Mais citações distorcidas

Após eu comentar aqui no Deus lo vult! sobre algumas citações falsas publicadas pela Montfort recentemente, recebi um email com a informação de que a mesma coisa já havia sido feita em outra ocasião, tendo o Card. Arinze como alvo. Verifiquei os links passados, e a informação está exata: as palavras das citações são trocadas, e as aspas são mantidas, dando-se a entender que a frase do Card. Arinze é uma coisa quando, na verdade, é outra coisa bem diferente. A Montfort coloca a sua interpretação dos fatos, com as suas próprias palavras, na boca de membros importantes da Cúria Romana, como se fossem citações literais de cardeais da Santa Igreja!

Este tipo de expediente desonesto não pode continuar. Os fins não justificam os meios; é necessário que tais textos da Associação Cultural Montfort sejam absolutamente repudiados, por uma questão de justiça. Abaixo, a mensagem que recebi por email, com as citações falseadas do Card. Arinze.

* * *

Em certa entrevista ao Inside the Vatican, o Cardeal Arinze, salvo engano em 2003, afirmou que normas baixadas por João Paulo II iriam acabar com a Missa “do it yourself” (faça você mesmo), ou seja, com os abusos na liturgia. As palavras do Cardeal na entrevista foram:

“We want to respond to the spiritual hunger and sorrow so many of the faithful have expressed to us because of liturgical celebrations that seemed irreverent and unworthy of true adoration of God. You might sum up our document with words that echo the final words of the Mass: ‘The do-it-yourself Mass is ended. Go in peace.” ( apud http://forum.catholic.org/viewtopic.php?f=158&t=7030)

Tradução: “Queremos responder à fome espiritual e dor que tantos fiéis expressaram a nós por causa das celebrações litúrgicas que pareciam irreverentes e  indignas da verdadeira adoração a Deus. Você pode resumir nosso documento com palavras que ecoam o final da Missa: “A Missa faça-você-mesmo terminou. Vão em paz”.

Fedeli, certa vez, citou o texto assim:
“Como disse certa vez, com espírito, o próprio Cardeal Arinze: “A Missa “do it yourself” vai acabar”. Ite, Missa Nova est. Deo gratias.”(http://www.montfort.org.br/index.php?secao=cartas&subsecao=apoio&artigo=20060501020700&lang=bra)
Até aqui, foi Fedeli quem equiparou a Missa “do it yourself” com a Missa Nova. Em outros textos, porém, Fedeli cita as palavras do Cardeal como se ele tivesse dito que a Missa nova iria acabar, e como se a Missa do-it-yourself, para o Cardeal, fosse a Missa nova.

Veja alguns exemplos:

“O Cardeal Arinze, falando da missa nova disse: “Ite, Missa Nova est!”. “Deo gratias”, responde-lhe a Montfort com os fiéis católicos”.
(http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=igreja&artigo=padre_bux&lang=bra);

“Caso tudo isso for decretado, poder-se-á dizer — como disse certa vez o Cardeal Arinze: “Ite, Missa Nova est”, e o povo responderá: “Deo Gratias”.
(http://www.montfort.org.br/index.php?secao=cartas&subsecao=apologetica&artigo=20060520141933&lang=bra)

“Como esse Cardeal disse certa vez: “Ite, Missa Nova est”
“Ide, a Missa Nova acabou”
Deo gratias!!!
Pior até:  chamou a Nova Missa de “Mass do it yourself”“Missa faça-a você mesmo”
(http://www.montfort.org.br/index.php?secao=veritas&subsecao=igreja&artigo=decreto_papal&lang=bra)

“Porque, como se anuncia em Roma: “Ite, Missa Nova est!” Arinze dixit!”(http://www.montfort.org.br/index.php?secao=cartas&subsecao=doutrina&artigo=20060531205611&lang=bra)

As palavras do cardeal Ratzinger

Às vezes eu me surpreendo com o que encontro na Montfort. Numa curta resposta a uma carta de um leitor, datada do dia 24 de setembro, o sr. Orlando Fedeli publica duas inverdades.

A primeira inverdade – e a mais gritante – está no próprio título da carta: Card. Ratzinger: “A Missa nova foi uma ruptura com a liturgia da Igreja”. A frase, citada entre aspas, indica que ela consiste em palavras literais do então Cardeal Ratzinger, porque é exatamente para isso que servem as aspas nas citações. No entanto, a citação do cardeal dada pela própria Montfort no corpo da resposta à carta não tem nada a ver com o que está no título:

“Fiquei estarrecido pela proibição do Missal antigo, pelo fato de que uma coisa como essa jamais se verificara na história da Liturgia.(…) A promulgação da proibição do Missal que se tinha desenvolvido no curso dos séculos, desde o tempo dos sacramentais da Antiga Igreja, comportou uma ruptura na história da Liturgia”  (Joseph Ratzinger, A Minha Vida, p. 115, apud Antonio Socci, Il Quarto Segretto di Fatima, Rizzoli, Milano, 2006, p. 212, nota 361)

Em primeiro lugar, a frase colocada entre aspas não existe. Isso já basta para caracterizar a inverdade. Em segundo lugar – e muito mais importante -, a frase do título não apenas não é literal, como também deforma as palavras do card. Ratzinger. De acordo com a citação (a correta, que está no corpo da carta, e não a que está no título), para quem tem uma mínima noção de interpretação de texto e não esqueceu as aulas de análise sintática do colegial, o sujeito de “comportou uma ruptura na história da Liturgia” é “[a] promulgação da proibição do Missal [antigo]”, e não “a Missa Nova”! Após a própria Montfort já ter publicado um artigo no qual expunha detalhadamente as regras de citações, é de causar espanto que ela incorra nos mesmos erros que repudiou com tanta veemência outrora!

