Há tragédias em que não há mártires e monstros

É bastante lamentável, sob quaisquer aspectos, este assassinato seguido de suicídio no seio de uma família em Goiânia. Pelo que dizem as notícias, o pai se desentendeu com o filho porque ele — contra a vontade do pai — participava das invasões às universidades que estão ocorrendo no Brasil inteiro. O pai, depressivo, não aceitava; na última terça-feira, após uma discussão, perseguiu o estudante e disparou contra ele, na rua, atirando em si mesmo logo depois. Ambos morreram.

Já tratei aqui, obliquamente, sobre as invasões quando falei da ocorrida na Faculdade de Direito do Recife. Disse então que elas eram inadmissíveis por mais nobres que fossem as intenções dos estudantes, porque os fins não justificam os meios e não se pode admitir que crimes sejam instrumentos para manifestar discordâncias políticas. Por uma “causa nobre” — ou pelo menos por uma causa que acreditavam nobre — bombas foram explodidas em aeroportos brasileiros e pessoas sequestradas passaram anos mantidas em cativeiro nas selvas da Colômbia. Todo mundo acredita que a causa pela qual está lutando é nobre, obviamente; não fosse assim, nem se daria ao trabalho de lutar.

Aqui, na tragédia do pai que matou o próprio filho, não se trata contudo de desavença política. A coisa mais asquerosa foi encontrar, no Facebook, pessoas aproveitando a desgraça para dividir a sociedade entre mártires e monstros — com os “progressistas” desempenhando o primeiro papel, é lógico, e os “reacionários” o último. Contra estes é preciso dizer, com firmeza, duas coisas. Primeiro que é totalmente de se censurar esta tentativa de capitalizar politicamente uma tragédia que ceifou duas vidas humanas, levantando a bandeira das próprias posições ideológicas sobre os cadáveres ainda quentes de dois familiares e a dor atavicamente apartidária dos parentes e amigos.

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Segundo que a posição conservadora não parte dos mesmos pressupostos que movem sequestradores de civis e esbulhadores de prédios públicos. Para os que acham que seus ideais justificam a violação (p. ex.) do direito de ir-e-vir alheio pode ser tentador imaginar que, para um pai que discorda das posições políticas do filho, o assassinato seja uma opção a se considerar; isto, no entanto, diz mais sobre os que insinuam a tese do que sobre os seus desafetos. A sugestão é injuriosa e não corresponde à verdade: prova-o o próprio desenrolar dos fatos em cada caso.

Os invasores de escolas orgulham-se de sua “resistência”, jactam-se dos crimes que cometem. Em momento algum demonstram mudança de opinião ou arrependimento: em todos os seus atos são de uma convicção férrea. Fazem, assumem que fazem e dizem que fariam de novo. Nisso não se distinguem dos revolucionários que explodem civis ou cometem justiçamentos contra seus companheiros. A incapacidade de sentir remorso é talvez a marca mais brutalizadora da mentalidade revolucionária.

Coisa completamente diversa ocorreu em Goiânia. Aqui o crime não é ativismo; não é uma técnica calculada para atingir determinado objetivo político. Aqui é um crime passional por excelência, onde o pai, desequilibrado, tem um momento de loucura, um ímpeto de fúria e mata o próprio filho. Não suportando o horror, mata-se logo em seguida: o arrependimento é tremendo e chega ao extremo do atentado contra a própria vida. É uma tragédia verdadeiramente lancinante e, por isso, humanamente trágica. Não tem, em absoluto!, a coloração político-ideológica que lhe querem atribuir os abutres das redes sociais.

Uma família foi destruída e, diante disso, o senso de humanidade mais comezinho reclama um armistício. Não foi um “jovem revolucionário” brutalizado por um “velho conservador”, não foi a “velha direita” assassinando a “nova esquerda”: foi um pai que perdeu um filho e se perdeu, foi uma mãe que perdeu de uma vez só marido e filho. Que o ódio cego emudeça diante da dor; que, pelo menos dessa vez, não deixemos que as afinidades ou desavenças ideológicas prevaleçam sobre os laços de sangue e afeto. Uma Ave-Maria pelos que se foram e pelos que ainda têm de ficar! Que Deus tenha misericórdia dessa família e de todos nós.

