A Diocese de Goiás, a AIDS e os preservativos

Leio no “Exército Católico” que a Diocese de Goiás “distribui preservativo e estimula fornicação”. O evento fez parte do World AIDS Day, ontem celebrado. Nas fotos (acessem e vejam), cartazes imorais com explícito incentivo ao sexo irresponsável e caixas contendo os “kits” com quatro camisinhas que, segundo a matéria, foram distribuídos na catedral de Sant’Ana.

No post sobre o dia de ontem, comentei que não havia encontrado no site oficial do World AIDS Day “nem uma palavra sobre as reais causas do problema ou sobre as suas reais soluções”. Alguém não me entendeu e fez a gentileza de, em comentário, citar dois links para me deixar “melhor informado”. No entanto, os links citados – repito-me! – não trazem “nem uma palavra sobre as reais causas do problema ou sobre as suas reais soluções”. Acredito, talvez, que eu não tenha sido claro o suficiente. Vou tentar de novo.

As reais causas da epidemia de AIDS estão no uso irresponsável do sexo e na assustadora promiscuidade que assola o nosso mundo. E “sexo responsável”, a despeito de todas as criminosas propagandas dos adoradores do látex, não é sinônimo de “sexo com camisinha”. As reais soluções para o problema da AIDS estão na abstinência pré-conjugal e na fidelidade matrimonial; e não, ao contrário do que os irresponsáveis arautos dos preservativos querem fazer acreditar, na distribuição maciça de camisinhas. Memento Uganda.

A idolatria do preservativo só aumenta a promiscuidade, e o aumento da promiscuidade só faz a AIDS avançar ainda mais. Isto é simples como dois e dois são quatro: não adianta nada diminuir a probabilidade de um resultado para eventos isolados e, ao mesmo tempo, multiplicar o número de eventos totais. Isto é, a relativa segurança introduzida pelo preservativo perde-se pela promiscuidade que ele proporciona. O Dr. Green já disse isso quando o Papa foi à África. No entanto, ninguém parece preocupado com isso; os idólatras que crêem firmemente estar na borracha a salvação do mundo são incapazes de pensar racionalmente. Para eles, importar “curtir o sexo com prazer” e “experimentar” a camisinha depois dos cinqüenta.

Vergonhosamente, esta desgraça – em franca e aberta oposição a tudo o que a Igreja sempre ensinou em matéria de Moral Sexual – instalou-se até mesmo em uma catedral católica. A desolação atingiu o lugar santo; onde estão as sentinelas que deviam velar pelos fiéis que Deus lhes confiou? Onde os que deviam ser guardiãos da Moral católica? Por que este desejo mórbido de voltar as costas para Cristo e conformar-se ao mundo, quando o mundo já deu incontáveis provas de não ser capaz de produzir senão miséria, sofrimento, degradação? Se o sal perde o sabor… para quê ele há de servir? Se a diocese de Goiás quer ser uma filial da UNAIDS, ou uma ONG de “direitos humanos”, ou uma sucursal do Inferno ou o escambau, por que não renuncia logo ao nome de “católica” e permite que a Igreja faça aquilo que compete a Ela fazer – aquilo em que Ela Se distingue?

“O Papa pode estar certo” – Edward C. Green

[Original: Washington Post
Tradução: SOVA
]

O PAPA PODE ESTAR CERTO

por Edward C. Green
publicado no The Washington Post
em 29 de março de 2009, pg A15

Quando o Papa Bento XVI disse, recentemente, que a distribuição de camisinhas não está resolvendo, e pode até estar piorando, o alastramento do HIV/AIDS na África, ele detonou uma explosão de protestos. A maioria dos comentários não-católicos foi altamente crítica em relação ao Papa. Uma charge do Philadelphia Inquirer, reimpressa no The Post, mostrou o Papa como um vampiro pregando a uma multidão de doentes e moribundos africanos dizendo: “Bem-aventurados os doentes, pois eles não usaram camisinhas”.

No entanto, a verdade é que as evidências empíricas atualmente disponíveis concordam com as palavras do Papa.