A “proibição do Missal” não é a mesma coisa que “[a] Missa Nova”, isto é evidente. Caberia perguntar à qual “promulgação da proibição” do missal antigo o então Card. Ratzinger está se referindo (já que tal proibição não consta na Missale Romanum), mas, independente disso, permanece cristalino que coisas distintas são distintas e, portanto, não podem ser indistintamente intercambiadas – muito menos numa citação de outra pessoa.

A segunda inverdade, mais sutil, refere-se a outra citação também falseada. Segundo Orlando Fedeli, “o Papa Bento XVI (…) considerava a Nova Liturgia como, em grande parte, a causadora da crise da Igreja”. A “Nova Liturgia” é, evidentemente, a Reforma Litúrgica. Só que a citação do então Cardeal, também publicada na Montfort, é a seguinte:

“Estou convencido que a crise eclesial em que nos encontramos hoje depende em grande parte do desmoronamento da liturgia, que por vezes vem concebida diretamente como se Deus não existisse – “etsi Deus non daretur” – como se nela não mais importasse se Deus existe, se nos fala e se nos ouve (…)”.

E o professor Orlando se esquece de que o Papa não chama e nem nunca chamou a Reforma Litúrgica de “desmoronamento da liturgia”. Quem deve dizer isso é o próprio sr. Fedeli. É universalmente reconhecido que existem abusos litúrgicos os mais diversos; e a Santa Sé, embora os tenha repetidas vezes condenado vigorosamente, nunca os atribuiu à Reforma da Liturgia em si.

Se o professor, portanto, afirma que o Papa considerava a Reforma Litúrgica como sendo uma causa da crise da Igreja, que apresente textos nos quais o Papa afirme que a Reforma Litúrgica é uma causa da crise da Igreja. Nada indica, no texto que foi citado, que o “desmoronamento da Liturgia” seja a mesma coisa que “a Reforma Litúrgica”. Trocando (mais uma vez) expressões que não são equivalentes, a Montfort apresenta inverdades aos seus leitores.

Se o cardeal Ratzinger disse o que o prof. Fedeli afirma ter dito, não o fez nos textos citados pela Montfort. A despeito de ser tentador, não importa perguntar se erros tão grosseiros são frutos de descuido, de cegueira ou de má fé; independente disso, o fato objetivo é que “argumentos” deste nível são indignos de qualquer debate que se pretenda minimamente honesto. Infelizmente, o resultado desta campanha que tenciona – per fas et per nefas – jogar lama na Liturgia atual da Igreja e num Concílio Ecumênico Legítimo é a confusão dos fiéis, na qual muitas almas são perdidas, e a solução da crise pela qual atravessa a Igreja de Cristo é postergada. É de se lamentar profundamente!

“Reforma contra o Modernismo”

A Montfort publicou uma interessante entrevista concedida pelo pe. Joseph Luzuy, do Instituto Cristo Rei (instituto que, segundo insinua o Fedeli, não poderia contar com o apoio da Montfort porque “aceita a Missa Nova”; o que confere uma certa isenção à entrevista). Destaco alguns aspectos que julguei mais relevantes.

[S]obre a cruz[,] Cristo, morrendo[,] não  foi compreendido. Ele expirou no mistério e não houve necessidade de tradutores ou de divulgadores para explicar aquele mistério. Portanto, se Cristo morto na Cruz é o mistério por excelência, por que razão a Missa deveria ser toda e racionalmente compreensível?

A comparação é primorosa, e confesso ser a primeira vez que a vejo! Se por um lado é verdade que os ritos litúrgicos “devem adaptar-se à capacidade de compreensão dos fiéis” (Sacrossantum Concilium, 34), por outro lado é igualmente verdade que a Paixão de Cristo – tornada presente em cada missa – é um dos principais Mistérios da nossa Fé e, portanto, por definição, transcende a compreensão humana. Esta verdade anda bem esquecida nos nossos dias, e neste sentido o latim ajuda a manter o Santo Sacrifício envolto num saudável véu de mistério, até mesmo por dificultar aos fiéis a compreensão completa e meramente racional de todas e cada uma das partes da Liturgia.

