Onde estudar doutrina católica?

Alguém me perguntou recentemente onde estudar doutrina católica. A pergunta, fazendo-me pensar talvez pela primeira vez em muito tempo sobre o assunto, fez-me perceber que não existem (mais) espaços virtuais de referência em catolicismo, como tais amplamente reconhecidos e capazes de pautar as discussões sobre determinados temas. Hoje tudo é muito pulverizado e, se por um lado há um ganho na amplitude dos assuntos acessíveis, por outro lado uma visão sistemática do todo exige, da parte do leitor, uma disciplina que a própria pulverização da informação torna cada vez mais difícil conseguir.

As coisas eram diferentes há uns dez anos atrás: tudo era muito mais, por assim dizer, concentrado. Os católicos estavam reunidos no canal #catolicos do IRC. Havia duas comunidades “Católicos” no Orkut, uma maior, e mais superficial, e outra, menor, voltada especificamente para dúvidas e debates. Havia dois grandes sites de referência em Catolicismo, o Veritatis Splendor e o da Associação Cultural Montfort. Havia a lista de emails do prof. Carlos Ramalhete, a tradicao-catolica. E praticamente era só.

Se alguém quisesse saber algo sobre um determinado assunto, os sites eram organizados tematicamente, sendo relativamente fácil encontrar o que se procurava. Se alguém tivesse alguma dúvida mais elaborada, a comunidade do Orkut era palco dos mais apaixonados debates — sobre temas não raro inéditos e, às vezes, bem espinhosos. A lista de emails do Yahoo Groups, por sua vez, também já abrigou as polêmicas católicas mais exaltadas que já trafegaram mediante TCP/IP. Em suma, havia uma grande concentração de esforços em um número restrito de espaços, o que tornava cada um deles um centro de excelência.

Hoje não. Primeiro porque, por incrível que pareça, as ferramentas que incentivam construção colaborativa de conhecimento são hoje mais raras do que nos primórdios da Web 2.0: o Facebook, convenhamos, é no máximo arena de propaganda, não comunidade de discussões. Segundo porque os blogs ocuparam o espaço dos grandes portais, e a proposta do blog é diferente daquela de um portal de referência: no próprio Deus lo Vult!, por exemplo, há sem dúvidas muito conteúdo de relativa qualidade, mas eu não posso dizer que, depois de quase uma década, haja suficiente sistematização dos textos aqui publicados. Se alguém chega agora e me pergunta o que já escrevi sobre um dado assunto, eu tenho pouca coisa a fazer além de recomendar o mecanismo de busca do site… Além do mais, os blogs, em regra projetos pessoais, costumam ter o estilo dos seus autores e o ritmo de sua disponibilidade particular, e um site que consegue manter uma boa equipe tende a possuir maiores versatilidade e constância.

Resumindo, a minha sincera impressão é a de que hoje a informação é muito mais completa e mais detalhada do que no início dos anos 2000, mas no entanto está muito mais espalhada — sendo, por isso, de muito mais difícil acesso.

Onde estudar então doutrina católica? Bom, pensando no assunto à luz do que falei acima, o que posso fazer é dar alguns conselhos que mimetizem, o quanto seja possível, a minha experiência particular da década passada. Se isso interessar a alguém, ótimo.

No tocante a dúvidas gerais sobre o Catolicismo envolvendo temas polêmicos, a sempre recomendada revista do saudoso D. Estêvão oferece uma espécie de apologética preambular. Os temas lá tratados, embora raramente sejam exauridos (até por conta dos limites de espaço), são contextualizados de modo bastante satisfatório para quem pretende entender os contornos gerais do problema. Muitas edições da revista estão disponíveis online e podem ser acessadas aqui. Desconheço se há alguma perspectiva de digitalizar os exemplares faltantes [p.s.: conforme informaram nos comentários, todo o acervo digitalizado da P&R está disponível no Scribd].