Nós, liberais que trabalhamos nos campos da HIV/AIDS e do planejamento familiar em âmbito global, correríamos um terrível risco em termos profissionais se nos puséssemos ao lado do Papa num assunto tão polêmico quanto este. A camisinha se transformou num símbolo da liberdade e – junto com a contracepção –  da emancipação feminina, de tal forma que aqueles que questionam a “ortodoxia do preservativo” são acusados de serem contra aquelas causas. Meus comentários são somente sobre a questão dos preservativos funcionarem como meio de alastramento da epidemia generalizada de AIDS na África – nada mais que isso.

Em 2003, Normam Hearst e Sanny Chen, da Universidade da Califórnia, conduziram um estudo sobre a efetividade da camisinha para o Programa das Nações Unidas para a AIDS e não encontraram nenhuma evidência de que as camisinhas estivessem funcionando como medida de prevenção da AIDS na África. A UNAIDS discretamente renegou o estudo. (Os autores depois negociaram para publicar seus achados na edição trimestral da Studies in Family Planning). Desde então, os principais artigos publicados em outras publicações com peer revisions, tais como Lancet, Science e BMJ, confirmaram  que a camisinha não funcionou como uma intervenção primária [primary intervention] nas populações que sofrem com grandes epidemias dessa doença na África. Em um artigo de 2008 intitulado “Reassessing HIV prevention”, dez peritos em prevenção à AIDS concluiram que “mesmo após muitos anos de promoção generalizada e frequentemente agressiva, o uso consistente de camisinha não alcançou uma diminuição mensurável de novas infecções da epidemia na África subsaariana”.

Permita-me rapidamente acrescentar que a promoção do uso de camisinha funcionou em países como a Tailândia e Cambodja, onde a principal causa de transmissão do HIV é o sexo comercial e onde foi possível forçar uma política de uso em 100% dos prostíbulos (mas não fora deles). Em teoria, a promoção do uso da camisinha deveria funcionar em qualquer lugar. E, intuitivamente, algum uso da camisinha deveria ser melhor do que o não uso. Mas não é o que mostram as pesquisas na África.

E por que não?

Uma razão é a chamada “compensação de riscos”. Isto é, quando as pessoas pensam que estão mais seguras porque usam camisinhas ao menos uma parte das vezes, então elas acabam por praticar um sexo mais “arriscado” [engage in riskier sex].

Outro fator é que as pessoas raramente usam camisinhas em relacionamentos estáveis porque fazer isso implicaria numa falta de confiança. (E se a taxa de uso da camisinha sobe é possível que estejamos assistindo a um aumento do sexo casual ou comercial). Contudo, são essas relações sexuais que levam à piora da epidemia na África. Lá, a maior parte das infecções se dá na população em geral e não nos “grupos de alto risco”, como os “trabalhadores do sexo”, homens gays ou usuários de drogas injetáveis. E em significante proporção da população africana, as pessoas têm dois ou mais parceiros sexuais regulares ao mesmo tempo [who overlap in time]. Em Botswana, que tem um dos maiores índices de incidência de HIV, 43% dos homens e 17% das mulheres pesquisados tinham dois ou mais parceiros sexuais regulares no ano anterior.

Essa múltipla concomitância de parceiros sexuais se assemelha a uma gigantesca rede invisível de relacionamentos através da qual o HIV/AIDS se espalha. Um estudo em Malawi conclui que mesmo se o número médio de parceiros for levemente superior a dois, praticamente dois terços dessa população foi interconectada através dessa rede de relacionamentos sexuais.

Então, o que funcionou na África? Estratégias que quebraram essa rede de relacionamentos sexuais múltiplos concomitantes – ou, numa linguagem coloquial, mútua fidelidade monogâmica ou, ao menos, redução no número de parceiros, especialmente concomitantes. Celibato [closed] ou fidelidade poligâmica também podem funcionar.

No programa de prevenção lançado em Uganda, que começou em 1986, o foco foi Sticking to One Partner [“aderindo a um parceiro”] ou Zero Grazing (que significa  permanecer fiel dentro de um casamento poligâmico) e Loving Faithfully [“amar com fidelidade”]. Estas simples mensagens funcionaram. Mais recentemente, dois países com os maiores índices de infecção, Suazilândia e Botswana, lançaram campanhas que desencorajam as pessoas terem múltiplos e concomitantes parceiros sexuais.

