Site da Arquidiocese de Olinda e Recife deforma católicos: Carta de bispos eméritos revolucionários é apresentada como material de “formação”!

Nem só de apoios oficiosos ao Grito dos Excluídos vive a Arquidiocese de Olinda e Recife. Não satisfeita em envergonhar os católicos com a descabida participação do Arcebispo Metropolitano num evento onde se contradiz abertamente a doutrina da Igreja Católica, a Mitra também colocou no seu site oficial, na página principal, na seção de “Formação” (!), uma carta divulgada por três bispos eméritos na qual qualquer pessoa com dois dedos de testa reconhece o brado revolucionário de velhos inimigos de Cristo ávidos por transformarem a Igreja Católica no seu próprio e mesquinho projeto fracassado de uma “igreja” em tudo diferente d’Aquela fundada por Nosso Senhor.

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Sob o bem-sonante pedido por uma «Igreja servidora e pobre», os três bispos eméritos – «Dom José Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba, Dom Tomás Balduino, bispo emérito de Goiás e Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia» – destilam o seu veneno e conclamam os seus leitores a se colocarem contra a Igreja Católica. As informações abertamente falsas e insinuações diabólicas ocorrem em tal profusão que não podem ser fruto de mero descuido: ao contrário, indicam a tentativa consciente e deliberada de atingir a Igreja nas Suas características essenciais. Veja-se:

A organização do papado como estrutura monárquica centralizada foi instituída a partir do pontificado de Gregório VII, em 1078.

Trata-se de mentira pura e simples. Qualquer pessoa que tenha alguma vez na vida lido algum documento do Concílio Vaticano II (que essas raposas velhas, mentindo de forma descarada, evocam a seu favor!) sabe que a Lumen Gentium dedica um capítulo à «Constituição Hierárquica da Igreja» (LG, Cap. III), onde se pode ler que «para que o (…) episcopado fosse uno e indiviso, colocou o bem-aventurado Pedro à frente dos outros Apóstolos e nele instituiu o princípio e fundamento perpétuo e visível da unidade de fé e comunhão» (LG 18, destaques meus). Não foi portanto Gregório VII quem colocou o papado como uma estrutura monárquica: foi o próprio Nosso Senhor!

Durante o 1º milênio do Cristianismo, o primado do bispo de Roma estava organizado de forma mais colegial e a Igreja toda era mais sinodal.

É mesmo? Quem disse? Não aceitemos levianamente essa “estória” da Carochinha contada por velhos maliciosos no afã de enganar os incautos. Olhemos a História. E, dentre inumeráveis exemplos que poderíamos aduzir aqui para demonstrar a falsidade dessa afirmação dos três bispos eméritos, fiquemos somente com um. De Santo Ireneu de Lião. Que aliás não era Papa.

Mas visto que seria coisa bastante longa elencar, numa obra como esta, as sucessões de todas as igrejas, limitar-nos-emos à maior e mais antiga e conhecida por todos, à igreja fundada e constituída em Roma, pelos dois gloriosíssimos apóstolos, Pedro e Paulo (…). Com efeito, deve necessariamente estar de acordo com ela, por causa da sua origem mais excelente, toda a igreja, isto é, os fiéis de todos os lugares, porque nela sempre foi conservada, de maneira especial, a tradição que deriva dos apóstolos (Sto. Ireneu de Lião, “Contra as Heresias”, Livro III, 3,2. Ed. Paulus, 2ª Edição, 1995, pp.249-250. Grifos meus).

Isto é o que era pregado e crido no século II! Isso sim é História, e isso era o que deveria estar na área de “Formação” de um site que se pretendesse católico. Não as doutrinas vãs de três lobos disfarçados de pastores. Vê-se, assim, que a única “forma colegial” que sempre vigorou na Igreja de Cristo é precisamente aquela da qual fala o Concílio Vaticano II: «o colégio ou corpo episcopal não tem autoridade a não ser em união com o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, entendido com sua cabeça, permanecendo inteiro o poder do seu primado sobre todos, quer pastores quer fiéis. Pois o Romano Pontífice, em virtude do seu cargo de vigário de Cristo e pastor de toda a Igreja, tem nela pleno, supremo e universal poder que pode sempre exercer livremente» (LG 22). Esta é a doutrina católica, frontalmente contrária à tagarelice publicada com destaque no site da Arquidiocese de Olinda e Recife.

