Pe. Edson sobre o caso da menina grávida.

[Reproduzo o seguinte post na íntegra, dada a sua capital importância no recente caso da menina de nove anos grávida, que culminou com o assassinato dos seus dois filhos gêmeos e a execração pública da única voz a se levantar na defesa dos dois irmãos, o Arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso. Trata-se de um texto escrito pelo pe. Edson, pároco de Alagoinha, que nos traz alguns fatos que a grande mídia faz questão de não mostrar.]

GRÁVIDA DE GÊMEOS EM ALAGOINHA

O lado que a imprensa deixou de contar

Há cerca de oito dias, nossa cidade foi tomada de surpresa por uma trágica notícia de um acontecimento que chocou o país: uma menina de 9 anos de idade, tendo sofrido violência sexual por parte de seu padrasto, engravidou de dois gêmeos. Além dela, também sua irmã, de 13 anos, com necessidade de cuidados especiais, foi vitima do mesmo crime. Aos olhos de muitos, o caso pareceu absurdo, como de fato assim também o entendemos, dada a gravidade e a forma como há três anos isso vinha acontecendo dentro da própria casa, onde moravam a mãe, as duas garotas e o acusado.

O Conselho Tutelar de Alagoinha, ciente do fato, tomou as devidas providências no sentido de apossar-se do caso para os devidos fins e encaminhamentos. Na sexta-feira, dia 27 de fevereiro, sob ordem judicial, levou as crianças ao IML de Caruaru-PE e depois ao IMIP (Instituto Médico Infantil de Pernambuco), de Recife a fim de serem submetidas a exames sexológicos e psicológicos. Chegando ao IMIP, em contato com a Assistente Social Karolina Rodrigues, a Conselheira Tutelar Maria José Gomes, foi convidada a assinar um termo em nome do Conselho Tutelar que autorizava o aborto. Frente à sua consciência cristã, a Conselheira negou-se diante da assistente a cometer tal ato. Foi então quando recebeu das mãos da assistente Karolina Rodrigues um pedido escrito de próprio punho da mesma que solicitava um “encaminhamento ao Conselho Tutelar de Alagoinha no sentido de mostrar-se favorável à interrupção gestatória da menina, com base no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) e na gravidade do fato”. A Conselheira guardou o papel para ser apreciado pelos demais Conselheiros colegas em Alagoinha e darem um parecer sobre o mesmo com prazo até a segunda-feira dia 2 de março. Os cinco Conselheiros enviaram ao IMIP um parecer contrário ao aborto, assinado pelos mesmos. Uma cópia deste parecer foi entregue à assistente social Karolina Rodrigues que o recebeu na presença de mais duas psicólogas do IMIP, bem como do pai da criança e do Pe. Edson Rodrigues, Pároco da cidade de Alagoinha.

No sábado, dia 28, fui convidado a acompanhar o Conselho Tutelar até o IMIP em Recife, onde, junto à conselheira Maria José Gomes e mais dois membros de nossa Paróquia, fomos visitar a menina e sua mãe, sob pena de que se o Conselho não entregasse o parecer desfavorável até o dia 2 de março, prazo determinado pela assistente social, o caso se complicaria. Chegamos ao IMIP por volta das 15 horas. Subimos ao quarto andar onde estavam a menina e sua mãe em apartamento isolado. O acesso ao apartamento era restrito, necessitando de autorização especial. Ao apartamento apenas tinham acesso membros do Conselho Tutelar, e nem tidos. Além desses, pessoas ligadas ao hospital. Assim sendo, à área reservada tiveram acesso naquela tarde as conselheiras Jeanne Oliveira, de Recife, e Maria José Gomes, de nossa cidade.

Com a proibição de acesso ao apartamento onde menina estava, me encontrei com a mãe da criança ali mesmo no corredor. Profunda e visivelmente abalada com o fato, expôs para mim que tinha assinado “alguns papéis por lá”. A mãe é analfabeta e não assina sequer o nome, tendo sido chamada a pôr as suas impressões digitais nos citados documentos.

