A mídia nunca esteve interessada em transmitir fielmente o pensamento papal

Alguém já disse que a única coisa pior do que uma imprensa hostil ao Papa é uma imprensa que o festeje. Os católicos têm-no percebido ao longo do último pontificado: o Papa Francisco pode dar mostras inequívocas de catolicismo zeloso setenta vezes por dia, que – mesmo assim! – só serão alçadas às manchetes seculares aquelas coisas que forem capazes de incutir, no leitor, uma imagem distorcida da Igreja Católica.

Qualquer mínimo contato com a realidade demonstra isso que estou falando. Hoje mesmo um amigo, não-católico, dizia-me achar que o Papa Francisco estava preparando uma “religião mundial”. Ora, isso não faz nenhum sentido. Não apenas por uma questão de direito (a Igreja Católica, nós o sabemos, é a instituição fundada pelo próprio Cristo para perpetuar a mensagem da Salvação através do tempo, e conta com o auxílio infalível do próprio Deus para desempenhar essa divina missão etc.), mas também por uma questão de fato: o Papa Francisco repete, o tempo todo, que somente Jesus Cristo salva, que somente na Igreja Católica se encontra Jesus Cristo, que é necessário fazer parte da Igreja etc. Provavelmente se pode dizer que ele é o Papa que mais insistentemente tem falado isso nas últimas décadas! À guisa de exemplo, algumas das coisas que anotei aqui no Deus lo Vult! (todas são palavras do próprio Papa Francisco – as referências estão lá):

  1. Março de 2013: «Cristo é o único Salvador do homem todo e de todos os homens. Este anúncio permanece válido hoje como foi no início do Cristianismo».
  2. Abril de 2013: «[S]implesmente é isto que Jesus disse: ‘Eu sou a Porta’, ‘Eu sou o Caminho’ para nos dar a vida. Simplesmente. É uma porta bela, uma porta de amor, é uma porta que não nos engana, não é falsa. Sempre disse a Verdade. Há talvez caminhos mais fáceis, mas são enganosos, não são verdadeiros: são falsos. Somente Jesus é o Caminho».
  3. Setembro de 2013: «[N]ão existe caminho de vida, não existe perdão nem reconciliação fora da mãe Igreja».
  4. Janeiro de 2015: «Nenhuma manifestação de Cristo, nem sequer a mais mística, pode jamais ser separada da carne e do sangue da Igreja, da realidade histórica concreta do Corpo de Cristo».

É de uma eloquência invejável, de uma clareza cristalina: de Bento XVI ou de S. João Paulo II eu não teria uma antologia dessas para apresentar! No entanto, a dar ouvidos à voz do povo, o Papa que vai inventar uma supra-religião amorfa que congrace promiscuamente os mais diferentes credos é… o Papa Francisco! Como é possível tamanha discrepância entre o que o Papa passa os dias dizendo e a percepção que tem dele o não-católico (ou mesmo o católico médio)?

O problema, como eu disse acima, é a mídia. Pior do que falar mal é enaltecer seletivamente. Quando o Papa Francisco repete extra ecclesiam nulla salus de duzentas maneiras distintas, ninguém dá um pio. Quando o Papa fala alguma coisa da qual se possa construir uma interpretação contrária ao Catolicismo, então é esta interpretação que se alardeia aos quatro ventos como se fosse a última declaração infalível de um Pontífice falando ex cathedra. A pior forma de conhecer um Pontificado é o perceber através da mídia anti-católica! É a pior ignorância, porque ela se manifesta travestida de informação fidedigna.

De ontem para hoje, contudo, este relacionamento amoroso fingido (impossível não lembrar os versos de Augusto dos Anjos: cuidado, que «a mão que afaga é a mesma que apedreja»…) entre a imprensa anti-católica e o Papa Francisco parece ter sofrido um duro golpe. Foi no avião que o levava às Filipinas. Referindo-se à liberdade de expressão, o Sumo Pontífice disse que o seu amigo poderia esperar (no vídeo se ouve bem o verbo aspettare) uma bofetada caso falasse mal de sua mãe. No original: «se il dott. Gasbarri, grande amico, mi dice una parolaccia contro la mia mamma, gli arriva un pugno!». Foi o suficiente.

Papa fala bobagem!, disseram daqui; Papa tropeça e diz besteira!, berraram acolá. O Reinaldo, aliás, gravou até um vídeo sobre o assunto. A mesmíssima hipertrofia seletiva que nos acostumamos a ver a mídia fazer nos últimos meses; o mesmo cherry-picking tantas vezes empregado para apresentar ideias estranhas ao Catolicismo como se viessem do Pastor Supremo da Igreja. Dessa vez, contudo, em desfavor da figura do Papa Francisco. Que sirva de lição. Oxalá o imbroglio possa provocar, doravante, uma certa sadia desconfiança da mídia laica, cuja competência para transmitir o pensamento religioso alheio é (para dizer o mínimo) bastante questionável.

O assunto nem merece muito latim. Para mostrar que o Papa – é óbvio! – não estava “justificando” o atentado islâmico, bastaria citá-lo no parágrafo imediatamente anterior à “declaração polêmica”: «non si può uccidere in nome di Dio. Questa è una aberrazione. Uccidere in nome di Dio è un’aberrazione». “Não se pode matar em nome de Deus. Isto é uma aberração. Matar em nome de Deus é uma aberração” – do jeito enfático que lhe é peculiar. Sinceramente, pode haver alguma dúvida?