Concílio Vaticano II orientou a Igreja para a compreensão do episcopado como um ministério colegial. Essa inovação encontrou, durante o Concílio, a oposição de uma minoria inconformada. O assunto, na verdade, não foi suficientemente amarrado.

Na verdade, está tudo perfeitamente amarrado. Citando de novo a Lumen Gentium (grifos meus):

A Ordem dos Bispos, que sucede ao colégio dos Apóstolos no magistério e no governo pastoral, e, mais ainda, na qual o corpo apostólico se continua perpetuamente, é também juntamente com o Romano Pontífice, sua cabeça, e nunca sem a cabeça, sujeito do supremo e pleno poder sobre toda a Igreja (63), poder este que não se pode exercer senão com o consentimento do Romano Pontífice. Só a Simão colocou o Senhor como pedra e clavário da Igreja (cfr. Mt. 16, 18-19), e o constituiu pastor de todo o Seu rebanho (cfr. Jo. 21, 15 ss.); mas é sabido que o encargo de ligar e desligar conferido a Pedro (Mt. 16,19), foi também atribuído ao colégio dos Apóstolos unido à sua cabeça (Mt. 18,18; 28, 16-20) (64). Este colégio, enquanto composto por muitos, exprime a variedade e universalidade do Povo de Deus e, enquanto reunido sob uma só cabeça, revela a unidade do redil de Cristo. Neste colégio, os Bispos, respeitando fielmente o primado e chefia da sua cabeça, gozam de poder próprio para bem dos seus fiéis e de toda a Igreja, corroborando sem cessar o Espírito Santo a estrutura orgânica e a harmonia desta (LG 22).

Querer forçar uma “colegialidade” independente do Romano Pontífice, assim, significa trair o Concílio Vaticano II. Significa não resgatar um ensinamento que não está “suficientemente  amarrado”, mas sim desdizer abertamente o que os Padres Conciliares ensinaram para toda a Igreja. Quem esses três bispos velhos pensam que são para contradizer tão descaradamente assim todos os bispos católicos do mundo reunidos com o Papa em um Concílio Ecumênico?

Entretanto, para dar passos concretos e eficientes nesse caminho – e que já está acontecendo – ele [o Papa Francisco] precisa da nossa participação ativa e consciente. Devemos fazer isso como forma de compreender a própria função de bispos, não como meros conselheiros e auxiliares do papa, que o ajudam à medida que ele pede ou deseja e sim como pastores, encarregados com o papa de zelar pela comunhão universal e o cuidado de todas as Igrejas.

O chamado ao cisma é sutil mas não pode deixar de ser apontado. Para os autores dessa carta diabólica, os Bispos não deveriam meramente ajudar o Papa «à medida que ele pede ou deseja». A conseqüência lógica e imediata disso é que os Bispos, segundo esta carta que está na parte de “Formação” do site oficial de uma Arquidiocese Católica, deveriam agir por conta própria – «como pastores» – mesmo que o Papa não peça ou não deseje! Ou seja, mesmo contra a vontade do Romano Pontífice! Coisa mais estranha ao catolicismo não pode haver. Contra esta doutrina absurda, repetimos de novo o que já citamos da Constituição Dogmática Lumen Gentium: «o colégio ou corpo episcopal não tem autoridade a não ser em união com o Romano Pontífice» (LG 22). E essa «união» não é uma palavra vazia ou uma mera formalidade, mas ao contrário: para ser real, precisa ser efetiva. Alguém consegue imaginar coisa mais estranha a qualquer possível “união” do que agir à revelia do seu superior, mesmo contra a sua vontade? No entanto, é exatamente isso o que advogam os três autores desta malfadada carta! E a Arquidiocese de Olinda e Recife ainda a coloca com destaque na seção de “Formação” do seu site!