Sempre defendi que existem “graus de ignorância”. Oras, a Santa Missa simplesmente não pode ser compreendida em sua totalidade. Portanto, o latim (não-compreendido) ajuda os fiéis a saberem que não entendem por completo o que está se desenrolando diante dos seus olhos. Eles não sabem e sabem que não sabem. O vernáculo, ao contrário, passa a falsa impressão de que se entende completamente tudo o que está acontecendo, afinal, o significado das palavras é conhecido… portanto, hoje em dia, não é que as pessoas “compreendam mais” a missa por causa do vernáculo, é exatamente o contrário: eles não compreendem e julgam compreender, e isso é muito pior do que o primeiro caso. É uma ignorância muito mais grave.

Creio que esteja se dando, especialmente após o Vaticano II, mas não por culpa dele, um processo de protestantização da cultura religiosa, da liturgia e nos próprios estudiosos.

A acusação é grave, mas respeitosa e digna de atenção. O problema – já infinitas vezes reportado – é a utilização indevida de textos conciliares para que sejam “justificadas” as maiores barbaridades. Creio já ter falado aqui, mas repito: urge resgatar o Concílio da mão dos hereges e colocá-lo de novo a serviço da Igreja de Cristo, para a maior glória de Deus.

Circulam rumores que esteja em estudo uma reforma da liturgia, com a troca da paz antes do Ofertório, a comunhão de joelhos e o canon em latim, o senhor confirma isso?

“Não sei quando isso se dará. Mas eu também ouvi os mesmos rumores e me congratulo com eles. Posso confirmar lhe que essas  indicações estão em vias de serem feitas: nada sei sobre a real atuação e o tempo. Mas o projeto existe.”

Não é a primeira vez que isto é noticiado; permita Deus que o Papa Bento XVI, gloriosamente reinante, possa ser conservado ainda por muitos anos no trono de Pedro! E, às vésperas do aniversário de um ano da entrada em vigor do motu proprio Summorum Pontificum (próximo domingo, dia 14 de setembro, festa de Exaltação da Santa Cruz), rezemos pelo Papa e pelo triunfo da Santa Igreja:

V. Oremus pro Pontifice nostro Benedictus.
R. Dominus conservet eum, et vivificet eum, et beatum faciat eum in terra, et non tradat eum in animam inimicorum eius.

Pater Noster.
Ave Maria.

Deus, omnium fidelium pastor et rector, famulum tuum Benedictus, quem pastorem Ecclesiae tuae praeesse voluisti, propitius respice: da ei, quaesumus, verbo et exemplo, quibus praeest, proficere: ut ad vitam, una cum grege sibi credito, perveniat sempiternam. Per Christum, Dominum nostrum. Amen.

Será a “Missa Nova” intrinsecamente má?

“[A] Igreja sempre teve o poder de, na administração dos sacramentos, salva a substância deles, determinar e mudar aquelas coisas que julgar conveniente à utilidade dos que os recebem ou à veneração dos mesmos sacramentos, segundo a variedade das coisas, tempos e lugares”.
(Concílio de Trento, sessão XXI, cap. 2 [Denz-Sho 1728] apud Rifan, Dom Fernando Arêas, “O Magistério Vivo da Igreja”)

Jesus Cristo, Deus e Homem verdadeiro, com o Seu Sacrifício na Cruz do Calvário “perdoou[-nos] todos os pecados, cancelando o documento escrito contra nós, cujas prescrições nos condenavam. Aboliu-o definitivamente, ao encravá-lo na cruz” (Col 2, 13-14), “isto é, reparou as nossas culpas com a plena obediência do Seu amor até à morte” (Compêndio, 122). O próprio Cristo “[e]stá presente no sacrifício da Missa, quer na pessoa do ministro – «O que se oferece agora pelo ministério sacerdotal é o mesmo que se ofereceu na Cruz» – quer e sobretudo sob as espécies eucarísticas” (Sacrossantum Concilium, 7) e, por isso, a Igreja celebra a Eucaristia, que é “o próprio sacrifício do Corpo e do Sangue do Senhor Jesus, que Ele instituiu para perpetuar o sacrifício da cruz no decorrer dos séculos” (Compêndio, 271).

O Sacrifício da Nova Aliança é aquele que – segundo a profecia de Malaquias – é oferecido do nascente ao poente, em todos os lugares (cf. Ml 1, 11) e este sacrifício – ainda segundo a mesma profecia – é puro. Isto posto, e considerando ainda a indefectibilidade da Igreja, “é proposição censurada (…) dizer que a Igreja, regida pelo Espírito de Deus, possa promulgar uma disciplina perigosa ou prejudicial às almas (Cf. Papa Pio VI [1], e Papa Gregório XVI [2])” (Rifan, Dom Fernando Arêas, “O Magistério Vivo da Igreja”).

A questão da Reforma Litúrgica é complexa, delicada e dolorosa. Nas palavras do Santo Padre Bento XVI na Carta que acompanha o Motu Proprio Summorum Pontificum:

[E]m muitos lugares, se celebrava não se atendo de maneira fiel às prescrições do novo Missal, antes consideravam-se como que autorizados ou até obrigados à criatividade, o que levou frequentemente a deformações da Liturgia no limite do suportável. Falo por experiência, porque também eu vivi aquele período com todas as suas expectativas e confusões. E vi como foram profundamente feridas, pelas deformações arbitrárias da Liturgia, pessoas que estavam totalmente radicadas na fé da Igreja.