Para se obter uma visão ampla dos diversos ramos do Catolicismo o caminho mais simples é a leitura dos manuais — em português antigo, quase sempre xerocados ou, pior, em xerox digitalizadas. Para citar os mais facilmente encontráveis: Dogmática, Ludwig Ott; Moral, Del Greco, Royo Marín; Mística, Tanquerey. Também o Boulenger (Instrução Religiosa; Apologética) me foi muito útil nos proêmios do Catolicismo. Alguns sites que possuem obras valiosas disponíveis na íntegra são o Mercabá, o Alexandria Católica e o Obras Raras do Catolicismo: não deixem nunca de visitar, divulgar e colaborar com eles.

Livros clássicos, há-os muitos e é até difícil sistematizá-los aqui. Mais uma vez, com base unicamente na minha experiência particular, sem nenhuma sistematização mais rigorosa, sem pensar muito no assunto, os livros que tiveram maior relevância na minha formação foram: o Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem (São Luís de Montfort), A prática do amor a Jesus Cristo (Santo Afonso de Ligório), Filotéia (São Francisco de Sales), Ortodoxia (Chesterton), A Fé em Crise? (Vittorio Messori / Card. Ratzinger), A Imitação de Cristo (Tomás de Kempis), Confissões (Santo Agostinho), O Diálogo (Santa Catarina de Sena). Ao lado destes há um sem-número de outros cuja não-leitura até hoje perfaz talvez o aspecto mais embaraçoso da minha parca erudição, como a História de uma Alma (Santa Teresinha), o Castelo Interior (Santa Teresa), A alma de todo apostolado (Dom Chautard), As Grandes Heresias (Billoc), a Apologia Pro Vita Sua (Card. Newman), As três idades da vida interior (Garrigou-Lagrange) e tantos, tantos outros. Trata-se de lista que eu não tenho envergadura para elaborar.

Leituras demoradas e silenciosas de coisas antigas: em linhas gerais é isso. Reconheço que é uma receita muito diferente da sistemática atual, onde a Timeline tem uma efemeridade assustadora e onde as pessoas só parecem capazes de ler manchetes ou assimilar memes. Mas eu penso que a apreensão de um conhecimento sólido sobre o que quer que seja não condiz com a forma como se consome informação na internet atualmente. É preciso parar para ler algumas coisas que não fiquem mudando rapidamente na tela do computador ou do celular enquanto você olha para o lado: é preciso ler aquilo que tem suficiente estabilidade ao longo do tempo para valer a pena ser lido. Talvez essa não seja a única forma de se aprender doutrina católica, reconheço; mas serviu para mim e, portanto, talvez sirva para mais alguém.

“Um caminho fácil, curto, perfeito e seguro”

Um curto e bem didático documentário sobre o “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem” de  S. Luís de Montfort, obra que em 2012 completa 300 anos.

Um caminho fácil, curto, perfeito e seguro para a nossa santificação: a devoção à Santíssima Virgem! Faço coro ao pedido do final do vídeo: leia e consagre-se você também.

O livro é editado pela Vozes. Pode também ser encomendado à Fraternidade Arca de Maria. Ou pode também ser baixado (junto com as orações preparatórias da Consagração) na internet.

Padre Joãozinho mexendo em vespeiro…

Fico pensando em qual é a do pe. Joãozinho. Quando do falecimento do professor Orlando Fedeli, na semana passada, ele publicou (como virtualmente a totalidade da internet católica, graças a Deus) uma nota no seu blog, pedindo orações pelo fundador da Associação Cultural Montfort.

Eu ainda não tinha lido os comentários. Hoje, estão em número de 112, alguns dos quais – de ambos os lados – absurdamente desnecessários, até mesmo para os meus padrões.

E ainda, agora há pouco, foi publicada uma “carteirada”: a visão de um canonista sobre a Associação Cultural Montfort. Neste “comentário muito bem redigido”, após ser dito que “o sítio Montfort deveria ser tirado do ar”, é feita a seguinte interpelação aos membros da Montfort:

Admoesto os queridos internautas integrantes da Associação Montfort a retornarem ao grêmio da Igreja católica, submetendo-se totalmente a Bento XVI, que aceita e ajudou a forjar as linhas mestras do Concílio, e ao seu respectivo bispo diocesano.

Essa singela admoestação está em um texto que não possui quinze linhas. Alguém com um mínimo de senso de realidade acha que isso vai surtir algum efeito, que não seja provocar a ira dos “monfortianos” Brasil afora? E acaso o padre Joãozinho pretende levar a cabo a polêmica que porventura nasça desta sua provocação?

