da verdade, na realidade, se destroem homens»? -, que foi praticamente proscrita do cenário atual mas que por séculos foi abraçada alegremente pela virtual totalidade dos homens, tendo dado indiscutíveis bons (e santos) frutos tanto para os indivíduos quanto para as sociedades. Trata-se de uma proposta à qual deveria – quando menos por respeito às suas cãs – ser garantido, no mínimo, o direito à cidadania.

É possível referir-se a ela pela tradicional expressão “família numerosa” com a qual ela foi canonizada pela doutrina e pela praxis católicas ao longo dos séculos, como também é possível falar sobre ela com termos metonímicos mais líricos do tipo “uma mesa cheia de crianças”. Mas aqui não importa tanto o nome da rosa e sim o seu perfume: quero dizer, o ponto aqui é defender que é viável – mais ainda, que é profícuo e feliz – um modelo de família erigido, digamos, em função dos filhos.

A primeira coisa que salta aos olhos neste modelo de família (e talvez seja este um dos motivos pelos quais ele é tão odiado e perseguido nos dias de hoje) é a profunda desigualdade instaurada entre o homem e a mulher que ele revela. Talvez o aspecto desta desigualdade que mais salta aos olhos seja quanto à fertilidade de ambos os sexos: o homem é fértil o tempo inteiro e, a mulher, apenas durante alguns dias do mês. A fertilidade masculina é menos sensível ao passar dos anos: enquanto que os homens podem em princípio ter filhos “mais tarde” na vida, as mulheres precisam necessariamente tê-los em algum momento entre a adolescência e os quarenta e poucos anos. Corolário imediato deste “descompasso biológico” é a idade com a qual podem contrair núpcias o homem e a mulher: se desejam filhos, ela não pode esperar tanto quanto ele.

Há mais desigualdades. Sem dúvidas existem casos e casos, mas as defensoras dos “direitos da mulher” hão de certamente concordar comigo que os filhos costumam afetar a vida profissional da mulher bem mais do que a do homem – e isto por razões que não têm, absolutamente, nada a ver com “papéis socialmente construídos” nem nenhuma bobagem do tipo. Tal ocorre pelo fato concreto de que uma mulher grávida ou lactante demanda alguns cuidados diferenciados, dos quais não precisam os homens ou as mulheres que não têm filhos. Tal decorre do fato objetivo de que ter um filho no ventre ou (principalmente) nos braços provoca uma certa influência na capacidade de trabalho (tanto físico quanto intelectual) da mulher.

Não foi o capitalismo quem inventou a especialização ou a divisão do trabalho. Séculos antes, Platão já enunciava o princípio lapidar (e, aliás, cristalino) de que o melhor sapateiro é aquele que produz apenas sapatos. Na sociedade familiar, portanto, foi historicamente natural que os papéis se diferenciassem e coubesse principalmente ao homem a função de “provedor”, enquanto que a mulher assumia o cuidado quotidiano do lar e da prole. Não me atirem pedras ainda as feministas de plantão, que isto não tem nada a ver com a mulher não ter “direito a trabalhar” nem com nenhuma outra cantilena idiota que as incendiárias de soutiens implantaram no inconsciente coletivo. Está-se aqui apenas constatando o fato de que coisas como tempo e energia são “recursos limitados”, e portanto empregá-los na carreira profissional ou em uma (nova) gravidez são não raro opções conflitantes entre si.

De tudo isto decorre que a hoje tão alardeada “igualdade entre o homem e a mulher” é uma grandíssima falácia que não resiste à análise dos fatos, e que só se sustenta se apoiada por um gigantesco ethos imoral que inclui, entre outras coisas,

i) a contracepção, uma vez que as “conseqüências” do ato sexual não são iguais para ambos os sexos, pois somente a mulher “arca” com uma gravidez e todas as suas conseqüências físicas e psicológicas (o homem precisa “assumir” o filho, claro está, mas isto é menos do que os efeitos provocados na mulher pela gravidez);

ii) o aborto, uma vez que a contracepção é falha e, portanto, em um cenário de “liberdade sexual”, ocasionalmente uma gravidez indesejada vai ocorrer; e, last but not least,