No entanto – e à semelhança do que é feito com as pregações pontifícias ostensivamente católicas que eu listei mais acima -, quem liga? A mídia nunca esteve interessada em transmitir fielmente o pensamento papal. O seu modus operandi é o de pinçar algumas frases soltas e lhes dar o primeiro sentido estapafúrdio que lhe vier à cabeça: há anos é assim. Se agora isso é feito de maneira a “azedar” as relações midiáticas com o Papa Francisco, louvado seja Deus!, tanto melhor. Tem feito muito mal à Igreja a imprensa que enaltece o Papa. Parece que estávamos precisando, de novo, de uma mídia que o denegrisse.

[OFF] Eu, com câncer (II): retrospectiva e primeiro ciclo de Quimio

Antes de mais nada, preciso dizer que tenho uma dívida de justiça e de caridade para com todas as pessoas que, nos últimos dias, me enviaram mensagens de ânimo e me asseguraram as suas tão valiosas orações. Foram emails e comentários no blog, mensagens de Facebook e de celular, telefonemas e visitas, tantas coisas, tantas, que estou certíssimo de que, no tocante à generosidade dos que me estimam, eu estou muitíssimo mais bem servido do que mereço. Obrigado, do fundo do coração, a todos e a cada um de vocês. Tenham a certeza de que uma parte dos incômodos dessa etapa da minha vida está e continuará sendo oferecida em retribuição aos que tão generosamente correram em meu favor assim que souberam dos meus infortúnios. Que o Bom Deus, que é rico em misericórdia, possa recompensar-lhes esta (tão grande!) caridade com toda a munificência da qual só Ele é capaz.

Alguém me pediu para que fizesse uma pequena retrospectiva do que me levou ao diagnóstico da doença. Quando cheguei na emergência do hospital, no último dia 14 de dezembro, eu tinha quatro sintomas mas somente uma queixa: dificuldade respiratória, acúmulo de líquido abdominal (ascite), perda de peso e aumento dos gânglios linfáticos (perceptíveis na região das axilas, virilhas, etc.).

A minha única queixa era a dificuldade respiratória. Todos os outros “sintomas” me pareciam explicáveis: eu estava já há alguns meses fazendo exercícios diários e intensivos para perda de peso, nunca tive barriga de tanquinho (e sempre ouvira dizer que gordura abdominal (a minha, praticamente congênita) era a mais complicada de se perder mesmo) e os gânglios, inchados mas completamente indolores, até que eram perceptíveis se procurados, mas nunca me passou pela cabeça esquadrinhar meu corpo à caça deles. Quando o médico começa a anamnese você passa a responder “sim, sim, é mesmo”; antes disso, você simplesmente não imagina. Como já disseram com muita propriedade, câncer é doença “dos outros”. E temos a irritante mania de não nos darmos conta de que, para os outros, “os outros” somos nós.

Uma coisa puxou a outra e o resto da história vocês já sabem: a dispnéia era causada por um derrame pleural bilateral, os derrames concomitantes em diversas partes do corpo (dois lados da pleura, cavidade abdominal, etc.) apontavam para um problema sistêmico, os gânglios hipertrofiados faziam suspeitar de linfoma e a biópsia o confirmou. Depois foi mais uma semana para análise do tipo específico do câncer e, só então, o tratamento pôde ser definido e iniciado. Problemas burocráticos impediram a quimioterapia de iniciar no sábado (como eu disse que seria), então a iniciei no dia seguinte, 29 de dezembro, Domingo, festa da Sagrada Família e meu aniversário de 15 meses de casamento.

chemo

É desagradável, mas suportável. Até eu, “mole como um prato de papa” como já me defini a respeito de procedimentos médicos, munido com as orações dos amigos pelas quais já agradeci acima, pude atravessá-la com relativa tranquilidade. Um pouco febril, assomado por ondas violentas de náuseas, tontura permanente, dor de cabeça constante, uma crise de calafrios: é o que lembro daquelas horas de domingo. Passaram. Se aquele coquetel de drogas fizer pelo menos tanto mal à doença quanto parece fazer ao resto do corpo são, creio que ela está sendo muito bem combatida. E o melhor de tudo é o fantástico efeito do dia seguinte, em tudo análogo àquela anedótica sensação de ter ampliado o espaço doméstico após se livrar da vaca que se passou uma semana criando na sala do apartamento: diante das lembranças das horas da QT, na segunda eu me sentia a pessoa mais bem-disposta do mundo.

Hoje escrevo já de casa, pela primeira vez em casa desde o dia 14 de dezembro. Faz muito tempo, e é interessante como isso nos ensina a valorizar as coisas simples da vida: respirar ar puro depois de semanas de ar condicionado e sentir um pouco de sol no rosto após quinze dias apenas o vislumbrando pelas persianas das janelas, por exemplo. É tudo clichê, eu sei, mas parece que a gente não consegue introjetar direito enquanto esse tipo de coisa não acontece com a gente.