Falecimento de Orlando Fedeli

Acabo de chegar em casa, e recebo um email comunicando o falecimento do prof. Orlando Fedeli. Abro o site da Montfort, e encontro lá a confirmação da funesta notícia, em grandes letras, na página de abertura do site:

A Associação Cultural Montfort comunica o falecimento de seu presidente e fundador Orlando Fedeli

E pede a seus alunos e a todos os que o conheceram orações por sua alma.

Montfort
São Paulo, 09.06.2010

Recebo a notícia com pesar. Conheci o prof. Orlando pessoalmente, em mais de uma visita que ele fez a Recife. A leitura da Montfort foi-me de extrema importância, quando – há alguns anos – redescobria a Fé Católica na qual fora batizado e da qual me afastara na adolescência. Tive cartas publicadas e respondidas na Montfort. Troquei emails pessoais com o Fedeli. Discuti abertamente com ele, deixando bem clara a minha posição irredutível de não investir jamais contra a Suprema Autoridade da Igreja, nas polêmicas sobre o Vaticano II e/ou o Novus Ordo Missae – após o que ele passou a considerar-me seu inimigo.

Sempre aceitei o apodo. Não é segredo para ninguém as profundas divergências existentes entre o apostolado exercido por mim e o levado a cabo pelo recém-falecido presidente da Associação Cultural Montfort. Estou moralmente convencido de que ambos aspirávamos sem dúvidas ao mesmo fim – à exaltação da Santa Madre Igreja -, mas por meios muito divergentes entre si. Um sempre censurou os meios escolhidos pelo outro. As escolhas feitas ao longo do tempo pela Montfort e pelo Deus lo Vult! não raro foram muito diferentes; das vezes que escrevi aqui no blog sobre ela, nem todas foram para fazer coro ao que pregava o professor Fedeli. E nada disso mudou.

Sempre aceitei ser considerado inimigo do Orlando Fedeli pelo próprio, mas é no entanto nesta condição que aqui escrevo – para prestar a minha homenagem ao velho professor e fazer coro aos pedidos de orações. Desejo ardentemente – e rezo por isso – que o professor tenha partido devidamente preparado para o encontro com o Juiz da História. Aos que por aqui passarem, peço que rezem ao menos uma ave-maria pela alma do professor Fedeli. E que o Senhor possa dar-lhe descanso eterno.

Requiem aeternam dona ei, Domine,
et lux perpetua luceat ei.

Requiescat in Pace,
Amen.

P.S.: O Fratres in Unum também noticiou.

Provas da existência de Deus – prof. Orlando Fedeli

Com todas as desavenças que eu tenho para com a Associação Cultural Montfort, é uma questão de honestidade reconhecer a inacreditável capacidade didática do professor Orlando Fedeli. Não comungo – quem me lê sabe disso – da maior parte das posições da Montfort referentes à crise atual que atravessa a Igreja de Cristo; em consciência, não posso deixar de dar combate àquilo que considero deletério para a Igreja de Nosso Senhor e pernicioso para as almas católicas. No entanto, também em consciência, não posso deixar de reconhecer o valor do material produzido pelo professor Orlando em outros assuntos.

A série de vídeos a seguir, que falam sobre a existência de Deus, é um exemplo das coisas indubitavelmente boas legadas pela Montfort. O primeiro, segue abaixo:

E, quem tiver interesse em assistir aos demais, segue abaixo a lista que recebi por email. Que a Virgem Santíssima olhe para o bem realizado pelo professor Fedeli, e possa interceder para que a Associação Cultural Montfort não encaminhe as almas para longe da Barca de Pedro, fora da qual só existe confusão.

