CESEP, CNBB, CTEH’s, “orientação sexual” – onde andam os responsáveis?

Por email, uma amiga me envia a divulgação do curso “A vida: desafio à ciência, bíblia e bioética – do genoma às células tronco”, promovido pelo CESEP – “Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular”. Neste blog há uma divulgação com o cartaz do evento.

O problema aparece quando entramos na página do CESEP que apresenta este curso de verão. Lá, em “conteúdo”, podemos encontrar a seguinte palestra:

A revolução científica na biologia e genética. O projeto genoma e as células tronco embrionárias – uma nova fronteira na pesquisa genética: seus dilemas científicos, éticos e jurídicos.
Lygia da Veiga Pereira – Livre docente e pesquisadora na área de genética humana-USP – São Paulo – SP

Para quem não lembra da sra. Lygia Pereira, trata-se de pesquisadora da USP favorável ao uso de embriões humanos em pesquisas científicas. Oras, cabe perguntar: em quê, exatamente, esta senhora pode contribuir para uma formação “à luz da Bíblia, Teologia, Pastoral e do compromisso cristão na sociedade” – que é a forma como se apresenta o curso de verão do CESEP?

O curso foi divulgado. Está no site do CNLB, está também no site da PJMP. E ninguém vê problemas em uma pesquisadora que afronta totalmente a posição da Igreja referente ao uso de CTEH’s em pesquisas cientícas ser convidada para palestrar em um evento que, teoricamente, é direcionado também para o povo católico – uma vez que está sendo divulgado em meios católicos? O que é isso, vamos chamar Hitler para dar uma palestra sobre respeito ao povo judeu? Bruna Surfistinha para explicar a moral sexual católica? Por que raios, então, uma pesquisadora que trabalha com embriões humanos – em frontal discordância, repita-se, com o que ensina a Igreja – é convidada para fazer parte de um evento (teoricamente, repita-se) direcionado a católicos? Ou, então: por que meios de comunicação católicos divulgam um evento onde vai ser dada uma conferência por uma pesquisadora que discorda da posição da Igreja sobre o emprego de CTEH’s em pesquisas? Será que é pedir demais um mínimo de coerência?

O evento ocorreu entre os dias 09 e 16 de janeiro de 2011. Ao seu término, foi divulgado no site da CNBB um texto contendo os “Compromissos do Curso de Verão 2011”. No texto, não é feita nenhuma menção ao singelo fato de que a Igreja não admite pesquisas com células-tronco embrionárias humanas. Nem é apresentada a menor explicação para que a presença da Lygia Pereira neste evento. No entanto, encontro lá, entre os compromissos assumidos, a necessidade de se “superar[em] discriminações de gênero, cor, raça, deficiência física, orientação sexual” (!). Agora expliquem-me como é que a “discriminação” por “orientação sexual” foi parar entre os compromissos firmados num curso cujo tema era “do genoma às células-tronco”!

A própria existência das pesquisas da sra. Lygia Pereira é, de per si, um fato já bastante lamentável. Que esta senhora seja conferencista em um curso de bioética ecumênico, já se transforma em um terrível escândalo. Agora, que meios de comunicação católicos – incluindo aí o próprio site da CNBB – divulguem e elogiem esta palhaçada, aí já ultrapassa todos os limites do tolerável. Repito-me: será que é pedir demais um pouco de coerência? Será que os católicos não podem se ocupar simplesmente em divulgar o que é católico e criticar o que é contrário à Igreja? Quem são os responsáveis por semear a confusão no meio do povo de Deus? E onde estão as sentinelas responsáveis por zelar pela doutrina da Igreja, que parecem não fazer nada?

A criação da vida artificial

Não tenho muito tempo agora, mas é só para comentar en passant um assunto ao qual eu provavelmente terei que voltar depois: Vida sintética criada pela 1a vez. Pelo que entendi, um cientista projetou um genoma em computador, sintetizou, colocou em uma “carcaça” de bactéria (i.e., retirou o DNA “original” dela) e o bicho “funcionou” – a bactéria começou a se comportar de acordo com o DNA novo.