Perguntei a ela sobre o seu pensamento a respeito do aborto. Valendo-se se um sentimento materno marcado por preocupação extrema com a filha, ela me disse da sua posição desfavorável à realização do aborto. Essa palavra também foi ouvida por Robson José de Carvalho, membro de nosso Conselho Paroquial que nos acompanhou naquele dia até o hospital. Perguntei pelo estado da menina. A mãe me informou que ela estava bem e que brincava no apartamento com algumas bonecas que ganhara de pessoas lá no hospital. Mostrava-se também muito preocupada com a outra filha que estava em Alagoinha sob os cuidados de uma família. Enquanto isso, as duas conselheiras acompanhavam a menina no apartamento. Saímos, portanto do IMIP com a firme convicção de que a mãe da menina se mostrava totalmente desfavorável ao aborto dos seus netos, alegando inclusive que “ninguém tinha o direito de matar ninguém, só Deus”.

Na segunda-feira, retornamos ao hospital e a história ganhou novo rumo. Ao chegarmos, eu e mais dois conselheiros tutelares, fomos autorizados a subirmos ao quarto andar onde estava a menina. Tomamos o elevador e quando chegamos ao primeiro andar, um funcionário do IMIP interrompeu nossa subida e pediu que deixássemos o elevador e fôssemos à sala da Assistente Social em outro prédio. Chegando lá fomos recebidos por uma jovem assistente social chamada Karolina Rodrigues. Entramos em sua sala eu, Maria José Gomes e Hélio, Conselheiros de Alagoinha, Jeanne Oliveira, Conselheira de Recife e o pai da menina, o Sr. Erivaldo, que foi conosco para visitar a sua filha, com uma posição totalmente contrária à realização do aborto dos seus netos. Apresentamo-nos à Assistente e, ao saber que ali estava um padre, ela de imediato fez questão de alegar que não se tratava de uma questão religiosa e sim clínica, ainda que este padre acredite que se trata de uma questão moral.

Perguntamos sobre a situação da menina como estava. Ela nos afirmou que tudo já estava resolvido e que, com base no consentimento assinado pela mãe da criança em prol do aborto, os procedimentos médicos deveriam ser tomados pelo IMI dentro de poucos dias. Sem compreender bem do que se tratava, questionei a assistente no sentido de encontrar bases legais e fundamentos para isto. Ela, embora não sendo médica, nos apresentou um quadro clínico da criança bastante difícil, segundo ela, com base em pareceres médicos, ainda que nada tivesse sido nos apresentado por escrito.

Justificou-se com base em leis e disse que se tratava de salvar apenas uma criança, quando rebatemos a idéia alegando que se tratava de três vidas. Ela, desconsiderando totalmente a vida dos fetos, chegou a chamá-los em “embriões” e que aquilo teria que ser retirado para salvar a vida da criança. Até então ela não sabia que o pai da criança estava ali sentado ao seu lado. Quando o apresentamos, ela perguntou ao pai, o Sr. Erivaldo, se ele queria falar com ela. Ele assim aceitou. Então a assistente nos pediu que saíssemos todos de sua sala os deixassem a sós para a essa conversa. Depois de cerca de vinte e cinco minutos, saíram dois da sala para que o pai pudesse visitar a sua filha. No caminho entre a sala da assistente e o prédio onde estava o apartamento da menina, conversei com o pai e ele me afirmou que sua idéia desfavorável ao aborto agora seria diferente, porque “a moça me disse que minha filha vai morrer e, se é de ela morrer, é melhor tirar as crianças”, afirmou o pai quase que em surdina para mim, uma vez que, a partir da saída da sala, a assistente fez de tudo para que não nos aproximássemos do pai e conversássemos com ele. Ela subiu ao quarto andar sozinha com ele e pediu que eu e os Conselheiros esperássemos no térreo. Passou-se um bom tempo. Eles desceram e retornamos à sala da assistente social. O silêncio de que havia algo estranho no ar me incomodava bastante. Desta vez não tive acesso à sala. Porém, em conversa com os conselheiros e o pai, a assistente social Karolina Rodrigues, em dado momento da conversa, reclamou da Conselheira porque tinha me permitido ver a folha de papel na qual ela solicitara o parecer do Conselho Tutelar de Alagoinha favorável ao aborto e rasgou a folha na frente dos conselheiros e do pai da menina. A conversa se estendeu até o final da tarde quando, ao sair da sala, a assistente nos perguntava se tinha ainda alguma dúvida. Durante todo o tempo de permanência no IMIP não tivemos contato com nenhum médico. Tudo o que sabíamos a respeito do quadro da menina era apenas fruto de informações fornecidas pela assistente social. Despedimo-nos e voltamos para nossas casas. Aos nossos olhos, tudo estava consumado e nada mais havia a fazer.