* * *

Vídeo 1 de 9

INTRODUÇÃO

http://www.youtube.com/watch?v=N-WzHIEDC68

Vídeo 2 de 9

INTRODUÇÃO (continuação)

http://www.youtube.com/watch?v=-hgPO4BW-S0

Vídeo 3 de 9

PRIMEIRA PROVA – PROVA DO MOVIMENTO

http://www.youtube.com/watch?v=VKdkfMunW38

Vídeo 4 de 9

PRIMEIRA PROVA – PROVA DO MOVIMENTO (continuação)

http://www.youtube.com/watch?v=-6cIT-RsXcA

Vídeo 5 de 9

PRIMEIRA PROVA – PROVA DO MOVIMENTO (término –> 7:00 min)

SEGUNDA PROVA – PROVA DA CAUSALIDADE (início –> 7:01 min)

http://www.youtube.com/watch?v=1PuzqHgMpYY

Vídeo 6 de 9

SEGUNDA PROVA – PROVA DA CAUSALIDADE (continuação) (término –> 1:10 min)

TERCEIRA PROVA – PROVA DA CONTINGÊNCIA (início –> 1:11 min; término –> 6:23min)

QUARTA PROVA – PROVA DOS GRAUS DE PERFEIÇÃO DOS ENTES (início –> 6:24 min)

http://www.youtube.com/watch?v=h9HosG7Ie9Y

Vídeo 7 de 9

QUARTA PROVA – PROVA DOS GRAUS DE PERFEIÇÃO DOS ENTES (continuação)

http://www.youtube.com/watch?v=XYsvGHSVrNs

Vídeo 8 de 9

QUARTA PROVA – PROVA DOS GRAUS DE PERFEIÇÃO DOS ENTES (término –> 7:42 min)

QUINTA PROVA – PROVA DA FINALIDADE (início –> 7:43 min)

http://www.youtube.com/watch?v=nXsPomgy9IU

Vídeo 9 de 9

QUINTA PROVA – PROVA DA FINALIDADE (continuação e término)

http://www.youtube.com/watch?v=85jkhReRI0s

Existe santidade no protestantismo?

Acompanhando o debate entre o pe. Joãozinho e a Montfort (a última novidade são os versos do professor Orlando), sinto vontade de dizer algumas palavras para evitar os extremismos (aos quais parece estar fadada a interminável discussão).

Não recordo agora a fonte, mas lembro-me da frase: a Igreja Católica e Apostólica é aquela “fora da qual não existe nem salvação nem santidade”. Não sei se o pe. Joãozinho entende isso de modo católico, mas eu sempre estive convencido de que o prof. Orlando o entendia, sim. No entanto, no seu último desafio lançado ao padre Joãozinho, a Montfort omitiu uma parte do dogma que eu tenho certeza de que ela conhece, pois já falou sobre isso antes.

Trata-se da possibilidade de salvação para os não-católicos pela ignorância invencível. Em resumo bem resumido, diz-se que a ignorância de uma pessoa é invencível se ela, com todos os meios dos quais dispõe, busca sinceramente a Verdade e não A consegue encontrar. Diz-se de tal pessoa que “pertence à alma da Igreja”, ou que é “católica sem o saber”, ou outras expressões similares.

O problema óbvio com isso é que, como ninguém sonda as consciências, não dá para dizer quem está em ignorância invencível e quem não está. A solução mais óbvia para o problema é logicamente fazer apostolado com todo mundo e deixar que o próprio Deus julgue, dentre os que não aderiram à Igreja em vida, quais o fizeram culposamente e quais o fizeram sem culpa própria.

Voltando, portanto, à frase sem referência que citei acima: não há santidade fora da Igreja Católica como também fora d’Ela não há salvação; contudo, caso a pessoa seja salva por ignorância invencível, nesta pessoa há sem sombra de dúvidas santidade. O protestantismo em si considerado evidentemente não salva ninguém, mas um protestante que esteja em ignorância invencível pode ser salvo. E, se ele pode ser salvo, logicamente pode também ser santo. Acho importante repetir: não sei se é isso que o pe. Joãozinho está dizendo! Mas é isso que diz a boa Doutrina Católica. É uma pena que o reverendíssimo sacerdote prefira – aliás, de novo! – citar os documentos sem os explicar.

Não há santidade própria no protestantismo, mas  há santidade “na alma da Igreja” à qual pertencem os que, sem culpa própria, ignoram a plenitude da Revelação de Cristo. E nada impede que estes sejam protestantes, posto que “quem será tão arrogante que seja capaz de assinalar os limites desta ignorância, conforme a razão e a variedade de povos, regiões, caracteres e de tantas outras e tão numerosas circunstâncias?” (Pio IX, Alocução Singulari Quadam, 1854, Denzinger, 1647 apud Montfort).