Neste último dia de ano, tenho muito a agradecer. Por estranho que talvez pareça a alguns, agradecer inclusive (e talvez até principalmente) por estas cruzes que me foram enviadas, pelas enfermidades e por todos os atropelos dos últimos dias. É nos sofrimentos que nos sentimos mais amados por Deus, quando nos percebemos com uma capacidade de enfrentá-los que nos é estranha e não pode vir de nós: quando ao (perdão, Senhor!) desespero do primeiro contato com o diagnóstico segue-se, sem razão aparente, a serenidade para os necessários duros passos seguintes. É óbvio que ninguém gosta de sofrimentos; mas o que peço a Deus, antes de que simplesmente me livre deles, é que me conceda o valor de enfrentá-los de pé, de fronte erguida, com galhardia, pela glória d’Ele. É esta a oração cristã, é esta a minha oração, é nisto que peço a Deus que tenha a misericórdia de me sustentar daqui em diante.

As doenças graves têm o salutar efeito de aproximar as pessoas. Falei nos últimos dias com pessoas queridas com as quais há muito tempo não falava; parece que precisamos nos deparar com a consciência da fragilidade da vida para nos libertarmos da síndrome do “Sinal Fechado”. Sou muito grato por isso também.

Por fim, agradeço por estar onde estou agora: com um diagnóstico que, embora desagradável, está longe de ser o pior possível, e com o tratamento já iniciado – ONLY FIVE MORE TO GO! – ainda no final deste ano. Cuidar mais da própria saúde deixou de ser uma utópica resolução de ano novo para se transformar já em ação concreta antes mesmo do Reveillon. O câncer perdeu a sua oportunidade de livre proliferação e, agora, já está sendo combatido. O pior já passou: agora, o caminho pode até ser árduo, mas é para cima.

E é para lá que vamos.

Deus lo Vult!: Restrospectiva 2012

Mais um ano terminou e, com o fim de 2012, gostaria de presentear os meus leitores com uma retrospectiva do que se passou por aqui ao longo deste ano. Selecionei os artigos abaixo dentre os que julguei mais relevantes neste espaço virtual em 2012; quem os acompanhou vai poder relembrá-los e, quem ainda não os viu, pode aproveitar a oportunidade para uma leitura, que julgo valer a pena.

Janeiro: o ano começou com um ataque – e da pena de um padre! – à Igreja Católica por conta de um Seu alegado “machismo”, que foi aqui respondido. Também foi em janeiro que o deputado Jean Wyllys deu o seu primeiro chilique contra o Papa Bento XVI; iniciei falando sobre isso aqui e, entre diversos outros textos que foram publicados sobre o mesmo assunto, vale mencionar a repercussão do tema no Twitter. Também em janeiro apareceu a pérola de uma intimação do MPF movida contra a Igreja Católica por conta de um texto alegadamente “homofóbico” que fora publicado num boletim da Universidade de Londrina.

Fevereiro: Fevereiro começou com o Laerte de saias em um banheiro feminino. Foi neste mês que nós começamos a denunciar a ampla legalização do aborto no projeto de Reforma do Código Penal. Ao mesmo tempo, aqui na nossa Facvldade de Direito, uma dissertação de Mestrado de um amigo sobre os direitos do nascituro era aprovada com distinção pela Banca Examinadora. A ministra Eleonora Menicucci foi nomeada para a Secretaria das Mulheres, e começou a mostrar a sua inépcia a nível mundial quando foi confrontada com um número totalmente absurdo de alegadas mortes maternas por ano decorrentes de aborto clandestino. E, claro, como diz a canção, em Fevereiro tem Carnaval.

Março: Refutei uma carta contra o pe. Paulo Ricardo que circulava oficiosamente pela internet. Nas manifestações do Senado comemorativas do Dia da Mulher, uma brasileira de verdade tomou o microfone e disse umas poucas e boas à corja de feministas que, ao contrário do que dizem, não representam as mulheres do Brasil. No auge da polêmica sobre os crucifixos em espaços públicos, o ex-ministro do STF Paulo Brossard escreveu umas belas linhas em defesa da Cruz. Inspirado na Campanha da Fraternidade, escrevi uma meditação sobre a Jerusalém Celeste que se esconde para além deste Vale de Lágrimas em que vivemos; e, na iminência do julgamento do STF sobre o aborto de crianças anencéfalas, tomei abertamente partido pelo direito da criança nascer, independente de quem seja a sua mãe.

Abril: Semana Santa, e a maior das tristezas da Sexta-Feira Santa. Este ano a tristeza era ainda maior porque, poucos dias depois, o STF mostrava de novo as suas garras e dizia que crianças deficientes podiam ser assassinadas se as suas mães o desejassem. Escrevi uma pequena meditação sobre o silêncio do Cânon Romano na Forma Extraordinária do Rito Romano; e, no sétimo ano do Pontificado de Bento XVI, a Gazeta do Povo publicou um artigo de minha autoria sobre o Papa.

Maio: Desmascarei aqui uma “sentença” da Inquisição contra o pe. António Vieira que o Estadão inventou para atacar gratuitamente a Igreja. Fui ao sul do país para presenciar o casamento de um grande amigo, e aproveitei para escrever algumas linhas sobre a união entre Cristo e a Igreja. Registrei aqui o meu protesto contra a Marcha das Vadias e as suas militantes com as tetas à mostra.

