Sempre há flores possíveis

Foi no final do mês passado que correu a internet o vídeo de uma menina, chilena, vítima de uma doença grave e incurável; a adolescente, de nome Valentina, fazia uma súplica emocionada para que a deixassem morrer. À eutanásia há quem confira o eufemismo de “morte piedosa”; para estes, pôr fim ao sofrimento de um doente terminal seria uma atitude piedosa e compassiva, até moralmente exigível àqueles que pretendem possuir algum grau de civilidade e empatia.

Os problemas com esta argumentação – que, aqui, saltam aos olhos – são dois.

Em primeiro lugar, uma decisão é tanto melhor tomada quando mais se a toma de maneira isenta e desapaixonada, longe da turbação mental que a experiência concreta e presente de um estado de espírito extremo (como, por exemplo, as terríveis dores e a ausência de perspectiva de futuro características de doenças graves e incuráveis) costuma provocar. Em uma palavra, ao contrário do que a viralização do vídeo da pequena Valentina induz a crer, estar doente não qualifica especialmente a pessoa para decidir em questões graves de vida e de morte – muito pelo contrário aliás. A dor oferece muitas vezes obstáculo à meditação serena. E morrer é grave. Decisão assim tão grave simplesmente não pode ficar nas mãos de quem sofre. Impôr-lha, isso sim, é uma desumanidade insensível, é acrescentar à já precária condição de vida do doente um fardo como maior não pode haver.

Em segundo lugar, matar – matar diretamente, por meio da administração de um veneno, do sufocamento, da inanição ou de qualquer coisa do tipo – é, em si mesmo e para além de qualquer possibilidade de floreio retórico, um mal. Não se trata aqui principalmente de “aliviar” as dores de ninguém, e sim de empurrar a pessoa para aquele lado da existência do qual não há volta possível, cortar-lhe sem possibilidade de remendo o único fio que a liga à existência terrena, cerrar-lhe definitivamente a porta que dá acesso ao mundo dos vivos. Tal não pode ser pintado com as cores bonitas de um «dormir para sempre» que apaguem a realidade nua e crua da morte, dessa experiência única, irrepetível e irrevogável que, em situações normais, ninguém deseja para si: como é possível que alguém, com a consciência tranquila, ofereça, como uma dádiva, ao que sofre aquilo que o sadio não desejaria para si nem como a mais cruel das penas? Há um quê de doentio na idéia de que pode ser um bom negócio oferecer a morte àquele a quem não se é capaz de consertar a vida. Repugna à razão humana acreditar, assim, sem mais, como se fosse um lugar-comum, que uma coisa pode servir de sucedânea do seu oposto.

No entanto – e embora esta outra notícia tenha merecido muito menor divulgação -, após o seu vídeo ganhar notoriedade mundial e após receber diversas visitas, a garota chilena mudou de idéia: Valentina desistiu da eutanásia! Vejam a pequena reportagem de seis minutos. Por que fizeste aquele vídeo, Valentina? “Estava cansada, já não aguentava mais”. E agora? Ainda queres dormir? “Já não sei”. Ao final, o que tens a dizer? “Sigam-me apoiando. Tenho que seguir adiante”.

Sim, é coisa edificante encontrar uma menina, aos catorze anos de vida, portadora de fibrose cística, e que há menos de um mês queria morrer… dizendo, agora, entre sorrisos, que precisa seguir adiante! Veja-se, foi bem pouco o que mudou. Algumas poucas semanas se passaram. O prognóstico da adolescente ainda é bastante delicado. No entanto, que diferença entre os dois vídeos! E que importante lição: não é verdade que, quando não haja mais nada que se possa clinicamente fazer por uma pessoa, só reste entregá-la à morte. Não, tal não é verdade! Sempre há flores que podem ser oferecidas no lugar do veneno pretensamente libertador. É sempre possível fazer algo – algo em si mesmo bom – por alguém a quem não se pode fazer mais nada. E é sempre possível mudar a maneira como as vicissitudes da vida – mesmo uma doença grave – nos influenciam. Eis que, do Chile, uma adolescente nos está a ensiná-lo. Que o bom Deus a console! E nos abra os ouvidos para que possamos entender.

Uma morte boa decorre de uma boa vida

Foi com pesar que soube do falecimento recente do Mario Palmaro. Para quem não lembra, ele já foi mencionado no Deus lo Vult! em duas ocasiões, aqui e aqui, a respeito de uma polêmica envolvendo certas críticas ao Papa Francisco que lhe valeram a demissão de uma Rádio Católica. Posteriormente o próprio Papa teve a gentileza de entrar em contato com ele, oferecendo-lhe a sua proximidade.

É ainda válido o que eu disse há quase cinco meses sobre o assunto, e penso que seria desrespeitoso à memória do professor italiano se usássemos a tragédia presente para conferir ares de martírio à celeuma passada – ou, inversamente, de estopim da Ira Divina. Que Deus confira o descanso eterno ao Mario Palmaro, e que a Lux Perpetua possa brilhar sobre ele: a mesma Luz pela qual ansiamos neste claro-escuro da vida e para merecer a qual queremos viver e morrer.

