Certas coisas são realmente inacreditáveis: com referência ao documento da CNBB sobre a formação de sacerdotes, encontrei na internet três notícias com manchetes diferentes e contraditórias.
- Folha de São Paulo: Bispos aprovam diretrizes para novos padres mas retiram menção a homossexualidade
- Estado de São Paulo: CNBB reafirma que homossexual não pode ser padre
- Zero Hora: Gays celibatários podem ser padres, diz bispo
Cabe perguntar como é possível uma tal discrepância na apresentação de notícias sobre o mesmo fato; a incoerência é gritante e salta aos olhos. Mais ainda se levarmos em consideração que o tal documento não foi ainda publicado, só o devendo ser após a aprovação do Santo Padre. Como é possível, então, que três agências de notícias possam dar informações tão díspares sobre uma coisa que nem sequer foi tornada pública ainda?
[A bem da verdade, é preciso deixar claro que o último texto – reproduzido pelo Zero Hora – fala não sobre o documento “Diretrizes para a Formação dos Presbíteros” em si, e sim sobre uma declaração do bispo dom Luís Soares Vieira, vice-presidente da CNBB. Mesmo assim, merece registro o samba do crioulo doido que foi feito pelos jornais brasileiros.]
Qual é, portanto, a verdadeira posição da Igreja Católica no meio desta confusão toda? Ela deve ser buscada na Instrução Sobre os critérios de discernimento vocacional acerca das pessoas com tendências homossexuais e da sua admissão ao Seminário e às Ordens Sacras, da Congregação para a Educação Católica. O texto é taxativo; lá, a Igreja afirma “claramente” que “não pode admitir ao Seminário e às Ordens sacras aqueles que praticam a homossexualidade, apresentam tendências homossexuais profundamente radicadas ou apoiam a chamada cultura gay“.
A CNBB não pode fugir disso; quer o documento traga expressamente o termo “homossexualidade” ou não, quer um bispo diga o contrário, gays não podem ser ordenados sacerdotes porque assim dispõe a Santa Sé. C’est fini. Permitindo-me um desabafo, bem que a Conferência poderia evitar estas fofocas descabidas todas afirmando de maneira clara o que a Igreja já afirmou há quatro anos [a referida instrução é de 2005]; mas parece que a CNBB só sabe ser taxativa quando é para ser contrária à redução da maioridade penal…
“Ah, mas e se o gay for celibatário?”, pode perguntar alguém. Ao contrário do que disse o vice-presidente da CNBB, no entanto, só é autorizada pela Congregação para a Educação Católica a admissão às ordens sacras do candidato no “caso de se tratar de tendências homossexuais que sejam apenas expressão de um problema transitório como, por exemplo, o de uma adolescência ainda não completa”. Ou seja, se o sujeito estiver confuso durante a adolescência, se tais tendências forem transitórias, e não se ele for verdadeira e propriamente gay, assumido e feliz com a sua “orientação” sexual. E, mesmo assim, essas tendências precisam “ser claramente superadas, pelo menos três anos antes da Ordenação diaconal”. Que diferença entre o que diz a Santa Sé e o que diz a vice-presidência da CNBB!
Só mais dois detalhes: primeiro, não é verdade que “o que se exige do heterossexual para ser padre, se exige também do homossexual” assim, simpliciter, como disse Sua Excelência. De um heterossexual se exige a renúncia de um bem (o Matrimônio) e, do suposto homossexual sacerdote, exigir-se-ia evitar um pecado (os atos homossexuais). Não é, nem de longe, a mesma coisa. Privar-se de algo que é um bem é um ato meritório; afastar-se dos pecados é obrigação de todo cristão. É, portanto, evidente a diferença.
E, segundo, causa espécie que (conforme o Estadão) o tal documento tenha… “388 artigos e 97 páginas, antes dos acertos finais”! Uma centena de páginas e, mesmo assim, sem tratar do problema da homossexualidade?! É realmente necessário tudo isso? Tenho até medo de saber o seu conteúdo. Bem que o Papa poderia devolver uma versão que contivesse somente um quarto do tamanho desta papelada; tenho certeza que daria para abordar tudo o que é necessário para a formação dos presbíteros (incluindo a homossexualidade). Rezemos pelos nossos bispos, rezemos pelos futuros sacerdotes.