Junho: Mais um padre resolveu atacar a Igreja, desta vez despejando o seu veneno sobre a Santíssima Eucaristia; mais uma vez eu me levantei aqui para defender o Sacramento do Corpo e Sangue de Cristo. Denunciei aqui a nova estratégia abortista do Governo, com a sua “redução de danos” para aborto ilegal. Respondi também a uma campanha idiota e hipócrita surgida nas redes sociais sobre o “Trono de Ouro” do Papa. Em junho o grande bispo de Guarulhos, D. Luiz Gonzaga Bergonzini, foi chamado às hostes celestiais para, de lá, fornecer-nos valoroso apoio na luta pró-vida; e, baseado numa conversa de almoço com um amigo, sobre filhos, defendi o verdadeiro direito de os escolher.

Julho: Respondi a outra campanha idiota das redes sociais sobre religiosidade e hipocrisia, e também a um comentário TL materialista que fora publicado n’O Domingo da Paulus. Em julho perdemos também o grande Card. Sales, e as imagens do seu funeral eram um belíssimo símbolo de Fé. Também em julho morreu – aos dois anos e meio – a pequena Vitória de Cristo, diagnosticada com anencefalia ao nascer. Em dois episódios neste mês a intolerância da militância anti-católica mostrou-se sem máscaras: na repercussão contra o Carlos Ramalhete por conta de um artigo sobre a Marcha das Vadias e nos protestos virulentos contra a Chick-Fil-A por sua posição contra o “casamento” gay.

Agosto: Em Agosto nós tiramos do ar um site que vendia medicamento abortivo no Brasil. Aos quinze dias deste mês celebra-se a Festa da Assunção da Virgem Santíssima, e escrevi-Lhe algumas linhas de louvor aqui. Com a morte do astronauta Neil Armstrong, lembrei que a viagem à Lua era um hino de louvor a Deus. E, ao escrever contra a adoção de crianças por duplas de homossexuais, o Carlos Ramalhete transformou-se em alvo da truculência da turba de bárbaros apoiadores desta insensatez.

Setembro: Na esteira da autorização do STF para o assassinato de crianças anencéfalas, como era de se esperar, aumentou o rol dos que podem ser mortos “legalmente” e um juiz autorizou o assassinato de uma criança com uma deficiência que não era anencefalia. O caso “Pernambuco não te quer” também ganhou as manchetes de jornais em setembro. Este ano, mais uma vez e infelizmente, a Arquidiocese de Olinda e Recife fez-se presente – na pessoa do Metropolita – a um evento esquerdopata no Sete de Setembro. No meio da polêmica sobre um fragmento de papiro que poderia insinuar ter sido Cristo casado, mostrei aqui que isto faz diferença dentro do Cristianismo sim. Visitando uma igreja fechada para reformas no centro da cidade do Recife, escrevi umas pequenas memórias. E, last but not least, foi neste mês a belíssima noite em que eu fui Cristo celebrando um Sacramento diante do Altar de Deus.

Outubro: Em meio à euforia generalizada por conta do julgamento do Mensalão conduzido implacavelmente pelo STF, busquei trazer as pessoas de volta à realidade lembrando que não há juízes em Brasília. Aproveitando a celebração do patrono da educação brasileira, falei um pouco sobre os frutos podres da pedagogia de Paulo Freire. Tivemos belas notícias: o “Sim à Vida!” em Recife foi mais uma vez um sucesso e conhecemos a belíssima história do pe. Michel Marie Zanotti Sorkine, pároco de Marselha. Num raro momento de mostrar-se sem máscaras, um seminário LGBT propôs explicitamente a desconstrução da cultura judaico-cristã como objetivo da luta do movimento gay. E, após a dor e destruição provocadas nos USA pelo furacão Sandy, uma imagem da Santíssima Virgem permanecia em pé no meio da desolação.

Novembro: Escrevi esta reflexão sobre o sentido da vida e o pecado contra o Espírito Santo. Levantei minhas armas contra a cruzada fundamentalista atéia que intentava banir o “Deus seja louvado!” das cédulas de Real. Referente ao “casamento” gay, dissertei um pouco sobre mudanças legislativas e militâncias políticas. Teci alguns comentários sobre a crise em que estavam as universidades católicas brasileiras, em particular as PUCs do Paraná e de São Paulo. E recolhi esta preciosa confissão de alguns protestantes: os Padres do Cristianismo primitivo são, de fato, os pais da Igreja Católica Apostólica Romana.

Dezembro: Contra os que dizem ser necessário à Igreja “abrir-Se” aos costumes modernos, demonstrei que – na verdade – os homens querem é ouvir falar de Deus. Sobre a legislação “anti-gay” da Uganda, eu falei e refalei aqui. Na morte do Niemeyer e na missa de corpo presente à qual teve direito o defunto ateu, escrevi este texto. Para desmascarar as mentiras abortistas sobre o grande número de mortes maternas decorrentes de abortos ilegais, trouxe estes dados: na Dinamarca, onde o aborto é legalizado há décadas, a mortalidade das mulheres que abortam é três vezes maior do que a das que não abortam. O Jean Wyllys voltou a dar piti contra o Papa, e eu voltei a confrontá-lo aqui no blog. Por fim, diante do massacre na escola infantil de Sandy Hook (e das discussões sobre controle de armas que se lhe seguiram), lembrei que, geralmente, quando a polícia chega a chacina já está feita.