Foi no Fratres in Unum que encontrei essa sua bonita meditação sobre a doença, talvez umas das últimas coisas que o jornalista tenha escrito. Ela me tocou sobremaneira porque também me encontro às voltas com uma doença, decerto menos grave do que a que vitimou o Palmaro mas, ainda assim, a mais grave que já atravessei. E me senti representado pelas suas palavras. Subscrevo particularmente o seguinte trecho:

Às vezes eu imagino a minha casa, o meu escritório vazio e a vida que ali prossegue embora eu não esteja mais lá. É uma cena que me dói, mas extremamente realística porque me faz compreender quem sou eu, e percebo que tenho sido um servo inútil, que todos os livros que eu escrevi, todas as conferências, todos os artigos são como palha.

Sim, a perspectiva da morte é uma coisa extremamente sadia, por mais paradoxal que a afirmação possa parecer à primeira vista. Faz-nos viver melhor. Trata-se de uma meditação que todos deveriam praticar com freqüência, sem que para isso fosse necessário encontrar-se de fato diante dos umbrais do Túmulo, já a sentir-lhe o bafo gélido. As pessoas viveriam melhor – e por conseguinte morreriam melhor – se se acostumassem a viver como se fossem morrer um dia.

Penso que morrem mal as pessoas que só percebem que vão morrer ao fixar os olhos escarnados da Morte diante de si. E morrem mal porque viveram mal; porque só então percebem terem passado a vida inteira sem aquela consciência – sobre a qual falou o Mario Palmaro – de ser um «servo inútil» e de não ter jamais feito senão «palha». É essa consciência que nos permite ser grandes; é somente com ela que podemos ser o que Deus espera de nós.

Quando eu era mais jovem, lembro que alguns amigos diziam querer uma morte rápida e indolor; qualquer coisa que os fizesse morrer depressa sem nem se aperceberem de que estavam morrendo. E eu discordava; essa perspectiva me aterrorizava. Era importante, eu pensava, morrer com a plena consciência de estar morrendo, com tempo para deitar na cama e agonizar pensando na vida, receber a visita dos parentes e dos amigos, dos sacerdotes a ministrar os Últimos Sacramentos.

Hoje eu já vejo as coisas um pouco diferente: não há nenhuma razão para colocarmos nos nossos últimos estertores essa reflexão sobre a própria vida que deve ser quotidiana. Não existe nenhum sentido em simplesmente desejar morrer pensando em como se viveu, quando podemos e devemos já viver pensando em como estamos vivendo. É uma coisa santa e piedosa desejar – como eu sempre desejei – uma “boa morte”, sem dúvidas, mas esse desejo só faz sentido quando tomamos consciência de que isso necessariamente inclui o desejo de uma boa vida. É por isso que precisamos meditar na nossa morte quando – e principalmente – a percebemos ainda distante de nós. Assim essa meditação nos será mais proveitosa.

Voltando àquelas palavras do jornalista católico, elas me consolam e fortalecem. Consolam, porque entrevejo nelas uma alma que morre bem; fortalecem, porque me instam, já agora, a preocupar-me a cada dia com bem viver; a fim de que eu também possa alcançar um dia este bom termo que é muito difícil obter quando se vive como se se fosse viver para sempre, como quem não precisará prestar contas jamais. Ao Palmaro, a minha admiração, meus agradecimentos e as minhas preces. O Senhor o saberá recompensar por este bem póstumo realizado.

[OFF] Eu, com câncer (III): The road so far…

– Essa tua barba vai cair. Mas depois nasce de novo.

Assim me disse a dra. Rosa, com um sorriso, naquela – parece já tão distante! – noite em que prescreveu minha quimioterapia. A primeira parte da “profecia” já se cumpriu à risca: minha barba e meu cabelo caem aos tufos, enquanto durmo, ao banho, quando lhes passo a mão. Fico feliz de voltar a ser imberbe: o simbolismo do rejuvenescimento é óbvio demais para não ser percebido…

O cabelo que nasce depois, dizem, é um cabelo todo novo; pode inclusive nascer diferente do que era antes, se estava já branco volta a nascer preto, se era liso pode nascer encaracolado, etc. Eu, no entanto, de calvície já avançada antes dos trinta, fico já animado com a mera possibilidade de que ao final do tratamento ele nasça simpliciter. Quem sabe um cabelo novo não vem, anos depois, estabelecer-se no lugar que lhe cabe, sobre a careca antiga? E não consigo deixar de conter um sorriso: quem sabe, ainda, eu não ganho de volta os cachos de anjo que eu tinha quando criança, quando o futuro não cabia num lance de vista e se tinha a vida toda pela frente…?

Amanhã (segunda-feira, 20 de janeiro) é minha segunda sessão de QT. Este primeiro ciclo guardou as suas intercorrências para o final; só na última semana a minha imunidade baixou, os meus cabelos começaram a cair, meus pulmões voltaram a encher.

A minha contagem de leucócitos caiu para 3.310 somente na última segunda-feira. Antes se manteve em queda, mas dentro dos valores de referência. Sinal amarelo: usar máscaras com mais freqüência, reduzir o número de visitas, essas coisas. Mas não tive nada. Trata-se de um número num exame de sangue, que se eu não o tivesse visto nenhum outro sintoma perceptível me avisaria da minha imunodeficiência.