A ocasião, pois, é de assumir o Concílio Vaticano II atualizado

Três raposas velhas não têm autoridade nenhuma para “atualizar” o que todos os bispos do mundo chancelaram em união com o Papa. Deve-se assumir o Concílio Vaticano II com honestidade, com escrupuloso respeito àquilo que ele ensina, e não com essa “atualização” pirata que estas múmias putrefatas querem nos empurrar.

(…) reivindicando os plenos direitos da mulher, superando a respeito os fechamentos advindos de uma eclesiologia equivocada.

Para bom entendedor, pingo é letra. Quais são os «fechamentos» impostos às mulheres pela Igreja? A referência à ordenação feminina salta aos olhos. No entanto, sobre este assunto já se manifestou definitivamente o Magistério da Igreja por meio do Papa João Paulo II:

Portanto, para que seja excluída qualquer dúvida em assunto da máxima importância, que pertence à própria constituição divina da Igreja, em virtude do meu ministério de confirmar os irmãos (cfr Lc 22,32), declaro que a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja (Ordinatio Sacerdotalis, 4).

Esta é a sã eclesiologia católica, que três bispos eméritos têm a desfaçatez de chamar de «equivocada» em uma carta à qual a Arquidiocese de Olinda e Recife dá publicidade por meio do seu site oficial! Afinal de contas, o que pretende a Mitra olindo-recifense? Servir à Igreja ou espalhar a revolta contra Ela?

[O] clericalismo vem excluindo o protagonismo eclesial dos leigos e leigas, fazendo o sacramento da ordem se sobrepor ao sacramento do batismo e à radical igualdade em Cristo de todos os batizados e batizadas.

É exatamente pelo fato desses três bispos serem batizados que devem respeito às autoridades eclesiásticas, em particular ao Magistério da Igreja. E, portanto, não poderiam jamais vir a público usando as suas credenciais de «bispos eméritos» para atacar a Igreja Católica e promover a subversão de Sua Doutrina. Que estes bispos comecem dando o exemplo e respeitando com seriedade as obrigações decorrentes do seu Batismo, em particular a submissão àquilo que ensina a Santa Madre Igreja! Seria engraçado se não fosse trágico: quando querem minar a importância do sacerdócio católico, falam em «radical igualdade em Cristo de todos os batizados e batizadas». Para poderem passar uma falsa aparência de autoridade nos seus ataques ao que a Igreja ensina, no entanto, não coram de vergonha em se alardearem bispos com o pretenso direito de agir mesmo quando o Papa não peça ou não deseje! E é esta hipocrisia sem tamanhos que o site da Arquidiocese apresenta como “Formação” para os católicos que por lá passarem!

Nos nossos países, é preciso ter a liberdade de desocidentalizar a linguagem da fé e da liturgia latina.

A tagarelice é pura birra contra a Igreja. Nós, países latino-americanos, estamos jurídica e historicamente ligados ao Rito Romano, quer os três bispos gostem, quer não. E ainda: que me conste, nós estamos no Ocidente! Nada do que é “ocidental” nos é estranho.

Finalmente, está em jogo o nosso diálogo com o mundo. Está em questão qual a imagem de Deus que damos ao mundo e o testemunhamos pelo nosso modo de ser, pela linguagem de nossas celebrações e pela forma que toma nossa pastoral.

O testemunho que somos chamados a dar ao mundo passa pelo respeito à nossa própria identidade e pela obediência àquilo que anunciamos. Ora, que “testemunho” é possível dar ao mundo quando se levanta de maneira tão cretina contra a instituição que se diz servir? Como é possível testemunhar alguma coisa para os de fora quando três bispos eméritos clamam à rebelião contra os fundamentos da Igreja? O que estes bispos eméritos estão fazendo, na verdade, é um grandíssimo e eloqüente contra-testemunho. Que a Arquidiocese de Olinda e Recife faça coro a tão grande pedra de tropeço é um escândalo injustificável.