Dada a repercussão do fato, surge um novo capítulo na história. O Arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife, Dom José Cardoso, e o bispo de nossa Diocese de Pesqueira, Dom Francisco Biasin, sentiram-se impelidos a rever o fato, dada a forma como ele se fez. Dom José Cardoso convocou, portanto, uma equipe de médicos, advogados, psicólogos, juristas e profissionais ligados ao caso para estudar a legalidade ou não de tudo o que havia acontecido. Nessa reunião que se deu na terça-feira, pela manhã, no Palácio dos Manguinhos, residência do Arcebispo, estava presente o Sr. Antonio Figueiras, diretor do IMIP que, constatando o abuso das atitudes da assistente social frente a nós e especialmente com o pai, ligou ao hospital e mandou que fosse suspensa toda e qualquer iniciativa que favorecesse o aborto das crianças. E assim se fez.

Um outro encontro de grande importância aconteceu. Desta vez foi no Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, na tarde da terça-feira. Para este, eu e mais dois Conselheiros, bem como o pai da menina formos convidados naquela tarde. Lá no Tribunal, o desembargador Jones Figueiredo, junto a demais magistrados presentes, se mostrou disposto a tomar as devidas providências para que as vidas das três crianças pudessem ser salvas. Neste encontro também estava presente o pai da criança. Depois de um bom tempo de encontro, deixamos o Tribunal esperançosos de que as vidas das crianças ainda poderiam ser salvas.

Já a caminho do Palácio dos Manguinhos, residência do Arcebispo, por volta das cinco e meia da tarde, Dom José Cardoso recebeu um telefonema do Diretor do IMIP no qual ele lhe comunicava que um grupo de uma entidade chamada Curumins, de mentalidade feminista pró-aborto, acompanhada de dois técnicos da Secretaria de Saúde de Pernambuco, teriam ido ao IMIP e convencido a mãe a assinar um pedido de transferência da criança para outro hospital, o que a mãe teria aceito. Sem saber do fato, cheguei ao IMIP por volta das 18 horas, acompanhado dos Conselheiros Tutelares de Alagoinha para visitar a criança. A Conselheira Maria José Gomes subiu ao quarto andar para ver a criança. Identificou-se e a atendente, sabendo que a criança não estava mais na unidade, pediu que a Conselheira sentasse e aguardasse um pouco, porque naquele momento “estava havendo troca de plantão de enfermagem”. A Conselheira sentiu um clima meio estranho, visto que todos faziam questão de manter um silêncio sigiloso no ambiente. Ninguém ousava tecer um comentário sequer sobre a menina.

No andar térreo, fui informado do que a criança e sua mãe não estavam mais lá, pois teriam sido levadas a um outro hospital há pouco tempo acompanhadas de uma senhora chamada Vilma Guimarães. Nenhum funcionário sabia dizer para qual hospital a criança teria sido levada. Tentamos entrar em contato com a Sra. Vilma Guimarães, visto que nos lembramos que em uma de nossas primeiras visitas ao hospital, quando do assédio de jornalistas querendo subir ao apartamento onde estava a menina, uma balconista chamada Sandra afirmou em alta voz que só seria permitida a entrada de jornalistas com a devida autorização do Sr. Antonio Figueiras ou da Sra. Vilma Guimarães, o que nos leva a crer que trata-se de alguém influente na casa. Ficamos a nos perguntar o seguinte: lá no IMIP nos foi afirmado que a criança estava correndo risco de morte e que, por isso, deveria ser submetida ao procedimentos abortivos. Como alguém correndo risco de morte pode ter alta de um hospital. A credibilidade do IMIP não estaria em jogo se liberasse um paciente que corre risco de morte? Como explicar isso? Como um quadro pode mudar tão repentinamente? O que teriam dito as militantes do Curumim à mãe para que ela mudasse de opinião? Seria semelhante ao que foi feito com o pai?

Voltamos ao Palácio dos Manguinhos sem saber muito que fazer, uma vez que nenhuma pista nós tínhamos. Convocamos órgãos de imprensa para fazer uma denúncia, frente ao apelo do pai que queria saber onde estava a sua filha.

