Pelos lábios dela fala a voz da experiência

O mais recente rebuliço das redes sociais está sendo provocado por uma única feminista que, tendo abandonado a sororidade, resolveu dedicar a vida pública a desmascarar o feminismo tupiniquim. Não sei exatamente a trajetória dela entre o fim das atividades do Femen Brazil e a sua apoteótica irrupção pública ocorrida há algumas semanas; sei, no entanto, que a vida da Sara Winter nunca foi e nem tem sido fácil.

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Ela o conta no seu livro — Vadia, não! Sete vezes que fui traída pelo feminismo –, cujo lançamento foi na última segunda feira. Li-o, e a sensação que fica da leitura é um misto de repulsa e pena. São sete pequenos capítulos, bem curtos, nos quais a autora conta (com o devido cuidado na utilização de pseudônimos) algumas histórias escabrosas pelas quais ela própria passou no seu passado de militante feminista. A autoridade da testemunha ocular — mais forte até: da própria envolvida diretamente nos eventos relatados — transforma a obra em uma denúncia que importa, penso, conhecer e fazer conhecida. Contra ela não cola a velha estratégia de afirmar que são os “de fora”, malvados e invejosos, esbravejando falsamente contra “as mulheres” que não fazem senão lutar por seus direitos: trata-se de uma insider, de uma militante feminista, ela própria mulher também, que se entregou à luta feminista com uma invejável paixão — quase como se se tratasse de um ofício sagrado — e que depois, decepcionada com o que viu e viveu, rompe agora o silêncio trazendo à tona aquilo sobre o que é, hoje em dia, deselegante falar.

Outro dia eu dizia que não faz ninguém ser feminista o ser a favor do voto das mulheres, ou a favor de que elas possam estudar nas Universidades, ou contra os seus maridos espancarem-nas, ou coisas do tipo. Isto não faz ninguém ser feminista porque estas pautas pertencem à humanidade, e não a grupo sectário algum. Querer o bem das mulheres é característica dos seres humanos civilizados e decentes; e o maior logro do qual se aproveitam os movimentos sedizentes “feministas” é, justamente, rotular todos os que lhes são contrários como se fossem ogros ávidos por bater em mulheres, impedir-lhes o acesso à educação, tratar-lhes como coisas sem vontade própria ou qualquer outra barbaridade do tipo que — importante! — ninguém defende. Com esta tática depravada pretendem estes movimentos limpar o terreno da opinião pública para dar livre curso às suas pautas verdadeiras — como o aborto, por exemplo, esta sim uma reivindicação feminista por excelência. Ser “contra o feminismo”, portanto, geralmente não significa querer reduzir as mulheres ao status de escravas de seus pais/maridos. A maior parte das vezes significa coisas muito mais prosaicas como ser contra o assassinato de crianças indefesas no ventre de suas mães.

Ser “contra o feminismo” não significa deixar as mulheres entregues à própria sorte. Ao contrário até: querer ajudar verdadeiramente às mulheres implica em denunciar os movimentos que as instrumentalizam em prol de seus (dos movimentos) próprios interesses escusos. Querer ajudar as mulheres só é possível, em última instância, colocando-se firmemente contra o feminismo. É isto o que se evidencia quando as coisas são analisadas com mais vagar e menos emoção, e quando se percebe que as notas características dos movimentos que se dizem feministas — notas que os distinguem dos outros grupos e ideologias sociais — na verdade têm pouco ou nada a ver com as mulheres.

Foi isto, aliás, o que a Sara Winter descobriu. “Meu intuito é despertar as meninas para ficarem bem longe do feminismo”, diz a chamada da entrevista que ela concedeu recentemente a Zenit. E pelos lábios dela fala a voz da experiência, a voz do testemunho de quem viveu por quatro anos naquele mundo. A voz machucada de uma mulher extremamente ferida, cujo alerta outro intento não tem que poupar as meninas dos sofrimentos pelos quais ela própria teve que passar. É sábio dar-lhe ouvidos.