“É hora de despertar, é hora e de vestir as armas da luz” (13,11). Seja essa a nossa mística e nosso mais profundo amor.

É verdadeiramente irônico que terminem conclamando os leitores a vestir «as armas da luz» três lobos caquéticos que no decurso do seu texto teceram incansáveis loas ao nefasto Pacto das Catacumbas

Vistamos, sim, as armas da luz, que são as armas da Verdade. E, como vimos, a Verdade passa longe desta carta escrita por três bispos eméritos que, longe de quererem servir à Igreja de Cristo, são movidos por um amor desmesurado a si próprios e a “modelos” fracassados de igreja que eles não conseguiram enquanto jovens colocar no lugar da Igreja de Nosso Senhor. Pretendem consegui-lo agora, quando já estão velhos e quando as suas mentiras já estão mais do que batidas?

Entre o que ensina a Igreja e o que dizem três hippies velhos que perderam o bonde da história, é bastante óbvio que qualquer pessoa que tenha amor à própria alma deve dar ouvidos não a estes, mas sim Àquela que é a Esposa de Cristo. Desgraçadamente, há aqueles que preferem deformar os fiéis católicos pelos quais tinham o dever de zelar. É verdadeiramente lamentável que a Arquidiocese de Olinda e Recife prefira se unir aos escarnecedores e transformar o seu site oficial em palanque para que velhos caquéticos destilem o seu ranço anti-católico e conclamem os seus ouvintes a uma ridícula rebelião contra Aquela que as portas do Inferno jamais vencerão. É uma vergonha que um site de uma Arquidiocese católica se preste a disseminar assim a revolta contra a Igreja.

Entre o gayzismo e os skinheads, os católicos rezam ave-marias

Segundo este site de turismo francês, Lyon é “a segunda maior cidade gay francesa”. Vergonha para esta terra que, um dia, foi pastoreada por Santo Ireneu e, hoje, brada aos Céus vingança por esta depravação à qual está entregue! Que Se recorde o Altíssimo de que Lyon já deu santos para os Seus altares, e não olhe sobre a cidade com a severidade que ela merece atualmente.

Em Lyon houve, recentemente, um “kiss-in” gay defronte à catedral. A expressão inglesa, julgo, é melhor traduzida pelo termo “beijaço” – aos moldes dos que nós, infelizmente, encontramos também aqui nesta Terra de Santa Cruz. No Free Republic tem uma foto interessante – a notícia completa está aqui.

O rapaz que aparece na foto, no vídeo abaixo aparece sendo algemado e levado por policiais:

Outras pessoas também foram presas, como se pode ver no vídeo. Não sei exatamente o que aconteceu. A reportagem inglesa fala que havia, entre os “contra-manifestantes”, um grupo de skinheads com luvas e uniformes azuis-escuros, e que fizeram uma saudação nazista. Não sei se é o caso do rapaz da foto e do vídeo, pois o vídeo não mostra o instante em que ele é abordado pelos policiais. O que sei é que é uma grande pena: a defesa católica contra a horda de gayzistas acaba ficando com o estigma de um sub-grupo (aliás não-católico) que estava presente. Os católicos que lá estavam não eram skinheads: eles ostentavam cartazes com os dizeres “somos filhos de Heteros em primeira, segunda e terceira geração”, e, ajoelhados, rezavam ave-marias.

Se foi uma vitória do Gayzismo (como comemorou, na reportagem, o presidente do Gay Pride Lyon), foi uma pseudo-vitória, pois a polarização “skinheads x homossexuais” é falsa e indevida. No máximo, a vitória obtida foi contra os nazistas, mas isto é um espantalho, pois os católicos que lá estavam não eram nazistas. E, além de tudo, o desfecho deste caso foi totalmente injusto: afinal de contas, foram os “ativistas gays” que tomaram a iniciativa de provocar os católicos, promovendo um kiss-in diante de uma catedral católica – em que mundo cínico isto pode ser chamado de “tolerância” e “respeito às diferenças”?