E é este o balanço do ano. A quem interessar, disponibilizo também o simpático relatório do Jetpack sobre o blog, do qual colho as seguintes informações estatísticas: o blog foi visitado 430.000 vezes em 2012, ano no qual foram publicados 326 novos posts. É quase um por dia; é uma boa meta. O blog recebeu visitas de 114 países: naturalmente, Brasil e Portugal têm o maior número de acessos, até por questões de afinidades lingüísticas. Mas da Itália vieram-me mais visitantes do que de todos os demais países da América do Sul somados; mais até do que de Angola ou de Moçambique, onde se fala português – e isto me foi uma grata surpresa.

Aos meus leitores, um feliz Ano-Novo! Que a Santíssima Virgem nos guarde a todos, e que o Seu Divino Filho aja para com todos com liberalidade. E que nós saibamos demonstrar bravura e coragem no enfrentamento das batalhas que 2013 nos reserva.

Há sete anos, Bento XVI era eleito Papa – #7BXVI

Em uma manhã de domingo de 2005, diante dos milhares de católicos que lotavam a Praça de São Pedro para acompanhar a missa de início do Ministério Petrino de Sua Santidade o Papa Bento XVI, o recém-eleito pontífice fez ressoar por três vezes este pedido: “Rezai por mim!”.

São Pedro negou a Cristo por três vezes; o seu sucessor, olhos fitos na experiência passada, julgou prudente fazer a tríplice súplica tão logo pôs nos dedos o anel do Pescador. Inusitado particularmente o terceiro pedido desta série: “Rezai por mim, para que eu não fuja, por receio, diante dos lobos”.

E não é senão contra lobos que vem lutando heroicamente o Papa Bento XVI desde então. As orações que ele recebeu a partir de abril de 2005 vêm dando um incrível resultado; quem poderia imaginar, há sete anos, que a Igreja Católica estaria na situação em que se encontrar hoje? Fruto, claro está, da Sua história e dos homens que, do Trono de Pedro, cuidaram de pavimentar as estradas para que o atual Soberano Pontífice pudesse trilhar o caminho pelo qual conduz hoje o Povo de Deus; mas fruto também, sem dúvidas, da genialidade do pontificado deste ancião que nos impressiona e desconcerta.

É difícil fazer um balanço do pontificado de Bento XVI (porque alguma injustiça será feita, ainda que por esquecimento involuntário). No campo da Liturgia, é o Papa do Summorum Pontificum e da restauração da sacralidade das Liturgias Pontifícias; no campo do Ecumenismo, é o Papa da histórica Anglicanorum Coetibus. É o Papa que beatificou o seu predecessor e que canonizou o nosso Frei Galvão. Foi quem levantou a excomunhão dos bispos da FSSPX. No campo do diálogo entre Fé e Razão foi o autor do (também histórico) discurso de Ratisbona; e foi também ele quem tomou sobre os seus ombros o encargo de enfrentar corajosamente o problema dos abusos sexuais no clero, colocando [mais uma vez] a Igreja como vanguarda no combate a este terrível mal da sociedade contemporânea.

Nem sempre foi bem compreendido, e esta é uma das características de Bento XVI que eu considero mais marcantes. Certa vez a injustiça foi tão flagrante que ele se permitiu esta queixa aos Seus irmãos no episcopado: “Fiquei triste pelo facto de inclusive católicos, que no fundo poderiam saber melhor como tudo se desenrola, se sentirem no dever de atacar-me e com uma virulência de lança em riste”. Do alto do seu trono, o Vigário de Cristo não esconde a sua humanidade e, abertamente, diante de todos os católicos que lhe estão sujeitos por direito divino, tanto se queixa quando pede por orações!

E ver o princípio sobrenatural da Unidade da Igreja de Cristo emanar de um homem que em tudo faz questão de se manter próximo dos católicos sobre os quais governa é contemplar com maior intensidade o verdadeiro significado de Pontífice, i.e., aquele que faz (ou que é) a ponte entre o mundo sobrenatural e o natural, entre Deus e os homens. Hoje é o aniversário da eleição do Cardeal Ratzinger ao Sólio Pontifício; é o sétimo anversário daquele histórico Habemus Papam que ainda nos ressoa aos ouvidos. Que o Senhor lhe conceda vida longa e [ainda mais] próspera! Et oremus pro pontifice nostro Benedicto, de novo e ainda mais uma vez, porque é evidente que o Todo-Poderoso tem escutado nossas preces e está realizando maravilhas na Sua Igreja por intermédio do vigário do Seu Filho.

Parabéns, Santo Padre!

Deus lo Vult! – Retrospectiva 2011

Foram 316 posts publicados no Deus lo Vult! este ano. Abaixo, uma pequena lista de alguns que eu considero mais importantes; de textos que eu gostei particularmente de ter escrito e que, ainda hoje, julgo valerem uma leitura. Quem ainda não leu algum deles, tem agora a chance de o fazer. Quem já leu, vale a pena ler de novo.