O fim de quem abraça o estado eclesiástico

Quem digita “padre Fábio de Melo” no Google recebe como primeiro resultado um link para “Fábio de Melo – novo site”. Na descrição, lê-se: “Site oficial do compositor, escritor e cantor Padre Fábio de Melo”.

Compositor. Escritor. Cantor. Só depois, ao final, padre. Já há diversas polêmicas internet afora envolvendo o reverendíssimo sacerdote e os mais díspares críticos, de modo que as minhas palavras sobre o assunto seriam, no máximo, redundantes. Quero apenas fazer um breve comentário sobre o que enxergo ser o cerne da problemática.

Tem razão – por exemplo – a Montfort em dizer que “Padre Fábio de Melo é um herege completo”? Decerto que não. Primeiro, que um católico vere et proprie herege, nos dias de hoje principalmente, é uma coisa relativamente rara (aliás, o que vem a ser um “herege completo”? O que seria um “herege pela metade”?). Segundo, que, dentre os diversos graus de censura teológica existentes, é muito pouco provável que os textos do padre Fábio fossem classificados como “heréticos”. Terceiro, que não se chama um sacerdote do Deus Altíssimo de “herege completo” em público antes que os seus superiores o façam.

Tem razão, então, o padre Fábio de Melo em escrever e falar as barbaridades que escreve e fala? Tampouco. O problema, no meu entender, está expresso de forma lapidar no site oficial do padre: é o reverendíssimo sacerdote comportar-se como compositor, depois como cantor, depois como escritor, e só depois como padre católico.

“O fim de quem abraça o estado eclesiástico”, escrevia São Pio X, “deve ser unicamente a glória de Deus e a salvação das almas” (Catecismo de São Pio X, q. 820, grifos meus). E para as almas serem salvas é necessário que elas possuam a Fé Católica e Apostólica, sem a qual ninguém pode agradar a Deus e se salvar. Um sacerdote do Deus Altíssimo, então, que deve ter como único fim a glória de Deus e a salvação das almas, precisa empenhar-se com todo o seu ser na propagação da Fé. Precisa torná-la compreensível aos seus fiéis. Por isso, como é doloroso ver o Padre Fábio de Melo compôr, depois cantar, depois escrever, e só depois anunciar a Fé!

O resultado é que a Doutrina vem expressa de maneira sofrível, e é necessário um bocado de boa vontade para interpretar as declarações do reverendíssimo sacerdote em um sentido católico. Isso é muito triste, porque enseja reações [às vezes mais duras do que seria devido, de modo que restam improfícuas por falta de prudência] dos católicos indignados com o digníssimo desleixo sacerdotal; e isso sem falar na multidão incomensurável dos católicos que precisam da Doutrina Católica para se salvar e, no entanto, são forçados a hercúleos esforços para encontrá-La sob o manancial de futilidades e digressões complicadas que jorra em profusão dos discursos do reverendíssimo padre Fábio de Melo! Acaso todos eles são capazes de semelhante empreitada…?

Consegue o padre – entre trancos e barrancos – fugir da heresia, mas o objetivo do sacerdote não é simplesmente fugir da heresia, e sim fazer a Doutrina conhecida, para que Deus seja glorificado e as almas sejam salvas, como ensinou São Pio X! O discurso dos sacerdotes [de todos os católicos aliás, mas dos sacerdotes de uma maneira particularíssima] deve almejar ser o mais fiel possível à Doutrina Católica, e não simplesmente possuir o mínimo indispensável para não ser classificado como heteroxo. Fazer desta segunda concepção a norma da própria vida é, infelizmente, não compreender qual é realmente o fim de quem abraça o estado eclesiástico, ou os meios necessários para alcançá-lo.

Gregório X – Decreto de proteção aos judeus

[Fonte: Montfort]

GREGÓRIO X, BISPO, SERVO DOS SERVOS DE DEUS

Gregório, bispo, servo dos servos de Deus, estende saudações e bênção apostólica aos seus amados filhos em Cristo, os fiéis Cristãos, aqueles daqui e de hoje, e aqueles no futuro.