Estou convencido da superioridade do Missal Tradicional sobre o Missal de Paulo VI, ao mesmo tempo em que estou igualmente convencido da necessidade de se retomar, na Igreja Universal, a disciplina litúrgica vigente até a reforma do século passado. E é com dor e tristeza que eu vejo algumas pessoas – pretensas defensoras da Tradição da Igreja – utilizarem-se dos tesouros sagrados da Liturgia Católica como arma contra a própria Igreja de Cristo, dificultando assim o acesso dos fiéis verdadeiros a estes tesouros que tão fundamentais seriam para a solução da crise que hoje atravessamos.

A (atual) Forma Extraordinária do Rito Romano não foi praticamente proscrita somente por causa dos modernistas que a odeiam, mas também por causa dos rad-trads que a transformaram em cavalo de batalha contra o Magistério da Igreja. Há na Doutrina da Igreja certas proposições teologicamente certas – como as que foram colocadas acima – e que são frontalmente atacadas por algumas críticas feitas à Reforma Litúrgica de Paulo VI. A Igreja, evidentemente, não pode ceder nestes pontos. Se alguns tradicionalistas fossem mais sensatos e não colocassem sempre juntas uma justa reivindicação (à “missa antiga”) e uma intolerável acusação (à “missa nova”), a crise dolorosa pela qual atravessamos não tardaria tanto a passar. Ao contrário, associando fortemente (e injustamente) a Missa Tridentina a posições inaceitáveis por católicos, os rad-trads acabam por obrigar a Igreja ao difícil e inglório trabalho de dissociar as duas coisas, coisa que não é fácil nem rápida, mas que não pode deixar de ser feita.

Não é admissível afirmar que a Missa celebrada pela quase totalidade da Igreja hoje em dia é herética ou inválida (isso, são poucos os que fazem), mas também não é admissível afirmar que ela seja em si nociva, protestantizante, heretizante ou qualquer coisa análoga! Pelo simples fato de que é proposição condenada afirmar que “a Igreja que é governada pelo Espírito de Deus (…) [possa] constituir uma disciplina (…) perigosa, nociva e que induza à superstição e ao materialismo” [1].

Claro está que uma “missa protestantizante” é nociva. Claro está que uma “missa heretizante” é perigosa. É evidente, então, que aqueles que afirmam ser a “Missa Nova” heretizante ou protestantizante defendem que ela é nociva e perigosa e, portanto, defendem uma posição condenada pela Igreja.

Infelizmente, há muitos que defendem isso. O sr. Orlando Fedeli chama a “Missa Nova” de “modernista e protestantizante” e ainda tem a blasfêmia de insinuar que ela seja um culto ao Diabo:

Sem duvida, Padre Carbonnel tem razão ao dizer que o deus cultuado na Missa de sempre é o Deus transcendente e que o deus da missa nova é o deus imanente no universo e no homem.
Resta saber qual é o deus verdadeiro e quem é o diabo.
[Orlando Fedeli, in “Quando um herege diz a verdade: Confissões do modernista dominicano Jean Cardonnel”]

A Permanência afirma que a “Missa Nova” é intrinsecamente má:

As evidências são copiosas. Como negar, sem má-fé, que é protestantizante o novo rito, não apenas em sua intenção, não apenas no entender dos protestantes, mas naquilo mesmo que o constitui?

Oras, ser “naquilo mesmo que o constitui” e ser “intrinsecamente” são sinônimos, e ser “protestantizante” é, evidentemente, uma coisa má; portanto, o que se diz aqui é que a “Missa Nova” é intrinsecamente má.

A FSSPX diz exatamente a mesma coisa:

[S]e bem que, por si mesma, [a “Missa Nova”] não seja inválida, é realmente má pelo seu equívoco. Fosse ela celebrada pelo mais virtuoso dos padres, fosse ela dita pelo próprio Santo Cura d’Ars, ainda favoreceria a perda da Fé e o pulular das heresias, e constituiria um objetivo ultraje a Deus.

Estas posições não são aceitáveis. Afirmam estes que a Igreja determinou universalmente a celebração de um culto que é intrinsecamente mau. Alardeiam estes, por conseguinte, que as “oblações puras” profetizadas por Malaquias foram corrompidas [ou que se reduziram aos guetos rad-trads, o que é negar a profecia da mesma forma, pois esta fala que o Sacrifício é celebrado em todo o tempo e em todos os lugares]. Quando os defensores de tamanha impiedade, ao mesmo tempo, utilizam a “Missa Tridentina” como estandarte de suas loucuras, é porventura de se espantar que o Vetus Ordo tenha o “rótulo odioso” que desgraçadamente tem?

