Dom Antonio de Castro Mayer sempre me pareceu mais sensato e equilibrado do que Dom Marcel Lefebvre, a despeito de ambos quase sempre serem citados juntos na “resistência” ao Vaticano II – e também na excomunhão… Ontem, eu e mais dois amigos conversávamos sobre o assunto, julgando interessantes alguns aspectos da vida e do ministério episcopal do Leão de Campos.
Por exemplo, Dom Mayer não proibiu jamais nenhum dos seus padres de celebrar o Novus Ordo Missae. Apesar dele próprio ter sempre utilizado o missal de S. Pio V, em sua diocese nenhum padre foi impedido de adotar (caso desejasse) a Reforma Litúrgica. Cada padre de Campos recebeu uma cópia do Missal de Paulo VI quando ele foi promulgado, junto com uma nota diocesana avisando que, em Campos, manter-se-ia a viva a Liturgia tradicional, apesar de cada sacerdote ser livre para optar por uma ou outra forma de oferecer o Santo Sacrifício.
Mais: Dom Antonio nomeou párocos que celebravam o Novus Ordo. Ou seja, em Campos, havia paróquias onde as missas eram celebradas segundo a Reforma Litúrgica, e isso sem nenhuma perseguição do então bispo diocesano (ao contrário do que aconteceu no resto do Brasil – e mesmo em Campos, depois – em contrapartida, quando os bispos perseguiam quem ousasse continuar celebrando segundo as antigas rubricas). Em Campos, apesar dos problemas de consciência de Dom Antonio, as duas formas do Rito Romano coexistiram. Fico imaginando se a nossa situação atual não seria incomparavelmente melhor caso exemplos assim houvessem perdurado e se multiplicado… afinal, na prática, o que fez Dom Mayer foi uma aplicação diocesana (com mais de três décadas de antecedência) do que estabelece o Summorum Pontificum para toda a Igreja. O Missal de Paulo VI e o de São Pio V lado-a-lado. Com uma liberdade muito maior para este último – é evidente – do que se pode encontrar hoje, mas sem nenhuma perseguição de nenhum dos lados.
E Dom Mayer não foi jamais perseguido por causa disso. Não foi suspenso de ordens (ao contrário do prelado francês), não foi afastado, não recebeu censura alguma da Santa Sé. Um ano antes da sua renúncia em 1981, em visita ad limina apostolorum (junto com o então pe. Rifan, a propósito), encontrou-se com João Paulo II e, em Roma, tudo transcorreu em clima da mais completa normalidade. Apresentou ao Vigário de Cristo a situação da sua diocese, falaram sobre os assuntos pertinentes à visita, e a situação litúrgica em Campos não foi colocada em questão. Até se tornar bispo emérito, no início dos anos oitenta, Sua Excelência manteve-se em fiel espírito de submissão e respeito à Sé de Pedro. O que aconteceu depois disso foi mais complicado; mas, até João Paulo II aceitar a renúncia do bispo de Campos em 1981, Dom Mayer – ao que parece – serviu plenamente à Igreja de Cristo, como se espera que faça um Sucessor dos Apóstolos. Algumas pessoas, muitas vezes, “esquecem-se” disso, e querem ver no bispo de Campos somente o superior da União Sacerdotal São João Maria Vianney.
Sobre o mesmo assunto, ler também: Carta de D. Mayer ao Papa Paulo VI. Vejam-se as palavras, o tom, o objetivo. Destaco:
Cumpro, assim, um imperioso dever de consciência, suplicando, humilde e respeitosamente, a Vossa Santidade, se digne, por um ato positivo que elimine qualquer dúvida, autorizar-nos a continuar no uso do “Ordo Missae” de S. Pio V, cuja eficácia na dilatação da Santa Igreja, e no afervoramento de sacerdotes e fiéis, é lembrada, com tanta unção, por Vossa Santidade.
Ao que me consta, infelizmente esta carta não obteve nunca resposta…