Janeiro: embora curtas, são atemporais estas regras para o engajamento dos católicos na internet. E estas considerações sobre a diferença entre fazer uma coisa errada e defender que uma coisa errada é na verdade certa são um tema sempre recorrente.

Fevereiro: vale relembrar a imagem (de gesso!) de Nossa Senhora das Graças que resistiu às enchentes do início do ano. E reler alguns depoimentos sobre as guerras pernambucanas entre os católicos brasileiros e os holandeses calvinistas.

Março: a refutação de um texto ateu que “respeita” e “considera” as religiões. E também este primeiro artigo de uma série sobre o carnaval, a alegria e a posição cristã durante os dias do reinado de Momo.

Abril: gosto muito deste texto sobre a “Causa das causas” e o Bule Voador, mostrando como é ridícula a comparação dos neo-ateus. Foi em abril também a polêmica com o pe. Alex Cordeiro e os seus ataques descabidos ao pe. Paulo Ricardo. E vale também a pena ler este texto sobre intolerância e homofobia.

Maio: não deixe de ler estas dez dicas para a organização de celebrações litúrgicas. E foi também em maio o disparate do STF sobre a “união homoafetiva”.

Junho: Chesterton vs. Blatchford é imperdível. Junho também viu a blasfêmia com os santos católicos realizada na Parada Gay de São Paulo. E também em junho eu me utilizei de um verso de Gregório de Matos para protestar contra o pe. Fábio de Melo e sua política de “boa vizinhança” (para dizer o mínimo!) para com o Movimento Gay.

Julho: em julho nós descobrimos que os brasileiros não são nem homofóbicos e nem pró-gays. Também no sétimo mês do ano morreu a Amy Winehouse, e eu comentei um pouco sobre ela aqui. E eu fiz uma detalhada explicação sobre o mito de que Orígenes defendia a reencarnação espírita, inclusive citando textos do próprio Orígenes que desmentem esta tese.

Agosto: foi o mês da Jornada Mundial da Juventude em Madrid! Em particular, vale a pena lembrar de como os servos do Rei da Glória calaram os escravos do Príncipe das Trevas, bem como daquele inefável minuto onde o Vigário de Cristo olhou para nós. Sobre o aborto, merece menção a frieza deste depoimento de uma mulher que, após matar o seu filho, diz que é necessário apertar a descarga e torcer para não entupir.

Setembro: vejam o heroísmo católico em Iwo Jima. Em setembro refutei também estas provas da inexistência de Deus que algum estulto despejou na internet. E é também de setembro este conto sobre o Reino dos Papa-Bostas, forte candidato a post do ano do Deus lo Vult! e um dos que eu mais gostei de ter escrito.

Outubro: em outubro o Papa foi a Assis e disse que o “não” a Deus gerou violência sem medida. Em resposta às bravatas do Sakamoto, lembramos que foi a Igreja quem inventou a saúde pública sim. E em outubro também faleceu o Steve Jobs – fruto de uma gravidez indesejada.

Novembro: um homossexual simulando felação em uma parada gay no Acre provocou a indignação dos brasileiros e – pasmem! – a ABGLT respondeu acusando os ofendidos de serem falsos moralistas e hipócritas! Foi também em novembro que o movimento #CançãoNovaSemPT venceu e o petista Edinho Silva foi defenestrado da emissora católica (onde, no mesmo mês, tinha ganho um programa). E foi também em novembro que escrevi estas impressões sobre o Congresso Pró-Vida da Human Life International.

Dezembro: vimos um corajoso padre cancelar um batizado após descobrir que o padrinho era “casado” civilmente com outro homem. Numa absurda tentativa de reescrever a realidade, o Gabriel Chalita insiste em dizer que a Dilma é contra o aborto mesmo quando tem vídeos dela dizendo, com todas as letras, ser a favor da descriminalização. Foram também apresentados aqui os dogmas sem sentido do espiritismo. E, para fechar o ano com chave de ouro, o Deus lo Vult! venceu o Top Blog 2011 e levou o primeiro lugar na categoria Religião (Pessoal) pelo Júri Acadêmico.

Histórico: CNBB e PNDH-3

Achei muito interessante o artigo publicado pelo “Brasil Pela Vida”, que recebi por email mas está também disponível no site deles. Recomendo a leitura.

Concordo com a análise apresentada. O PNDH-3, desde que surgiu, já se mostrava completamente imbuído de um espírito totalitário e totalmente incompatível com uma visão de mundo católica. Era claro e era urgente ser dito. A CNBB, no começo, para vergonha desta Terra de Santa Cruz, preferiu “não bater de frente com o Planalto”.

Escrevi, no dia oito de janeiro, um email a S. E. R. Dom Geraldo Lyrio Rocha e a S. E. R. Dom Dimas Lara Barbosa, onde ao final eu perguntava o seguinte:

Isto posto, pergunto: é verdade que a CNBB não vai emitir uma declaração condenando o programa abortista do Governo Federal? É verdade que a CNBB prefere “não bater de frente com o Planalto”, mesmo quando o Planalto está empenhado no assassinato de crianças indefesas? É verdade que, entre Nosso Senhor e o Partido, a CNBB cerra fileiras com este último?