Os verdadeiros inimigos da Igreja “já não devem ser procurados entre inimigos declarados; mas, o que é muito para sentir e recear, se ocultam no próprio seio da Igreja” (São Pio X, Pascendi). O Papa santo falava dos modernistas, mas hoje em dia os rad-trads associaram-se aos hereges condenados no início do século passado, atacando a Igreja sob uma máscara de zelo. Importa que eles sejam desmascarados, e importa que os tesouros da Igreja sejam resgatados e, arrancados aos inimigos da Igreja, retornem às mãos dos fiéis católicos, para a maior glória de Deus, e para a superação – o mais breve possível! – da crise atual que já foi por muito tempo alimentada pelo conluio dialético entre modernistas e rad-trads. Que a Virgem Soberana consiga-nos esta graça do Seu Filho Jesus o quanto antes, é o nosso sincero desejo e a nossa mais fervorosa oração.

* * *

Notas (retiradas de Rifan, Dom Fernando Arêas, “O Magistério Vivo da Igreja” – renumeradas para se adequar ao presente texto [os números originais são, respectivamente, 78 e 79]):

[1] cf. Papa Pio VI, Const. Auctorem fidei, condenação dos erros do Sínodo de Pistóia, jansenista: “A prescrição do Sínodo… na qual, depois de advertir previamente como em qualquer artigo se deve distinguir o que diz respeito à fé e à essência da religião do que é próprio da disciplina, acrescenta que nesta mesma disciplina deve-se distinguir o que é necessário ou útil para manter os fiéis no espírito do que é inútil ou mais oneroso do que suporta a liberdade dos filhos da Nova Aliança, e mais ainda, do que é perigoso ou nocivo, porque induz à superstição ou ao materialismo, enquanto pela generalidade das palavras compreende e submete ao exame prescrito até a disciplina constituída e aprovada pela Igreja – como se a Igreja que é governada pelo Espírito de Deus pudesse constituir uma disciplina não só inútil e mais onerosa do que o suporta a liberdade cristã, mas também perigosa, nociva e que induza à superstição e ao materialismo – é falsa, temerária, escandalosa, perniciosa, ofensiva aos ouvidos pios, injuriosa à Igreja e ao Espírito de Deus pelo qual ela é governada, e pelo menos errônea” [Denz. 2678]

[2] “Seria verdadeiramente reprovável e muito alheio à veneração com que devem ser recebidas as leis da Igreja condenar por um afã caprichoso de opiniões quaisquer a disciplina por ela sancionada e que abrange a administração das coisas sagradas, a norma dos costumes e os direitos da Igreja e seus ministros, ou censura-la como oposta a determinados princípios do direito natural ou apresenta-la como defeituosa ou imperfeita, e submetida ao poder civil.” (Papa Gregório XVI, Encíclica Mirari Vos, 9 (1932).

Errata

Um anônimo teve a caridade de fazer-me uma correção no texto “Que há de extraordinário…?” aqui publicado. Trata-se de um erro de tradução: na verdade, “de internis nisi Ecclesia” significa do que é interno, [ninguém] a não ser a Igreja [julga], e não “do que é interno, nem a Igreja julga” como eu coloquei.

Fui induzido ao erro por dois motivos: primeiro, pelo contexto no qual a frase se encontrava no texto do sr. Orlando Fedeli, onde o sentido é claramente aquele que foi colocado por mim no texto aqui publicado. Segundo, porque o próprio Orlando Fedeli traduziu errado em outro lugar do site Montfort (grifos meus):

Não entro no foro das intenções, onde nem mesmo a Igreja entra: “De internis, nisi Ecclesia”.

Na verdade, o ditado correcto é “De internis, nec Ecclesia”, como o próprio professor Fedeli cita correctamente uma vez, e como encontra-se em repositórios de frases latinas na internet. Portanto, a despeito da tradução [de segunda mão] equivocada, é certo que o prof. Fedeli quis escrever “de internis nec Ecclesia”, e não “de internis nisi Ecclesia” como escreveu.

Agradeço, mais uma vez, ao anônimo pela correção.

Que há de extraordinário…?

De internis,  nisi Ecclesia.
[Orlando Fedeli, in A capela vazia]

As intenções, aquilo que é interno, o que passa no coração dos homens, nem a Igreja julga. É o que diz o conhecido ditado eclesiástico, repetido pelo prof. Fedeli na sua última crônica, último capítulo – espero – sobre a saída do IBP do Brasil.

Impossível não concordar. E impossível não se entristecer com os acontecimentos recentes. Primeiro, um instituto pontifício “polariza-se” no Brasil e, nascido e criado em atmosfera tupiniquim insalubre, tem a sua atuação enviesada por interesses que não estão perfeitamente alinhados com os da Santa Igreja. Depois, ao invés de se ajustarem as velas e prosseguir o caminho correto, a saída… finalmente, ao invés de se procurar tirar da atitude corajosa do IBP um bom ensinamento e um sinal de esperança, a perda de tempo com discussões inúteis sobre pessoas. Não raro, esquecendo-se do de internis.

As pessoas são falhas. Necessariamente falhas. Como perguntava retoricamente São Francisco de Sales, “que há de extraordinário em que a enfermidade seja enferma, e a fraqueza fraca, e a miséria miserável”? Por que, então, deter-se tão demoradamente e com tanto afinco nas desgraças das pessoas?

