As redes sociais divulgaram recentemente um vídeo, ao que parece feito em uma paróquia de Fortaleza, durante uma Missa, onde se vê um homem entrar na fila de comunhão, pegar a Eucaristia, jogá-La no chão e A pisotear. Muitas pessoas apontaram corretamente aquilo que é mais grave nas imagens: mais do que a profanação cometida pelo demônio em forma de velho, o que verdadeiramente choca e estarrece é a completa indiferença com a qual todos os presentes parecem encarar a situação.
Não se vê ninguém tomado da justa indignação que uma situação dessas exigiria. Não se vê ninguém procurando impedir o velho — visivelmente alterado — de entrar na fila da comunhão em primeiro lugar; não se vê ninguém reagindo quando ele, teatralmente, de forma macabra, cospe a sagrada partícula no chão. Não se vê ninguém esboçando a mais mínima reação quando ele dá as costas e vai embora — lançando imprecações inaudíveis no vídeo, imagino eu. E, mais assustador, não se vê a menor perturbação no processo maquinal de continuar distribuindo a Sagrada Eucaristia. O sacerdote permanece impassível enquanto a “ministra” tenta, sem sucesso, administrar a comunhão diretamente na boca do velho possesso; depois da profanação consumada, o padre desce do altar com vagar e normalidade. Limpa o chão por alguns instantes. Após, retorna, e a distribuição da Eucaristia prossegue como se nada houvesse acontecido.
São imagens verdadeiramente angustiantes, diante das quais é imperioso lembrar dois “pequenos” pontos. Primeiro: com a consagração do Pão e do Vinho, durante a Santa Missa, ocorre o fenômeno da transubstanciação, por virtude do qual as espécies consagradas não são mais pão e vinho, mas se tornam, real e substancialmente, o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo. Em cada minúscula partícula da Eucaristia está presente Cristo inteiro, com Seu Corpo, Sangue, Alma e Divindade. Ou seja, o que está ali, jogado no chão, pisoteado e cuspido, é literalmente o Deus Todo-Poderoso, o Criador dos Céus e da Terra.
Não se trata de um símbolo nem de uma metáfora, não é força de expressão. É exatamente isto: aquele pedaço de pão é Deus. Seria já uma coisa grave, por exemplo, alguém pegar um objeto do culto católico — uma imagem, um crucifixo — e o deitar no chão; seria ofensivo e provocaria por si só um enorme mal-estar. Imagine-se alguém que entrasse na igreja revirando os bancos, quebrando as imagens dos santos, arrancando as toalhas do altar, chutando as velas e as flores: ofenderia a sensibilidade católica, sem dúvidas, e seria muito improvável que os fiéis permanecessem inertes diante de semelhante espetáculo iconoclasta.
O que se fez, no entanto, foi muito pior. Foi infinitamente pior. O demônio se voltou não contra um objeto dedicado ao culto de Deus, mas contra o próprio Deus. Ele não vilipendiou o templo, as imagens sacras ou os paramentos: foi muito além e jogou ao chão Aquele para cujo culto os paramentos foram tecidos, cuspiu n’Aquele para cuja glória as imagens sacras foram confeccionadas, pisou sobre Aquele para cuja honra o templo foi edificado. Não à toa existe uma excomunhão latae sententiae específica para quem profana a Santíssima Eucaristia: quem destrói as igrejas volta-se indiretamente contra Deus, mas quem profana as Sagradas Espécies ofende direta e substancialmente a Deus em Si mesmo.
E isso nos leva ao segundo ponto: há algo de muito, muito errado na nossa catequese. Quando os católicos ficam indiferentes diante de alguém que pisa e cospe na Eucaristia no meio de uma Missa é preciso reconhecer que estamos diante de um problema pastoral muito sério — e é legítimo até nos perguntarmos se ainda se crê realmente na presença real e substancial de Nosso Senhor sob o pão e o vinho consagrados.
Porque, afinal de contas, as nossas ações são um reflexo das nossas convicções. Quem acredita que somente Deus é digno de adoração não toma parte na incensação do Caesar ainda que ameaçado com o Amphitheatrum Flavium. Quem segue a lei de Moisés guarda o repouso sabático ainda sob a vigilância dos familiares do Santo Ofício. Quem acha errado matar animais para se alimentar não come nem jujuba depois que descobre que elas são feitas de pele de porco. Ora, se tudo isso é assim, como é possível que alguém que acredite na Presença Real possa agir com indiferença diante de uma profanação eucarística gravíssima como a que é mostrada no vídeo?
As reações mostradas na filmagem não são condizentes com pessoas que sabem que a Eucaristia é — não “simboliza”, não “representa”, mas verdadeiramente é — o próprio Deus. Não tem cabimento as pessoas, sabendo que a comunhão eucarística deve ser recebida com a dignidade que convém ao Todo-Poderoso, não se incomodarem com um sujeito sem camisa tumultuando a fila de comunhão. Não tem lógica a pessoa saber que está diante de Nosso Senhor e continuar agindo normalmente quando Ele é jogado no chão. Se fosse um animal o agredido pelo velho — se ele chutasse um cão sarnento, digamos — a reação dos circunstantes seria (muito!) mais enérgica. Como, então, ele cospe em Deus e ninguém faz nada?
A profanação ofende, sem dúvidas, mas os inimigos de Deus existirão sempre: é de se esperar que os incréus persigam a Religião, que os ímpios se levantem contra as coisas santas. Que os inimigos de Deus O ofendam não é algo propriamente espantoso: o que é de pasmar é que os pretensos amigos de Deus não façam nada! A apatia dos católicos clama aos Céus vingança mais alto que a profanação do velho endemoniado. Se nem os próprios católicos preocupam-se em respeitar as coisas sagradas, como é possível esperar que as respeitem os inimigos de Deus?