Na manhã da quarta-feira, dia 4 de março, ficamos sabendo que a criança estava internada na CISAM, acompanhada de sua mãe. O Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (FUSAM) é um hospital especializado em gravidez de risco, localizado no bairro da Encruzilhada, Zona Norte do Recife. Lá, por volta das 9 horas da manhã, nosso sonho de ver duas crianças vivas se foi, a partir de ato de manipulação da consciência, extrema negligência e desrespeito à vida humana.Isto foi relatado para que se tenha clareza quanto aos fatos como verdadeiramente eles aconteceram. Nada mais que isso houve. Porém, lamentamos profundamente que as pessoas se deixem mover por uma mentalidade formada pela mídia que está a favor de uma cultura de morte. Espero que casos como este não se repitam mais.

Ao IMIP, temos que agradecer pela acolhida da criança lá dentro e até onde pode cuidar dela. Mas por outro lado não podemos deixar de lamentar a sua negligência e indiferença ao caso quando, sabendo do verdadeiro quadro clínico das crianças, permitiu a saída da menina de lá, mesmo com o consentimento da mãe, parecendo ato visível de quem quer se ver livre de um problema.

Aos que se solidarizaram conosco, nossa gratidão eterna em nome dos bebês que a esta hora, diante de Deus, rezam por nós. “Vinde a mim as crianças”, disse Jesus. E é com a palavra desde mesmo Jesus que continuaremos a soltar nossa voz em defesa da vida onde quer que ela esteja ameaçada. “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham plenamente” (Jo, 10,10). Nisso cremos, nisso apostamos, por isso haveremos de nos gastar sempre. Acima de tudo, a Vida!

Pe. Edson Rodrigues
Pároco de Alagoinha-PE
padreedson@hotmail.com

Ainda sobre o aborto e a excomunhão

Alguns ligeiros esclarecimentos e comentários sobre o triste desfecho do caso das duas crianças que foram brutalmente assassinadas em Recife sob o beneplácito e – não raro – até mesmo apoio da opinião pública se fazem necessários, graças à enxurrada de “opiniões” desinformativas que estão circulando por aí, às quais é necessário contrapôr a verdade dos fatos.

Excomunhão é uma pena canônica da Igreja Católica que a Ela interessa e a mais ninguém; tem efeitos jurídicos dentro da Igreja, e dizer que, para a sociedade, “não faz diferença” estar ou não excomungado é dizer uma obviedade, dado que, no nosso país, o Direito Canônico é completamente estranho ao Direito Civil.

– Igualmente, querer impôr à Igreja como Ela deve agir e como deve deixar de agir, dizendo quais pessoas deveriam ser excomungadas e quais não deveriam, é uma impropriedade e uma clara intromissão de estranhos em assuntos que não conhecem e que extrapolam a sua competência. A Igreja não é a casa da Mãe Joana onde todo mundo mete o bedelho e qualquer um pode dar opinião; rege-se Ela pelo Direito Canônico, e não pela [má] vontade de fulanos e sicranos que só se lembram da Igreja quando é para descer o sarrafo n’Ela. Citando um só exemplo de vários que poderiam ser trazidos, o senhor presidente da República: “Como cristão e como católico, lamento profundamente que um bispo da Igreja Católica tenha um comportamento conservador como este”. Sem comentários.

Excomunhão não significa “passaporte para o inferno”; de acordo com o Código de Direito Canônico, cân. 1331, “§1. Ao excomungado proíbe-se 1°- ter qualquer participação ministerial na celebração do sacrifício da Eucaristia ou em quaisquer outras cerimônias de culto; 2°- celebrar sacramentos ou sacramentais e receber os sacramentos; 3°- exercer quaisquer ofícios, ministérios ou encargos eclesiásticos ou praticar atos de regime; […] §2. Se a excomunhão tiver sido imposta ou declarada, o réu: 1° – se pretende agir contra a prescrição do § 1, n. 1, deve ser afastado, ou então deve ser suspensa a ação litúrgica, a não ser que grave causa o impeça; 2° – pratica invalidamente os atos de regime que de acordo com o § 1, n. 3, são ilícitos; 3° – fica proibido de gozar dos privilégios anteriormente concedidos; 4° – não pode conseguir validamente dignidade, ofício ou qualquer outro encargo na Igreja; 5° – não percebe os frutos de dignidade, ofício, encargo ou pensão que tenha na Igreja”. Ou seja, como foi já dito, trata-se de uma pena canônica cujos efeitos são muito bem especificados, e o “passaporte para o inferno” não consta entre eles.

