Ontem, 29 de junho, foi a festa de S. Pedro e S. Paulo – por óbvia extensão, a festa do Papa, vigário de Cristo e sucessor de S. Pedro. No Brasil, nós antecipamos a solenidade: domingo último, as nossas igrejas se revestiram de vermelho para celebrar a memória do Príncipe dos Apóstolos. Vermelho – talvez o detalhe se nos passe despercebido – que é a cor do martírio. Celebramos o Papa; e o martírio do Papa.
Aquele quo vadis, Domine? não é apenas uma expressão latina relativamente bem conhecida: tem, em si mesma, toda uma história. Em resumo: explode a perseguição romana contra os cristãos e S. Pedro, bispo de Roma, com medo de ser martirizado, foge da cidade. No caminho tem uma visão: é Cristo que cruza com ele, caminhando no sentido oposto, de volta a Roma, carregando a cruz. “Onde vais, Senhor?” – quo vadis, Domine? -, pergunta o Príncipe dos Apóstolos. “Vou a Roma, ser crucificado no teu lugar”, responde o Salvador. Pedro cai em si. Tomado de coragem, volta à cidade. É martirizado, como temera e desejava. Recebe a palma do martírio. E lega à Igreja a festa de ontem.
A vida se renova e, em certo sentido, a história se repete: a vida dos sucessores de S. Pedro é a vida do próprio S. Pedro. É a fraqueza humana unidade à força do Alto, é a escolha terrível e quotidiana entre as coisas da terra e as coisas do Céu – entre os pensamentos dos homens e os de Deus -, é, em última instância, o martírio. Pedro sofre!, e não se pense que ele não é crucificado.
Cumpre ao Papa Francisco – cumpre a todos os Papas – seguir os passos do Príncipe dos Apóstolos: S. Pedro vive em seus vigários. E a história da Igreja nascente não pode ser resumida ao glorioso ecce Petrus Pontifex Maximus; quem visse Pedro apenas em seu esplendor não teria uma visão completa daquele sobre o qual Cristo prometeu edificar a Sua Igreja. Ser Papa – é o que quero dizer – não significa apenas ser o Vigário de Cristo gloriosamente reinante. Ser Papa, sempre, significa antes de mais nada ser «o martirizado».
Ontem nós celebramos o martírio de S. Pedro – e simultaneamente rezamos pelo Papa. Há uma inegável sabedoria eclesial nesta solenidade litúrgica, que muitas vezes pode nos escapar. Orgulhamo-nos de cantar, ufanos, o «salve, Santo Padre!, vivas tanto ou mais que Pedro!»; mas por vezes nos esquecemos – e, disso, o Papa Francisco tem insistido em nos lembrar praticamente todos os dias – de rezar por aquele que enverga a batina branca do Sumo Pontificado.
Porque – é o que a meditação serena da História Sagrada nos mostra – Satanás quer joeirar Pedro como trigo; e Pedro precisa, sempre, de quem rogue por ele, a fim de que a sua Fé não desfaleça. Nas páginas dos Evangelhos e da Sagrada Tradição foi Cristo quem tomou para Si este papel – no Cenáculo como na Via Appia. Christianus alter Christus; o cristão – todo cristão – é um outro Cristo e, por isso, é aos cristãos que hoje cabe – é a cada um de nós portanto – rezar por S. Pedro, rezar pelo Papa.
Afinal de contas, ele é martirizado…! S. Pedro sofre em seus sucessores, e importa que ele sofra de modo a completar em sua carne o que falta aos sofrimentos de Cristo em favor da Igreja – como ensina o Apóstolo, também ontem celebrado. Porque, no fundo, a escolha não é entre o sofrimento e a tranquilidade: S. Pedro sofria ao fugir de Roma e sofreu no madeiro da Cruz. A escolha cristã – do Papa e de cada um de nós – é entre o sofrimento inútil e o sofrimento agradável a Deus. E isto não é fácil. Importa, portanto, que rezemos com afinco uns pelos outros. Principalmente pelos que mais precisam e aos quais estamos mais obrigados.
É a solenidade de S. Pedro, o Príncipe dos Apóstolos: que ele olhe pelos seus sucessores! E nós, oremus pro pontifice nostro Francisco, sempre. Ele precisa. Ele o pede. Nós devemos.