iii) a ubíqua mentalidade anti-natalista, revelada por uma infinidade de meios: seja através de um terrorismo sociológico neo-malthusiano (não apenas extemporâneo mas também já anacrônico) que desabrocha em violentas campanhas de controle de natalidade, seja por meio do divórcio e da pregação em favor da necessária “independência” feminina (afinal, a mulher não pode depender de um marido do qual ela pode muito bem se divorciar amanhã…), seja pela criação de empecilhos (principalmente sociológicos) às mulheres se casarem cedo (com pressões sociais do tipo “precisa-terminar-a-faculdade-para-não-ser-uma-amélia”), seja pelos maus salários pagos aos trabalhadores e que são insuficientes para o sustento do lar (empurrando assim as mulheres para o mercado de trabalho com o fito de complementar a renda familiar), seja pela idealização da mulher bem-sucedida profissionalmente (com conseqüente marginalização da “dona-de-casa”), seja por quaisquer outros meios.

Contra esta cultura moderna (e, por que não dizê-lo, anti-cristã) é imperativo o resgate do “modelo tradicional”. Não (como aliás já dissemos) como uma obrigatoriedade, mas como uma opção legítima à qual as pessoas do nosso século precisam ter direito: se a mulher deseja uma descendência numerosa, ela precisa ter o direito de construir a sua vida com vistas a este fim, e isto com todas as exigências que ela julgar necessárias – ainda que isto inclua atitudes impopulares hoje em dia como casar-se cedo ou renunciar à sua vida profissional.

Afinal de contas, se nos provoca pena uma garota que se case aos 16 anos (por ela não conseguir talvez, digamos, terminar os estudos ou trabalhar), e se julgamos (quiçá até inconscientemente) que ela está desperdiçando a sua vida, há algo de muito estranho e errado conosco. Tragédia muito maior me parece ser uma mulher casar aos 30 anos e talvez não conseguir, por conta disso, constituir uma família grande – e, estranhamente, este tipo de perda que é muito mais grave não nos provoca compaixão. Deveria ser óbvio que ter uma carreira não é mais importante do que ter filhos; na pior das hipóteses, para os que não têm Fé, as duas coisas deveriam ser consideradas como se tivessem o mesmo valor. Não se entende, portanto, por qual misterioso motivo seria degradante renunciar a uma carreira profissional mas renunciar à própria prole não mereceria [nem ao menos] igual censura. Os que não têm Fé deveriam, pelo menos por coerência, lutar para que cada qual pudesse elencar as suas próprias prioridades de vida livre de pressões sociais sem sentido.

Alvíssaras! Agora o Governo não vai precisar gastar com as crianças que não virão!

O Brasil é um país gravemente doente: este é o resultado que salta aos olhos quando se lê a apresentação dos resultados preliminares do Censo 2010 do IBGE. E a prova cabal desta doença está exposta no próprio texto, em letras capitais sem que contudo se dê maior atenção ao fato: «Taxa de fecundidade chega a 1,86 filho por mulher; em 2000 era de 2,38 filhos». Abaixo, a tabela:

A média nacional está abaixo da taxa de reposição populacional (de 2,1 filhos por mulher), assim como quase todas as médias regionais (à única exceção da região Norte – que é a mais alta – com 2,42). A região Sudeste chega a incríveis 1,66 filhos por mulher, colocando-se assim bem próxima às taxas mais críticas dos mais problemáticos países europeus (problema, aliás, que é reconhecido até mesmo pelos ateus, embora estes não dêem o braço a torcer quanto às suas causas).

Mas o mais incrível de tudo foi ouvir hoje na CBN o Gilberto Dimenstein falando que isto é uma coisa muito boa, muito legal e muito importante porque… agora  “fica mais fácil” pro Governo, que “não precisa construir tanta creche, não precisa construir tanta escola”! Sim, senhoras e senhores, as aspas são literais, e o comentarista da CBN saúda o suicídio demográfico do Brasil porque agora o Governo não vai precisar gastar tanto com as crianças que não virão!