É triste. Que Santo Ireneu de Lião interceda pela sua França.

São Policarpo e o valor do Evangelho

[Depois que eu escrevi ontem aqui sobre porcos e pérolas, um leitor do Deus lo Vult! enviou-me por email um trecho da ata do martírio de São Policarpo de Esmirna (da edição “Padres Apostólicos”, coleção “Patrística”, da Paulus; também na “História Eclesiástica” de Eusébio de Cesaréia), bem como algumas considerações que Santo Ireneu (apud Eusébio de Cesaréia) faz sobre o glorioso mártir. Cito-as ambas; primeiro a ata de martírio e, depois, o que escreveu Santo Ireneu, porque ambas as passagens são bastante ilustrativas do valor que os Padres da Igreja davam à Mensagem Cristã, não aceitando de modo algum desperdiçá-la.]

No estádio, o tumulto era tão grande que mal se escutavam as palavras. Ao entrar Policarpo no estádio, veio uma voz do céu: Sê forte, Policarpo, sê homem (cf. Js 1,9). Ninguém viu quem falava, mas muitos dos nossos ouviram a voz .

Ora, enquanto o conduziam, houve um grande tumulto da parte dos que ouviram dizer ter sido preso Policarpo. Ele adiantou-se e então o procônsul perguntou se ele era, de fato, Policarpo. Ao obter a resposta afirmativa, exortou-o a renegar, dizendo: Tem pena de tua idade!, e frases semelhantes, conforme se costuma dizer. Acrescentou: Jura pela fortuna de César! Muda de opinião e dize: Abaixo os ateus!

Então Policarpo, fitando severamente a multidão presente no estádio, estendeu a mão contra eles, suspirou, olhou para o céu e disse: Abaixo os ateus!

Insistiu o procônsul, dizendo, Jura e eu te liberto. Amaldiçoa a Cristo. Policarpo disse: Há oitenta e seis anos que o sirvo e ele jamais me fez mal. Como posso blasfemar a meu Rei, meu Salvador?

O procônsul insistiu ainda e disse: Jura pela fortuna de César! Policarpo retrucou: Se esperas em vão que hei de jurar pela fortuna de César, como dizes, finges ignorar quem sou eu; escuta, falo com franqueza: Sou cristão. Se queres aprender a doutrina do cristianismo, dá-me o prazo de um dia e escuta.

O procônsul disse: Convence o povo. Policarpo respondeu: Considero-te digno de explicação, pois aprendemos a tributar aos magistrados e às autoridades estabelecidas por Deus a honra que lhes compete, contanto que não nos prejudique (cf. Rm 13,1). Quanto a estes, não os julgo dignos de me defender diante deles.

* * *

Ele [São Policarpo] viveu longamente e atingiu idade avançada, morrendo num glorioso e brilhante martírio. Sempre ensinou o que aprendera dos apóstolos, o que a Igreja transmite, somente a verdade.

Atestam-no todas as Igrejas da Ásia e todos os que até hoje sucederam a Policarpo, o qual foi testemunha da verdade mais fidedigna e mais segura que Valentino, Marcião e os restantes de espírito pervertido. Tendo ido a Roma, sob Aniceto, reconduziu muitos dos supramencionados hereges à Igreja de Deus, anunciando ter recebido dos apóstolos uma só e única verdade, aquela transmitida pela Igreja.

Alguns ouviram-no contar que João, o discípulo do Senhor, tendo ido a Éfeso, quis banhar-se; mas vendo ali Cerinto, saiu do balneário, sem se banhar, dizendo: Fujamos daqui, para que o balneário não desabe. Aí se encontra Cerinto, o inimigo da verdade.