A situação atual perde-se na polêmica vazia; a última crônica da Montfort [em epígrafe] só vai exaltar os ânimos dos defensores da Associação. E quanto aos problemas reais, os que permanecem? E quanto aos estatutos do IBP, sem os quais é simplesmente impossível acusar de traição ou de interpretação errada qualquer um dos lados? Nem uma palavra…

Uma ave-maria pelo Santo Padre, pela exaltação da Santa Madre Igreja, pela extirpação das heresias; outra ave-maria pelo prof. Orlando, pelo pe. Renato, pelo pe. Navas, pelo pe. Laguerie e por todos os que estão envolvidos diretamente na dolorosa situação; e uma ave-maria por nós todos, é o que peço aos que por aqui passarem.

Ave Maria
Ave Maria
Ave Maria

Nossa Senhora, Refugium Peccatorum,
ora pro nobis!

P.S.: A tradução do latim em epígrafe está errada. Veja por quê.

Ainda a Montfort e o IBP

Padre Renato Leite, publicado no FRATRES IN UNUM:

A casa do IBP situada no bairro do Ipiranga da qual estive à frente por oito meses, foi instituída com uma finalidade específica: “Preparar os alunos do Professor Orlando para ingressarem no seminário do IBP em Courtalain, França”. E obviamente, essa preparação estaria prioritariamente a cargo do professor Orlando que com os amigos, “pagavam todas as contas da casa”, imaginando ter uma espécie de “direito adquirido” para assim proceder no que dizia respeito à formação dos rapazes.

A casa seria um instrumento para o professor Orlando atingir um dos seus mais ousados objetivos: O ter padres sob o seu comando direto. E, para atingí-lo, seria enviado para Courtalain um número cada vez maior de alunos do professor que, ordenados padres, garantiriam a influência e o controle do Instituto do Bom Pastor pelo professor e seus amigos, recordando que o IBP já nasceu Pontifício ou seja “grande” canonicamente falando, com aprovação direta do Papa e portanto “tentador”.

Gostaria de terminar esses esclarecimentos recordando a todos que toda essa confusão deve ser “creditada” nas contas das vaidades de duas pessoas:

Primeiramente na conta do professor Orlando que vive esquecido de que, não importa o que diga ou faça, continua sempre um leigo não tendo autoridade docente na Igreja para submeter sacerdotes e formar seminaristas como pretendia nessa malfadada empreitada junto ao IBP. Tal tarefa está reservada exclusivamente aos bispos membros da Hierarquia da qual ele não faz parte.

Em segundo lugar na conta do Padre Laguerie Superior Geral do IBP que tem autoridade direta sobre os padres e sobre a formação dos seminaristas e que discordando das idéias do professor “desde sempre”, tinha a obrigação moral de deixar isso claro sem “simular” uma autorização que depois se verificou inexistente e que gerou inúmeros transtornos permitindo que o “oportunismo” prevalecesse sobre a franqueza e a sinceridade.

Lamento tudo isso e rogo a Deus Sua Misericórdia de modo particular para aqueles que defendendo a “Bandeira da Fé Católica” acabam por ter na prática, as mesmas atitudes daqueles que dizem combater.

Tais denúncias deveriam provocar em nós profunda tristeza. Gostaria de pedir a todos quantos aqui passarem que rezassem pelo Santo Padre, rezassem pela Igreja, rezassem pelo IBP, pelo padre Renato e pelo professor Orlando Fedeli. E recordo as belas palavras de Dom Rafael Cifuentes:

Todos temos de enfrentar dificuldades e sofrer decepções, mas estas trazem consigo conseqüências bem diferentes segundo sejam encaradas com espírito negativo e encolhido, envelhecido, ou com esse espírito esportivo de que falamos. Não há dúvida de que, muitas vezes, as nossas atitudes perante os fatos são mais importantes que os mesmos fatos. É o que diz certa frase do escritor católico inglês William Ward: “O pessimista queixa-se do vento, o otimista espera que ele mude e o realista ajusta as velas”.
[Rafael Llano Cifuentes, “Juventude para todas as idades”, Ed. Quadrante, São Paulo, 2008]

Ajustemos as nossas velas. Não desanimemos. Não nos prendamos ao passado. Duc in altum!

P.S.: o Padre Renato escreveu o mesmo testemunho no orkut. E com um acréscimo que vale a pena ser reproduzido:

Aqui não julguei intenções que só de Deus são conhecidas.
Me restringi aos fatos e só a eles porque lá estava quando se deram.

Quebrando o silêncio

[O] IBP foi criado para criticar o Concílio Vaticano II e celebrar exclusivamente a Missa de sempre.

Muitos de nós da Montfort apoiamos o IBP – e continuaremos a apoiá-lo – sempre que ele cumprir as suas finalidades: criticar o Concílio Vaticano II e defender a Missa de sempre com exclusividade e, portanto, recusando os erros da Nova Missa de Paulo VI.