Para a minha surpresa, este email mereceu uma resposta. No final de janeiro, Dom Geraldo Lyrio Rocha respondia-me falando sobre a (então já publicada) “Declaração da CNBB sobre o PNDH-3”, que linkei aqui no dia 15 de janeiro.

O texto era ruim, mas pelo menos alguma coisa se salvava. E, da CNBB, não se podia esperar mesmo muita coisa… No entanto, graças a Deus, o Espírito Santo dignou-Se olhar com misericórdia para o Brasil e suscitou, de janeiro para cá, diversas declarações de prelados que tiveram a coragem de romper com o tom politicamente correto da cúpula da Conferência e fazer críticas públicas mais contundentes ao plano do governo – mais adequadas à terrível situação pela qual o país atravessava e mais dignas de sucessores dos Apóstolos que eles são. Peço a todos que lerem essas linhas que rezem, agora mesmo, uma ave-maria por esses bispos que tiveram esta coragem. Nosso Senhor saberá levar esta atitude em consideração n’Aquele Dia. E registro os meus mais sinceros agradecimentos àqueles que não se calaram.

Sucessivamente, vieram à tona um panfleto onde Lula era comparado a Herodes, dois artigos da Comissão Episcopal para a Vida e a Família, um abaixo-assinado subscrito por 67 bispos, um artigo do Bispo auxiliar de Niterói e a nota da Pastoral de Católicos na Política do Rio de Janeiro – sem contar as coisas que eu, por descuido ou ignorância, possa eventualmente não ter publicado aqui no Deus lo Vult!. Mas estes exemplos já são suficientes para ilustrar o que eu quero dizer: há uma clara discrepância entre a primeira Declaração da CNBB e as manifestações de diversos bispos, em todo o Brasil, que se lhe seguiram. Graças a Deus!

Nem tudo são flores, no entanto. A Declaração sobre o PNDH-3 que a Assembléia Geral aprovou anteontem, embora seja uma colcha de retalhos, aproxima-se muito mais do primeiro documento emitido pela CNBB do que das reações dos bispos individuais que vieram em seguida. Porém, o recado foi dado, e o saldo final é positivo: quando foi a última vez que os bispos haviam tido a coragem de destoar publicamente das declarações da Conferência? Sinceramente, eu não me lembro.

E lembremo-nos de que são os bispos que fazem parte da Hierarquia da Igreja. Acima dos bispos, somente o Papa – não as conferências nacionais. Graças a Deus, desta vez alguns bispos perceberam isso e assumiram o seu papel. Que a Virgem Santíssima os possa ajudar a perseverar neste santo propósito. E que a Conferência possa ser expurgada dos inimigos de Nosso Senhor que lá estão entrincheirados. Queremos o catolicismo. Queremos a Igreja Católica. Queremos servir a Nosso Senhor, e não ao mundo.

Mais sobre as Campanhas da Fraternidade

Já há quase um mês, comentei aqui sobre a Campanha da Fraternidade. Volto ao assunto agora, que estamos em meados da Quaresma; vou tentar (reconhecendo de antemão a dificuldade da empreitada) ser o mais sincero possível e o mais condescendente possível.

Primeiro, uma retrospectiva: no site da CNBB tem os cartazes de todas as Campanhas da Fraternidade de todos os anos desde 1964. Clicando nas figuras, é possível ver o “objetivo geral” de cada um dos anos. Peguemos uma campanha ao acaso; digamos, 1984, que foi o ano em que eu nasci.

Lema: Comunicação para a verdade e a paz.

Objetivo Geral: Despertar a consciência crítica do receptor no uso da mídia, como atitude interior necessária para a comunicação da verdade e da paz. Quer também conscientizar os receptores sobre seu papel de agentes de influência na orientação de programas nos meios de comunicação.

Um ano é uma amostragem muito pequena. Peguemos ao acaso outro ano; à frente. Digamos, 1999, quinze anos depois.

Lema: Sem trabalho… Por quê?

Objetivo Geral:  Contribuir para que a comunidade eclesial e a sociedade se sensibilizem com a grave situação dos desempregados, conheçam as causas e as articulações que a geram e as conseqüências que dela decorrem;

Denunciar, conseqüentemente, modelos sócio-político-econômicos, tais como certas formas de neoliberalismo sem freios éticos, que causam desemprego quer estrutural quer não estrutural e, igualmente, impõem padrões de consumo insaciável e exacerbem a competição e o individualismo;

Anunciar uma sociedade baseada em novos paradigmas, onde a pessoa humana seja o centro, a vida não se subordine à lógica econômica idolátrica e o trabalho não se reduza à mera sobrevivência, mas promova a vida, em todas as suas dimensões;

Abrir, assim, perspectivas sobre novas relações e novas formas de trabalho prenunciadas para o Novo Milênio;

Incentivar amplo movimento de solidariedade para manter viva a esperança dos que enfrentam diretamente o problema do desemprego, promovendo iniciativas concretas de geração de trabalho e renda, no paradigma da solidariedade cristã;

Mobilizar a própria Igreja para se colocar mais ainda profeticamente a favor da justiça e da solidariedade, principalmente em relação aos desempregados e às desempregadas.

Ainda mais um exemplo; para trás, agora, do ano do meu nascimento. Fomos quinze anos para frente, vamos um pouco menos para trás: dez anos. 1974.

