Era um dia de abril de 1927: vinha à luz aquele que, muitas décadas depois, sentar-se-ia no Trono de Pedro sob o nome de Bento XVI. E faria história.
No meu entender, são duas as principais razões pelas quais o papado de Bento XVI merece ser considerado “histórico”. Em primeiro lugar, ele foi, e o foi sinceramente, com todas as forças de sua alma, um resistente. Foi ele o Papa que impôs serena e intransponível resistência a todas as demandas por mudanças na Igreja que lhe chegavam, violentamente, todos os dias, dos quatro cantos do planeta. É injusto chamá-lo simplesmente de “conservador”, uma vez que o termo carrega uma conotação negativa totalmente inaplicável a Bento XVI. Ele não lutou simplesmente por “conservar”, de maneira acrítica e beligerante, a tradição da Igreja Católica – atividade que por si só já seria extremamente meritória, vale mencionar. Ele foi além e se empenhou, com admirável e incansável zelo, por fazer essa tradição conhecida ao mundo.
É lógico que “conservar” a mensagem da Igreja – no sentido de garantir que ela não sofra acréscimos e nem mutilações – é uma coisa necessária. É um dever da mais alta necessidade, primário até, coisa à qual católico algum – muito menos o Papa! – pode se furtar. No entanto, a simples conservação não é suficiente: é preciso levar as almas à Fé. É neste sentido que o atual pontificado, aliás, fala tanto em acabar com a autorreferencialidade da Igreja: a Fé é pra ser guardada, sim, indubitavelmente, mas é também para ser transmitida. A doutrina deve ser levada ao conhecimento dos homens: Cristo disse “ide e ensinai” (cf. Mt XXVIII, 19), e a importância deste mandato não pode ficar escondida sob a necessidade (sem dúvidas legítima) de preservar a pureza da Fé.
E a outra razão pela qual o papado de Bento XVI se pode dizer histórico é o seu término: foi ele o homem que proferiu a Grã Renúncia após séculos. A estreiteza do nosso horizonte histórico faz com que nos escape a importância desse gesto, sem dúvidas; mas, mesmo daqui, já existem duas coisas que podemos entrever. Primeira, que a pressão pela renúncia será, doravante, mais um peso acrescido à cruz reservada aos vigários de Cristo – que isto os torne mais santos! E, segunda, que a boa convivência entre um Papa e o seu sucessor tende a ser uma eficaz barreira à verossimilhança da tese de ruptura entre pontificados, que a cada conclave interessa aos aproveitadores propagar. Acho que já o disse aqui: não canso de me perguntar o carnaval que não se faria se o cardeal Bergoglio tivesse sucedido a um falecido Bento XVI… E, sob esta ótica, a renúncia do Papa que hoje completa 88 anos afigura-se-me providencial.
São os 88 anos de um gigante. Feliz aniversário, Bento XVI! Que o Deus Altíssimo o abençoe e guarde, proteja-o e não o entregue às mãos dos seus inimigos. Que o aproximar-se de Deus sobrepuje o avançar dos anos: que a santidade de vida nada deva à velhice alcançada. Obrigado por tudo.