Por mais que não seja permitido aos judeus, em suas assembléias, presunçosamente, assumirem para si mais do que lhes é permitido por lei, ainda assim eles não devem sofrer nenhuma desvantagem nesses [privilégios] que lhes foram garantidos . Embora eles prefiram persistir em sua intransigência a reconhecer a palavra de seus profetas e os mistérios das Escrituras,  e, dessa maneira, chegarem ao conhecimento da Fé Cristã, e da salvação; contudo, porquanto eles fizeram um apelo à nossa proteção e ajuda, nós, portanto, admitimos tal petição e lhes oferecemos o escudo da nossa proteção pela clemência da piedade Cristã. Agindo de tal forma, nós seguimos os passos de nossos predecessores de abençoada memória, os papas de Roma – Calixto, Eugênio, Alexandre, Clemente, Inocêncio, e Honório.

Além disso, nós decretamos que nenhum Cristão deve compelir a eles ou qualquer um do grupo deles ao batismo, sem o desejo. Mas, se algum deles, por convicção, se refugiar entre os Cristãos, por sua própria vontade, após manifestar sua intenção, ele deverá ser feito Cristão sem nenhuma intriga. Porque, de fato, não se pode considerar que tenha a Fé Cristã, aquela pessoa que tenha se tornado Cristão coagido, sem vontade própria, nem desejo.

Ainda mais, nenhum Cristão deve atrever-se a apanhar, aprisionar, ferir, torturar, mutilar, matar, ou infligir qualquer violência a eles; além disto, exceto por ação judicial das autoridades do Estado,  ninguém deve atrever-se a mudar os bons costumes na terra em que vivem para o propósito de tomar o dinheiro ou bens deles ou de outros.

Ainda mais, ninguém deve perturbá-los de qualquer forma durante a celebração de seus festivais, seja de dia ou de noite, com paus, pedras, ou qualquer outra coisa. Também, ninguém deve extrair nenhum serviço compulsório deles, a não ser que tal serviço seja o que eles estejam acostumados a oferecer desde tempos anteriores.

Da mesma forma que os Judeus não podem prestar testemunho contra Cristãos, nós decretamos em adição que o testemunho dos Cristãos contra os Judeus não será válido, a não ser que existam entre estes Cristãos alguns Judeus que lá estejam com o propósito de oferecer o testemunho.

Já que ocorre que alguns Cristãos perdem suas crianças e os Judeus são acusados, por seus inimigos, de, secretamente, as levarem a força e matarem-nas, e, ainda, fazerem sacrifícios com o sangue e coração destas crianças. Ocorre, ainda, que os pais destas mesmas crianças, ou outros inimigos Cristãos destes Judeus, secretamente, escondem estas crianças com o intuito de poder fazer mal a tais Judeus, e, com isso, ter a possibilidade de extorquir deles certa quantia de dinheiro para redimi-los.

Falsamente, clamam tais Cristãos, que os Judeus, secretamente e furtivamente, tomam tais crianças e matam-nas, e que os Judeus oferecem sacrifícios com o coração e sangue de tais crianças, uma vez que a lei deles, a respeito desta matéria, precisa e expressamente, proíbe os Judeus a sacrificarem, comerem ou beberem o sangue e carne de animais que tiverem garras. Isso foi demonstrado várias vezes em nossa corte por Judeus convertidos à Fé Cristã; no entanto, muitos Judeus são apanhados e detidos injustamente por causa disto.

Nós decretamos, portanto, que os Judeus não precisam obedecer a Cristãos em uma situação como essa, e ordenamos que  todo Judeu aprisionado sob um pretexto tolo como esse  seja imediatamente libertado, e que eles não sejam presos de agora em diante sob tão miserável pretexto, a não ser que – o que não acreditamos que ocorra – sejam pegos enquanto cometam o crime. Decretamos que nenhum Cristão fomente nada novo contra eles, mas que eles devem ser mantidos no status e posição em que eles estavam na época de nossos predecessores, da antigüidade até agora.

Decretamos, para parar a malvadeza e avareza dos homens maus, que ninguém deve se atrever a devastar e destruir os cemitérios dos Judeus, ou desenterrar corpos humanos para ganhar dinheiro .