O rei está nu!

Alvíssaras! A despeito dos descalabros do STF, ainda resta um mínimo de bom senso no judiciário brasileiro: um juiz de Goiás cancelou um registro de “união estável” feito por uma dupla de sodomitas em Goiânia. O gesto é pequeno – aliás, certamente será derrubado nas instâncias superiores – e o meritíssimo juiz provavelmente sofrerá, a partir de agora, a implacável perseguição da Gaystapo; mas tem uma força simbólica muito grande. Houve em Goiás quem não quisesse abaixar a cabeça diante dos despautérios que vêm de Brasília. Houve em Goiás quem se recusasse a queimar alguns grãozinhos de incenso diante dos deuses do Novo Olimpo. Houve em Goiás quem não abrisse mão da sua consciência nem da sua capacidade de pensar e, na contramão do mundo, afirmasse claramente que o branco é branco, a despeito do Supremo Tribunal Federal insistir em dizer que é preto. Houve em Goiás um juiz digno da toga que veste!

O magistrado [juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública Municipal e Registros Públicos de Goiânia, Jeronymo Pedro Villas Boas] contestou a decisão do Supremo, e disse que a Corte não tem competência para alterar normas da Constituição Federal. O artigo 226 traz em seu texto que, “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão”. Esta seria a norma que o juiz entendeu inviolável.

Alvíssaras! Para ser possível viver em sociedade, é fundamental haver respeito à autoridade e à hierarquia; mas existem algumas situações nas quais o absurdo é tão gritantemente manifesto (lembremo-nos de que o STF decretou que a Consituição era inconstitucional, agindo deliberadamente contra tanto a letra do texto constitucional quanto contra a manifesta intenção da Assembléia Constituinte) que os subordinados precisam se levantar contra os seus superiores e lhes chamar à razão. E assim teve a coragem de dizer um juiz em Goiás: “a Corte não tem competência para alterar normas da Constituição Federal”! Disse o que era evidente e que todo mundo já sabia, mas ninguém tivera ainda a coragem de o dizer; como, no conto, todos fingiam admirar a “roupa que os tolos não eram capazes de ver” do monarca envaidecido, e ninguém tinha coragem de gritar que o rei estava nu [créditos ao pe. Lodi pela analogia].

Enquanto isso, encerra-se o prazo de recurso para o PDC 224/2011 (que sustava “a aplicação da decisão do Supremo Tribunal Federal (…) que reconhece a entidade familiar da união entre pessoas do mesmo sexo”), e ninguém apresenta recurso. A matéria foi devolvida ao relator. Os gestos dos descontentes com o golpe de Estado dado pelo STF em 05 de maio p.p. são tímidos, como se houvesse um medo de ferir susceptibilidades ou de se parecer retrógrado, homofóbico… ou tolo. Mas os que mantêm o seu bom senso intacto perfazem a imensa maioria dos cidadãos de bem deste país, a despeito do que decidam onze lunáticos (não eleitos pelo povo, é sempre bom frisar) lá em Brasília. É preciso ter a coragem de defender os valores inegociáveis. É preciso mostrar o descontentamento com as arbitrariedades dos poderosos. É preciso gritar que o rei está nu.

A Escola Litúrgica da CAJU

Um amigo enviou-me por email uma pequena nota publicada no Sector Católico, sobre uma tal escola de liturgia brasileira “de Caju”, cujo conteúdo era o seguinte:

La Escola Litúrgica de Caju

Hoy SECTOR CATÓLICO publica un vídeo con nuevos abusos litúrgicos que se están produciendo en Brasil, en una mal llamada “escuela litúrgica” de Caju. Lamentable, pues, seguir permitiendo que sean los laicos los que, a su antojo, puedan decidir cambios en la estructura fundamental de la celebración sacramental de la Iglesia.

De seguir así las cosas, los fieles ya no podremos reconocer o diferenciar nuestra liturgia católica de otras que no lo son, y que, por tanto, no son capaces de transmitir el don de Dios, como canales ordinarios de la gracia divina que son.

