“Primeiramente mando e encomendo a minha alma a Deus Nosso Senhor que a fez e remiu por seu precioso sangue”. Assim começavam os testamentos de antigamente, em uma época em que as pessoas tinham consciência de que a alma que se vai apresentar diante de Deus é mais importante do que os bens que ficam nesta terra. Alguém pode dizer que isso era a formalidade da época, e que os todos os testamentos tinham, por padrão, cláusulas similares a esta; bom, que seja. Se de fato for assim, não muda o fato objetivo de que esta prática, de certo modo, obrigava o doente a pensar na sua salvação eterna, quando precisasse escrever o seu testamento. A mera formalidade não é a melhor coisa do mundo, mas é melhor do que nada.
Hoje em dia, as coisas mudaram. No Reino Unido, uma igreja (Metodista) foi fechada e, em seu lugar, foi aberta uma loja de conveniência. Triste é a conclusão à qual chega um entrevistado que mora perto: “Eu suponho que isso representa as prioridades das pessoas nos dias de hoje – a conveniência de poder comprar o seu pão alguns quilômetros mais perto é mais importante que a oração e da religião”.
Comprar pão mais perto é mais importante do que a oração! Talvez nem seja, mas a frase não deixa de ser impactante. Talvez o triste simbolismo da caixa registradora defronte a um vitral não tenha realmente este significado para todas as pessoas que moram nos arredores da antiga Igreja; mas é um símbolo. E, como o simbolismo das clásulas de encomendação da própria alma a Deus nos testamentos de antigamente, ilustra as linhas gerais de uma cultura.
É assustador considerar quanta coisa foi perdida de lá para cá. O século XVII sabia que encomendar a alma a Deus é mais importante do que lavrar escrituras de inventário e determinar heranças patrimoniais. Já o século XXI, acha mais importante ter por perto um lugar onde se venda pão do que uma igreja onde se possa rezar.