– Tampouco a excomunhão é uma pena irreversível; havendo arrependimento, é possível ao penitente, por meio do Sacramento da Confissão, receber o perdão de Deus e o levantamento das penas canônicas (inclusive a excomunhão) nas quais porventura ele tenha incorrido.

– O Arcebispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, não excomungou ninguém; a excomunhão automática para quem pratica aborto está tipificada no Código de Direito Canônico, e aplica-se indistintamente a qualquer católico, quer haja pronunciamento da autoridade competente (no caso, o Bispo), quer não. Segundo o Código, cân. 1398, “[q]uem provoca aborto, seguindo-se o efeito, incorre em excomunhão latae sententiae”. Portanto, os que provocaram o aborto da menor, em Recife, incorreram na excomunhão automática que está prevista pelo Código de Direito Canônico (e que vale para toda a Igreja), e não numa suposta excomunhão que tenha sido aplicada pelo Arcebispo. Dom José apenas comunicou que os assassinos de crianças e seus cúmplices já haviam incorrido – desde a morte dos fetos – na excomunhão prevista pelo Direito Canônico.

– A criança de nove anos, obviamente, não está excomungada, por diversos motivos, bastando citar aqui o mais evidente: segundo o Código, cân. 1323, “[n]ão é passível de nenhuma pena, ao violar lei ou o preceito (…) quem ainda não completou dezesseis anos de idade”.

– A mera constatação de um fato (no caso, da excomunhão), feita pelo Arcebispo de Olinda e Recife, não significa, de modo algum, que a Igreja não se preocupe com a saúde da menina, nem que não dê a devida importância ao crime bárbaro do estupro, nem que deseje impôr um sofrimento à família, nem nada parecido. A existência de um crime bárbaro, por ninguém negado – o estupro – não faz com que seja moralmente lícito praticar um outro crime horrendo – o assassinato das duas crianças. Igualmente, dizer que é errado assassinar crianças não implica, sob nenhuma ótica minimamente racional, que se esteja relativizando a gravidade dos outros aspectos envolvidos (o estupro, a possibilidade de risco para a criança, etc).

– Para saber mais, aqui, no Deus lo Vult!, “Estão excomungados” (comentários), onde a discussão já desde ontem está correndo; igualmente, “O bufão da Globo” (comentários), sobre os infelizes comentários do Jabor sobre o assunto.

Cronologia de um assassinato

26 de fevereiro de 2009: Padrasto suspeito de engravidar enteada de nove anos. Menina espera gêmeos.

28 de fevereiro de 2009: Família de criança grávida autoriza aborto. [nota: aparentemente, “família” aqui significa apenas a mãe da criança]

01 de março de 2009: Menina de nove anos grávida de gêmeos continua internada para aborto.

02 de março de 2009: Denunciei aqui o assassinato em curso.

02 de março de 2009: Pai da menina é evangélico e contrário ao assassinato dos netos; aborto da menina estuprada pelo padrasto nas mãos da justiça.

03 de março de 2009: Elogiei aqui o exemplo comovente de um pai.

03 de março de 2009: Mãe pede alta [do IMIP] da menina estuprada por padrasto. [nota: aparentemente, a mãe – em decisão unilateral e à revelia do pai – tirou a criança do IMIP para que ela abortasse]

03 de março de 2009 [noticiado no dia seguinte]: Dom José luta contra aborto da menina. Sobre o mesmo assunto: Igreja vai denunciar aborto ao Ministério Público. [nota: aparentemente, as ONGs abortistas eram as mais interessadas em fazer com que o aborto fosse realizado o mais depressa possível]

04 de março de 2009: Menina de nove anos estuprada pelo padrasto é submetida a aborto em Recife. Sobre o mesmo assunto: Menina de nove anos aborta gêmeos. Aqui no Deus lo Vult!, ri-se Satanás.

Kyrie, eleison.
R.I.P.

Exemplo comovente de um pai

Foi com tristeza que comentei ontem aqui a existência de um assassinato em curso: uma garota de nove anos, estuprada pelo padrasto e grávida de gêmeos, estava na iminência de iniciar um processo de aborto autorizado pela mãe. No último instante, porém, aconteceu uma coisa extraordinária (que eu só fiquei sabendo hoje): o pai da menina é evangélico e disse ser contrário ao assassinato de seus netos! Diz o Jornal do Commercio que, “com a divergência entre os pais, a situação será decidida por um juiz da infância e da juventude”.