Ya está bien. Los católicos nos merecemos algo mejor. Y por eso, recomendamos denunciar a las autoridades eclesiásticas este tipo de comportamientos, con el fin de que sean ellas las encargadas de actuar de oficio y poner orden en casa.

Juan Miguel Comas

Sem fazer a mínima idéia do que se tratava, ao chegar em casa vi que outro amigo havia encontrado o tal vídeo no youtube. Ei-lo:

Foi então que parte do mistério foi resolvido. Descobri no youtube que a tal escola litúrgica “da CAJU” era a  “Escola de Liturgia da Casa da Juventude Pe. Burnier, Goiânia/GO”. Procurando um pouco mais na internet, descobri no site da Casa da Juventude o convite para a “Escola de Liturgia para Jovens” de 2009! Em pleno século XXI, encontrar uma assombração dessas, fantasma das trevas libertacionárias, chega a ser frustrante.

O escândalo atravessou o oceano e chegou à Espanha. Os nossos irmãos católicos do outro lado do Atlântico recomendaram denunciar às autoridades eclesiásticas este tipo de comportamento, a fim de que elas ponham ordem na casa. Faço coro ao pedido. Coisas como “uma forma celebrativa de rosto orante, jovem e inculturada”, “vivência do Laboratório Litúrgico”, “[a]ssembléia celebrante”, “dança na liturgia” e afins que se encontram na programação da tal escola são injustificáveis. Não precisamos de outra liturgia que não a da Santa Igreja. Para vencermos o caos litúrgico hoje reinante, é fundamental que sejamos diligentes em apagar os focos de incêndio. O email de Sua Excelência Reverendíssima Dom Washington Cruz disponível no site da CNBB é dwcruz@uol.com.br e, o da cúria, curia@arquidiocesedegoiania.org.br. Sinceramente, não merecemos isso. Os jovens têm muito mais a oferecer.

Expulsando os lobos do redil

Não me incomodam tanto as pessoas que atacam a Igreja estando fora d’Ela. O que realmente me tira do sério são aqueles que se dizem “católicos” e, mesmo assim, fazem tudo de maneira diametralmente oposta àquilo que a Igreja ensina e pede. O mau testemunho que estas pessoas dão, o escândalo, as feridas que se disseminam por todo o Corpo Místico de Cristo – afinal, lembremo-nos da comunhão dos santos – são simplesmente terríveis. Tais pessoas terminam por “queimar o filme” da Igreja e, assim, afastar d’Ela as almas sinceras que buscam a Verdade que liberta, e que só na Igreja de Nosso Senhor pode ser encontrada em plenitude.

“Mas todo o que fizer cair no pecado a um destes pequeninos que crêem em mim, melhor lhe fora que uma pedra de moinho lhe fosse posta ao pescoço e o lançassem ao mar!”, disse Nosso Senhor no Evangelho (Mc 9, 42). Pode-se traduzir também “todo o que escandalizar a um destes pequeninos” – no latim de São Jerônimo, o verbo é scandalizaverit – e, na minha opinião, desta forma fica mais evidente o mal que é o escândalo. Comentando esta passagem do Evangelho, o Catecismo da Igreja diz o seguinte:

O escândalo reveste-se duma gravidade particular conforme a autoridade dos que o causam ou a fraqueza dos que dele são vítimas. Ele inspirou esta maldição a nosso Senhor: «Mas se alguém escandalizar um destes pequeninos que crêem em Mim, seria preferível que lhe suspendessem do pescoço a mó de um moinho e o lançassem nas profundezas do mar» (Mt 18, 6). O escândalo é grave quando é causado por aqueles que, por natureza ou em virtude da função que exercem, tem a obrigação de ensinar e de educar os outros. Jesus censura-o nos escribas e fariseus, comparando-os a lobos disfarçados de cordeiros.
[CIC 2285]

Todo este preâmbulo foi necessário para que eu comentasse um caso que eu vi no Jornal Nacional de ontem, sobre um padre “casado” que insistia em celebrar os Sacramentos mesmo estando suspenso de ordens. O padre Osiel dos Santos chegava mesmo a dizer: “o que eu faço não é com ordem da diocese”. Ou seja: estamos diante de um caso de deliberado e consciente desprezo à autoridade da Igreja de quem o padre recebeu o ministério sacerdotal!