Já quanto aos meus pulmões, estes, sim, eu percebi. A minha respiração cada vez mais curta não deixava margens para dúvidas: eles estavam enchendo de novo. Terror. A quimioterapia, disseram-me, deveria secar os linfonodos do mediastino cuja compressão era responsável pelo acúmulo de líquido linfático na pleura que tanto me incomodava. Não estava funcionando. Eu estava disposto a simplesmente esperar que funcionasse; no entanto, uma angustiante falta de ar no domingo passado (após o “esforço” de caminhar em terreno plano os pouco mais de cinqüenta metros que separam a minha casa da paróquia, que fica no mesmo quarteirão) me convenceram a ir ao hospital.

Lá o raio-x foi implacável: «seios costofrênicos com derrame pleural». Seja lá o que isso for. Mas olho a chapa, e entendo perfeitamente: a ameaçadora mancha branca sobe, dos dois lados, deixando-me menos da metade de cada um dos pulmões. O que significa que eles só se expandem até metade da caixa torácica, quando muito. Discutem entre si pneumologista, hematologista, cirurgião torácico: é melhor drenar antes da quimio, concluem.

Faço a punção, de novo. Dessa vez, dos dois lados. 1,9 l do lado direito, 1,3 l do esquerdo: mais de três litros ao todo, sem contar o (muito!) que ainda foi deixado nas bases. Respiro aliviado, literalmente. Os resultados dos exames confirmam que se trata do mesmíssimo caso da vez anterior. É normal, ainda é cedo: no segundo ciclo da QT é que os efeitos devem começar a ser perceptíveis. Deus, tomara que sim. A barba já começou a cair. A contagem de leucócitos já diminuiu. Já está na hora dos linfonodos começarem a atrofiar.

Implantei um port-a-cath na última sexta-feira. Fica do lado direito do meu peito, logo abaixo da clavícula, sob a pele, e é menos horrendo do que imaginara. Fica um “calombo”, como se fosse um pequeno osso fora do lugar, nada muito grotesco. A micro-cirurgia foi simples e não tive com ela maiores problemas; só as dores normais do pós-operatório, de quando passa a anestesia. Duraram pouco. Ontem já não doía quase nada, hoje já praticamente não dói. Mantenho ainda os curativos até amanhã, e os pontos ficam pelo menos até a próxima sexta-feira. Depois, só o “calombo” e a cicatriz. Ao menos preservo as veias periféricas do braço; ao menos, como todo mundo me disse, as sessões de quimioterapia serão agora mais fáceis e mais seguras.

Do último post para cá eu recebi um sem-número de recomendações sobre como cuidar da minha saúde. Agradeço de coração por todas elas. Li-as todas. Pesquisei sobre todas e, se todas não adotei, foi porque não considero sensato fazer mudanças radicais no meu estilo de vida agora, justamente no meio de um câncer e de um tratamento quimioterápico, sem nem ao menos consultar uma nutricionista. Tenho procurado melhorar a minha alimentação, sem contudo fazer extravagâncias que não são do meu feitio. Hoje como com mais freqüência (lancho entre as refeições), como mais frutas, bebo mais água. Prefiro mel natural ao açúcar (do qual nunca fui muito fã, a propósito), e introduzi gengibre e um probiótico (Kefir) na minha alimentação diária. Estou me dando bem com isso: meu apetite funciona, meu intestino, idem, minhas funções excretoras parecem estar em ordem.

Não tenho ainda autorização e nem condições para fazer exercícios, o que tem me incomodado um pouco. Por enquanto, apenas a fisioterapia respiratória com o Respiron e o esforço de andar da sala ao quarto algumas vezes ao dia, só para fugir do temível “repouso absoluto” que provoca tromboses em quem faz viagens longas de avião. Tenho sobrevivido bem. Como diz a clássica passagem das Escrituras, até aqui tem me ajudado o Senhor. E sei que Ele não há de me faltar.

Amanhã é a minha segunda sessão de quimioterapia. A partir de amanhã, as coisas vão melhorar mais: é mais um passo, another brick in the wall, uma hora a menos da noite escura que não pode durar para sempre. Uma hora a menos…! O arrebol já vem. Há aquela história dos três pedreiros trabalhando juntos, o primeiro dos quais disse estar cimentando um tijolo, o segundo, levantando uma parede e, o terceiro, construindo uma catedral. Eu poderia dizer que amanhã estarei tomando Rituximab ou me tratando de um linfoma. Mas, agora, vou preferir dizer que amanhã estarei fazendo crescer de novo um pouco dos caracóis dos meus cabelos infantis.

Para onde conduz a ideologia gay?

Há aquela frase de efeito que diz que a inteligência humana tem limites, mas a estupidez não. Hoje eu pensei nela – obviamente mais como recurso retórico do que como proposição teológica – aplicada ao binômio santidade x pecado. Parece que há um limite para até onde o homem é capaz de subir; mas, para descer, ele desgraçadamente sempre encontra um buraco mais fundo onde se enfurnar. Isso porque, diferentemente do pecado, Deus não violenta a vontade humana: se ao homem que se esforça por se tornar melhor há sempre a concupiscência puxando-o para baixo, para aquele que dá as costas ao Altíssimo e afunda cada vez mais na podridão do pecado não existe nenhuma mão divina puxando-o para fora do pântano. Estendida em direção a ele, sim, sempre; arrastando-o contra a sua vontade, jamais.