Não confio, absolutamente, nos “juízes de infância e juventude” que nós temos, nem tampouco nos “médicos” do IMIP (aliás, o Diário de Pernambuco disse hoje que o procedimento abortivo já começou e “pode levar dias”… Kyrie, eleison!). Mas existem algumas coisas sobre este caso que precisam ser ponderadas, além daquelas que eu já comentei em resposta ao Steven no post de ontem.

Antes de mais nada, vale a pena salientar que estamos diante da mais extrema situação de “aborto justificável” que os abortistas poderiam desejar, porque esta garota reúne em si virtualmente todos os [pseudo-]argumentos tradicionalmente utilizados pelos defensores do assassinato de bebês: é uma criança, foi estuprada, a gravidez é de risco. Impressionante como quase todos os “motivos” ad nauseam alegados pelos abortistas encontram-se personificados nesta menina que está internada em um hospital daqui de Recife!

Exatamente por isso, merece extremo louvor o pai da criança que, evangélico, declarou-se contra o assassinato dos bebês. Ele não se declarou simplesmente contrário ao aborto: com esta atitude heróica, ele deu um eloqüente testemunho contra quaisquer “argumentos” abortistas, já que se trata de uma filha dele, criança, que foi violentada, que leva uma gravidez de risco. Tentação maior para se optar pelo caminho “mais fácil” eu não conseguiria imaginar; no entanto, o pai da menina acredita no valor da vida, e acredita que nem mesmo a conjunção de todos os sofismas abortistas juntos é capaz de justificar o assassinato de inocentes. Ainda há pais verdadeiros neste mundo!

Se não for moralmente aceitável que esta criança aborte os seus filhos (como o pai dela acredita, e como eu acredito), então o aborto nunca é aceitável, porque situação mais difícil do que essa não poderá existir. Os abortistas sabem disso, e portanto precisam fazer de tudo para cativar as pessoas e fazê-las acreditar que, neste caso, o aborto é a solução mais perfeita e mais razoável, mais humana e mais sensata. Não surpreendentemente, o Jornal do Commercio aproveitou a reportagem já citada para fazer uma enquete sobre o aborto – em cuja vitória ele certamente confia – e divulgar um especial sobre o assassinato de crianças. “Uma mulher morre a cada três minutos no mundo por aborto inseguro; são 35  a 50 milhões de interrupções por ano; no Brasil, são mais de um milhão de abortos, entre espontâneos e provocados; (…) o aborto é a quarta causa de mortalidade materna no País”. Que primor de jornalismo sério e de imparcialidade!

Contra o blá-blá-blá, contudo, existe um pai, aqui em Pernambuco, que tem uma filha grávida, correndo risco com a gravidez, criança de nove anos de idade, violentada; mesmo com tudo isso, este pai é contra o aborto. Provavelmente nenhum dos abortistas que encontramos tagarelando por aí jamais passou por uma situação nem mesmo próxima dessa! No entanto, é o homem que sofre na pele tudo isso que tem a coragem de se dizer contrário ao assassinato de bebês. Que belíssimo exemplo! Rezemos por este pai, e rezemos pelas três crianças pernambucanas que estão no centro desta polêmica toda: a mãe e os dois gêmeos. Que Deus Se compadeça de nós, e que a Virgem de Guadalupe, padroeira das Américas e protetora dos nascituros, seja em favor das três.

Assassinato em curso

A garota de nove anos que foi estuprada pelo padrasto e está grávida de gêmeos terá a qualquer momento – ou já teve – os seus filhos assassinados. O Diário de Pernambuco diz que ela continua internada esperando o aborto; o Jornal do Commercio, idem. A Folha de Pernambuco dá informações mais detalhadas: diz que a menina – que é de Alagoinha – “vai ter que interromper a gravidez de gêmeos”, que tomará medicamentos e, depois, submeter-se-á a uma curetagem.

Rezemos pelas três crianças: a que foi violentada e as que serão assassinadas. Rezemos, para que as pessoas não achem normal responder a violência com mais violência e, a estupros, reagir com assassinatos. Rezemos, para que Deus tenha misericórdia de nós todos, e Nossa Senhora livre o Brasil da maldição do aborto.

Devem as pessoas ser protegidas?