Bom, antes de mais nada, remeto ao lúcido texto da Lenise Garcia sobre o assunto, publicado na Gazeta do Povo. “Venter está ‘brincando de Deus’? Nem tanto. Afinal, o homem gera novas espécies de plantas e vegetais há muito tempo, fazendo cruzamentos”. As exaltações são até justificáveis, uma vez que o avanço científico é sem dúvidas notável; mas não há motivos para se colocar os carros na frente dos bois, ou – pior ainda – enxergar nos experimentos de Venter coisas que não estão lá.

Quais as grandes novidades do resultado? Ao que me conste, já se sabia o que era um genoma. Já se tinha noção de como ele funcionava. Já se sabia que o DNA, grosso modo, é um polímero bem grande, e já se sabia que polímeros podem ser sintetizados. A novidade, portanto, ao que parece, é que isso pela primeira vez foi feito.

Não acompanhei a pesquisa e não sei exatamente quais eram as dúvidas que os cientistas tinham, nem quais as linhas de pesquisa que se abrem agora, as próximas barreiras a serem ultrapassadas, os objetivos visados, ou nada disso. Quais as implicações teológicas desta descoberta, é o assunto que nos toca mais proximamente. Sobre estas, volto a escrever em breve.

Papa, Trindade e Genoma

La prova più forte che siamo fatti ad immagine della Trinità è questa: solo l’amore ci rende felici, perché viviamo in relazione per amare e viviamo per essere amati. Usando un’analogia suggerita dalla biologia, diremmo che l’essere umano porta nel proprio “genoma” la traccia profonda della Trinità, di Dio-Amore.
– Bento XVI, Angelus, 07 de junho de 2009

Estas foram as palavras do Papa, na saudação do Angelus dominical, feita no domingo passado, Festa da Santíssima Trindade. G1 não perdeu tempo para publicar: Papa diz que homem tem em seu genoma marca profunda da Trindade.

Às vezes eu fico me perguntando o que passa pela cabeça de alguns jornalistas, porque parece que eles têm o dom de fazer os comentários mais irrelevantes possíveis sobre as palavras do Santo Padre. A leitura de uma matéria como essa me passa a forte impressão de que o autor dela “pescou” frases aleatórias do Papa e as distribuiu ao acaso formando uma colcha de retalhos sem nenhum significado.

Ao invés de traduzirem frases aleatórias, um serviço jornalístico muito mais útil seria se eles traduzissem a íntegra do pronunciamento de Bento XVI no Angelus. Aí, sim, poderíamos falar em uma informação que faz sentido. Ao apresentar frases desconexas com uma manchete nonsense, a imprensa não está fazendo o papel de informar os leitores.

Ainda mais se considerarmos que o Angelus dominical é… dominical. É um evento que se repete todas as semanas, todos os domingos, não configurando de nenhuma maneira um acontecimento digno das manchetes sensacionalistas. Já imaginaram uma manchete do tipo “Papa reza Angelus ao meio-dia do Domingo, diante da Praça de São Pedro”? Uma manchete dessas não poderia ser colocada nos jornais. Daí eles precisam “inventar”, e pegar uma frase qualquer colhida ao acaso do pronunciamento do Papa, e colocá-la na manchete da reportagem como se fosse a coisa mais importante daquele texto.

E é claro que a analogia com a biologia – aliás, a manchete não diz que é uma analogia… – não é a parte mais importante do pronunciamento do Papa. “Solta” assim, aliás, ela perde completamente o sentido. Entretanto, a mídia ávida por novidades parece que não consegue se acostumar com a cadência romana, e talvez fosse pedir demais uma tradução semanal dos discursos de Bento XVI: os brasileiros que se informam sobre a Igreja na grande mídia precisam se contentar com fragmentos desconexos daquilo que ensina o Sucessor de Pedro.