Com relação aos graves problemas que vêm com as pirâmides etárias invertidas, o Dimenstein é perfeitamente lacônico: lá pelos 1m50s, ele fala que “ainda num vamo pegar o rolo de ter muita população na chamada terceira idade” (!). E pronto. Resta explicar por qual miraculoso motivo nós não iríamos pegar este “rolo”, se estamos caminhando cada vez mais rápido para ele (afinal, a variação da taxa de natalidade na última década foi de mais de 20% para baixo) e isto sim é matemática básica. Ora, ter uma taxa de natalidade inferior à de reposição (que é o caso do Brasil) significa exatamente que mais pessoas morrem do que nascem, que mais pessoas saem do mercado de trabalho do que nele entram, que cada vez mais pessoas precisam ser sustentadas por cada vez menos pessoas: e este é exatamente o “rolo” que o Dimenstein (contra toda a lógica mais elementar) diz que nós “num vamo pegar” – com a mesma simploriedade com a qual um cego caminhando em direção a um precipício dá graças a Deus porque “ainda” não vai cair nele.

Eu não sei se isto é uma crença irracional no progresso (por achar que, no futuro, estes problemas vão simplesmente “se resolver” sozinhos), se é um otimismo completamente irreal (como se, depois, fosse só dizer às pessoas “tenham filhos!” para que as taxas de natalidade se equilibrem automaticamente) ou se é, simplesmente, uma irresponsabilidade para com o futuro. Sei que é sintomático que a imprensa formadora de opinião deste país saúde com alvíssaras as notícias que prenunciam o declínio da civilização, o inverno demográfico, a crise à mostra adiante em direção à qual se caminha a passos largos e sorridentes. É sintomático e é deprimente.

20 and counting – sobre famílias numerosas e inverno demográfico

Linda foto! Em um mundo com 7 bilhões de pessoas, uma família assim é sinal de que podemos ter esperança em tempos melhores. Um sinal – em certo sentido profético – de que o mundo não enlouqueceu completamente. O egoísmo (mesmo o transvestido de “consciência social”) não tem a última palavra em uma unanimidade de bocas. Ao menos para a Família Duggar, é com evidente prazer que eles anunciam que agora é 20 & counting.

A foto é de G1. Que contraste com o que estamos acostumados a ver! No Congresso Pró-Vida, o Raymond de Souza explicava as conseqüências óbvias deste generalizado suicídio da natalidade que presenciamos: os europeus irão se tornar “minorias étnicas” em seus próprios países tomados por imigrantes (nas paróquias européias já há mais funerais do que batizados!), e os muçulmanos sabem tanto disso que já cantam vitória dizendo que dominarão o mundo pelo ventre de suas mulheres. O que os cruzados cristãos outrora impediram pela bravura, hoje a Europa sem Fé entrega de graça pela pusilanimidade dos seus “cidadãos modernos”. Os derrotados do passado são hoje vitoriosos! E, na excelente metáfora do Raymond, estamos presenciando atônitos o crepúsculo de uma civilização: quando o Sol do Cristianismo que iluminou as nações se põe, e a lua crescente se levanta nas trevas da noite.

Talvez não seja mais possível reverter o quadro europeu. Sem dúvidas é humanamente impossível fazê-lo; não obstante, precisamos lutar. Não dá para saber o que será do futuro: se por um milagre esta tendência vai se reverter, se o Brasil enviará missionários para (re)converter as terras das quais primeiramente recebemos a Fé ou se Nosso Senhor porá fim ao opróbrio com Sua vinda gloriosa. Não dá para saber e também não importa. Importa, contudo, manter firmes as posições corretas mesmo na contramão do mundo. Importa levantar bem alto o estandarte de Cristo, mesmo que em meio aos escombros nos quais a modernidade lançou o mundo – mesmo que ninguém pareça vê-lo ou com ele se importar. Importa não vacilar nem mesmo na Cruz. É a Deus a nossa fidelidade, e Ele saberá julgá-la bem.

Quanto custa um família?

Tua mulher será em teu lar como uma vinha fecunda. Teus filhos em torno à tua mesa serão como brotos de oliveira (Salmos 127, 3).

Vede, os filhos são um dom de Deus: é uma recompensa o fruto das entranhas. Tais como as flechas nas mãos do guerreiro, assim são os filhos gerados na juventude. Feliz o homem que assim encheu sua aljava: não será confundido quando defender a sua causa contra seus inimigos à porta da cidade (Salmos 126, 3-5).

Mais filhos trazem mais felicidade. Na contramão de toda a propaganda hedonista moderna (esta aqui consegue ser particularmente repugnante e odiosa), uma pesquisa – feita “pelo engenheiro Franz Heukamp, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), e pelo matemático Miguel Ariño, da Universidade de Barcelona” – descobriu que o índice de bem-estar aparentemente cresce junto com o número de crianças em uma sociedade.