E atenção!, que não se trata de uma Santa Madalena arrependida saindo pelo mundo com ardor sobrenatural a pregar ousadamente o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo! É simplesmente uma garota machucada pelo movimento feminista, que teve a coragem de levantar a cabeça e tentar (re)construir a própria vida não mais sob as garras daquelas que tanto lhe fizeram mal — e, por isso, merece todo nosso respeito e consideração. A Sara não precisa, assim, de encômios e nem de maldições, não merece que se lhe atirem pedras e nem confetes: do que ela realmente precisa, sem dúvida, é de nossas orações. Ser feminista deixa marcas profundas no corpo e na alma, das quais não é nunca fácil se desvencilhar: e o que esta garota está fazendo em público é admirável. Ouçam a Sara. Ajudem a Sara. Rezem pela Sara.

O melhor protesto do Femen

Certas coisas são cômicas. O feminismo é um movimento tão revolucionário, mas tão revolucionário que, para afirmar com mais veemência a própria rebeldia, decidiu agora revoltar-se contra si mesmo. O mais recente eco do brado “Não me representa!” foi dado pelo Femen contra o próprio Femen. Ou, para ser mais exato, pelo Femen internacional contra o braço tupiniquim do movimento.

A notícia nos chegou pelo divertido título de «O Femen Brazil não nos representa, afirma líder de organização ucraniana». Em resumo, o fato é que a líder do movimento na Ucrânia disse que a ativista brasileira até então responsável pelas atividades do Femen no solo pátrio não pertence mais ao movimento. Por quê?

Alexandra Shevchenko, a ucraniana (“uma das fundadoras do Femen”, diz Zero Hora), expõe as suas razões: «A pessoa que nos representava, Sara Winter, e que tem sua própria conta no Facebook, o Femen Brazil, não faz parte do nosso grupo. Tivemos muitos problemas com ela. Ela não está pronta para ser líder. É uma pena, mas essa decisão faz parte do nosso crescimento como movimento honesto. O Femen Brazil não nos representa».

Sara Winter, a paulista, defende-se: «Elas queriam que eu contratasse um helicóptero para desenhar um símbolo do Femen no Cristo Redentor. Como iria fazer uma coisa dessas? Queriam que eu encontrasse uma cruz de madeira no Rio ou em São Paulo e serrasse, como elas fizeram em Kiev. Elas tinham muitas ideias absurdas que foram nos distanciando».

O que dizer disso tudo? Faço só três ligeiros comentários.

Primeiro, que este imbroglio nos revela, uma vez mais, que essas senhoritas não passam de vândalas arruaceiras, cujo propósito de vida se resume a perpetrar agressões cada vez mais absurdas (pichar o Cristo Redentor de helicóptero, sério?!) que qualquer pessoa civilizada não pensaria duas vezes antes de classificar como criminosas. Por não encontrarem ninguém com o mesmo grau de instinto criminoso aqui no Brasil, as celeradas da Ucrânia preferiram romper com o movimento local. O problema não é portanto ideológico, mas de praxis: não importa se a sra. Winter comunga ou não das mesmas idéias do movimento, se ela não está disposta a fazer as barbaridades que o Femen quer que ela faça, então ela não é boa o bastante para o grupo.

Segundo, que certamente não faltarão quem se disponha a defender as fundadoras. E, sob este aspecto concreto, elas não deixam de ter razão: se existe um grupo com certos objetivos e alguém não concorda com eles, nada mais lógico do que afirmar que esta pessoa não faz parte daquele grupo. Neste caso, quanto à coerência das baderneiras eu não tenho nada do que reclamar. Mas quando um outro grupo decide expulsar um membro que não se coaduna com os objetivos para os quais o grupo existe – por exemplo, quando um padre rebelde é excomungado pela Igreja por defender heresias -, não faltam pessoas que rapidamente se levantem contra esta intolerância obscurantista. Ora, onde estão estes baluartes da “liberdade de expressão” para defender a pobre da Sara Winter, que foi sumariamente expulsa do seu movimento por discordar das orientações da sua superiora?

Terceiro, que o Brasil certamente não perde nada com o fim dos “serviços” do Femen Brazil: que vá com Deus e nos deixe em paz! A srta. Alexandra garante que vai «reconstruir o Femen no Brasil» – não tenha pressa! Por enquanto, é motivo de júbilo saber que a metralhadora rotatória das revolucionárias acabou ferindo de morte as próprias companheiras. Se elas continuarem assim – que o bom Deus o permita! -, acabarão se auto-destruindo: e esta será de longe a melhor coisa que o Femen já terá feito pelas mulheres do século XXI.