Sempre me pareceu bastante óbvio que estimular e incentivar o homossexualismo fatalmente o levaria a se manifestar socialmente sob formas cada vez mais degeneradas. Porque, como se diz em boa teologia moral católica, abismo atrai abismo: o pecado clama por outro pecado ainda maior, e este por outro, e mais outro ainda, e esta cadeia só é encerrada quando o pecador, por misericórdia divina, cai em si e, com a graça de Deus, empreende um esforço lancinante para pôr fim ao redemoinho vicioso em cujo vórtice se encontra cativo. Como é bastante óbvio, uma pessoa que se encontra nessa situação lastimável merece toda a nossa solidariedade e todo o nosso auxílio para dar um basta ao drama que está desempenhando; quando, ao contrário, nós fingimos que isso é muito bonito e aplaudimos entusiasmados uma alma angustiada que sofre violentando diuturnamente a sua natureza, tornamo-nos réus da sua tragédia.

Não nos enganemos: seremos cobrados pelo triste fim de tantas pessoas que nós incentivamos a embarcar nesta canoa furada da violência contra a própria natureza à qual os homens dos dias de hoje gostam de tecer tantos elogios. Como se um barco furado fosse uma coisa positiva por quebrar os paradigmas anacrônicos da integridade dos cascos náuticos e por se constituir num grito de liberdade contra o imperialismo dos grandes transatlânticos e o eurocentrismo das caravelas que macularam a pureza das Américas transportando homens brancos para cá: chavões à parte, somos pessoalmente responsáveis por cada pessoa que, com nossa ação ou omissão, induzirmos a navegar neste esquife macabro.

Há uma forma bastante fácil de se comprovar empiricamente o quanto o homossexualismo é desordenado: basta dar-lhe livre curso social e observar se ele vai tender a algum equilíbrio ou se, ao contrário, vai polarizar-se em extremos cada vez mais ridículos. Infelizmente, nós já estamos em condições de conhecer os resultados desta experiência: este artigo do New York Times (traduzido na Folha) nos dá o triste e desolador retrato do nonsense ao qual conduz a exaltação da cultura gay. Espalhadas ao longo de um confuso e angustiante texto (onde ao leitor é propositalmente nebuloso saber, por exemplo, se as pessoas citadas são homens ou mulheres) estão inúmeras pérolas da intelectualidade e dos bons costumes contemporâneos.

Conforme o texto, há uma nova geração para a qual o simples direito de relacionar-se sexualmente com pessoas do mesmo sexo já não é mais o bastante. Reclamam a multiplicação das definições sexuais (ou “comportamentais”, “existenciais” ou seja lá como chamem isso), até o ponto de transformar a simples auto-definição das pessoas em uma atividade excruciante e enlouquecedora:

  • Se o movimento gay hoje parece ter como foco o casamento gay, a geração de Stephen busca algo mais radical: virar de ponta-cabeça os papéis e superar o binômio macho/fêmea.
  • Com a profusão de novas categorias, como “genderqueer” [“gênero bicha”] ou “andrógino”, cada uma dotada de uma subcultura on-line, montar uma identidade de gênero pode ser um verdadeiro trabalho do tipo “faça você mesmo”.

Trata-se de uma geração que tem profundos e nobres anseios, entre os quais se destaca a fixação fetichista em modernos utensílios descartáveis voltados à obtenção de prazer interpessoal igualmente descartável:

  • Em novembro, cerca de 40 alunos lotaram o Centro LGBT para o evento inaugural do grupo. O microfone estava aberto a todos. Os organizadores panfletaram convites oferecendo “camisinha de graça! Protetor labial de graça!”.

O profundo equilíbrio desses jovens encontra sua máxima representação num rapaz (?) que é incapaz de diferenciar um órgão sexual de um cinto de penetração e numa garota (?) que acha reconfortantemente normal enxergar a própria sexualidade como uma mancha amorfa:

  • Britt explicou que ser bigênero é manifestar tanto a persona masculina quanto a feminina, quase como ter um “pênis que possa ser colocado e tirado”.
  • No colégio, Kate se identificava como “agênero” (sem gênero) e usava o pronome “eles” (“they”, que é neutro em inglês); agora ela vê seu gênero como “uma mancha amorfa”.

As Universidades americanas, isentas de todo interesse pecuniário demagógico e motivadas somente por um profundo e angélico desejo de atender aos anseios legítimos desta comunidade, competem entre si para mostrar quem é a mais moderna e receptiva:

  • A Universidade do Missouri, em Kansas City, tem seu Centro de Recursos LGBTQIA que, entre outras coisas, ajuda os alunos a localizar banheiros “de gênero neutro” no campus.
  • O plano de saúde da faculdade [Universidade da Pensilvânia] inclui cirurgia de mudança de sexo.
  • A universidade [da Pensilvânia] já tinha duas dúzias de grupos de gays, incluindo o Negros Gays, a Aliança Lambda e o J-Bagel, a “comunidade judaica LGBTQIA”.
  • Segundo pesquisa do grupo Campus Pride, ao menos 203 campi permitem que alunos transgêneros dividam o quarto com colegas do gênero de sua preferência; 49 têm um processo de mudança de nome e gênero nos registros da universidade, e 57 cobrem terapia hormonal.