Não é propriamente a descoberta da pólvora. A relação entre filhos e felicidade existe desde que o mundo é mundo, só sendo negada nas últimas décadas. Mas é talvez um sinal de que as trevas da modernidade estão começando a se dissipar. É talvez uma lufada de bom senso no meio da loucura moderna, é talvez um rasgo de luz no horizonte tenebroso – anunciando que a noite não há de durar para sempre. As loucuras vêm e passam; só a palavra de Deus permanece eternamente. Afinal de contas, é sem dúvidas uma loucura tratar um filho como uma linha da planilha do orçamento mensal. A pergunta correta não é quanto se gasta com um filho, e sim quanto vale a felicidade.

Enquanto isso, a Mai$ Dinheiro diz que filhos podem não custar nada. Alfinetando de modo bem ferino: «Se você acha que um filho sai caro, faça as contas de quanto custa um adulto. Sai mais barato pedir um divórcio amigável e adotar uma criança». Na verdade, já no ano passado a Gazeta do Povo publicava uma interessante matéria sobre leite fraldas. E, após dizer que os gastos não são o bicho de sete-cabeças que costumam pintar, o Iacomini encerra com um conselho: «Uma última observação a respeito da tendência de os casais se preocuparem com a estabilidade financeira e a carreira antes de terem filhos: o relógio biológico continua correndo».

Sábia advertência. Sinal de que – talvez… – a vida esteja sendo colocada novamente (enfim!) no seu lugar de direito, ao invés de ser preterida em nome de uma quimera utópica chamada “estabilidade” que só faz sentido em um mundo incrédulo que se esqueceu do que significa Providência. Sinal de que o Amor possa estar começando a vencer o egoísmo. Sinal de que – quiçá… – dias melhores virão.

O feminismo levará as mulheres à extinção?

Vi recentemente este estudo que apontava para uma possível “extinção das mulheres” (!) em algumas gerações. A previsão é um pouco absurda porque tem a ousadia de olhar muitos séculos à frente [p.ex., diz que “[e]m 25 gerações, o número de mulheres no país [Hong Kong] vai cair dos atuais 3,75 milhões para apenas uma no ano de 2798”]; mas serve para identificar tendências. Serve para fazer o alerta.

Até porque há previsões muito mais próximas e nem por isto menos dramáticas. Esta, p.ex., diz que em 2020 “haverá mais de 24 milhões de chineses sem mulheres para casar”. Não creio que semelhante flagelo tenha já alguma vez se abatido sobre a humanidade. Deste nós podemos nos orgulhar, porque ele é eminentemente moderno. Moderno demais.

E, diante de coisas assim, impressiona-me vivamente este paradoxo do feminismo (quer seja enaltecendo a “realização” da mulher que a faz não casar e/ou não ter filhos – como em Hong Kong -, quer seja defendendo e praticando o aborto – como na China). Que brilhante “defesa” das mulheres esta! Quem jamais ouviu falar em um movimento a favor de uma “classe” que, aplicado, leva à extinção desta classe?

São males modernos. São os frutos da modernidade. É o resultado de um mundo sem Deus.

Divulgação: Mini-Curso Pró-vida c/ Mons. Schooyans

[Divulgando, conforme recebi por email. Para baixar o cartaz em uma resolução maior (para impressão, p.ex.), basta clicar na figura.]

Clique para obter a imagem em tamanho maior

Estamos organizando um Mini-Curso Pró-vida (em anexo cartaz de divulgação).

Será dia 29 de julho de 2010, das 19hs até as 22:00hs, Paróquia de São Judas Tadeu (Rua Comendador Queiroz nº 33, salão paroquial – Niterói – RJ).

O tema a ser tratado será “População e soberania nacional”.

A temática será apresentada especificamente em duas palestras, são elas:

a) Uma análise do envelhecimento no Brasil: causas, conseqüências, remédios

b) Proteção da vida e terrorismo jurídico.