Diversas vezes me deparei com pessoas que me confrontaram e tentaram se desvencilhar dizendo coisas do tipo: “Bem, você teve sorte!”. Pode ter certeza de que minha sobrevivência não tem nada a ver com sorte. O fato de eu estar viva hoje tem a ver com as escolhas feitas pela nossa sociedade: pessoas que lutaram para que o aborto fosse ilegal em Michigan naquela época — mesmo em casos de estupro —, pessoas que lutaram para proteger a minha vida e pessoas que votaram a favor da vida. Eu não tive sorte. Fui protegida. E vocês realmente acham que nossos irmãos e irmãs que estão sendo abortados todos os dias simplesmente são “azarados”?

Esta é a história de uma garota chamada Rebecca Kiessling, uma americana que foi concebida em um estupro e cuja mãe não pôde abortá-la. Ela tem um site pró-vida na internet, em inglês; o trecho da sua história em epígrafe (os grifos são meus) foi obtido no blog do Julio Severo, e vale muito a leitura completa.

“Eu não tive sorte. Fui protegida” – que força têm estas palavras! Nos dias de hoje – em que as pessoas têm sérias dificuldades em fazer abstrações – é muitíssimo eloqüente que um “exemplo vivo” daquilo sobre o qual estamos falando venha a público para dar o seu testemunho. O pai desta garota é um estuprador serial que violentou a sua mãe: ela é fruto de um estupro. Acaso não seria digna de viver por causa disso?

É tremendamente desumano acreditar que a vida ou a morte das pessoas dependam simplesmente de “sorte”, e que nós não devemos fazer nada para protegê-las. “É escolha da mulher”… então, a vida de um ser humano está ao arbítrio da mulher? No fundo, a pergunta fundamental a ser respondida nas discussões sobre a descriminalização do aborto não têm nada a ver com os direitos das mulheres, nem com os direitos ao próprio corpo, nem com os direitos sexuais e reprodutivos, mas sim com esta questão capital: as pessoas devem ser protegidas ou não? É o direito à vida que está em jogo! Tergiversar para longe desta questão é falsear o que se está discutindo e procurar “vencer pelo cansaço”, afogando as questões relevantes num oceano de sofismas e futilidades.

Quando se defende a inviolabilidade da vida humana, quando se afirma insofismavelmente que crianças inocentes não podem ser assassinadas – independente da situação -, então podemos ter a nossa consciência tranqüila, na certeza de que o nosso discurso é coerente. Mas, quando nós começamos a abrir exceções, e dizemos que, em certos casos, certas vidas não merecem proteção… então, onde vamos parar? Se uma vida pode ser descartada, então por que outra também não poderia ser? Se alguns inocentes podem ser assassinados, por que outros não o poderiam? Ora, se a vida não é defendida em sua integridade, então ela não é defendida. A diferença entre uma clínica de abortos onde se matam crianças e um campo de concentração onde se matam judeus não é de essência e sim de grau. Não dá para, racionalmente, condenar o segundo e defender a primeira: tal aberração lógica, mais dia menos dia, vai fatalmente ruir.

Gado de matadouro

O Brasil é um país violento. Em praticamente qualquer lugar, sair de casa é estar com a terrível sombra da criminalidade pairando sobre nossas cabeças, qual ave de rapina procurando a sua presa. Ninguém parece fazer nada para solucionar o problema. Contudo, repetem-nos o tempo inteiro, como se fosse um novo mandamento dos tempos modernos: não reagirás.

O discurso é impressionantemente uniforme. “Em hipótese alguma tente reagir”, diz a VEJA. “Jamais reaja”, diz o site “Tudo sobre Segurança”. “[O] cidadão comum (…) não deve reagir à voz de assalto do criminoso”, diz uma reportagem d’O Globo. “A principal dica é nunca reagir”, tem até num site português!

Contudo, há quase duas semanas, uma garota sofreu uma tentativa de estupro aqui em Recife. Não seguiu o discurso das autoridades públicas. “Ele disse que ia me estuprar e depois me matar. Como ele ia me matar de todo jeito, o meu raciocínio foi que eu poderia até morrer, mas não iria deixar ele me estuprar. Foi aí que decidi. Reagi e comecei a brigar com ele”. E está viva, e bem, graças a Deus.

Incomoda-me que ninguém procure resolver o problema, e que tentem convencer todas as pessoas a serem gado de matadouro. A impressão passada é a de que as autoridades julgam ser possível até conviver com a criminalidade, mas jamais com uma vítima fatal da sua negligência. Como se a política de “minimizar os danos” servisse tão-somente para impedir as pessoas de verem com clareza e incompetência da segurança pública nacional.