Lema: Onde está teu irmão?

Objetivo Geral:  A vida é o dom que mais fortemente ambicionamos e mais desesperadamente defendemos, a partir do próprio instinto de sobrevivência. A vida é o dom que mais devemos respeitar e promover em nossos irmãos.

Toma-se aqui a vida nos mais diversos níveis e circunstâncias: a vida da graça, a vida moral, a vida da honra, a vida do nascituro, a vida do enfermo e do velho, a vida do pobre e do faminto, a vida vítima de violência e injustiças… É este o dom que devemos construir, e em muitos casos, reconstruir como modernos samaritanos.

Está de bom tamanho. Agora, perguntemo-nos o que é a Quaresma. De acordo com o Catecismo Maior de São Pio X:

499) Para que fim foi instituída a Quaresma?
A Quaresma foi instituída a fim de imitarmos, de algum modo, o rigoroso jejum de quarenta dias que Jesus Cristo observou no deserto, e a fim de nos prepararmos, por meio da penitência, para celebrar santamente a festa da Páscoa.

Pois bem. Eu posso até conceder – embora particularmente seja de opinião frontalmente contrária – que haja alguma relevância n’alguns dos temas escolhidos pela CNBB para serem tratados na Campanha da Fraternidade (embora parte considerável deles seja simplesmente uma porcaria). No entanto, qualquer um há de convir que mesmo o melhor dos temas (da nossa amostragem acima, é de longe o de 1974, único a falar em “vida da graça”…) não nos ajuda (ao contrário, atrapalha) a “imitarmos, de algum modo, o rigoroso jejum de quarenta dias que Jesus Cristo observou no deserto, e (…) nos prepararmos, por meio da penitência, para celebrar santamente a festa da Páscoa”, que, afinal, são os motivos pelos quais foi instituída a Quaresma!

Isto é uma evidência impossível de ser negada: a Campanha da Fraternidade não ajuda nada, absolutamente nada, os católicos a viverem melhor a Quaresma. O problema não está somente nos temas (horríveis) algumas vezes escolhidos; afinal de contas, dêem uma olhada nos cartazes de todas as Campanhas da Fraternidade desde 1964 até o ano presente: qual a relação que existe entre qualquer uma delas e a Quaresma? No meio do lixo, há sem dúvidas temas que pode[ria]m ser bem explorados (como “A Família”, 1994; ou a própria “Fraternidade e Defesa da Vida”, do ano passado). No entanto, nenhum, nenhum deles, nem mesmo os melhores, tem relação direta com a Quaresma.

Onde está o tema “Jejum e Oração: únicos remédios para alguns pecados”? Ou o tema “Oração: alimento para alma”? Ou o tema “Penitência, penitência, penitência”? Ou o tema “Esmola, ato concreto de caridade cristã”? Não existe nada nem parecido com isso nos últimos [mais de] quarenta anos de Campanhas da Fraternidade! Portanto, mesmo quando os temas escolhidos pela CNBB são católicos (o que já é uma coisa rara) ou são catolicamente abordados (o que é tão raro que pode chegar a ser considerado um milagre), eles não são conexos com a Quaresma e, por conseguinte, não ajudam os católicos a viver bem este tempo litúrgico. Ao contrário, estas Campanhas da Fraternidade até atrapalham – por melhores que sejam elas, repito (coisa que, repito também, é muitíssimo rara) -, na medida em que dispersam os católicos, fazendo-os prestarem atenção em temas que não guardam relação direta com o tempo litúrgico no qual as campanhas estão inseridas. É preciso, portanto, afirmar claramente e com muita sinceridade: a Campanha da Fraternidade, atualmente, presta-se a impedir os católicos de viverem realmente a Quaresma. Esta é a verdade nua e crua.

Eu disse no início do artigo que ia ser condescendente; qual a única condescendência possível? Antes de qualquer coisa, parece-me óbvio que a Campanha da Fraternidade precisa urgentemente ser retirada da Quaresma. No entanto, eu concedo [como já disse, discordo, mas concedo] que, nas atuais conjunturas, alguns temas sociais possam ser objeto de alguma campanha da Igreja, contanto que (a) esta campanha não fale besteiras (como sói acontecer na Campanha da Fraternidade – à guisa de exemplo, veja-se este artigo sobre a atual campanha) e (b) ela seja colocada em algum outro período do ano que não a Quaresma (p. ex., como já ouvi sugestões de sacerdotes, um “mês temático” organizado em algum momento (distinto da Quaresma) do ano). Isso sim é possível: o que não dá para fazer é deixar as coisas como estão, porque está realmente insuportável.

Atualmente, estas Campanhas não passam de coisas das quais os verdadeiros católicos têm vergonha, que não servem à glória de Deus e nem tampouco à salvação das almas, que impedem os católicos de viverem a Quaresma. Isso precisa mudar. É pedir muito que as autoridades eclesiásticas do Brasil preocupem-se com as coisas de Deus? É pedir muito que possamos viver o tempo quaresmal de acordo com os motivos pelos quais a Igreja o instituiu? É pedir muito que não precisemos nos envergonhar das campanhas idealizadas por nossos bispos? É pedir muito que possamos ser católicos em paz… ?