Expositor:

Mons. Michel Schooyans

Curriculum do expositor:

  • O prof. Michel Schooyans é sacerdote, professor emérito da Universidade Católica de Louvain (Bélgica)
  • Doutor em Filosofia – Instituto Superior de Filosofia de Louvain, 1958
  • Doutor em Filosofia e Letras, Faculdade de Filosofia de Letras de Louvain, 1960
  • Doutor em Teologia – Faculdade de Teologia da Universidade Católica de Lisbonne, 1978
  • De 1959 a 1969 foi Professor de Filosofia da PUC – SP
  • Membro vitalício da Pontifícia Academia para a Vida – Vaticano
  • Membro da Pontifícia Academia de Ciências Sociais – Vaticano
  • Consultor do Pontifício Conselho para a Família – Vaticano
  • Consultor de vários dicastérios da Cúria Romana – Vaticano
  • Foi assessor do Presidente da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal Joseph Ratzinger hoje Bento XVI
  • Autor de mais de 20 livros sobre questões de bioética, população, demografia etc.
  • Entre eles: “O comunismo e o futuro da Igreja no Brasil, Herder, São Paulo, 1963.”; “O desafio da secularização, Herder, São Paulo, 1968.”
  • Conferencista em vários congressos internacionais
  • Fala e escreve fluentemente: francês (sua língua natal), português, espanhol, italiano e inglês.

O evento é totalmente gratuito, nós pedimos somente que as pessoas façam o quanto antes a sua inscrição pelo site www.humanitatis.net para reservarem a sua vaga.

Será um momento ímpar com o objetivo de:

  • Abordar as políticas em favor da vida sob o enfoque geopolítica
  • Enfatizar o papel do cidadão consciente de seus direitos e deveres no mundo atual;
  • Aprofundar os aspectos positivos de uma cidadania consciente e transformadora;
  • Provocar no cristão a consciência de sua missão como cristão no exercício de suas atividades profissionais;

Esta é uma iniciativa do “Grupo Famílias em Cristo”, do “Instituto Filosófico e Teológico do Seminário de São José” e da “Pastoral Universitária da Arquidiocese de Niterói”.

Esperamos você lá. Divulgue este e-mail para todos os seus conhecidos e em seu blog também.

Curtas

– Já foi colocado aqui nos comentários, mas merece destaque: Possessões Demoníacas. Ainda o pe. Fortea. Como eu falei antes: o demônio existe, e possessões – ainda que raras – acontecem ainda nos dias de hoje. Destaque para: “Estamos acumulando arquivos digitais [de som, com a voz de Marta, a menina possuída] para que, futuramente, alguma Universidade especializada em idiomas estranhos possa determinar que línguas ela usa. Às vezes ela fala latim, às vezes hebraico, às vezes aramaico, idiomas diferentes”.

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– Aborto, Itália, Governo: italianas grávidas receberão 4.500 euros para não abortar. Não é a Igreja quem está fazendo isso, e a medida tomada pela Lombardia – a julgar pela notícia – não tem conotação religiosa. A questão é, de novo, os incontáveis problemas gerados pelo controle de natalidade. Vale ressaltar: “enquanto esta região italiana procura incentivar os nascimentos, na Espanha o Governo do Partido Socialista (ao qual pertence o presidente do governo José Luis Zapatero) decidiu eliminar os 2 mil e 500 euros do cheque bebê, a ajuda que o governo costumava dar às mães de recém nascidos”…

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As feministas sobre o aborto. Interessante as confissões delas. Show de cretinices, mas que retrata de maneira lúcida a guerra contra a vida travada no Brasil. Um exemplo entre tantos, já no final: “Temos um presidente e ministros de Estado se posicionando contra um arcebispo, no caso da menina violentada que ficou grávida de gêmeos e teve que abortar no ano passado. Então, a palavra deixa de ser sagrada. É preciso atentar para isso como um avanço significativo”.

“A palavra deixa de ser sagrada”! Certamente a feminista quis dizer “proscrita”, mas todo mundo entendeu. Ela quis dizer que a revolta do Estado contra a Igreja – quando Dom José Cardoso declarou a excomunhão dos assassinos dos gêmeos de Alagoinha – abriu uma brecha na discussão pública sobre o assunto. E, nas entrelinhas, disse praticamente que a Igreja é a única muralha sólida que defende as crianças por nascer.

A propósito, o texto é antigo, mas talvez valha a pena: a violência contra a mulher.

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– De acordo com enquete feita pela Ave Maria, a maior parte dos católicos (mais de 50%, neste momento) se identifica com o catolicismo tradicionalista. Para ver a enquete, cliquem aqui (canto inferior esquerdo, em azul).