E, por fim, estas pessoas estão valentemente em luta contra a derradeira exclusão: a da sigla que as define, ainda insuficientemente vasta para abarcar toda a diversidade do alfabeto:

  • Parte da solução é acrescentar letras à sigla, e a bandeira dos direitos pós-pós-pós-gays tem ficado mais longa -ou frouxa, para alguns.
  • O Amherst College tem um Centro LGBTQQIAA, no qual cada grupo ganha sua própria letra.
  • “Por que só determinadas letras entram na sigla?” indagou Santiago.

Fazia tempo que eu não via um texto tão ridículo, e acho que nem nos meus mais pessimistas devaneios eu poderia imaginar uma tão grande futilidade erigida em bandeira de luta da juventude. As bobagens acima seriam certamente consideradas pelos militantes gays como caricaturas desonestas de conservadores homofóbicos, se não fossem a mais cândida e sincera auto-expressão das novas gerações de eufóricos continuadores do combate contra a natureza apregoado pelo movimento gay.

O meu temor é haver quem não perceba o quanto tudo isso é humanamente degradante; quem defenda ser saudável esta radical negação da natureza humana; quem acredite que o sexo é uma coisa tão exógena ao ser humano que é possível simplesmente optar por ambos ou por nenhum; quem ache que goza da mais perfeita sanidade mental um indivíduo cujo sonho é um pênis que pudesse colocar e retirar. Contra estes eu talvez nem saiba o que é possível dizer. Provavelmente só me levariam a abanar a cabeça, desesperançado.

Apenas um último detalhe. Os militantes gays gostam de bradar que o homossexualismo não é (mais) doença segundo a Organização Mundial da Saúde. Aqui, resta-lhes a constrangedora incumbência de explicar como é possível, então, que ele naturalmente degenere nesta caterva de patologias sexuais e comportamentais, devidamente catalogadas como distúrbios pela mesmíssima OMS que gostam de evocar em seu favor. Será que vão dizer que nisso a OMS está errada – e irão conviver com esta embaraçosa concessão seletiva de autoridade a este órgão? Ou negarão sua afinidade com estes novos revolucionários sexuais – dando assim as mãos aos “homofóbicos” para condenar esta militância dos que pretendem «superar o binômio macho/fêmea»?

Belos exemplos contra o aborto e contra a eutanásia

A vida é o bem mais precioso que possuímos, o mais importante, o mais fundamental e o que mais merece a nossa defesa intransigente; e, justamente por conta disso, as políticas que o ameaçam são as mais vis e covardes, as mais perniciosas, as mais desumanas e as que mais merecem o nosso mais veemente repúdio. A profusão de advérbios de intensidade aqui, mesmo em sacrifício do estilo, é proposital para enfatizar esta idéia: a vida não é apenas um bem. É o maior bem natural do qual dispomos, o bem do qual dependem todos os outros e o único bem cuja perda não podemos fazer nada para reverter. A vida é o bem que está no ápice da hierarquia de valores humanos.

Esta verdade é tão óbvia que uma miríade de atitudes humanas a testemunha a cada instante. Ninguém quer ser morto, e toda a odisséia humana nesta terra pode ser vista como uma desesperada tentativa de continuar existindo a despeito de um mundo hostil; toda vida humana pode ser narrada aos moldes do sobrevivente que se debate para fugir às garras da fome, da sede, da doença, da velhice, do tempo, da guerra; da morte, em suma. Podem dizer que este quadro é simplista, uma vez que existem incontáveis outro valores – como a Fé, a honra, o amor, etc. – que soem ser defendidos até às custas da própria vida; e eu serei o primeiro a concordar com esta acusação. Mas nem por isso o que digo se torna menos verdadeiro: afinal, o sacrifício da própria vida só se transforma em uma coisa louvável em altíssimo grau justamente porque a própria vida é em si um bem em grau altíssimo. Os próprios contra-exemplos aqui aduzidos atestam a luminosa validade da regra. Sim, um soldado que morre tentando salvar outras pessoas é um herói, mas ele o é justamente porque a sua vida tem um valor inestimável e, por isso, é heróico entregá-la por outrem. Fosse uma coisa de somenos importância – digamos, como uma trufa de chocolate -, não haveria heroísmo algum em abrir mão dela em benefício de outras pessoas. Exigir-se-lhe-ia, até.

A vida é um bem tão precioso que, como se dizia acima, não é exagerado dizer que as pessoas dedicam a sua vida a preservá-la. E, como é comum nos seres humanos, este instinto protetor dirige-se não somente a eles próprios, mas também às pessoas que lhes são caras. Duas notícias que vi hoje confirmam esta verdade. Duas belas notícias.

A primeira, sobre um bebê que nasceu com o coração para fora do peito (há um vídeo aqui). Tão logo a anomalia foi descoberta, ainda durante a gravidez, como infelizmente é comum acontecer, sugeriu-se à mãe que abortasse a sua filha; como jubilosamente é também comum acontecer, a mãe disse que isso estava fora de cogitação. A menina nasceu sob os cuidados de cirurgiões obstetras, cardiotorácicos e plásticos; sobreviveu, e passa bem; teve alta, e já está em casa com a mãe.

A segunda, sobre dois pais que mantiveram o seu filho vivo por anos revezando-se diuturnamente no bombeio de um saco ressuscitador. O rapaz sofreu um acidente, e a família não tinha condições de arcar com os custos do tratamento em um hospital. Tratou-o em casa, do jeito que podia, mesmo isso significando dedicar a vida a bombear manualmente ar para os pulmões do filho que não conseguia respirar sozinho. Depois que a história foi divulgada num jornal local, um médico ofereceu-lhe tratamento hospitalar. O rapaz segue vivo, e diz não saber se será capaz de agradecer aos seus pais um dia.