Agora só nos resta rezar pelo IBP, para que seja fiel aos objetivos que lhe foram incumbidos pelo Vaticano: criticar o Concílio Vaticano II e rezar exclusivamente a Missa de sempre.

Todas as citações acima são do sr. Alberto Zucchi, e foram publicadas hoje no site da MONTFORT. Três vezes ele repetiu que os objetivos do IBP são (i) criticar o Vaticano II e (ii) recusar a “Missa Nova”. É passada, muito claramente, a idéia de que a razão de ser do IBP são estes dois objetivos, e que este é o “carisma” do instituto, é a nota essencial que faz com que ele seja o que é. Fica a impressão de que o IBP existe única e exclusivamente para criticar o Vaticano II e rejeitar a Missa Nova.

Pois bem; tal informação não existe no site do vaticano, não existe no Decreto de Ereção do IBP, não existe em lugar nenhum! Peço encarecidamente, a quem informar possa [óbvio, por meio de fontes oficiais] quanto segue, que se digne fazê-lo:

Primum: se o reconhecimento do rito próprio do IBP como sendo o Rito Romano em sua forma tradicional implica em um direito ou dever de se rejeitar por princípio o Novus Ordo Missae como herético, ilícito, inválido, mau em si, impiedoso, que contém erros, ou coisa parecida;

Secundum: se a tal “crítica construtiva ao Vaticano II” inclui o direito ou dever de afirmar que há heresias nos documentos conciliares tal e qual foram aprovados;

Tertium: se estas são as únicas coisas para as quais foi erigido o IBP.

Já basta de tanta confusão.

A propósito, se alguém tiver acesso aos Estatutos do IBP (em qualquer idioma – a gente dá um jeito de traduzir), seria excelente e encerraria de vez esta confusão toda.

A metade do argumento

Brincando com o google durante o meu horário de almoço, descobri, com surpresa, que um artigo de minha autoria (publicado primeiro aqui no BLOG e, depois, no Veritatis Splendor) fora atacado em um outro BLOG que parece ser dedicado à difamação do Veritatis. O post é do dia 30 de junho; como eu só o vi agora, somente agora vai a resposta.

Primeiro, o texto por mim publicado tem um escopo muito bem definido: contra-argumentar o artigo da MONTFORT sobre Hans Küng e o Vaticano II. Ele não é, e nem pretende ser, por evidentes limitações de espaço, a defesa completa do Concílio Vaticano II contra todas as acusações rad-trads dos últimos quarenta anos. Se, nele, só tem metade do argumento, é porque no artigo original comentado não tem argumento nenhum e qualquer “meio-argumento” basta para o refutar.

Segundo, a acusação do BLOG “Falsitatis Splendor” – de estar faltando a segunda parte do argumento – só procederia se o meu objetivo fosse refutar o Küng. Aí sim, de facto, seria necessário debruçar-me sobre os argumentos do teólogo herege (por mais herege que ele fosse) para fazer o serviço completo e mostrar como ele estava errado em cada um deles. Mas acontece que – como eu disse acima – não estou contra-argumentando Hans Küng, e sim Orlando Fedeli.

Afinal de contas, o que tem no texto da Montfort? Uma acusação – a de que o Vaticano II “conseguiu introduzir e integrar na catolicidade o paradigma da reforma protestante e o paradigma iluminista da modernidade” – e um argumento – Hans Küng disse assim. Oras, qualquer um há de convir que dizer “Küng disse” não é um argumento! Gratis affirmatur, gratis negatur: assim, a simples frase “o Vaticano II não introduziu o paradigma da reforma protestante na catolicidade” já refutaria o palavrório da Montfort no artigo em litígio. Não prova nada, mas a frase de Küng também não prova e, portanto, ficamos empatados.

Terceiro, o que eu escrevi não se resume a negar de maneira gratuita o que disse o Küng e o Fedeli toma como dogma (embora eu pudesse ter feito isso). Fui além disso e propus uma comparação entre o que disseram e dizem dois teólogos participantes do Vaticano II: um deles diz que o Concílio foi herético, o outro diz que foi ortodoxo. A análise de um deles a Montfort subscreve, a do outro eu subscrevo. Um deles é Hans Küng, o outro é Joseph Ratzinger. Um deles é herege, o outro é Papa.

O Papa pensa diferente de Küng, como foi citado, e isso muda a história: afinal, a uma opinião, foi contraposta outra, que – por acaso – é a do Vigário de Cristo. Alguém poderia redargüir que o Papa não é infalível quando emite opiniões sobre o Vaticano II, e isto é verdade, mas tampouco Hans Küng o é. Outrossim, é óbvio para qualquer pessoa que não tenha perdido o sentido de catolicidade que as opiniões do Papa são mais garantidas do que as opiniões dos hereges.

Quarto, há equívocos no texto do BLOG “Falsitatis Splendor”:

Mas precisamos mostrar que a letra é boa, enquanto que a leitura modernista é falsa.