Não me entendam mal: eu não sou anti-camisinha. Todas as pessoas deveriam ter pleno acesso à camisinha e ela deve sempre ser uma estratégia substituta para aqueles que não querem ou não conseguem permanecer em uma relação de mútua fidelidade. Este foi o ponto-chave no “Consenso de 2004” publicado e endossado por mais de 150 peritos em AIDS, incluindo representantes das Nações Unidas, Organização Mundial da Saúde e Banco Mundial. Estes peritos também afirmaram que para os adultos sexualmente ativos, a primeira prioridade deveria ser promover a mútua fidelidade. Além disso, liberais e conservadores concordaram que a camisinha não podem vencer os desafios que permanecem críticos na África, tais como o sexo entre gerações, a desigualdade de gênero e o fim da violência doméstica, estupro e coerção sexual.

Certamente é hora de se começar a prover uma prevenção da AIDS na África baseada mais em evidências.

O autor é pesquisador senior na Harvard School of Public Health.

Citando rapidamente

1. Em defesa de D. José Cardoso Sobrinho, texto do dr. Rodrigo Pedroso. “Apenas uma pequena minoria se posicionou contra o padrasto pelo crime cometido e menos ainda contra o aborto praticado. A sanha, o ódio, o xingatório se voltaram quase que exclusivamente contra Dom Cardoso Sobrinho e contra a Igreja Católica”. As considerações feitas pelo Dr. Rodrigo não são novas, mas são importantes e estão expostas de forma clara e concisa.

2. Papa está certo, sobre a AIDS. É uma versão em português da matéria aqui citada, “do médico e antropólogo Edward Green, uma das maiores autoridades mundiais no estudo das formas de combate à expansão da AIDS. Ele é diretor do Projeto de Investigação e Prevenção da AIDS (APRP, na sigla em inglês), do Centro de Estudos sobre População e Desenvolvimento da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. Uma das instituições educacionais mais prestigiadas do mundo”.

3. O Papa e a AIDS, artigo de Dom Fernando Rifan que está no site da CNBB! “A distribuição de preservativos, como solução para o problema, insinua e inclui como pressuposto a promiscuidade, uma das principais causas da AIDS, convidando ao desregramento sexual. O fim bom não justifica utilizar meios perversos. Evitar a AIDS é ótimo, mas fomentar a promiscuidade é péssimo. Não se estaria utilizando um inibidor para a AIDS – o preservativo – que, em última análise, pode se tornar causa desta mesma doença? E depois chamam de irresponsável a quem dá um grito de alerta. O Papa João Paulo II já havia advertido: “o uso dos preservativos acaba estimulando, queiramos ou não, uma prática desenfreada do sexo”. Propagar a promiscuidade é um meio de propagar a AIDS”.

Ainda o Papa e os preservativos

Para a mídia tupiniquim, o Papa “distorce fatos sobre preservativos”. Cita-se, com muita pompa, a “respeitada revista médica Lancet” para dizer que o Papa vai na contramão da ciência e – ainda mais! – que precisaria “se retratar” (parece que agora virou moda exigir retratações) por ter tido a ousadia de questionar a borracha salvadora da humanidade:

“Quando qualquer pessoa influente, seja um líder religioso ou político, faz uma falsa declaração científica que pode ser devastadora para a saúde de milhões de pessoas, ela deve se retratar ou corrigir os registros públicos”, disse o editorial.

O que não sai na mídia tupiniquim – óbvio – é o pronunciamento de Edward Green, diretor da AIDS Prevention Research Project at the Harvard Center for Population and Development Studies, que concorda integralmente com o que falou o Papa Bento XVI. Segundo ele:

“Há”, Green acrescenta, “uma associação consistente mostrada por nossos melhores estudos, inclusive o U.S.-funded Demographic Health Surveys, entre maior disponibilidade e uso de preservativos e uma maior (não menor) taxa de infecção por HIV. Isto pode ser em parte graças a um fenômeno conhecido como compensação de risco, o que significa que, quando alguém usa uma ‘tecnologia’ de redução de risco (como camisinhas), com freqüência este benefício (da redução do risco) é perdido por [este alguém] ‘compensar’ ou ‘assumir’ maiores riscos do que alguém assumiria sem a tecnologia de redução de risco”.

Curioso, não?

Ah! Outra coisa: os bispos dos Camarões deixaram claro que as declarações do Papa Bento XVI, ao contrário do que foi noticiado, não provocaram nenhum mal-estar no país africano. E acusaram o Ocidente de “desinformar” sobre a visita do Papa…