Histórias assim revigoram a nossa esperança na humanidade; através delas, nós podemos ver que os homens continuam a reconhecer a importância capital da vida humana a despeito do desolador avanço da cultura da morte nos meios ditos “intelectuais”. Ainda há esperança! Contra a glorificação do aborto, há uma mãe que mobiliza multidões de médicos para recolocar o coração de seu bebê dentro do peito; contra a exaltação da eutanásia, há um casal de chineses respirando por seu filho vinte e quatro horas por dia. Que sejam pessoas assim a povoar o nosso futuro! É reconfortante descobrir que, em nosso mundo, apesar de tudo, ainda há pessoas dispostas a consumir a própria vida para testemunhar – com atos! – que é preciso defender a vida humana desde a concepção até a morte natural.

Qual o valor de um corpo perfeito?

Belíssima história, que reproduzo abaixo do exato jeito que encontrei no Facebook, com a foto e o texto lá postados. Contra o “argumento” de que é fácil ter Fé em Deus quando se tem saúde e bens materiais, dona Maria dá a excelente resposta do testemunho da própria vida. Porque, como nos diz o Apóstolo, se fosse apenas para esta vida que estivesse voltada a nossa esperança, seríamos, dos seres humanos, os mais dignos de pena. A falta de saúde nos ajuda a colocar as coisas em perspectiva; felizes os que são capazes de perceber esta verdade contemplando a riqueza da criação de Deus! Porque mesmo a dor nos direciona para Ele. Mesmo a deficiência revela a plenitude do Ser Humano à qual aspiramos e a cuja luz somente as nossas limitações fazem sentido.

Não sei se vocês leram este texto do João Pereira Coutinho sobre o culto ao corpo. Caso negativo, façam-no agora. O articulista português expõe impiedosamente a pústula do anti-transcendentalismo moderno:

Se não existe nenhuma continuidade pós-terrena, se tudo que resta é esta passagem breve e incompleta que termina entre quatro tábuas, o olhar humano recentra-se sobre a matéria. Pior: coloca a matéria no altar das antigas divindades e troca as orações e as penitências do passado pelo calvário tangível da malhação matinal. […] Um deus caprichoso e inconstante, sujeito às inclemências da velhice, da doença e da morte. Se existem causas perdidas, o corpo é a primeira delas. Alimentar causas perdidas é um sintoma de demência.

Excelente exposição! E contra esta demência generalizada levanta-se o exemplo de Dona Maria, uma simples senhora de Manaus que nunca terá nesta vida um corpo perfeito. Mas, ao que parece, a sua alma está muito mais sadia e vigorosa do que a de muitos cujos corpos, comparados ao dela, são de uma perfeição olímpica. Na contramão da histeria moderna, esta senhora soube cultivar a própria alma. Aprendamos com ela.

* * *

Fonte: Facebook

Esta é a dona Maria. Ela mora em Manaus e é deficiente de nascença. Como se percebe, ela nasceu sem os braços e as pernas. Todas as terças feiras ela fica na porta do Santuário Nossa Senhora Aparecida participando das novenas perpétuas e pedindo ajuda aos fiéis. E numa conversa que eu tive com com a dona Maria, ela me fez a seguinte confissão: “Meu filho, eu nasci sem as pernas e os braços, mas sou uma pessoa feliz porque o essencial eu tenho: saúde, paz e principalmente fé! Confio muito em Deus e em Nossa Senhora. Sou aposentada, mas peço esmolas porque preciso ajudar a sustentar os meus netinhos que moram comigo e são doentes.” (Dona Maria)

Depois eu fiquei me perguntando: quantas vezes nós reclamamos tanto da vida mesmo tendo saúde, dinheiro, e tantas outras coisas. E ver uma guerreira como esta, na situação que se encontra ainda ajudando a cuidar da família com tanta disposição e alegria!

Realmente a dona Maria nos deixa aqui um exemplo de fé e superação de problemas!

Deus nos mostra por meio dessas pessoas que, por mais que a vida aparenta ter seus grandes problemas, eles só se tornam grandes a medida que permitimos que nossa fé esteja pequena!

Maria Clara: geneticamente selecionada para curar a irmã

Não posso deixar de registrar a excelente cobertura que a Gazeta do Povo, de Curitiba, deu ao caso da menina gerada por meio de fecundação artificial e que foi geneticamente selecionada para salvar a irmã de uma doença (aliás, há um filme de 2009 – My Sister’s Keeper – com a mesma temática).

Irmãos feitos para salvar irmãos, por Salmo Raskin: “Há o risco de a criança que veio ao mundo para salvar seu irmão se sinta diferente quando compreender o que motivou o seu nascimento. Traz à tona o temor de que possa estar mais próximo o dia em que também será aceita a seleção de embriões por fatores não ligados a doenças, ou até a manipulação de material genético de embriões”.

Bebê-medicamento é uma solução?, por Lenise Garcia: “Sorte de Maria Clara, que, por ser saudável e compatível, sobreviveu. Mas ela saberá, ao longo de sua vida, que não foi escolhida por ela mesma, mas apenas por alguns de seus genes. E Maria Vitória saberá que teve mais sorte ainda, por ter sido concebida naturalmente, pois se ela fosse fruto de uma fertilização in vitro teria ido para o ralo”.