O próprio Policarpo um dia viu Marcião, que veio ao seu encontro e lhe disse: Reconhece-nos. Ele lhe respondeu: Eu te conheço. Conheço-te, primogênito de Satanás. Tal era a prudência dos apóstolos e de seus discípulos que não mantinham relação alguma, nem mesmo conversavam com os falsificadores da verdade, segundo diz Paulo: Depois de uma primeira e de uma segunda admoestação, nada mais tens a fazer com um herege, pois é sabido que um homem assim se perverteu e se entregou ao pecado, condenando-se a si mesmo (Tt 3,10-11).’ […]

As armas na defesa da Verdade

Recebi aqui no blog alguns comentários referentes à forma segundo a qual é lícito ao cristão travar os seus debates em defesa da Verdade. Em particular, foi atacada uma característica que sempre esteve presente na história da Igreja, que é a ironia direcionada contra os inimigos de Deus. Cabe, portanto, perguntar se é lícito ao cristão utilizar-se de ironia para defender a Deus e a Santa Igreja. A questão precisa ser analisada com um pouco de atenção.

Comecemos pelo Catecismo da Igreja Católica; o único momento em que ele fala sobre “ironia” é no parágrafo seguinte:

2481. A jactância ou vanglória constitui um pecado contra a verdade. O mesmo se diga da ironia que visa depreciar alguém, caricaturando, de modo malévolo, um ou outro aspecto do seu comportamento.

A ironia é, portanto, um pecado contra a Verdade. Mas cabe-nos ainda perguntar: isto se aplica a toda espécie de ironia? Ou ainda: a quê, exatamente, refere-se o catecismo quando coloca a ironia como sendo um pecado contra a Verdade?

Santo Tomás de Aquino também fala sobre a ironia na Suma Teológica (Secunda Secundae, q. 113). Para o Doutor Angélico, no entanto, a ironia é aquela coisa “pela qual alguém finge ser menos do que é na realidade”. E ele distingue a ironia que respeita a Verdade daquela que A falseia; esta última é sempre pecado mas, a primeira, não é pecado em si. Parece-nos, todavia, que ainda não é bem este o sentido da palavra que nós estamos buscando.

Sejamos um pouco mais insistentes e mergulhemos com mais afinco nos escritos do Aquinate. Em outro lugar da Summa, falando sobre a “burla” (Secunda Secundae, q.75) e principalmente sobre a “contumélia” (Secunda Secundae, q. 72), encontramos Santo Tomás falando de algo que se assemelha mais àquilo sobre o qual estamos tratando; esta última, aliás, refere-se justamente às injúrias verbais e, salvo melhor juízo, a “ironia” que nós estamos procurando encaixa-se justamente aqui. Santo Tomás nos ensina que “nos pecados de palavras parece que deve considerar-se, sobretudo, com que intenção se pronunciam as palavras. (…) [S]e alguém pronuncia palavras de insulto ou de contumélia contra outro, mas sem intenção de desonrá-lo, e sim para corrigi-lo ou por outro motivo similar, não profere um insulto ou contumélia formal e diretamente, senão acidental e materialmente. (…) Por isso, isto pode ser algumas vezes pecado venial e outras vezes nem sequer haver pecado” (II-IIae, q.72, a.2).

Isso nos explica melhor o sentido do parágrafo 2481 do Catecismo; a ironia que é pecado contra a Verdade é aquela “que visa depreciar alguém”, que é feita “de modo malévolo”. Se, ao contrário, for usada no meio dos embates apologéticos, com o intuito de defender a Verdade e condenar o erro, para desmascarar os sofismas levantados contra Deus e expôr ao ridículo os inimigos da Santa Igreja, então a ironia pode ser não apenas lícita como também meritória. E, desta boa aplicação da ironia, há abundantes exemplos na História da Igreja.