Sejamos claros: ninguém é obrigado a ser católico. Para quem é católico, ninguém é obrigado a ser padre. No entanto, se o sujeito livremente se decide por ser católico e – ainda – por ser ordenado sacerdote, tem a obrigação de “seguir as regras do jogo”, e ter pelo menos um mínimo de coerência e de consideração à Igreja para cujo serviço ele foi ordenado. Ninguém tem o “direito” de ser sacerdote do Deus Altíssimo; uma vez que atinja este estado, portanto, é necessário esforçar-se para ser digno dele. Agir como lobo que dispersa as ovelhas e pôr-lhes as almas em risco quando se tinha o encargo de guardá-las e conduzi-las a Deus é uma atitude particularmente perversa. Foi a pessoas assim que Jesus dirigiu aquelas duras palavras dos Evangelhos citadas mais acima.

Os Sacramentos da Igreja não são todos iguais. A Eucaristia, por exemplo, é validamente celebrada mesmo por um padre que esteja suspenso de ordens – embora seja ilícita. Mas as confissões e os matrimônios são inválidos mesmo, porque são Sacramentos que exigem o exercício da jurisdição da Igreja – coisa que um padre suspenso não possui. Portanto, o padre Osiel estava não somente escandalizando os fiéis, mas também enganando-lhes ao lhes oferecer “teatros” de Sacramentos que não têm valor. Ele deveria dizer não somente que não age “com ordem da diocese”; deveria dizer claramente que está fazendo teatro e “celebrando” casamentos sem valor algum, dizendo ainda – para que as pessoas que o procuram pudessem entender – que um casamento em presença dele e em presença de ninguém eram a mesma coisa, ou seja, nada. Mas por que alguém que despreza a Igreja iria se preocupar com as almas dos fiéis que Ela tem a missão de guardar?

N’O Globo, foi publicada a mesma notícia com um outro detalhe que vale a pena mencionar:

– Eu sempre lutei pelo celibato opcional e pela ordenação de mulheres – diz Osiel.

Eis, portanto, as garras do lobo de fora. Embora o celibato seja uma disciplina da Igreja, é antiquíssima, e santa e santificante, e a Igreja já deixou claro (inclusive recentemente) que não pretende alterá-la (cf. Sacramentum Caritatis, 24); mas a ordenação de mulheres é uma impossibilidade doutrinária, que simplesmente não pode ser feita, como a Igreja também já o disse outras vezes. Mulheres não podem ser ordenadas, como papagaios não podem ser batizados ou pedras não podem ser crismadas. Em qualquer um dos casos o sacramento é inválido e é um sacrilégio. A função da mulher – importantíssima e insubstituível – na Igreja é outra; leiam a Mulieris Dignitatem! E não aceitemos que um padre, que deveria guiar os fiéis pelo estreito caminho da Salvação, despreze a dignidade feminina com base em um inexistente igualitarismo entre os gêneros.

O padre diz que não crê estar fazendo nada de errado. Sim, está, é claro que está. Está traindo a Igreja, escandalizando o povo fiel, oferecendo simulações de sacramentos no lugar dos sacramentos verdadeiros, defendendo disparates já há muito tempo condenados pela Igreja. No site da Arquidiocese, encontra-se um comunicado de Sua Excelência Reverendíssima Dom Washington Cruz, avisando a todas as pessoas que o padre Osiel não pode celebrar os Sacramentos. Graças a Deus, as pessoas estão se cansando dos escândalos, e os bispos estão agindo verdadeiramente como sentinelas que são, defendendo os fiéis católicos de tudo aquilo que pode colocar em risco a salvação de suas almas, e expulsando valentemente os lobos do meio das ovelhas. Rezemos pela Igreja, para que Ela tenha sempre santos pastores, dignos do grave encargo que lhes foi confiado.