Ainda mais, se alguém, após ter tomado conhecimento do presente decreto, atentar – o que, esperamos, não ocorrerá – audaciosamente contra ele, sofra a punição em sua categoria e posição, ou, seja punido pela excomunhão, a não ser que faça reparações por sua ousadia por meio de devida compensação. Ainda, desejamos que somente os Judeus, os quais não tenham atentado em fazer nada visando a destruição da Fé Cristã, sejam fortificados pelo suporte de tal proteção.

Dado em Orvieto, pelas mãos do Mestre João Lectator, vice-chanceler da Santa Romana Igreja, no 7º dia de Outubro, no primeiro indicto , no ano de 1272 da Divina Encarnação, no I ano do pontificado de nosso mestre, o Papa Gregório X.

[Tradução: Marcos Vinicius Mattke. Texto original em latim no Vaticano].

[A presente tradução para língua portuguesa do Decreto de Proteção Papal aos Judeus não é a versão portuguesa oficial da Santa Romana Igreja, inexistente até o momento da presente tradução].

Novo Arcebispo do Rio de Janeiro

Foi nomeado o novo Arcebispo do Rio de Janeiro: Dom Orani João Tempesta, até então Arcebispo de Belém do Pará. Sua Excelência escreveu uma carta ao Cardeal Scheid, a quem ele vai suceder na Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro. A nomeação saiu na Sala de Imprensa da Santa Sé.

Só me lembro de duas coisas sobre Dom Orani; a primeira, que ele é cisterciense e, a segunda, que ele recebeu uma carta do prof. Orlando Fedeli certa vez…

Que Deus abençoe o novo Arcebispo do Rio de Janeiro!

Estatutos do IBP

Há uns seis meses atrás, eu perguntei sobre os Estatutos do IBP, quando, cansado com a insistência de algumas pessoas em repetir ad nauseam que o Instituto havia sido criado “para criticar o Vaticano II e a Missa Nova” e blá-blá-blá, perdi a paciência e quis saber de onde havia sido tirada esta informação. Silêncio sepulcral; se o IBP havia sido erigido com este propósito, tal fato não havia sido divulgado para ninguém.

Anteontem o Fratres in Unum noticiou que foram publicados – finalmente – os Estatutos do IBP. A íntegra – em francês – pode ser aqui encontrada; é um documento relativamente curto, de cinco páginas. Nem uma palavra sobre uma suposta crítica ao Vaticano II e à Missa Nova, como é natural. E agora, como ficam os que repetiram isso à exaustão?

O Ferretti fez o enorme favor de resolver o mistério e mostrar para todo mundo qual é a fonte desta informação, em comentário que me permito reproduzir aqui:

[A] possibilidade de crítica construtiva ao Vaticano II está prevista nas “Atas de adesão” assinadas pelos Padres do IBP quando da fundação do Instituto.

“A propósito de certos pontos ensinados pelo Concílio Vaticano II ou relativos às reformas posteriores da liturgia e do direito, que nos parecem dificilmente conciliáveis com a Tradição, nos comprometemos a ter uma atitude positiva de estudo e de comunicação com a Sé Apostólica, evitando toda polêmica. Esta atitude de estudos quer participar, por uma crítica séria e construtiva, à preparação de uma interpretação autêntica por parte da Santa Sé desses pontos do ensinamento do Concílio Vaticano II, bem como de certos elementos de textos e disciplinas litúrgicas e canônicas que decorrem”.

http://blog.institutdubonpasteur.org/spip.php?article46

Convenhamos: a “crítica construtiva” do IBP, que não é estatutária, que é uma “atitude positiva” em “comunicação com a Sé Apostólica”, e ainda por cima “evitando toda polêmica”, é completamente diferente daquilo que foi por muito tempo alardeado (e diligentemente praticado) por alguns “baluartes da tradição” (esta, com ‘t’ minúsculo mesmo) que não medem esforços para – per fas et per nefas – “justificar” de alguma maneira os seus desvarios. A Verdade sempre aparece. Já disse Nosso Senhor que não há nada de oculto que não venha a ser descoberto.