Uma das passagens bíblicas que melhor ilustra isso encontra-se no Primeiro Livro dos Reis. Elias fez um desafio aos profetas de Baal: tanto um quanto outros colocariam um novilho sobre uma pilha de lenha, e invocariam, estes Baal, aquele o Senhor. O Deus que respondesse seria o verdadeiro Deus. Os sacerdotes de Baal foram os primeiros a fazer a prova. Após gritarem pelo ídolo pagão durante a manhã inteira sem obterem resposta, Elias começou a zombar deles:

Sendo já meio-dia, Elias escarnecia-os, dizendo: Gritai com mais força, pois (seguramente!) ele é deus; mas estará entretido em alguma conversa, ou ocupado, ou em viagem, ou estará dormindo… e isso o acordará. [1Rs 18, 27]

E eles gritaram. “Mas não houve voz, nem resposta, nem sinal algum de atenção” (v. 29). Foi quando Elias preparou um altar, e invocou o nome do Senhor, e então “o fogo do Senhor baixou do céu e consumiu o holocausto, a lenha, as pedras, a poeira e até mesmo a água da valeta” (v. 38). Elias debochou duramente dos seguidores de Baal, expondo-os ao ridículo diante do povo de Israel; depois disso, clamou ao Senhor e foi escutado.

E os santos que se envolveram em polêmicas foram por muitas vezes ácidos e irônicos. Existe um escrito de São Jerônimo que, na minha opinião, todos os católicos deveriam ler e reler: trata-se do Tratado da Virgindade Perpétua da Santíssima Virgem. Foi uma polêmica que o santo travou com um herege chamado Helvídio, que negava a Virgindade de Maria Santíssima. Já nas primeiras linhas da obra, São Jerônimo deixa claro qual é o seu estilo:

1. Há algum tempo, recebi o pedido de alguns irmãos para responder a um panfleto escrito por um tal Helvídio. Demorei para fazê-lo, não porque fosse tarefa difícil defender a verdade e refutar um ignorante sem cultura, que dificilmente tomou contato com os primeiros graus do saber, mas porque fiquei preocupado em oferecer uma resposta digna, que desmoronasse os seus argumentos.

Havia ainda a preocupação de que um discípulo confuso (o único sujeito do mundo que se considera clérigo e leigo; único também, como se diz, que pensa que a eloquência consiste na tagarelice, e que falar mal de alguém torna o testemunho de boa fé) poderia passar a blasfemar ainda mais, caso lhe fosse dada outra oportunidade para discutir. Ele, então, como se estivesse sobre um pedestal, passaria a espalhar suas opiniões em todos os lugares.

Também temia que, quando caísse na realidade, passasse a atacar seus adversários de forma ainda mais ofensiva.

Mas, mesmo que eu achasse justos todos esses motivos para guardar silêncio, muito mais justamente deixaram de me influenciar a partir do instante em que um escândalo foi instaurado entre os irmãos, que passaram a acreditar nesse falatório. O machado do Evangelho deve agora cortar pela raiz essa árvore estéril, e tanto ela quanto suas folhagens sem frutos devem ser atiradas no fogo, de tal maneira que Helvídio – que jamais aprendeu a falar – possa aprender, finalmente, a controlar a sua língua.

Não é um exemplo isolado. De muitos que poderiam ser citados, também Santo Ireneu, quando atacava os gnósticos do seu tempo, não tinha melindres sentimentalistas e lançava-se com ardor à batalha que precisava travar para defender a Sã Doutrina:

Vejamos agora as inconstantes doutrinas deles [dos gnósticos]. São duas ou três, e como falam de forma diferente sobre as mesmas coisas e, servindo-se de nomes iguais, indicam objetos diferentes.

[…]

Outro ilustre mestre deles, dotado de gnose mais sublime e profunda, expõe assim a primeira Tétrada: existe, antes de todas as coisas, um Pró-princípio pró-ininteligível, inexprimível e inominável que chamo Unicidade. Com ele está uma Potência que chamo Unidade. Estas, Unicidade e Unidade, que são uma coisa só, emitiram, sem emitir, um Princípio inteligível, ingênito e invisível, ao qual dou o nome de Mônada. Com esta Mônada está uma Potência da mesma substância, que chamo Um. Estas Potências, isto é, Unicidade e Unidade, Mônada e Um emitiram os restantes Eões.