Não, não precisamos, porque o ônus da prova cabe a quem acusa. Faltando – como falta no texto da Montfort – quaisquer argumentos contra a letra do Vaticano II, é evidente que não ficamos nós obrigados a contra-argumentar. Além do quê, há uma enormidade de textos escritos em português mostrando que é boa a letra do Vaticano II (por exemplo, veja-se este dossiê), que eu não preciso ficar reproduzindo aqui no BLOG o tempo inteiro sem que haja argumentos da parte contrária!

Afinal, graças à letra ambígua que surge esse espírito modernista.

Errado, o Modernismo existe desde antes do Vaticano II; afinal, foi condenado por São Pio X no início do século XX. Portanto, a causa do espírito modernista não é a “letra ambígua”.

Resumindo, o cerne da questão é o seguinte: Hans Küng dizer alguma coisa sobre o Vaticano II é, antes, motivo de cautela do que de adesão entusiasmada. Se, além disso, o que ele diz contraria frontalmente o que diz o Papa, então a cautela deveria ceder lugar ao repúdio direto. O fato de alguns darem mais ouvidos aos hereges do que ao Papa é lamentável e preocupante. Quem tem olhos, que veja.

Quando os hereges são seguidos…

O Concílio [Vaticano II] conseguiu introduzir e integrar na catolicidade o paradigma da reforma protestante e o paradigma iluminista da modernidade.
(Hans Küng, apud MONTFORT).

Quem é Hans Küng? Um “teólogo”, herege proeminente. Por exemplo, é autor de uma Carta Aberta por ocasião do conclave que elegeu o atual Papa Bento XVI gloriosamente reinante, na qual pede (entre outros disparates), a eleição de um papa que [a grafia está no Português de Portugal, já que os excertos abaixo são retirados ipsis litteris do link acima indicado]:

  • “se coíba de dar veredictos moralizadores sobre problemas complexos como a contracepção, o aborto e a sexualidade”;
  • “permita a ordenação de mulheres que, à luz do Novo Testamento, é urgentemente necessária para a nova situação actual”;
  • “corrija a encíclica proibitiva de Paulo VI, Humanae vitae, sobre a pílula, que afastou inúmeras mulheres católica da sua igreja, e reconheça explicitamente a responsabilidade pessoal dos cônjuges pelo controlo de natalidade e pelo número de filhos que têm””;
  • “reconheça finalmente os ministérios protestante e anglicano, como há muito foi recomendado pelas comissões ecuménicas e como já é prática em muitos lugares”;
  • “não reclame o monopólio da verdade”.

Em resumo: Küng é um herege completo que queria a eleição de um Papa herege como ele. Graças a Deus, João Paulo II foi sucedido pelo grande Bento XVI, e não pelo “papa herege” no qual o “teólogo” suíço pediu que os cardeais votassem.

Qual é o valor, então, que têm as opiniões de um herege manifesto para os católicos? Nenhum, por certo; ou, ao menos, tais opiniões deveriam ser muito bem comparadas com as posições de pessoas de ortodoxia incontestável, antes de serem abraçadas e seguidas. Assim, por exemplo, quando se vê Lutero afirmando ser na Epístola de São Paulo aos romanos que se baseia a sua [de Lutero] doutrina da Sola Fide, ou então quando se vê Calvino dizendo que a mesma Epístola de São Paulo e o livro do Êxodo fornecem a base para se crer que alguns são predestinados por Deus ao Inferno, a reação católica imediata é a de rechaçar os hereges, e não as Escrituras Sagradas. Isso é óbvio.

Todavia, o sr. Orlando Fedeli, no link citado na epígrafe, faz justamente o contrário. O fato de um herege “reconhecer” que o Vaticano II ensinou heresias é a prova incontestável de que assim o foi. O herege torna-se Magistério abalizado para pronunciar as sentenças infalíveis sobre o Vaticano II. O fato de Bento XVI sempre afirmar a ortodoxia do Concílio é irrelevante, diante das sentenças de um teólogo herege. Afinal, se o herege diz que Vaticano II introduziu “o paradigma da Reforma Protestante” na Igreja, ergo o Vaticano II introduziu o paradigma da Reforma Protestante na Igreja de Cristo. Küng locuta, causa finita.

Pergunta, enfim, retoricamente, o professor: “Quando até os hereges enxergam, por que alguns, que se dizem católicos, negam o visível”? Oras, isso é muito fácil de se retorquir; afinal, por que alguns, que se dizem católicos, compartilham as mesmíssimas opiniões dos hereges?

Isso são as conseqüências de não se abraçar firmemente a idéia de que a Igreja não pode subsistir sem o Seu Magistério e que, portanto, se Cristo prometeu que Ela perdurará até o fim dos tempos, então o Magistério da Igreja também perdurará sem interrupções. Chesterton disse, certa vez, que os homens, quando não acreditam mais em Deus, não é que eles passem a não acreditar em nada – ao contrário, eles passam a acreditar em tudo. O mesmo acontece, desgraçadamente, com quem não acredita mais no Magistério da Igreja: passa a acreditar em qualquer coisa, até mesmo em Hans Küng.