Os limites da Genética, por Gazeta do Povo (Editorial): “[E]mbriões, saudáveis ou não, acabam indefinidamente congelados ou são simplesmente descartados – a “solução” mais comum, nas palavras do próprio médico que atendeu os pais de Maria Clara. São seres humanos cujo único “defeito” foi não ter os genes corretos – ou também apresentariam talassemia ou, mesmo sendo saudáveis, não tinham as características exigidas para proporcionar a cura de Maria Vitória. Deve-se ressaltar que eugenia é eugenia independentemente de ocorrer no útero, em laboratório ou mesmo após o parto, e também independe do objetivo da seleção; do contrário, acaba-se legitimando o pensamento de que os fins justificam quaisquer meios”.

São opiniões excelentes que carregam ainda o mérito de serem exceções honrosas: tomadas de posição assim não são facilmente encontradas na grande mídia nacional. O serviço que o jornal paranaense presta à sociedade brasileira é inestimável. Não deixem de escrever para o jornal (clicando aqui (para o terceiro texto), ou por meio do email: leitor@gazetadopovo.com.br) parabenizando-o pela linha editorial que vem adotando, e que está – na contramão de parte esmagadora da imprensa brasileira – em sintonia com os princípios e valores do povo brasileiro.

O remédio prometido pela Mayana Zatz virá… das células-tronco adultas!

Eu vi na Canção Nova que o Brasil deve, ano que vem, testar um tratamento inédito com células-tronco. A boa notícia: este tratamento inédito é feito com células-tronco adultas, isto é, exatamente com aquelas células-tronco cuja utilização nós, católicos, passamos a vida inteira defendendo a despeito de vociferarem contra nós os inimigos da civilização e da humanidade – os que queriam destruir seres humanos em pesquisas científicas. A notícia surpreendente: a grande especialista entrevistada nesta matéria, e que recebe os louros pela notícia promissora, é… a Dra. Mayana Zatz!

Eu estava aqui quando a lei de Biossegurança foi aprovada. E me lembro da chantagem emocional barata da Dra. Zatz et caterva, usando pessoas doentes (inclusive crianças) para comover mentirosamente a opinião pública. O menino João Victor, aliás, tem hoje doze ou treze anos e desde os nove espera o remédio prometido após o julgamento do STF que autorizou a destruição de embriões humanos em pesquisas.

O interessante é que talvez o remédio agora venha. João Victor tem distrofia muscular, exatamente a doença cujo tratamento inédito está anunciado para o próximo ano. Com células-tronco adultas. E agora, quem vai dizer para o menino que o seu sofrimento foi instrumentalizado ideologicamente para a aprovação de uma lei iníqua que, ao fim, em nada o ajudou com o problema dele? E quem é que vai dizer a tantos doentes que a cura, afinal, não veio e nem vai vir de onde disseram que viria, mas de outro lugar? Quem vai dizer a eles que foram gastos tanto tempo, dinheiro e energias em um caminho que nós, católicos, desde o início dissemos que não deveria ser seguido?

Dona Zatz, vá falar com o João Victor. É o mínimo que ele merece após ter sido enganado por quase um quarto da sua vida. Aproveite e peça também desculpas públicas a todos – doentes ou não – os que foram enganados ao longo dos últimos anos. E aos embriões imolados nas placas de Petri – seres humanos sacrificados por uma promessa alquímica de panacéia universal -, as nossas orações e o nosso reconhecimento pela terrível injustiça sofrida, junto com o nosso compromisso de não cessarmos o nosso empenho em pôr fim a esta vergonha. É sobre o nosso século que recairá esta nódoa. Que ela não seja tão tenebrosa quanto se prenuncia.

Pais e filhos gays

Caiu-me às mãos um artigo de João Pereira Coutinho, intitulado “Pais, filhos e gays” (aqui para assinantes da FOLHA ou aqui para os demais), no qual o articulista tece algumas considerações sobre a homossexualidade enquanto fato natural e a licitude de se buscar, para ela, alguma espécie de tratamento terapêutico. Recomendo a leitura do artigo completo (em um dos links acima), sobre o qual eu pretendo fazer alguns comentários. Os itálicos deste post – retroativamente – são excertos do artigo ora em discussão.

Vou começar pelo fim, i.e., pela conclusão do Coutinho, com a qual eu concordo inteiramente: a vida humana é, em si, digna de respeito, e deve ser protegida da vaidade, soberba e tirania de seus progenitores. Isso é uma questão de princípio, que não pode ser negociada sob hipótese alguma, posto que a dignidade do ser humano – de todos e de cada um deles – é-lhe intrínseca, e não pode ser violada nem mesmo por uma boa causa. Assim, é imoral uma manipulação genética que ambicione “criar” artificialmente um ser humano ao gosto do freguês, montado pelos pais que, como clientes de um self-service, escolham as características que desejam e descartem as que não lhe apetecem.

Todavia, não dá para subscrever sem ressalvas todo o artigo. Nele, misturam-se coisas que não deveriam ser misturadas. Por exemplo: diz o articulista que a maioria das pessoas, se pudesse identificar a orientação sexual do filho por meio de um exame pré-natal, não hesitaria em recorrer ao ABORTO ou à “reprogramação” caso a sexualidade da criança apontasse para o lado “errado”. Oras, o aborto é clara e absolutamente imoral. Já o que é chamado de “reprogramação”, precisa ser melhor analisado.