Ha! he! ah! ah! Valem estas exclamações trágicas diante desta audácia em inventar nomes e aplicá-los despudoradamente a esta mentirosa invenção. Com efeito, quando diz: Existe antes de todas as coisas um Pró-princípio pró-ininteligível que chamo Unicidade e com ele está uma Potência que chamo Unidade, mostra claramente que são ficção todas as palavras que pronunciou e que deu a estas ficções nomes que ninguém antes dele lhes deu. Se não tivesse esta ousadia, segundo ele, ainda hoje a verdade estaria sem nome. Por isso, nada impede que outro qualquer, ao tratar deste assunto, use estes nomes: Existe certo Pró-princípio soberano pró-esvaziado-de-inteligibilidade, pró-esvaziado-de-substância e Potência pró-pró-dotada-de-esfericidade, que chamo Abóbora. Junto com esta Abóbora coexiste uma Potência que chamo Super-vacuidade. A Abóbora e a Super-Vacuidade, sendo um só, emitiram sem emitir um Fruto visível de qualquer lugar, comestível e saboroso, ao qual dou o nome de Pepino. Junto com este Pepino existe uma Potência da mesma substância, que chamo Melão. Estas Potências, isto é, Abóbora e Super-vacuidade, Pepino e Melão emitiram a multidão restante dos Melões delirantes de Valentim. Com efeito, se é necessário ajustar a fala comum à primeira Tétrada e se cada um escolhe os nomes que quer, o que impede usar estes nomes muito mais inteligíveis, usuais e conhecidos de todos?
[Santo Ireneu, Contra as Heresias, Livro I, Parte II, 11,1-11,4]

Ora, se os santos – que nos são propostos pela Igreja como modelos de virtude – souberam atacar virulentamente os inimigos da Igreja, como poderemos sustentar que a ironia seja algo de mau em si? Como pode a ironia ser contra a caridade, se tantas pessoas piedosas e tementes a Deus souberam utilizá-la tão bem? Na verdade, o bom católico não tem o sentimentalismo piegas que parece ser característica dos nossos dias. O verdadeiro católico é um soldado de Cristo, é uma alma corajosa, dotada de fibra e de zelo na defesa da Fé e na exaltação da Igreja de Nosso Senhor. O bom católico sabe – à imitação dos santos – agir com dureza quando estão em jogo coisas importantes. O bom católico, como no lema de São Bento, ora et labora: reza, como na Ladainha de todos os Santos, a fim de que os inimigos da Igreja sejam humilhados (ut inimicos Sanctae Ecclesiae humiliare digneris – Te rogamus, audi nos!) e trabalha, com afinco, para que a Verdade triunfe sobre os erros e sejam desmascarados os inimigos de Deus. Inclusive utilizando-se da ironia, se necessário for, ad Majorem Dei Gloriam. Note-se que ninguém está obrigado a ser irônico; mas aqueles que souberem, quiserem e puderem sê-lo, não precisam ficar com escrúpulos de consciência. A ironia não é condenável em si mesma.

Obviamente, é necessário haver parcimônia; claro que a ironia pode por vezes degenerar em deboche grosseiro, em agressão gratuita, e pode se transformar sim em falta de caridade. Além do mais, o tom irônico não dispensa os argumentos, como é óbvio, sob a gravíssima pena de ser contraproducente. Mas – e isso é o mais importante aqui – nem toda ironia é falta de caridade, e é lícito empregá-la na defesa de Nosso Senhor. Que a Virgem Santíssima nos faça católicos de fibra; e que os santos nos ensinem a fugir do “politicamente correto”, sabendo reconhecer o valor e a importância de dedicar-se com zelo ao Bom Combate que todos nós somos chamados a travar.