João Pereira Coutinho refere-se a um estudo sobre diferenças de anatomia cerebral entre homossexuais e heterossexuais (provavelmente o mesmo estudo que já foi comentado aqui neste BLOG) e sobre a influência de certos hormônios (durante a gestação e pouco depois dela) na formação do sistema nervoso do indivíduo. E prossegue: se os hormônios desempenham papel principal, abre-se a porta prometida: “reorientar” os hormônios, “reorientar” a preferência sexual do bebê. Antes de continuar, é preciso deixar claro que não pode ser aceitada simpliciter a tese segundo a qual [a] homossexualidade é um fato natural -como a cor dos olhos, a pigmentação da pele. Um bebê, embora evidentemente tenha cor de olhos, não tem preferência sexual nenhuma. O que ele pode ter é uma certa configuração biológica que o predisponha a, no futuro, quando se interessar sexualmente por alguém, fazê-lo por pessoas do mesmo sexo. No mesmo artigo, Coutinho diz que outros aspectos da personalidade humana – como para a depressão, para a liderança, para a criatividade – podem ser explicados da mesma forma que a homossexualidade. E bebês não têm nada disso, embora possam desenvolver essas características depois. Da mesma maneira que é preciso considerar em todo ato humano, onde entra o livre-arbítrio de cada um – ao contrário de coisas como cor de olhos e pigmentação da pele -, uma coisa é a predisposição e, outra, o determinismo. É aceitável que haja predisposição para o homossexualismo, mas é simplesmente falso que a configuração genética determine sozinha quem é gay e quem não é, porque as pessoas sempre podem (à exceção de alguns casos mais críticos) agir em desacordo com os seus impulsos e instintos imediatos. Nós fazemos isso o tempo todo, e é isso que nos diferencia dos animais irracionais.

Concedendo que certos comportamentos – entre eles, o comportamento homossexual – possa sofrer influências neurobiológicas (como, aliás, eu concedo facilmente), é forçoso incluir neste conjunto também coisas como a depressão, a cleptomania, a ninfomania ou a pedofilia (sobre este último, aliás, recomendo esta leitura, que traz confissões interessantes). Se é assim, então, por que alguns destes comportamentos são moralmente passíveis de tratamento e outros devem permanecer protegidos da “violência de terceiros”? Por acaso dar anti-depressivos a pessoas que sofrem de depressão é condená-las a habitar vidas que não lhes pertenceriam? Por que uma ninfomaníaca pode ser tratada e um homossexual não pode? O critério colocado pelo articulista é arbitrário: a homossexualidade não é impeditiva de um funcionamento pleno do indivíduo nem põe em risco a sua sobrevivência futura. E é arbitrário por pelo menos dois motivos.

Primeiro: o que é “funcionamento pleno”? Na plenitude da realização de um indivíduo, não deveria estar – pelo menos em possibilidade de escolha – a formação de uma família? Homossexuais não podem fazê-lo de maneira natural. Por que esse aspecto naturalíssimo da vida humana foi retirado do funcionamento pleno do indivíduo que Coutinho defende como o critério que diferencia aquilo que é passível de interferência terapêutica daquilo que não o é?

Segundo: existem coisas que não se enquadram no supradito critério e que sempre foram feitas sem maiores questionamentos pela medicina. Por exemplo, cirurgias estéticas. “Ah, mas uma cirurgia estética é de responsabilidade do sujeito sobre si mesmo, pois é ele que escolhe fazer”, poderia alguém argüir. Não necessariamente. Por exemplo, os pais de uma criança que tenha lábio leporino estariam porventura fazendo alguma violência contra o seu filho se lhe fizessem uma cirurgia corretiva? É claro que não.

O homossexualismo é anti-natural, ainda que se possa observar “na natureza” atos sexuais entre animais do mesmo sexo, e ainda que ele tenha raízes n’alguma configuração neurobiológica do indivíduo. E a razão para isso é que ele vai contra a própria natureza do ato sexual, pois este nos mostra que há complementaridade entre o homem e a mulher, e que esta complementaridade é necessária à perpetuação da espécie humana. Isto não é um pressuposto do catolicismo, é um fato que está ao alcance da razão natural. É um valor objetivo, e justifica a intervenção terapêutica para se corrigir as predisposições à homossexualidade que porventura existam já num recém-nascido ou num nascituro, sem que isso seja violar-lhe a dignidade intrínseca (como no caso do aborto), porque o que detém a dignidade é o ser humano, e não a homossexualidade. A manipulação genética é condenável, se tiver como fim a criação do “super-homem”; mas a razão humana pode e deve ser utilizada para que o ser humano – parafraseando João Pereira Coutinho e dando um sentido diverso à expressão dele – possa ter uma vida plena. E uma pessoa vive tão mais plenamente quanto menos ela se desvia daquilo que ela deve ser, quanto mais ela se conforma à Lei Natural – da qual podemos, no tocante ao que se está discutindo aqui, encontrar uma eloqüente expressão lá no início da narrativa bíblica: et creavit Deus hominem ad imaginem suam ad imaginem Dei creavit illum masculum et feminam creavit eos (Gn 1, 27).